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Psicologia USP

versão On-line ISSN 1678-5177

Psicol. USP v.6 n.2 São Paulo  1995

 

ARTIGOS ORIGINAIS

 

O uso de procedimentos projetivos na pesquisa de representações sociais: projeção e transicionalidade

 

The use of projective techniques in the research of social representations: projection and transitionality

 

 

Tânia Maria José Aiello-Vaisberg

Instituto de Psicologia - USP

 

 


RESUMO

O artigo propõe o estudo das representações sociais a partir da perspectiva psicodinâmica. Considera que a utilização de métodos projetivos tem-se revelado uma alternativa promissora de pesquisa, abordando-os como metodologia clínica sofisticada, que consiste precisamente na aplicação do método psicanalítico ao campo transicional.

Descritores: Representação social. Psicanálise. Psicodinâmica. Distúrbios mentais. Técnicas projetivas.


ABSTRACT

This paper proposes the study of social representations under a psychodinamic view. It considers that the use of projective methods is a promising alternative of research and should be seen as a sofisticated clinical methodology, based on the application of psychoanalysis to transitional area.

Index terms: Social representation. Psychoanalysis. Psychodynamics. Mental disorders. Projective techniques.


 

 

O conceito de representação social tem-se revelado ferramenta teórica extremamente útil na pesquisa. Alegam os trabalhos clássicos que sua definição tem sido propositadamente deixada em estado de certa "frouxidão" no intuito de garantir flexibilidade e fecundidade. De fato, o exame da literatura constata seu emprego produtivo em diversos campos de investigação na área das ciências humanas (Jodelet, 1989b), de modo que é aceitável a afirmação de que as representações sociais constituem um campo transdisciplinar, que desde seu nascedouro apresentou inconfundível vocação para o diálogo entre disciplinas afins (Spink, 1989, 1994). Entretanto, pensamos que é justamente este caráter transdisciplinar o que demanda um esforço no sentido de definição conceitual mais precisa, a partir da qual seja possível uma melhor organização disciplinar, no sentido de permitir a discriminação do que cada enfoque oferece como contribuição específica e do que é comum aos diferentes campos. Neste sentido, o apelo à "frouxidão" nos soa como justificativa frágil de um movimento teórico de esquiva à tarefa de depuração conceitual, pois, de acordo com nossa visão, a precisão, evitando ambiguidades desnecessárias, não diminui a potência heurística do conceito.

Trabalhando, ainda, sob o domínio desta imprecisão, as principais propostas de entendimento da organização da transdisciplinaridade são, a nosso ver, aquelas formuladas por Jodelet (1989a)1 e Sperber (1989)2, as quais nos parecem bastante interessantes, mas insuficientemente fundamentadas, na medida em que para aquela os objetos das diferentes disciplinas são, de fato, diferentes, enquanto este propõe diferentes perspectivas analíticas sem fundamentá-las convenientemente do ponto de vista epistemológico. Em todo o caso, uma transdisciplinaridade superficialmente discutida foi entusiasticamente celebrada na Segunda Conferência Internacional sobre Representações Sociais, em 1994, revelando talvez o receio de aprofundamento de controvérsias ou até mesmo a presença de interesses político-institucionais na maior difusão da Teoria das Representações Sociais.

Por esta razão, julgamos oportuno apresentar uma visão diversa, apoiando-nos na ordenação do campo psicológico proposta por Bleger (1975), segundo a elaboração que faz das contribuições de Politzer (1928)3. Esta ordenação, que é apresentada em apêndice na obra Psicologia da Conduta, corresponde, a nosso ver, a uma tentativa extremamente bem sucedida de organização do campo epistemológico das ciências em geral e das ciências humanas em particular, esclarecendo satisfatoriamente o que se entende por perspectiva analítica ou construção de objeto teórico. Considerando que a complexidade fenomênica é apreendida em diferentes níveis analíticos pela química, física e biologia, estabelece que o fenômeno humano, em virtude de sua complexidade essencial, é abordado no mesmo nível e a partir de diferentes perspectivas pelas diversas ciências humanas que incluem a economia, antropologia, sociologia, psicologia, biologia humana etc. As representações sociais, como todos os fenômenos humanos, devem ser vistas como condutas, na acepção dialética do termo (Bleger, 1975)4, e como condutas podem ser estudadas por todas as ciências humanas, segundo seus pontos de vista. Ou seja, diferentemente daquilo que professa o positivismo, de acordo com o qual o objeto é múltiplo e o método é único, fornece subsídios segundo os quais o objeto é único e os métodos são múltiplos. O objeto, imanentemente definido como social e histórico, são as manifestações ou condutas humanas, que se podem expressar de modo simbólico, corporal ou como atos concretos, em âmbitos individual, sociodinâmico ou institucional.

Especificamente falando, as representações sociais corresponderiam a um grupo particular de condutas, definidas por ocorrerem na área mental5 e no âmbito sociodinâmico6, na medida em que correspondem a manifestações simbólicas de subjetividades grupais. Este grupo particular de condutas, do mesmo modo que todas as condutas, pode ser tomado como objeto por todas as ciências humanas, as quais se diferenciariam entre si na medida em que cada uma se definisse como uma perspectiva particular de análise das manifestações simbólicas de subjetividades grupais. Pensamos, então, que às perspectivas antropológicas, cognitivas e psicossociais poderia ser promissoramente acrescentada uma nova possibilidade analítica: a perspectiva psicodinâmica.

Esta consideração das representações sociais como condutas, que se atualizam na área da mente e no âmbito sociodinâmico, é possibilitada por uma visão da psicanálise que não restringe o conceito de subjetividade ao domínio da personalidade individual. De fato, é bastante difundida uma leitura freudiana de acordo com a qual o sujeito psicanalítico é o indivíduo, que aliás, é concebido, nas palavras de Bleger (1975), em conformidade ao mito do homem natural, isolado e abstrato. Ora, se consideramos que o ser humano é, em essência, social e que a própria personalidade individual é produto do desenvolvimento histórico, e não um dado primário, entenderemos, com Politzer (1928) e Bleger (1958), que o discurso psicanalítico não depende intrinsecamente do conceito de subjetividade individual. De fato, os textos freudianos, em que nos basearemos para entender a teoria psicanalítica da representação, podem ser lidos proveitosamente sem que nos limitemos a uma visão do psíquico como fenômeno intraindividual. Deixaremos, assim, de transitar em espaço teoricamente confinado segundo modelos estruturais-pulsionais (Greenberg & Mitchell, 1994), tributários da visão de homem característica da ciência moderna. Tais modelos contrastam, por obsolescência, com as transformações paradigmáticas que se fazem cada vez mais presentes (Santos, 1987, 1989), em relação às quais as idéias de Bleger (1975) apresentam inegável afinidade.

A idéia de subjetividades coletivas ou grupais origina-se, evidentemente, da leitura dialética do freudismo, articulação que vem sendo tematizada há décadas por importantes autores. Entre eles, Goldmann (1974), que admitindo que marxismo e psicanálise, na qualidade de estruturalismos genéticos, são dois projetos epistemológicos que apresentam convergências e divergências profundas e fundamentais, assinala os seguintes pontos comuns: ambos aceitam o pressuposto segundo o qual não existe nada, no plano humano, desprovido de sentido; ambos elaboram métodos que visam o restabelecimento de sentido a partir de fragmentos em si mesmos aparentemente sem significado ou dotados de uma significação que o método revelará enganosa ou parcial; ambos buscam a integração do fenômeno estudado em uma totalidade relativa mais ampla, tanto no plano do psiquismo como no plano da vida histórica; finalmente, ambos assumem que as estruturas não são invariáveis e permanentes, mas que constituem a etapa final de processos genéticos de alta complexidade.

Por outro lado, considera este autor que uma das divergências mais profundas entre o marxismo e a psicanálise reside na concepção de sujeito. Quando atrelada à teoria da libido, a psicanálise veria o sujeito como unicamente individual, na medida em que, baseando-se no conceito de pulsões estribadas na unidade biológica individual, considera os demais indivíduos apenas objetos de satisfação, ou obstáculos para sua obtenção. Em virtude desta concepção do sujeito como indivíduo, as contribuições da psicanálise freudiana ao entendimento do fenômeno cultural são, de acordo com Goldmann (1974), transposições das análises do comportamento e da libido individual. A psicanálise deixaria de apreciar adequadamente que, com o desenvolvimento da função simbólica, da linguagem e da comunicação, aparecem outras necessidades, além das libidinais, que levam às tentativas de domínio da natureza e à divisão social de trabalho. O problema da divisão de trabalho, por seu turno, exigirá a concepção de um sujeito constituído por vários indivíduos, de sorte que, entre dois indivíduos componentes de um sujeito coletivo, existiriam relações intrasubjetivas e não relações sujeito-objeto, como quer a teoria da libido, nem relações intersubjetivas, como pensam filósofos individualistas que lidam com indivíduos como sujeitos absolutos.

Para Goldmann (1974), na impossibilidade da psicanálise conceber o sujeito coletivo ou transindividual, bem como relações intrasubjetivas, reside o ponto de ruptura fundamental entre esta e o pensamento dialético. Entretanto, o que é profundamente discutível nesta análise, é sua identificação da psicanálise à teoria da libido, de sorte a limitar-se a uma visão estrutural-pulsional que, firmemente ancorada nos escritos metapsicológicos, deixa muito a desejar como fundamento compreensivo dos trabalhos clínicos, segundo a duplicidade discursiva já apontada por Politzer (1928). De nossa parte, apoiados nas colocações de Herrmann (1979), que considera que as diversas teorias psicanalíticas são exemplos de aplicação do método e, portanto, secundárias, entendemos que os pontos de convergência existentes são suficientemente sólidos para suportar a leitura dialética de Bleger (1975), na qual nos apoiamos para focalizar fenômenos referidos a sujeitos coletivos.

 

A PSICODINÂMICA DAS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS

O estudo das representações sociais a partir da perspectiva psicodinâmica funda-se na investigação da pauta de relacionamento objetal, angústias, técnicas defensivas e elaboração imaginativa, fatores que, a meu ver, têm efeito determinante na constituição, elaboração, manutenção e/ou transformação das representações sociais. Na tradição dos estudos moscovicianos já se encontra, de modo implícito, esta vertente psicodinâmica, na medida em que se considera que uma das funções das representações sociais é tornar o desconhecido familiar (Moscovici, 1978), no sentido de se apresentarem como tentativas de diminuição da angústia existencial característica da condição humana. É justamente perseguindo a pista das possíveis relações entre a elaboração das representações sociais e o domínio de angústias que estamos propondo esta linha de investigação, considerando, em consonância com os pensamentos de Freud (1911) e Bion (1970), que todo pensamento se origina na tentativa humana de organizar a experiência emocional. Ou seja, o pensar visaria o conhecimento do mundo primordialmente com o objetivo de diminuir a angústia para, apenas em uma segunda instância, obter informações que podem facilitar o intercâmbio com a realidade externa.

Recentemente, Moscovici (1993) sugeriu a retomada de formulações psicanalíticas, o que, a nosso ver, pode ter um efeito heuristicamente fecundo, se nos mantivermos conscientes da limitação da teorização freudiana clássica pelo horizonte cultural e científico de seu tempo. Portanto, valeria a pena rever, tendo em vista o aprofundamento do conceito de representação social, as contribuições que Freud apresentou no Projeto de uma psicologia para neurólogos (1895), no capítulo VII da Interpretação dos sonhos (1900) e em Os dois princípios do funcionamento mental (1911). Resumidamente, considera que, de acordo com o princípio do prazer, aquilo que se representa nos primórdios da atividade mental é o objeto desejado, sob forma de alucinação. A ineficácia da alucinação, entretanto, provoca a instauração de um outro princípio de atividade psíquica, o princípio da realidade, de modo que se deixa de representar apenas o agradável, passando-se a representar o real, mesmo que desagradável. A partir deste momento, o aparelho psíquico transforma-se, desenvolvendo capacidades voltadas para o reconhecimento da existência da realidade exterior. Trata-se, portanto, de um processo que tem início na alucinação do objeto desejado e que desemboca no pensar. O pensamento, como mediação, vai permitir a postergação da satisfação dos impulsos e a aprendizagem progressiva da realidade. O organismo poderá, então, através de ações eficazes, desvios e adiamentos, chegar ao prazer. O ponto fundamental, a ser ressaltado no presente contexto, é que o psiquismo segue funcionando simultaneamente de acordo com os dois princípios, pois, paralelamente à capacidade de pensar propriamente dita subsiste, no fantasiar e no sonho, uma atividade sempre tributária do processo primário.

Se aceitamos as formulações freudianas acerca do pensar, distinguindo processo primário e secundário, como não essencialmente referidas ao psiquismo individual, cabe perguntar como deveriam ser vistas as formas de pensamento social. De acordo com esta perspectiva, as representações sociais devem ser consideradas como expressão simultânea tanto do acatamento do princípio da realidade, na medida em que visam ao conhecimento do mundo, como da sobrevivência mental do fantasiar com vistas à obtenção da satisfação de necessidades e desejos, no âmbito das subjetividades grupais. Assim, a aceitação da transposição das formulações teóricas acerca do aparelho psíquico, do âmbito individual para o grupal, justifica teoricamente a proposição de uma perspectiva psicodinâmica7 para o estudo do pensamento social, a qual poderá vir a fornecer uma base sólida de conhecimento que pode orientar intervenções psicoprofiláticas que visem a transformações em condutas de grupos e instituições. Ou seja, exatamente por proporcionar conhecimento que transcende a dimensão cognitiva das representações, focalizando seu substrato afetivo-emocional, tributário ao processo primário, a psicodinâmica das representações sociais instrumentalizaria eficientemente aquelas situações em que as mudanças não podem ocorrer em virtude de resistência emocional.

Contemporaneamente, alguns estudiosos tem criticado as colocações de Freud, na medida em que trabalhou metapsicologicamente com uma concepção de homem que abstrai suas condições concretas de vida (Bleger, 1975). De fato, entende-se que tenha trabalhado, nos escritos teóricos, com um modelo do funcionamento mental de tipo estrutural-pulsional (Greenberg & Mitchell, 1994), segundo o qual o psiquismo pode ser compreendido, em última instância, como um sistema fechado. Entretanto, os desenvolvimentos psicanalíticos, que tomaram como ponto de partida à experiência clínica, e os estudos freudianos clínicos e culturais privilegiaram cada vez mais os modelos estruturais-relacionais, centrados em teorias de relações objetais. Toda essa produção permite, na medida em que não abstrai a essência social do ser humano, a constituição de uma verdadeira psicodinâmica social. Desta forma, o conhecimento psicanalítico pode contribuir para um maior detalhamento do aspecto afetivo das representações sociais, cuja importância Spink (1994) preconiza enfaticamente.

A psicodinâmica social procura, assim, focalizar as representações sociais, como condutas simbólicas de subjetividades grupais, considerando a teoria psicanalítica da representação, oriunda da aplicação do método psicanalítico. Uma melhor compreensão de como podemos articular método e teoria representacional na construção de uma psicodinâmica das representações sociais requer a elucidação do conceito de fantasia inconsciente, principalmente porque este conceito é muitas vezes confundido com o de representação. O conceito de fantasia está comumente associado, nos escritos analíticos, a duas acepções: 1) forma ideativo-afetiva que o analista atribui ao seu paciente e 2) estrutura subjacente e eficaz, recoberta por uma representação, que o analista atribui ao paciente (Herrmann, 1979). A correta apreensão, do ponto de vista epistemológico, do que fundamenta a atividade interpretativa, demonstra, sem dificuldade, que o primeiro sentido é, no mínimo, ingênuo, e corresponde a uma visão positivista de "descoberta" de algo invisível. Além disso, este primeiro sentido não permite distinguir fantasia e representação. Por outro lado, a segunda acepção do termo já envolve o reconhecimento de que a especificidade de um trabalho interpretativo, voltado à captação da estrutura subjacente, está presente. Contudo, ainda se mantém vinculada a uma concepção do ato interpretativo tributária da crença na possibilidade de separação sujeito-objeto, que o paradigma epistemologicamente emergente rejeita decisivamente (Santos, 1987, 1989).

Quando podemos abandonar uma adesão não-crítica ao paradigma da ciência moderna, e voltamo-nos ao campo da experiência, que origina a construção do conceito de fantasia, podemos, com Herrmann (1979), entendê-la como produto do ato interpretativo consumado, que o par analítico constrói a partir dos significados potenciais do discurso do paciente. Podemos, assim, pensar na fantasia como estrutura significativa subjacente à representação, desde que tenhamos claro que ela "não está lá", no material ou no inconsciente, mas sim que é produzida pelo método interpretativo, conferindo inteligibilidade lógico-emocional às representações. Desta feita, no trabalho de pesquisa sobre representações sociais, visamos tanto à detecção das próprias representações, em termos de conteúdos ideo-afetivos, como à apreensão das fantasias subjacentes, entendidas como estruturas lógico-emocionais a serem produzidas pelo método interpretativo, sendo que os procedimentos projetivos revelam-se adequados em ambas as tarefas. Um exemplo pode esclarecer. Pensemos na realização de um estudo acerca da psicodinâmica das representações sociais sobre judeus por jovens neo-nazistas. Num primeiro momento seria fundamental saber quais são as representações dominantes - por exemplo inteligentes, estúpidos ou sem referência à dimensão inteligência, briguentos, corajosos, covardes etc. - enquanto, num segundo momento, tornar-se-ia fundamental detectar a lógica emocional subjacente, ou, para dizer em outros termos, construir interpretativamente a fantasia estruturante.

Um último ponto merece ser ressaltado, para finalizarmos a exposição de nosso pensamento em relação à proposição da perspectiva psicodinâmica de análise de representações sociais. Trata-se de sua contextualização dramática, requisito indispensável para a realização do trabalho interpretativo referido ao ser humano enquanto concreto, histórico e social. Desde os primeiros trabalhos de Freud, que focalizavam a constituição dos sintomas neuróticos e dos sonhos, sabemos que as condutas, por mais estranhas que pareçam, têm sempre significado que, para ser apreendido, exige o conhecimento dos acontecimentos que estruturam a trajetória vital do indivíduo. Assim, individualmente falando, a prática clínica tem ensinado que todo conhecimento psicodinâmico, para ter utilidade terapêutica, deve estar dramaticamente contextualizado, em termos da história singular de vida da pessoa. Nenhuma interpretação é eficaz se não é concebida "sob medida", tendo como referência concreta o acontecer vital do paciente. Analogamente, acreditamos que o estudo de condutas correspondentes a subjetividades grupais exige, evidentemente, a contextualização das manifestações em termos da dramática grupal(Bleger, 1975), tanto quando se tem em vista a pesquisa propriamente dita, como quando se elaboram intervenções. Por exemplo, o estudo de representações de estudantes sobre doença mental, desde a perspectiva psicodinâmica, requer o exame das condições concretas em que vivem, a partir das quais enfrentam as angústias específicas deste momento de vida, vivido neste momento histórico, neste país, nesta cidade etc., ou seja, seu enquadramento dramático. Tal enquadramento requer, a nosso ver, o concurso de estudos e conhecimentos provenientes de outras perspectivas analíticas, que incluem, principalmente, a psicologia social, a antropologia, a sociologia e a história.

 

PESQUISA DE REPRESENTAÇÕES SOCIAIS E PROCEDIMENTOS PROJETIVOS

A investigação de representações de diferentes grupos sobre o doente mental, à qual temos nos dedicamos nos últimos anos8, norteia-se pelo interesse eticamente fundado na modificação das práticas sociais psiquiatricamente prevalentes. Concebemos a pesquisa de representações sociais comprometida com um trabalho maior de desconstrução de representações restritivas e estereotipadas e de elaboração de outras, mais flexíveis e criativas, adotando uma abordagem que se inscreve, obviamente, em tradições de pensamento que valorizam a não-dissociação entre teoria e prática. Ora, quando se articulam a busca de conhecimento e o desejo de transformação, no campo das ciências humanas, evidentemente aparecem problemas novos. Alguns destes problemas derivam, exatamente, da exigência lógica de que a idealização de projetos de pesquisa leve em cota, desde o primeiro momento, o interesse básico na obtenção de mudanças9.

As pesquisas sobre a psicodinâmica das representações sociais, que ora propomos, visam ao conhecimento do aspecto afetivo inconsciente, que se delineia através da detecção de angústias, defesas, elaboração imaginativa e pautas de relacionamento objetal, bem como o alcance de insight. Assim, tornam-se desejáveis procedimentos de pesquisa que não apenas permitam a detecção de dados como também propiciem ou facilitem mudanças a partir de elaboração reflexivo-vivencial dos próprios sujeitos, de acordo com o paradigma clínico. A clínica psicodinâmica permite a expressão subjetiva, a interpretação e a transformação. Traz, assim, ensinamentos que podem ser transpostos para o âmbito sociodinâmico, articulando vinculadamente investigação e intervenção.

No primeiro momento deste tipo de trabalho, faz-se necessária a expressão subjetiva, a partir da qual as dimensões psicodinâmicas podem ser interpretadas. Considerando que as representações sociais, como formas de pensamento, enraizam-se no inconsciente, regido pelo processo primário, torna-se fundamental o uso de técnicas especiais, que permitam a sua captação. Tradicionalmente, reconhece-se que a interpretação onírica, a psicanálise clínica, através do procedimento de associação de idéias, e os procedimentos projetivos são os meios através dos quais se pode ter acesso ao inconsciente. Evidentemente, dados acerca de representações sociais podem ser recolhidos através de qualquer um destes três meios, bem como através de outras técnicas psicológicas, desde que cada caso estudado seja visto como caso genérico, ou seja, como representativo dos grupos a que pertence, superando-se, assim, o mito do homem isolado (Bleger, 1975)10. A nosso ver, do ponto de vista pragmático, os procedimentos projetivos oferecem muitas vantagens no sentido de aplicabilidade à pesquisa. Constatamos, entretanto, que, malgrado seu potencial, têm sido subutilizados cientificamente, no âmbito sociodinâmico. Aparecem em pequeno número de trabalhos, embora a idéia de seu emprego seja relativamente antiga (Henry, 1967). Este estado de coisas explica-se, a nosso ver, pelo fato de os procedimentos projetivos requererem experiência em psicologia clínica, o que, como sabemos, não é fácil adquirir. Por outro lado, a riqueza de material passível de ser obtido deste modo justifica o convite aos clínicos no sentido de trazerem sua contribuição metodológica para equipes de pesquisadores desta área de conhecimento.

Aponta Proshansky (1967) que, no campo da pesquisa social, quando são estudados grupos problemáticos ou questões problemáticas, ou seja, quando se pode esperar dificuldades na expressão dos sujeitos, são utilizadas técnicas encobertas de pesquisa. Estas dificuldades podem ser de mais de um tipo. Há casos em que os sujeitos não são capazes de articular idéias e sentimentos de acordo com o modo como demandam os pesquisadores. Assim, procedimentos especiais, pelo seu caráter indireto, podem evitar distorções oriundas das limitações dos sujeitos na utilização de modos discursivos característicos de camadas sociais mais instruídas do ponto de vista formal. Outras vezes, os sujeitos expressam-se de modo "politicamente correto", porque conhecem as expectativas acerca de certos temas, omitindo ou transformando propositalmente suas representações (Kirk & Miller, 1986). Em outros casos, o interesse de pesquisa aconselha o uso de procedimentos especiais porque sabemos, baseados no conhecimento psicanalítico, que os sujeitos não têm acesso aos determinantes inconscientes de seu pensamento. Esta particularidade da condição humana, que pode ser abstraída em certas situações e de acordo com determinados interesses de pesquisa, certamente interfere de modo decisivo quando são abordados temas socialmente problemáticos. Quando falamos em perspectiva psicodinâmica de análise de representações sociais, estamos focalizando, precisamente, os aspectos afetivos inconscientes, o que requer o uso de técnicas encobertas que ensejem a expressão deste material.

As técnicas encobertas podem ser identificadas pelo fato de, no primeiro momento, não deixarem visível sua aplicação, ou não deixarem visíveis os objetivos de uma aplicação percebida, com a finalidade de não criar situações que, no limite, inviabilizariam a própria realização da pesquisa. Ainda que problemas de ética de pesquisa e atendimento devam ser profundamente discutidos, em muitos casos fornecer aos sujeitos informações completas e detalhadas sobre a investigação pode levar à impossibilidade real de estudo de certos fenômenos.

Parece importante, como veremos abaixo, distinguir as técnicas encobertas em termos de seu grau de visibilidade. Quando a técnica é minimamente visível, os sujeitos nem percebem que estão sendo investigados. Como exemplo, podemos citar um certo tipo de observação participante, em que o pesquisador registra dados oriundos de interações espontâneas entre membros de uma equipe multidisciplinar, focalizando representações sobre pacientes com AIDS. Por outro lado, os procedimentos que se caracterizam pelo fato de os sujeitos saberem que estão sendo estudados, mas não como isto está sendo feito, podem ser considerados como técnicas encobertas maximamente visíveis. Nestes casos, os sujeitos perceberiam a presença do investigador, bem como sua atividade de pesquisa, mas não a natureza do meio que se utiliza ou a finalidade do estudo. Uma ampla gama de procedimentos encobertos maximamente visíveis corresponde precisamente aos procedimentos projetivos, os quais, em muitos casos, revelam-se como os mais convenientes por dois diferentes tipos de razão. De um lado, porque a massa de informações proveniente das técnicas encobertas não-projetivas é tão grande que sua organização fica muito dificultada, o contrário ocorrendo no segundo caso, caracterizado por uma quantidade de dados expressiva, mas passível de ser organizada e interpretada de um modo mais metódico. De outro lado, porque certas questões éticas ficam melhor resolvidas quando os sujeitos concordam em participar de atividades de pesquisa, aceitando, inclusive, o fato de não poderem ter todas as informações acerca de seus objetivos anteriormente à própria participação.

Cabe, entretanto, indagar acerca do que define, mais precisamente, o procedimento projetivo, enquanto modalidade de investigação encoberta. De acordo com Proshansky (1967), o traço fundamental dos procedimentos projetivos é o fato de as expressões do sujeito não serem compreendidas apenas a partir do significado que o próprio sujeito conscientemente lhes atribui, e sim interpretadas em termos de alguma conceituação psicológica pré-estabelecida. Importam menos os meios utilizados do que o modo como será tratado o material, de sorte que é até certo ponto secundário se aos sujeitos é solicitado que interpretem situações, respondam a perguntas ou questionários, narrem estórias sobre gravuras, desenhem ou representem, façam dobraduras, colagens etc. É igualmente secundário "o grau de estruturação dos estímulos apresentados", sendo coerente o abandono da idéia de que os métodos projetivos se definem essencialmente por serem pouco estruturados. Evidentemente, o grau de estruturação interferirá, determinando a maior ou menor liberdade do sujeito de impor seus próprios significados e organização ao que se lhe apresenta, mas de todo modo o grau de estruturação não definirá o caráter do procedimento. Um desenho livre, um desenho temático, a leitura de um poema ou as associações fornecidas às pranchas do Rorschach, podem ser projetivamente interpretados, ainda que estas diferentes tarefas apresentem diferentes graus de estruturação.

A proposta de Proshansky (1967) parece bastante interessante, na medida em que amplia consideravelmente a definição dos procedimentos projetivos. Entretanto, deixa de considerar um passo anterior que, a nosso ver, caracterizaria com rigor ainda maior o tipo de tratamento dispensado pelo pesquisador ao material projetivo. Este passo consiste exatamente no detalhamento de como se viabiliza o abandono dos significados que o próprio sujeito atribui conscientemente às suas comunicações, correspondendo à utilização do método psicanalítico de análise de manifestações ou de produtos de manifestações humanas.

Uma exposição clara e verdadeiramente prazerosa da essência do método psicanalítico é fornecida por Herrmann (1979),que o considera, fundamentalmente, uma forma subversiva de ouvir, na medida em que se quebra um acordo social tácito que, no cotidiano, restringe o significado das comunicações. Por isso, afirma expressivamente que fazer psicanálise é uma espécie de "falta de educação sistemática", "um ouvir fora da rotina" (Hermann, 1984). Assim, interpretar corresponde a romper os limites que a rotina impõe aos significados das comunicações entre pessoas, sendo que é justamente esta ruptura o que poderá produzir conhecimento e/ou cura. Ouvindo subversivamente pode-se chegar, inclusive, à recriação da própria mensagem, aí sim estabelecendo uma interlocução com alguma conceituação teórica pré-estabelecida, o que é muitíssimo diferente de interpretar usando a teoria como "chave".

 

PROCEDIMENTOS PROJETIVOS E TRANSICIONALIDADE

Se, para fornecer material projetivo, os sujeitos concordaram em ser investigados psicologicamente, desconhecendo como e por que suas respostas serão interpretadas, vale a pena focalizar como vivenciariam este tipo de situação. Chegariam a perceber que outra forma de leitura está sendo usada? Nossa hipótese é de que sim. Pensamos que, nestes casos, os sujeitos percebem que há uma espécie de jogo ou de "faz-de-conta" no ar, sabendo, também, que desconhecem regras que o outro conhece. O conceito winnicottiano de transicionalidade (Winnicott, 1951) pode ser aqui de alguma ajuda no que se refere ao entendimento dos processos subjetivos subjacentes ao uso dos procedimentos projetivos, como já adiantou Shentoub (1981), ainda que restringindo-se ao TAT. Assim, do ponto de vista psicanalítico contemporâneo, é possível explicar o processo projetivo de modo transicional, entendendo-se a apresentação do procedimento como uma forma sofisticada de brincar, de modo que o seu paradigma não é mais o teste psicométrico, mas a hora ludodiagnóstica e o jogo do rabisco. As perguntas são transicionalmente formuladas, feitas através de imaginação simbólica, e as respostas também são dadas da mesma forma. Pode-se, então, propor, para as situações em que os sujeitos conhecem que estão sendo psicologicamente estudados, mas não como estão sendo estudados, o conceito de procedimento projetivo como englobando tudo o que, a partir de uma forma sofisticada de brincar, propicie conhecimento acerca da subjetividade, mediante o uso, pelo pesquisador, de método de escuta que subverta o acordo consensual dos significados cotidianos e de teorias psicológicas que permitam a atribuição de novos significados às produções emergentes.

Sabemos que, historicamente, os chamados testes projetivos foram idealizados segundo a mesma linha de pensamento que norteou a elaboração dos psicométricos, ou seja, a partir de uma perspectiva positivista, que considerava que o dado "já estava lá", requerendo apenas ser descoberto de maneira rigorosamente objetiva11. A meta, então, era tornar o teste projetivo o mais parecido com aqueles concebidos para a mensuração da inteligência. Observou-se uma drástica mudança de rumo, em consonância não apenas com o aumento de prestígio das instituições psicanalíticas na América, nas décadas de quarenta e cinqüenta, mas sobretudo com os avanços da filosofia das ciências, que passou a criticar cada vez mais veementemente o conceito positivista de objetividade, bem como o ideal irrealista de não-interferência do pesquisador sobre a realidade estudada. Desenvolveram-se assim, idéias a partir das quais os projetivos passaram a ser considerados como procedimentos cientificamente válidos, que devem ser interpretados como comunicação entre sujeitos cujo psiquismo não é diretamente acessível, de modo completo, pela introspecção e/ou pela mera observação do comportamento manifesto. Ou seja, hoje é possível propor os procedimentos projetivos como uma forma especial de diálogo, em que o sujeito responde percebendo que o dito não será considerado de acordo com regras que geralmente são observadas nas situações cotidianas, mas de acordo com outras, que ele pessoalmente desconhece. Trata-se, portanto, de um diálogo lúdico. O rigor e a cientificidade ficam por conta da estruturação da própria situação dialógica, em certo sentido correspondente ao ambiente humano natural (Bleger, 1975), a partir do qual, mediante certos cuidados, garante-se que o campo interacional se estruture predominantemente a partir da personalidade dos sujeitos pesquisados (Bleger, 1975).

Durante a interação, o pesquisador brinca, fazendo uma proposta projetiva que é sempre uma pergunta feita de modo cifrado. Desenhe, conte uma estória, faça uma dobradura, dramatize, seja o que for, é uma pergunta indireta. Shentoub (1981) mostra que cada prancha do TAT é uma ou várias perguntas, pois cada prancha foi construída de modo a veicular, através do relato manifesto, um conteúdo latente. Assim, o pesquisador brinca ao perguntar, substituindo a questão conceitual por uma espécie de enigma imaginário, ao qual o sujeito só pode responder brincando. O sujeito brinca ao "fazer de conta" que só está atendendo à demanda manifesta quando sabe estar fazendo mais do que isto. Aliás, quando a capacidade de brincar está bloqueada, avizinhamo-nos de funcionamentos mentais francamente problemáticos, pertencentes ao campo da psicopatologia das psicoses.

Mas a ludicidade não se restringe ao acontecer da aplicação. Ao interpretar, o pesquisador também brinca, principalmente quando mantém uma relação sadia com a teoria, porque espontânea, criativa e não-defensiva. Se a teoria é vista como uma construção possível neste momento, como produto de trabalho humano que pode facultar uma aproximação esclarecedora da complexidade fenomênica, o pesquisador pode brincar. Se é tomada como revelação, torna o estudioso reverente, cristalizado e defensivo. Quando adota a postura propícia, o pesquisador pode apreender o que, num flash, o sujeito traz acerca do modo como se vincula a determinados objetos sociais, a partir das angústias, defesas e elaboração imaginativa, as quais, articuladamente, constituem a psicodinâmica das representações sociais.

Trabalhando a questão metodológica no contexto da investigação psicanalítica, Silva (1993) parece ter captado com precisão e sensibilidade esta face lúdica da pesquisa que se propõe como propiciadora da emergência de material inconsciente, na qual se incluem, como explicitamente reconhece, os procedimentos projetivos. Diz, então:

O método da psicanálise apresenta-se com uma dupla face: de um lado a prática, isso se traduz por uma espécie de jogo [grifo meu] em que as fantasias de ambos os interlocutores organizam-se em busca de um consenso sempre questionado a respeito do avesso do que foi dito. (...) A transposição dessas condições de investigação associação livre - oferta de material sem crítica ou intenção determinada; e de outro, a atenção flutuante - captação de material sem crítica ou intenção pré-determinada. Na - ou desse campo psicanalítico - do consultório para o campo de pesquisa sofre, naturalmente, ajustes adequados à fonte de material em estudo: sessão psicanalítica, entrevista, teste projetivo, livro, obra de arte, lenda, costume e instituições sociais, religiosas ou científicas. (Silva, 1993, p.20-1).

Assim, entendendo a relação do pesquisador com o material pesquisado como um brincar sofisticado, esta autora propõe que devem ser observados alguns aspectos essenciais que possibilitam a emergência do "significado submerso". Faz, então, algumas recomendações. A primeira delas é a de que o tema a ser investigado seja abordado a partir de um estado de desprendimento máximo em relação a conhecimentos ou teorias anteriores, de modo tal que se renuncie à segurança de um saber prévio em favor da assunção de uma curiosidade receptiva, que se faz através de uma atitude de paciência e espera de que o significado emerja a partir da expressão dos sujeitos. A seu ver, tal atitude tem origem na adoção de uma crença específica:

Para se contrapor ao medo de que nada de novo surja, ou à necessidade imperiosa de mostrar eficiência, há que acreditar no eterno movimento da vida, na natureza sempre pulsando em direção da representação, e ficar tranquilo de que um sentido sempre acabará por se fazer, porque é da ordem do humano que isto aconteça. (Silva, 1993, p.22).

Num passo seguinte, quando emerge o sentido na relação do pesquisador com o material estudado, acontece uma reestruturação do campo observado que, a partir de então, poderá vir a ser articulado com conhecimentos teóricos e empíricos anteriores. Resume, então, o seu conselho metodológico:

A pressa deve estar em ir a campo, e aí colher todos os dados que caírem na rede da atenção flutuante sem hipótese a ser testada, sem objeto muito bem definido, sem ansiedade de chegar rapidamente a uma compreensão desde sempre resenhada na introdução do trabalho. Deixar que os dados, em sua variedade e dispersão, repousem por algum tempo em nossa mente. Esta deve suportar o acúmulo de estímulos e a ausência de significação. Ter paciência para esperar que o inconsciente faça o seu trabalho e que a emergência do significado venha enfim aliviar a angústia do pesquisador e abençoá-lo com uma teoria provisória nascida de seu material de estudo.(Silva, 1993, p.24).

A nosso ver, o que preconiza Silva (1993), através dos conceitos de jogo de fantasias e atenção flutuante, pode ser mais profundamente compreendido se lançarmos mão do conceito winnicottiano de brincar, que se inscreve em sua teorização sobre os objetos e fenômenos transicionais (Winnicott, 1951). Estes correspondem ao campo da ilusão, precursor do espaço intermediário mental da imaginação e do mundo simbólico, que definem a especificidade existencial do ser humano. Conforme mostra Grolnick (1993), Winnicott usou o termo ilusão de um modo bastante diverso daquele encontrado na psicologia acadêmica tradicional, como uma variedade de alteração sensoperceptiva. Conservando, de modo bastante original, a noção de articulação entre experiência subjetiva e núcleo de realidade, que caracteriza o fenômeno ilusório, vincula o termo ilusão à sua etimologia latina, ludere, que significa brincar.

A pesquisa acerca da psicodinâmica das representações sociais, realizada mediante procedimentos projetivos, tanto no que se refere à coleta, ou seja, ao estabelecimento de condições propiciadoras da emergência do substrato inconsciente, como no que se refere à análise interpretativa dos dados, é entendida como uma forma sofisticada de um brincar que se faz em dois tempos, o tempo da expressão do sujeito e o tempo da interpretação. Somos, assim, remetidos a formulações winnicottianas que ensejam reflexões que conduzem à concepção de que o brincar criativo constitui-se como processo básico de conferência de significado humano à experiência. É precisamente neste espaço potencial, que é o campo da cultura, que se encontra a poiesis das representações sociais, na sua qualidade de elaboração subjetiva grupal. É também aí que o pesquisador realiza seu trabalho de interpretação psicodinâmica das condutas humanas e das representações sociais, como formas particulares de condutas: atribuindo significado a expressões subjetivas que, paradoxalmente, já lhe chegam prenhes de sentido12.

 

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1 Em Folie et representations sociales, Jodelet (1989a) distingue o uso deste conceito nas ciências sociais, na psicologia cognitiva e na psicologia social. Afirma, então, que as ciências sociais visariam a explicitação dos processos de interação entre as produções mentais e as condições concretas e funcionais dos grupos, sem considerarem a dimensão propriamente cognitiva do fenômeno. A psicologia cognitiva, por seu turno, teria por fito a apreensão das propriedades estruturais das representações sociais, focalizando o aspecto cognitivo sem contextuá-lo socialmente. Finalmente, a psicologia social buscaria o entendimento acerca das influências sociais sobre o processo cognitivo, articulando as condições sociais de produção do conhecimento com o processo elaborativo propriamente dito.
2 Sperber (1989) se preocupou com o entendimento do espraiamento do uso do conceito por diversas disciplinas, propondo a distinção entre diferentes tipos de análise. Desta feita, se as representações sociais são focalizadas como fenômenos intra-individuais, vale dizer, como representações mentais, podem ser estudadas pela psicologia cognitiva ou pela psicanálise, as quais desconsiderariam, a seu ver, a dimensão social. Quando são vistas como fenômenos culturais, estão sendo antropologicamente estudadas. A perspectiva de análise da psicologia social residiria, na sua opinião, em abordá-las como eventos comunicacionais.
3 Com a publicação de seu Critique des fondements de la psychologie, em 1928, Politzer inaugurou uma visão segundo a qual seria possível distinguir, no interior da obra freudiana, uma duplicidade discursiva. De um lado, seria possível reconhecer, nas obras metapsicológicas, uma visão causalista e mecanicista do fenômeno psíquico, enquanto nos estudos clínicos e na teoria do sonho se poderia encontrar uma descoberta verdadeiramente revolucionária, referente à concepção do homem enquanto sujeito concreto, cujos atos estão sempre dotados de significação, e cuja existência transcorre de modo dramaticamente contextualizado.
4 De acordo com Bleger (1975) a conduta deve ser definida da seguinte maneira: "A conduta molar é uma totalidade organizada de manifestações, que se dá com uma unidade motivacional, funcional, objetal, significativa e estrutural. Seus caracteres são os seguintes: 1) ter motivação, quer dizer, que tem causas, que está determinada; 2) unidade funcional; a de possuir função, finalidade ou objetivo:resolver as tensões produzidas pela motivação; 3) possuir objeto ou fim, que é sempre um vínculo, uma relação interpessoal, real ou virtual; 4) possuir uma unidade significativa, quer dizer, ter um sentido que se implica compreensivelmente como acontecer humano na personalidade total e na situação na qual emerge; 5) ter estrutura: implicar uma pauta específica de relação." (p.68).
5 Bleger (1975) adota proposta de Pichon-Rivière, segundo a qual é adequado distinguir três tipos de conduta, correspondentes aos fenômenos mentais, corporais e os de atuação no mundo externo, denominados, respectivamente, áreas um, dois e três. As áreas marcam uma pluralidade fenômenica que tem sua unidade no fenômeno da própria conduta.
6 De acordo com Bleger (1975), toda conduta dá-se sempre num campo, ou seja, numa delimitação no espaço e no tempo do fenômeno que se estuda. Tal consideração deve ser acompanhada, metodologicamente, de outra delimitação, a qual é feita em função da amplitude com que se considera o fenômeno humano focalizado. Assim, pode-se estudar um indivíduo de forma isolada, conjuntos de indivíduos ou fenômenos ainda mais amplos como condutas, normas e pautas consideradas como instituições sociais. Deve-se, nesta linha, distinguir, de acordo com a extensão ou amplitude com a qual estuda-se um fenômeno, três âmbitos: psicossocial, sócio-dinâmico e institucional. No âmbito sócio-dinâmico o estudo é centrado no grupo, o qual é tomado como unidade. Os sujeitos individuais deixam de ser o foco da investigação. É possível estudar indivíduos, grupos e instituições psicologicamente, bem como sociologicamente, antropologicamente, economicamente, biologicamente etc.
7 Bleger (1975) distingue três diferentes acepções de acordo com as quais o termo dinâmica é usado em psicologia. Na primeira acepção, esta noção é oposta à estática, significando que a conduta é estudada como processo em movimento. Numa segunda acepção o termo dinâmica designa a redução da conduta às forças que a determinam e condicionam, sentido este derivado da física mecanicista. Por fim, numa terceira acepção, dinâmica refere-se a todo estudo psicológico centrado no exame das motivações da conduta. Quando se considera que as motivações são dadas por forças, a terceira e a segunda acepção coincidem. Por outro lado, quando o estudo das motivações se funda na consideração das condições concretas e reais de vida dos seres humanos, o enquadre dinâmico se articula essencialmente ao enquadre dramático politzeriano, que corresponde à realização do estudo da conduta em termos de experiênca humana, o que exige, metodologicamente falando, que todas as explicações se mantenham no nível psicológico de integração, com total evitação de reducionismos neurológicos, físico-químicos ou mitológicos. Quando falamos de perspectiva psicodinâmica estamos usando o termo em sua acepção motivacional, articulando-o organicamente às categorias de drama e significação.
8 (Tofolo, 1990, 1992, 1994; Tofolo & Borges, 1991; Tofolo & Machado, 1993a, 1993b; Tofolo, Vieira & Garcia, 1992; Tsu, 1986, 1988, 1989, 1991a, 1991b, 1994a, 1994b; Tsu & Borges, 1991a, 1991b; Tsu & Machado, 1988, 1991a, 1991b; Tsu, Reis & Fidalgo, 1994; Tsu & Tofolo, 1990; Tsu et al., 1989a, 1989b; Vaisberg, 1995).
9 De acordo com Birman (1994), o debate filosófico contemporâneo vem abandonando a tematização da cientificidade da psicanálise em favor da consideração das dimensões ética e política na produção do conhecimento.
10 Bleger coloca que o mito do homem isolado é um dos pressupostos da cultura ocidental, segundo o qual o ser humano é originariamente não-social, assimilando com esforço a necessidade de relacionar-se com os outros. Este pressuposto criava a questão psicológica acerca de como vencia o homem esta inclinação natural e chegava a entrar em contacto com os demais. Para este autor, o homem é essencialmente um ser social, de modo que inclusive o alto grau de individualidade que chega a desenvolver é um produto social.
11 Filiavam-se à tradição filosófica ocidental que considerava o conhecimento como "espelhamento do real". (Ver Rorty, 1994).
12 Este fazer ciência supera o modelo positivista e inaugura a emergência de um novo paradigma (ver Santos, 1987).