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Revista Brasileira de Orientação Profissional

versión On-line ISSN 1984-7270

Rev. bras. orientac. prof v.8 n.2 São Paulo dic. 2007

 

SEÇÃO ESPECIAL

 

Análise do perfil da clientela de um serviço universitário de orientação profissional1

 

Client profile analysis of an university career guidance service

 

Análisis del perfil de usuarios de un servicio universitario de orientación profesional

 

 

Luciana Karine de SouzaI *; Maria Célia Pacheco Lassance** 2

I Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte
II Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre

 

 


RESUMO

As novas exigências para ingresso e permanência no mercado de trabalho conduziram a um notável crescimento na busca por atendimento em orientação profissional, levando a alterações no perfil dos clientes. O presente estudo investigou o perfil do público que buscou atendimento no Centro de Avaliação Psicológica, Seleção e Orientação Profissional (CAP-SOP) da UFRGS, no período entre 2001 e 2004. Foram analisadas 1058 fichas de inscrição, focalizando-se itens tais como: sexo, idade, escolaridade, atividade remunerada, tipo de encaminhamento e de atendimento. Um estudo derivado foi realizado com 100 indivíduos com experiência universitária. Dentre os principais resultados observou-se uma ampliação da faixa etária dos inscritos, com mais atendimentos individuais com adultos, especialmente mulheres com diploma universitário. O mapeamento do público inscrito no CAP-SOP permite acompanhar alterações em seu perfil, e apontar aspectos que sugerem tanto a revisão de procedimentos do Serviço como novas perguntas de pesquisa sobre o perfil do orientando.

Palavras-chave: Clientela, Atendimento, Orientação profissional.


ABSTRACT

New requirements for entering and remaining in the job market led to a noticeable increase in the search for career guidance services (CG), generating changes in clients profile. This study investigated the profile of the Psychological Evaluation, Selection and Career Guidance Center (CAP-SOP) clients at the Federal University of Rio Grande do Sul. We reviewed 1058 application forms, filled out between 2001 and 2004, focusing in items such as sex, age, educational level, employment status, and type and nature of assistance offered. A second study was conducted including 100 participants who were attending university or had attained a degree. Results indicated an increase on the age range, with more individual assistance directed to adults, especially women with university degrees. Maping clients allows the identification of changes in their profile and points to the need for revising procedures at CAP-SOP as well as evokes new research questions about clients profile.

Keywords: Clients, Assistance, Career guidance.


RESUMEN

Las nuevas exigencias para el ingreso y permanencia en el mercado de trabajo nos llevaron a un crecimiento notable de búsqueda de los servicios de orientación profesional (OP) con consecuencias en el cambio del perfil de los usuarios. Este estudio investigó el perfil del público que buscó atención en el Centro de Evaluación Psicológica, Selección y Orientación Profesional (CAP-SOP) de la Universidad Federal de Rio Grande do Sul. Fueron analizadas 1058 fichas de inscripción entre 2001 y 2004, seleccionando datos como sexo del inscrito, edad, escolaridad, actividad remunerada o tipo de derivación y estatus de la atención. Un estudio correlativo fue realizado con 100 individuos con experiencia universitaria. Entre los principales resultados se observó una ampliación de los intervalos de edad de los inscritos, mayor número de atenciones individuales con adultos, especialmente mujeres con diploma universitario. La configuración obtenida del público inscrito en el CAP-SOP permite acompañar alteraciones de su perfil e indicar aspectos que sugieren tanto la revisión de los procedimientos del Servicio como nuevas preguntas de investigación sobre el perfil del orientado.

Palabras clave: Usuarios, Atención, Orientación profesional.


 

 

Este trabalho apresenta a conclusão da primeira etapa de uma investigação que busca descrever o público que demanda atendimento no Centro de Avaliação Psicológica, Seleção e Orientação Profissional (CAP-SOP) da Universidade Federal do Rio Grande do Sul ao longo da presente década (2001-2010). O estudo originouse do depoimento dos orientadores profissionais do CAP-SOP sobre uma mudança percebida nas características do público que buscou orientação ao longo do período de 2001 a 2004. Tal percepção suscitou a necessidade de se empreender um levantamento do perfil do público inscrito, com a finalidade de identificar aspectos associados à mudança, principalmente a necessidade de se desenvolver estratégias de intervenção diferenciadas para populações diversas.

Em virtude do volume dos dados para análise, o estudo está delineado para se desenvolver em três etapas. A primeira etapa, já concluída, é apresentada nesta oportunidade, mediante a qual são discutidos os dados compreendidos entre os anos de 2001 e 2004. A segunda etapa da pesquisa, programada para encerrar em dezembro de 2008, abarca dados relativos aos anos de 2005, 2006 e 2007. A investigação estará concluída em 2011, quando os dados dos anos de 2008 a 2010 terão sido analisados, completando a pesquisa.

Entende-se relevante compartilhar as experiências referentes aos procedimentos adotados nos serviços e centros de atendimento voltados à orientação profissional &– procedimentos estes prévios aos atendimentos em si, que os ampara em termos organizacionais e estruturais &– na mesma direção da relevância incondicionalmente associada aos trabalhos que relatam os atendimentos em si. Por intermédio destes relatos é possível mapear tanto as conquistas, quanto os desafios encontrados no cotidiano dos serviços, proporcionando novas experiências em termos de prática e de pesquisa.

O crescimento na busca por atendimento em orientação profissional vem sendo relatado por diferentes centros e serviços na área distribuídos pelo Brasil (Andrade, Meira & Vasconcelos, 2002; Lassance, 2005; Silva, 2001). A justificativa consensual para tal crescimento envolve as novas exigências para ingresso e permanência no mercado de trabalho, que requerem do indivíduo flexibilidade e habilidades como trabalhar em equipe e ser criativo. Em uma discussão sobre essa questão, Teixeira e Gomes (2005) conduziram uma investigação com universitários formandos, sugerindo que a variável mais influente na decisão de carreira dos estudantes veteranos não é o mercado de trabalho em si, mas a percepção que o indivíduo tem sobre ele. Nesse sentido, o mercado de trabalho tem sido percebido como altamente exigente, despertando ansiedade e insegurança até mesmo nos indivíduos melhor preparados para enfrentá-lo, ou naqueles que lutam para permanecer compatíveis com as exigências que se atualizam constantemente.

A conseqüência natural do incremento no volume de indivíduos que buscam orientação profissional é uma alteração no perfil da clientela. Uma das alterações mais relatadas é a crescente demanda de jovens adultos com dificuldades de adaptação ao curso universitário e de adultos para orientação de carreira (Hotza & Lucchiari, 1998; Lassance, 2005; Silva, 2001). Teixeira e Gomes (2004) também discutem aspectos importantes dessa clientela, ressaltando a relevância das mudanças pelas quais o adulto-jovem vem passando em termos de, por exemplo, transformações na identidade e relacionamento com a família de origem.

São escassos os estudos que se dedicam especificamente a descrever a clientela de orientação profissional. Um destes trabalhos é o de Santos e Melo-Silva (2000), que apresenta a descrição das características de 68 clientes que buscaram atendimento no ano de 1994 no Serviço de Orientação Profissional do Centro de Pesquisa e Psicologia Aplicada (CPA) da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto (FFCLRP) da Universidade de São Paulo. Os autores realizaram uma análise documental com base no registro das respostas do cliente na entrevista utilizada para triagem para atendimento psicológico. A análise focalizou os itens faixa etária, sexo, naturalidade, região de moradia na cidade, grau de instrução, tipo de escola (pública ou privada), constituição familiar e renda familiar. Dentre os principais resultados, os autores encontraram um perfil de clientes majoritariamente feminino (61,8%), entre 16 e 18 anos de idade (64,7%), cursando o 3o ano do Ensino Médio (36,8%) em escolas públicas (48,5%), e residente na cidade de Ribeirão Preto (88%). Os indivíduos com experiência universitária completa ou incompleta perfizeram 1,5 e 2,9%, respectivamente, da clientela atendida pelo Serviço naquele ano. Santos e Melo-Silva (2000) apontaram, dentre outros aspectos, que camadas populares da cidade estavam sendo contempladas nos atendimentos.

Já o trabalho de Silva (2001) dedicou-se especificamente a descrever características do processo de orientação profissional da clientela adulta-jovem que buscou atendimento no Instituto Paranaense de Psicologia da PUC-PR no ano de 1998 e primeiro semestre de 1999. De 144 clientes que procuraram orientação, 32% estavam na faixa etária de 19 a 42 anos, sendo 27 mulheres e 18 homens. Segundo a autora, estes indivíduos se encontravam em uma de três distintas situações no momento do atendimento: com Ensino Superior completo, cursando Ensino Superior, ou havia trancado a matrícula entre o primeiro e o quarto ano do curso. O foco do trabalho de Silva foi descrever as problemáticas enfrentadas pela clientela adulta-jovem, fornecendo exemplos e discutindo as modalidades de atendimento. Embora a autora não tenha se dedicado a descrever os dados sóciodemográficos dos indivíduos (como Santos & Melo-Silva, 2000), salienta a necessidade de serem empreendidos mais estudos acerca da clientela adulta-jovem em orientação profissional.

Na mesma direção de Silva (2001), Moura e Menezes (2004) apresentam um levantamento das dificuldades e necessidades de 21 clientes insatisfeitos com a opção profissional, mas dispostos a repensá-la procurando auxílio para re-escolha na Clínica Psicológica da Universidade Estadual de Londrina, no Paraná. Embora os autores não tenham focalizado na descrição do perfil da clientela, 42,8% dos participantes da pesquisa estavam na faixa etária de 18 a 22 anos, eram do sexo feminino (66,6%), exercendo atividade remunerada (66,6%), sendo que todos estudavam em uma universidade pública. Moura e Menezes (2004) também salientam a importância de se conhecer mais detalhadamente a clientela que busca orientação, ou re-orientação, para que se possa oferecer auxílio mais direcionado às suas necessidades, aprimorando o atendimento disponibilizado.

As novas exigências para ingresso e permanência no mercado de trabalho, o crescimento na busca por atendimento em orientação profissional e a alteração do perfil dos clientes fundamentam a realização do presente estudo. Trata-se da descrição do perfil do público que buscou atendimento no CAP-SOP entre 2001 e 2004, com o acompanhamento de alterações nesta demanda ao longo do período.

 

Método

Trata-se de um estudo descritivo mediante a análise de 1058 formulários de inscrição preenchidos por jovens que buscaram atendimento no CAP-SOP (Centro de Avaliação Psicológica, Seleção e Orientação Profissional) durante o período de 2001 a 2004. O CAP-SOP é um projeto de extensão universitária do Instituto de Psicologia da UFRGS que atende, desde 1991, jovens e adultos da Região Metropolitana de Porto Alegre (RMPA) para fins de aconselhamento de carreira. A intervenção é realizada em três formatos: (a) atendimento em grupo (adolescentes e jovens adultos), composto por entrevista inicial, seis encontros grupais e entrevista(s) final(is) conforme a necessidade do cliente; (b) atendimento individual (adultos); e (c) maratona de escolha profissional (adolescentes), realizado em um sábado, com oito horas de duração, com foco nas crenças sobre escolha e trajetória profissional e informações sobre sistema educativo e ocupacional. Para todos os casos, os clientes preenchem um formulário de inscrição a partir do qual são derivados para o atendimento mais adequado.

O formulário de inscrição foi analisado com respeito a dois conjuntos de itens: 1) itens respondidos pelo indivíduo: idade, sexo, cidade de residência, escolaridade, nome da escola freqüentada no Ensino Médio, número de vezes que já prestou vestibular, intenção de prestar novo vestibular, se trabalha ou realiza algum tipo de estágio, e modo como tomou conhecimento da orientação profissional no CAP-SOP; e 2) itens preenchidos pelo CAP-SOP: encaminhamento e status do atendimento.

Os dados contidos nos formulários foram analisados por dois avaliadores que consultavam um terceiro em casos de discordância. A primeira etapa da análise compreendeu uma leitura conjunta de vinte formulários de cada ano para familiarização com os itens preenchidos e com a maneira pela qual tanto os indivíduos inscritos, quanto os orientadores responderam a eles. Na segunda etapa da análise, foram elaboradas categorias temáticas para os itens com base na leitura prévia realizada e na expertise de especialista da área. As categorias construídas foram as seguintes:

- cidade de residência: Porto Alegre; outra cidade da Região Metropolitana de Porto Alegre; outra cidade do RS; ou cidade não identificada.

- escolaridade: 2o ano do Ensino Médio (EM); 3o ano do EM; EM incompleto; EM completo; ensino superior (ES) incompleto; ES completo.

- escola freqüentada no EM: as escolas indicadas pelos inscritos foram assim categorizadas: pública (municipal, estadual ou federal), privada, ou não identificada (em casos onde a grafia do inscrito não permitia a identificação da escola, ou o mesmo não a registrou).

- freqüenta estágio ou trabalho: sim ou não.

- número de vezes que já prestou vestibular.

- pretende prestar vestibular: ano indicado no formulário ou não pretende.

- como tomou conhecimento sobre o CAP-SOP: família; colega; escola; professor; Internet; feira de profissões; jornal; ex-orientados; ou outros meios.

- encaminhamento: individual; para grupo; ou maratona.

- status do atendimento: atendido (isto é, atendimento concluído); desistente (atendimento incompleto, ou seja, o indivíduo desistiu durante o processo); ou não-atendido.

Na terceira etapa do procedimento de análise dos dados foi construído um banco de dados no programa estatístico SPSS. Todos os questionários foram registrados no banco conforme cada item e suas categorias, quando pertinente. Após o registro dos dados dos 1058 formulários, foram conduzidas estatísticas descritivas. Diferenças ao longo dos quatro anos compreendidos na amostra foram analisadas por meio de testes de qui-quadrado e comparações de médias. A significância estatística foi considerada ao nível de 0,05 em todos os testes.

Os seguintes itens, de natureza categórica, foram comparados mediante testes de qui-quadrado para o exame de associações significativas entre itens e os quatro anos de formulários: sexo, escolaridade, tipo de escola, exercício de atividade remunerada, meio de informação sobre o serviço, encaminhamento e atendimento. Detectadas as associações significativas, procedia-se à análise dos resíduos ajustados estandardizados para a localização das mesmas (Everitt, 1977).

Dos 1058 formulários analisados, 49 foram excluídos por não apresentarem dados sobre o sexo do inscrito, idade ou escolaridade &– variáveis relevantes para a realização do levantamento. Dentre os casos excluídos encontra-se também um indivíduo que freqüentava o 1º ano do Ensino Médio, visto que não se enquadra nos atendimentos típicos realizados pelo CAP-SOP. Ao final, a amostra contou com 1009 casos para análise.

 

Resultados

A amostra analisada compôs-se de 1009 formulários, distribuídos nos quatro anos analisados (2001-2004). Seis tabelas apresentam os resultados, possibilitando a visualização de estatísticas descritivas por ano. As diferenças percebidas nas tabelas foram posteriormente averiguadas quanto à sua significância por meio de testes de comparação de médias ao longo do período, e de busca de associação entre categorias e os quatro anos de inscrição.

de inscrição. Primeiramente são descritos os dados sóciodemográficos dos indivíduos inscritos para orientação profissional no CAP-SOP nos anos de 2001 até 2004. A Tabela 1 apresenta a distribuição por sexo, a média e o desvio-padrão da idade dos inscritos, e a faixa etária, por ano.

Tabela 1

Descritivas para sexo e idade dos clientes inscritos no CAP-SOP, por ano

 

 

Notas: M = média; DP = desvio-padrão. Os valores das porcentagens foram ajustados.

Ainda que a faixa etária demonstre certa amplitude, aproximadamente 70% dos inscritos, por ano, são de idade entre 16 e 18 anos. Os dados coletados quanto à procedência dos clientes revelaram que entre 90 e 92% dos inscritos residia em Porto Alegre, mesma cidade do CAP-SOP.

Para a comparação de médias de idade dos inscritos ao longo dos quatro anos foi conduzida uma análise de variância. Foram detectadas diferenças significativas (F(3) = 5,54; p < 0,001), localizadas através de teste post-hoc (modelo de Bonferroni), indicando que a média de idade dos inscritos em 2001 foi significativamente menor que as médias dos anos seguintes (comparando com 2002, p = 0,011 ; com 2003, p = 0,004; e com 2004, p = 0,011 ).

Realizou-se uma busca de associação entre sexo dos inscritos e os quatro anos de inscrição. O teste de qui-quadrado informou associação significativa entre sexo dos inscritos e o ano de inscrição: 2 (3, N = 1009) = 12,19, p = 0,007. Os resíduos ajustados estandardizados localizaram associações significativas entre o ano de 2001 e inscritos do sexo feminino; e o ano de 2004 e inscritos do sexo masculino.

A Tabela 2 apresenta os dados sobre a escolaridade, tipo de escola freqüentada no EM, e envolvimento em atividade remunerada (estágio ou trabalho) na época da inscrição.

Tabela 2

Freqüências e porcentagens para escolaridade, tipo de escola e atividade remunerada dos inscritos, por ano

 

 

Notas: EM = Ensino Médio; ES = Ensino Superior. Os valores das porcentagens foram ajustados.

Com relação à escolaridade, 16 casos de EM concluído em nível técnico e 10 casos de supletivo completo foram diluídos na categoria Ensino Médio completo. Dois casos com pós-graduação (ambos de 2003) foram incluídos na categoria de Ensino Superior completo. As escolas não identificadas não constam na Tabela 2, compreendendo 53 casos em 2001, 57 em 2002, 30 em 2003, e 25 em 2004.

Quanto ao exercício de estágio ou trabalho, os poucos casos de inscritos que freqüentavam estágio (13 casos em 1009 inscrições) foram colapsados com os que trabalhavam, gerando a categoria atividade remunerada, que compreende os casos que trabalhavam ou estagiavam no momento da busca por orientação. A atividade remunerada foi registrada no banco de dados quanto a seu exercício, marcando-se sim ou não em cada caso.

Encontrou-se associação significativa entre ano e escolaridade por meio do teste de qui-quadrado: 2 (15, N = 1009) = 36,39, p = 0,002. Os resíduos apontaram relações significativas entre o ano de 2001 e inscritos freqüentando o 3º ano do EM. A Tabela 2 mostra que está em 2001 o maior número de inscrições deste grupo de alunos. Outra associação significativa foi entre indivíduos com EM concluído e inscritos para orientação no ano de 2003, que apresentou a maior freqüência dentre os quatro anos.

O teste de qui-quadrado para ano de inscrição e tipo de escola sofreu influência direta da categoria de escolas não identificadas. Portanto, tal busca de associação entre as categorias ano e tipo de escola não se justifica. Ainda que se refaça o teste apenas com os casos válidos, ou seja, apenas com as categorias de escolas identificadas como públicas ou privadas, as freqüências e porcentagens calculadas por si só evidenciam a grande incidência de inscritos provenientes de escolas privadas.

Não foram detectadas associações significativas entre ano e exercício de atividade remunerada (estágio ou trabalho) (p = 0,13). As freqüências e porcentagens encontradas demonstram que a maioria dos inscritos não exercia atividade remunerada na época da inscrição.

Apresentados os dados sociodemográficos, relatam-se os demais dados do formulário. São eles: vezes que já prestou vestibular, intenção de prestar vestibular, meio pelo qual soube do CAP-SOP, encaminhamento e atendimento. Os dados quanto à intenção de prestar vestibular no momento da inscrição foram organizados em quatro categorias: mesmo ano (da inscrição), ano seguinte, em dois anos (ou seja, dois anos após o ano da inscrição), e não indicado. Estes resultados, assim como a incidência de vestibulares prestados, estão descritos na Tabela 3, por ano.

Tabela 3

Média de vestibulares prestados e freqüências e porcentagens da intenção de prestar vestibular, por ano

 

 

Notas: M = média; DP = desvio-padrão. Os valores das porcentagens foram ajustados.

Para comparar a incidência de vestibulares prestados previamente à inscrição para orientação no CAP-SOP nos quatro anos considerados, empreendeu-se uma análise de variância. Foram detectadas diferenças significativas (F(3) = 5,53; p < 0,001), localizadas através de teste post-hoc (modelo de Bonferroni), indicando que a média de vestibulares prestados dos inscritos em 2001 foi significativamente menor que as médias dos anos seguintes (comparando com 2002, p = 0,005; com 2003, p = 0,009; e com 2004, p = 0,012). Com respeito à intenção de prestar vestibular, a maioria dos inscritos pretendia realizá-lo no ano seguinte ao ano da inscrição, como se pode conferir nas porcentagens da Tabela 3. Para este item não se julgou adequado realizar teste de associação, em virtude do volume de casos com ano de intenção não indicado no formulário em 2004.

Com relação ao item sobre como o inscrito tomou conhecimento do CAP-SOP, onze categorias foram construídas para abarcar os dados. A Tabela 4 apresenta as freqüências e porcentagens, por ano, em cada categoria.

Tabela 4

Freqüências e porcentagens dos meios de informação sobre o serviço relatados pelos inscritos, por ano

 

 

Nota: Os valores das porcentagens foram ajustados.

Alguns tipos de informação sobre o serviço mostraram-se freqüentes nas fichas. Embora estas respostas tenham entrado na categoria outros meios, segundo as categorias previamente estabelecidas, julga-se interessante mencioná-las. São alguns exemplos destes casos as descrições: TV; rádio; telefonou para a UFRGS; viu no manual do Candidato do Concurso Vestibular da UFRGS; ou indicado por psicoterapeuta.

Os dados preenchidos pelos orientadores, referentes ao encaminhamento (individual, para grupo ou maratona) e ao atendimento (atendido, desistente &– atendimento incompleto, ou seja, o indivíduo desistiu durante o processo &– e não-atendido), estão dispostos na Tabela 5, representados em freqüências e porcentagens.

O teste de qui-quadrado para investigar a relação entre ano e tipo de encaminhamento encontrou associação significativa (p = 0,0001). Contudo, em virtude de algumas categorias estarem sub-representadas em termos de incidência de casos, 39% das caselas não apresentou uma freqüência esperada mínima de 5. Ainda assim, a Tabela 5 permite observar que a maioria dos inscritos foi encaminhada para atendimento em grupo.

Tabela 5

Freqüências e porcentagens dos encaminhamentos e atendimentos realizados no CAP-SOP, por ano

 

 

Nota: Os valores das porcentagens foram ajustados.

Foram detectadas associações significativas entre ano e atendimento: 2 (9, N = 1009) = 359,77, p = 0,0001. A análise dos resíduos localizou as associações no ano de 2001 e a categoria atendido; no ano de 2002 e as categorias não atendido e em branco; e no ano de 2003 e inscritos atendidos.

As análises conduzidas levantaram novas questões referentes ao perfil dos indivíduos inscritos que procuraram orientação no CAP-SOP. Considerou-se interessante investigar mais especificamente aqueles que indicaram como escolaridade o Ensino Superior, com status incompleto ou concluído. Nesse sentido, realizou-se um segundo conjunto de análises com foco nos dois grupos referidos.

Estudo Derivado: Análise dos Inscritos com Experiência Universitária

Um novo banco de dados foi organizado com indivíduos com idade mínima de 20 anos. Este critério foi escolhido com duas finalidades: 1) Distanciamento etário dos aproximadamente 70% de inscritos entre 15 e 18 anos da amostra de 1009 formulários; e 2) Seleção de casos factíveis de terem concluído o Ensino Superior, visto que é a partir dos 20 anos de idade que é possível encontrar jovens que já tenham concluído, por exemplo, cursos de quatro anos de duração, no qual o estudante ingressou aos 17 anos.

Num segundo momento, o interesse no exame dos casos com experiência universitária levou à seleção daqueles com escolaridade relatada como Ensino Superior incompleto ou concluído. Dessa forma, para a nova amostra foram considerados todos os formulários de inscritos entre 2001 e 2004 com experiência universitária completa ou incompleta. Obteve-se um total de 100 formulários, que não foram submetidos a análises por ano em virtude da reduzida freqüência encontrada. Estes indivíduos foram separados conforme a escolaridade da seguinte forma: grupo ESi (Ensino Superior incompleto) e grupo ESc (Ensino Superior concluído).

A Tabela 6 apresenta os seguintes dados para ambos os grupos: 1) freqüências e porcentagens por sexo do inscrito, exercício de atividade remunerada, meios mais mencionados de como tomou conhecimento do CAP-SOP (amigos, jornal e Guia de Profissões), tipo de encaminhamento e status do atendimento; e 2) médias para idade e para o número de vestibulares prestados.

Tabela 6

Idade, sexo, remuneração, vestibulares prestados, informação, encaminhamento e atendimento, por grupo

 

 

Notas: ES = Ensino Superior.

Com relação ao tipo de encaminhamento, na Tabela 6 não foram incluídos os dados para maratona nem as respostas em branco, que totalizaram, respectivamente, 5 e 2 casos para o grupo ESi, e 1 e 2 casos para o grupo ESc. Com relação ao status do atendimento, também não estão na Tabela 6 os casos não atendidos nem a categoria de respostas em branco, que somaram 1 e 9, respectivamente, para o grupo ESi, e 0 (zero) e 4 para o grupo ESc.

Focalizando-se nos indivíduos escolhidos para a descrição do perfil de inscritos com escolaridade de Ensino Superior incompleto (ESi) ou concluído (ESc), primeiramente pode-se notar a considerável diferença de idade entre os dois grupos. O grupo de ESc é significativamente superior em idade do que o grupo ESi, como apontou o teste t para amostras independentes: t (98) = 4,81, p = 0,0001. A faixa etária compreendida foi de 20 a 41 anos para o grupo ESi, e de 23 a 47 anos para o ESc. O teste t para amostras independentes apontou que a distinção entre as médias de vestibulares prestados nos dois grupos não foi significativa (p = 0,37).

Foram efetuados testes de qui-quadrado na busca de associações significativas entre os grupos ESi e ESc para os itens sexo e atividade remunerada. Encontrou-se associação estatisticamente significativa apenas para sexo do inscrito: 2 (1, N = 100) = 10,21, p = 0,002. Os resíduos ajustados localizaram as associações entre sexo masculino e Ensino Superior incompleto, e sexo feminino e Ensino Superior completo.

 

DISCUSSÃO

Previamente à discussão dos resultados, fazse necessário dois comentários. O primeiro diz respeito ao número de inscritos em 2004 (n = 176). Naquele ano a equipe de atendimento em orientação profissional do CAP-SOP contava com um número reduzido de integrantes. Esta redução no tamanho da equipe flutua conforme o interesse das turmas de estudantes de Psicologia que, durante alguns anos gerando cerca de 10 estagiários ao ano, por vezes motiva metade de interessados. Dessa forma, em virtude da redução na equipe de 2004, muitos jovens que buscavam orientação no CAP-SOP naquele ano foram informados a procurar outras opções na cidade.

O segundo comentário refere-se à incidência de itens não preenchidos pelos jovens inscritos ou pelos orientadores do CAP-SOP, dificuldade também enfrentada por Santos e Melo-Silva (2000). A possibilidade de se criar uma tradição em pesquisa de demanda, depende em grande medida de preenchimento correto e cuidadoso dos formulários de entrada do cliente. Assim, muitas perdas de informação ocorreram em função da ausência da realização de pesquisas no Centro, o que foi corrigido com o tempo e com a compreensão de que os procedimentos de preenchimento do formulário deveriam servir para coleta de dados e não mais apenas para registro de entrada e futuro contato com o cliente. Além disso, o presente trabalho despertou o interesse da equipe em estudar um novo formato de formulário de inscrição.

Primeiramente serão discutidos os dados relativos ao perfil do público inscrito no CAPSOP entre 2001 e 2004, analisando diferenças ao longo deste período. Num segundo momento serão discutidos os resultados do estudo derivado, com foco nos inscritos com idade a partir de 20 anos e experiência universitária.

O Perfil do Público Inscrito no CAP-SOP entre 2001 e 2004: A demanda por orientação

Mediante os dados coletados nos formulários de inscrição para atendimento em orientação profissional entre 2001 e 2004 pode-se descrever o perfil do público que demanda orientação no CAP-SOP da UFRGS. A predominância de inscritos do sexo feminino acompanha uma tendência não apenas na área de orientação profissional, como relatado em Santos e Melo-Silva (2000), mas também nos atendimentos em Psicologia em geral.

No entanto, a amostra de 2004, a mais recente do banco de dados, apontou uma súbita elevação na incidência de homens buscando orientação profissional. Mesmo que a maioria dos atendimentos seja solicitada por mulheres, é notável que os homens estejam se aproximando das instâncias que oferecem cuidado e orientação (por exemplo, serviços de aconselhamento psicológico ou de carreira), ultrapassando posturas tradicionais masculinas. Observa-se, assim, maior generalidade na busca, possivelmente em função das mudanças no mercado de trabalho e na rede de oportunidades educacionais e ocupacionais, que afetam a todos, homens e mulheres. Adolescentes e adultos precisarão, cada vez mais, de orientação, uma vez que a estrutura de oportunidades está mais complexa e o processo de escolha exige mais autonomia e maior senso de auto-eficácia de escolha, pois as barreiras ao ingresso e permanência no mercado de trabalho estão igualmente cada vez mais freqüentes e maiores (Lassance, 2005).

A permanência de uma maior demanda de adolescentes (ao redor de 70%) pode indicar certo descuido com o atendimento a indivíduos em outras etapas de vida, como a infância e a aposentadoria. Isto termina por dificultar o desenvolvimento de intervenções específicas para estas populações, fazendo com que as intervenções tradicionais sejam, quando frente a um cliente diverso, reproduzidas, comprometendo a eficiência do serviço. Além disto, a ausência de atividade remunerada dentre estes clientes (82 a 89%, nos quatro anos analisados) revela parte das variáveis que dificultam o processo autônomo de desenvolvimento de um projeto profissional. Experiência de trabalho, mesmo parcial ou eventual, auxilia no desenvolvimento da identidade de trabalhador, o que, por sua vez, está relacionado ao sucesso na tomada de decisão vocacional e, principalmente, no sucesso na transição escola-trabalho (Ng & Feldman, 2007).

A diferença significativa encontrada para a média de idade mostrou que a partir do ano de 2002 começaram a surgir mais jovens com Ensino Médio concluído à procura de orientação profissional no CAP-SOP. Além disso, foram observadas, também a partir de 2002, médias superiores de vestibulares prestados previamente à inscrição para orientação. Estes dados podem estar relacionados à maior busca por formação em nível universitário, acompanhada de um crescimento na oferta de cursos superiores na região. Aliada a isso está a exigência do mercado de trabalho sobre o jovem adulto, por formação em nível superior e por um comportamento mais próativo em sua trajetória de carreira. Isto está em descompasso com a escola média, visto que aos alunos não são oportunizadas vivências escolares de desenvolvimento de pró-atividade (comportamento exploratório), em um contexto que, cada vez mais, trabalha na direção de treinamento para o vestibular. Intervenções em educação de carreira nas escolas, que poderiam proporcionar o desenvolvimento de uma identidade de papel de trabalhador, facilitando em grande medida a tomada de decisão ocupacional (Guichard, 2001) são, no Brasil, iniciativas bastante escassas. Nessa direção, a associação significativa entre o ano de 2001 e inscritos no 3o ano do Ensino Médio (maior porcentagem dentre os quatro anos) não indica necessariamente que, a julgar pelos três anos seguintes, adolescentes formandos estão buscando menos orientação profissional. A redução de inscritos cursando a última série do Ensino Médio pode estar associada a um crescimento na oferta de atendimentos em orientação profissional na cidade. Como mostraram os resultados para tipo de escola, a maioria dos inscritos nos quatro anos analisados proveio de instituições privadas. Estas escolas gradativamente têm investido na oferta de orientação profissional a seus alunos, contando com profissionais capacitados na área. Além disso, estes resultados demonstram que o serviço oferecido não atinge camadas menos favorecidas da população, exatamente as que mais necessitariam de suporte para desenvolver projetos de carreira.

O item sobre o modo como tomou conhecimento da orientação profissional no CAP-SOP é interessante tanto por revelar os meios mais eficazes de informação sobre o trabalho, como por evidenciar a influência de contextos de desenvolvimento e de relações interpessoais relevantes na vida do adolescente e do adulto-jovem. O contexto das amizades figura em primeiro lugar como um dos motivadores à busca por orientação. A amizade, para o adolescente (maior público da orientação profissional), é um relacionamento que acaba se tornando tão importante quanto o relacionamento familiar &– observa-se que a família foi o segundo meio mais citado pelas quatro sub-amostras. É nesta etapa da vida que o indivíduo vai experimentar características da amizade fundamentais para os relacionamentos subseqüentes, como lealdade, confiança, proximidade e comprometimento (Bukowski, Newcomb & Hartup, 1996; Souza, 2006).

Outro contexto importante para o adolescente é a escola, à qual se relacionam as respostas que indicaram professores ou colegas como as pessoas que sugeriram a orientação profissional. Segundo Polonia e Dessen (2005, p. 308), “a família e a escola emergem como duas instituições fundamentais para desencadear os processos evolutivos das pessoas, atuando como propulsores ou inibidores do seu crescimento físico, intelectual e social”. Nessa direção, é esperado que o estudante seja motivado pela família e pela escola a buscar orientação profissional. Contudo, com base em Polonia e Dessen (2005), ambos podem impulsionar o desenvolvimento saudável do jovem, como podem inibi-lo, nos casos em que tanto a família, como a escola, pressionam negativamente o aluno a escolher uma profissão e preparar-se para concursos vestibulares. Não se pode desconsiderar, obviamente, a pressão de grupo exercida pelos amigos, que são os maiores divulgadores da orientação profissional no CAPSOP, segundo os jovens inscritos entre 2001 e 2004. Da mesma forma que os demais contextos de desenvolvimento, os relacionamentos de amizade também podem agir como fatores negativos ao desenvolvimento (Bukowski, Newcomb & Hartup, 1996), atuando como inibidores de um saudável processo de escolha de profissão.

Com respeito ao encaminhamento dos inscritos, caberia primeiramente uma breve explanação sobre os atendimentos na modalidade maratona. A maratona tem origem no elevado volume de inscrições para orientação profissional efetuadas muito próximas da data dos concursos vestibulares, sem tempo hábil para a realização dos atendimentos conforme o modelo utilizado no CAP-SOP, que abrange, em média, oito encontros semanais (Lassance, 1999). Muitos destes atendimentos, em função de sua urgência, não foram registrados nos formulários de inscrição convencionais, mas sim em listas especialmente organizadas para tal modalidade de atendimento. Apesar da pouca incidência detectada no presente estudo, julga-se importante discutir a maratona em virtude de se tratar de uma modalidade de atendimento especialmente desenvolvida para abarcar uma demanda que pode se mostrar gradualmente maior em função do despertar para a orientação profissional que o calendário de inscrição para os vestibulares suscita assim que é divulgado pela mídia. O anúncio deste calendário faz emergir um público com urgência por atendimento em OP. No entanto, ainda que seja esclarecido pelos orientadores que o processo de escolha profissional necessita de mais tempo, este público necessita de atendimento e, sobretudo, de acolhimento para redução de ansiedade e conscientização de que está escolhendo, no atendimento de tipo maratona, não uma profissão, mas uma opção de curso para inscrição em vestibular.

Metade dos formulários de inscritos no ano de 2002 não apresenta a informação sobre o status do atendimento do indivíduo. O não preenchimento deste dado interferiu nos resultados para este ano, também dificultando a busca de associações significativas entre categorias mediante o teste do quiquadrado. A explicação para este resultado pode estar no fato de que em 2001 foi introduzido um novo formato de formulário. Com isso, a equipe de atendimento da época estava mais atenta a seu preenchimento, ao contrário do ano seguinte, quando outra equipe, sem treinamento para o preenchimento, assumiu os atendimentos.

Finalmente, o perfil do público que demandou atendimento em orientação profissional no CAPSOP entre 2001 e 2004 apresentou as seguintes características:

1) sexo feminino, apesar do súbito aumento no número de homens inscritos em 2004;

2) média de idade de 19 anos, devido ao aumento detectado a partir de 2002. Aliado a isso, verificou-se uma ampliação da faixa etária, que se aproxima dos 50 anos;

3) residente em Porto Alegre (90%), cidade onde se localiza o Serviço;

4) com Ensino Médio concluído ou em vias de conclusão (3o ano), em instituição privada;

5) não exerce atividade remunerada;

6) vem prestando um maior número de vestibulares desde 2002;

7) pretendia prestar vestibular no ano seguinte à orientação;

8) tomou conhecimento do CAP-SOP mediante amigos, familiares e pelo jornal;

9) foi atendido, e o atendimento ocorreu em grupo.

A prevalência de clientes do sexo feminino (65%, considerados os quatro anos juntos) acompanha os dados relatados por Santos e Melo-Silva (2000) (61,8%), por Silva (2001) (60%) e por Moura e Menezes (2004) (66,6%). Quanto à faixa etária, os mesmos 70% de participantes entre 16 e 18 anos do estudo de Santos e Melo-Silva (2000) foram encontrados. Contudo, enquanto o estudo de Ribeirão Preto abrangeu mais adolescentes (com clientes a partir dos 12 anos de idade), o trabalho aqui apresentado relata uma amostra mais ampla a partir dos 30 anos. O relato de Moura e Menezes (2004), apesar de também apresentar uma ampla faixa etária, dedicou-se especificamente a descrever atendimentos de re-escolha profissional, não tendo incluído os clientes mais novos que buscam orientação profissional já durante o Ensino Médio. Um dado que se assemelha ao estudo de Santos e Melo-Silva (2000) é o relativo à proximidade geográfica da residência do cliente com o Serviço: naquele estudo, 88% residem na mesma cidade, ao passo que de 90 a 92% dos clientes gaúchos que buscaram o CAP-SOP entre 2001 e 2004 indicaram endereço em Porto Alegre.

Como mencionado na sessão de resultados, os achados do presente estudo motivaram a realização de um segundo estudo. Este segundo estudo focalizou o perfil de inscritos com experiência universitária, ou seja, com Ensino Superior completo ou em andamento, situados em diferentes etapas do ciclo vital.

O Perfil dos Inscritos com Experiência Universitária

O estudo derivado da amostra total de 1009 casos compôs-se de 100 formulários preenchidos por indivíduos inscritos com experiência universitária e idade a partir de 20 anos. A justificativa para esta segunda investigação está no fato de que esta clientela, situada nas etapas de desenvolvimento adulta-jovem e adulta, demanda atendimento focalizado em necessidades intrinsecamente associadas à fase de vida em que estão e aos papéis sociais que desempenham nos contextos de desenvolvimento que participam (Silva, 2001).

O grupo com Ensino Superior incompleto apresenta uma média de idade de 24 anos, divide- se aproximadamente de modo eqüitativo entre homens e mulheres, não exerce atividade remunerada, tomou conhecimento do trabalho do CAP-SOP tanto através de amigos como do contato com notícias sobre o Serviço veiculadas em jornais, com maioria encaminhada para atendimento em grupo. O grupo com Ensino Superior completo tem em média 30 anos de idade, exerce atividade remunerada, é maciçamente composto por mulheres, ficou sabendo do CAP-SOP principalmente por intermédio de amigos, foi encaminhado para atendimento em grupo, com mais de 80% de atendimentos concluídos.

Dois contrastes entre o grupo de adultos-jovens (ESi) e o grupo de adultos (ESc) se destacam e serão discutidos. O primeiro contraste está na maior incidência de mulheres no grupo de adultos com formação universitária. O elevado índice de mulheres com diploma no Ensino Superior e a maior incidência de mulheres a procurar orientação profissional são ambos responsáveis pelo contraste de gênero na amostra referida, embora, na prática cotidiana dos atendimentos, perceba-se uma mudança gradativa nesse quadro.

O segundo contraste está no maior número de atendimentos individuais para o grupo de adultos. O crescimento observado de adultos buscando orientação profissional (Lassance, 2005) auxilia na interpretação do resultado referido. Enquanto adultos-jovens envolvidos em atendimento direcionado à reflexão sobre a adaptação ao curso universitário se beneficiam mais de atendimento em grupo, adultos já formados em nível superior e inseridos no mercado de trabalho que procuram orientação demandam um atendimento individual. Isto porque, muitas vezes, são condições psicológicas especiais (ansiedade e depressão, por exemplo) que motivam as dificuldades de inserção no trabalho ou condições de integração entre os diversos papéis sociais. O equilíbrio entre trabalho e família tem sido alvo de muitos estudos (Amatea, Cross, Clark & Bobby, 1986; Biggs & Brough, 2005; Cook, 1994; Chi-Ching, 1995), os quais sugerem que o bem-estar subjetivo depende em grande medida de o quanto um indivíduo consegue dar vazão a suas habilidades, interesses e traços de personalidade através do desempenho equilibrado de vários papéis vitais como o conjugal, de trabalhador, de cidadão (Super, Savickas & Super, 1996). Assim, muito da necessidade de orientação em um adulto refere-se ao auxílio para definir saliências e tomar decisões que criem o mínimo de conflito ou pressão entre os diversos papéis que o indivíduo desempenha.

Uma questão que chama a atenção é a manutenção das amizades como o segundo meio que mais conduziu o inscrito a buscar orientação profissional no CAP-SOP no grupo de adultos com Ensino Superior completo. Isso sustenta as afirmações de Argyle (2001) de que os amigos ainda são relacionamentos importantes em adultos, provendo motivação para, por exemplo, buscar orientação profissional. Contudo, o fato de ter sido o segundo meio mais mencionado, ficando atrás da informação mediante jornais, representa tão somente o que já se espera de adultos com características encontradas (ao redor dos 30 anos e exercendo atividade remunerada). Segundo Carbery e Buhrmester (1998), o trabalho, o parceiro romântico, os filhos e os pais idosos, elementos típicos desta etapa da vida, abrangem relacionamentos que passam a demandar mais tempo e dedicação do adulto que, apesar de não deixar de estimar seus amigos, não consegue mais se dedicar a eles como, por exemplo, na época em que estava na universidade.

 

Considerações finais

O trabalho recém descrito possibilita o levantamento de questões para investigações futuras mais detalhadas sobre o público que demanda atendimento em orientação profissional no Centro de Avaliação Psicológica, Seleção e Orientação Profissional da Universidade Federal do Rio Grande do Sul.

Uma seqüência do estudo realizado poderia investigar, dentre outras questões, se a alteração observada no gênero dos inscritos se manteve, com proporcionalmente mais homens buscando atendimento em orientação profissional; e se a média de idade manteve-se inalterada ou se prosseguiu aumentando, com mais adultos formados buscando orientação para prosseguir em, ou rever, suas carreiras. Além disto, faz-se necessário ampliar o escopo da investigação, na direção de se verificar a procura e a eficiência ao atendimento de populações diversas.

Com a conclusão da primeira etapa (2001- 2004) da análise da clientela do CAP-SOP ao longo da década, visualizam-se outras questões relevantes que podem ser abordadas nas próximas duas etapas da pesquisa. Outros registros importantes podem ser utilizados na busca de associações entre os dados do formulário de inscrição. Exemplos disso são os formulários da primeira e da última entrevista realizadas com o indivíduo, contendo dados indicativos de preocupações iniciais e indicadores de tomada de decisão ou de planejamento futuro. A título de exemplo, seria interessante investigar se há associação entre experiência prévia com vestibulares (item presente no formulário de inscrição), interesse em cursos específicos ou em grandes áreas do conhecimento (formulário de entrevista inicial) e opção de curso ou cursos afins (formulário de entrevista final). Dessa análise seria possível verificar se o indivíduo com experiência prévia em vestibulares inicia a orientação com opções associadas a esta experiência anterior ou outras opções distintas, e se encerra o processo retomando as primeiras ou considerando as segundas.

Não parecem ser freqüentes os estudos dedicados especificamente a descrever o perfil do público que busca orientação profissional. Nesse sentido, espera-se que o presente trabalho motive os profissionais que atendem em serviços e centros de orientação profissional a compartilharem os dados sobre as características dos clientes &– indivíduos sem os quais não seria possível conduzir pesquisas e relatos de experiências práticas. Procedimentos sistemáticos e regulares de avaliação da demanda e da eficiência do atendimento são fundamentais para se monitorar a eficácia das intervenções de carreira e para identificar a direção que está tomando a orientação profissional no Brasil. A demanda por serviços de orientação de carreira pode ser um bom indicador da situação da orientação no país.

 

Referências

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Recebido: 31/7/07
1ª Revisão: 4/12/07
Aceite final: 30/1/08

 

1 Dados preliminares deste trabalho foram apresentados no VII Simpósio Brasileiro de Orientação Vocacional & Ocupacional realizado em Belo Horinzonte (MG). Nossos agradecimentos aos colaboradores I. Aquino, F. Mattos, D. Alves, I. Amparo, J. Sarriera e A. Antoniazzi. Apoio: CAP-SOP/UFRGS.
2 Endereço para correspondência: Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Instituto de Psicologia, CAP-SOP, Rua Ramiro Barcelos, 2600, sala 06, 90035-003, Porto Alegre, RS. Telefone: (51) 33085454. E-mail: maria.lassance@ufrgs.br.

 

Sobre os autores
* Luciana Karine de Souza é psicóloga pela UFRGS, Mestre e Doutora pelo PPG-Psicologia da UFRGS. É professora adjunta e pesquisadora no Departamento de Psicologia e no PPG-Psicologia da Universidade Federal de Minas Gerais.
** Maria Célia Pacheco Lassance é psicóloga pela PUC-SP, Mestre pela PUC-RS, e doutoranda pelo PPG-Psicologia da UFRGS. É professora adjunta do Departamento de Psicologia do Desenvolvimento e da Personalidade do Instituto de Psicologia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Membro da equipe técnica do CAP-SOP e do NAE (Núcleo de Apoio ao Estudante) da UFRGS. Fundadora e ex-presidente da ABOP nas gestões 1995-1997 e 2001-2003.

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