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Revista Brasileira de Orientação Profissional

versión On-line ISSN 1984-7270

Rev. bras. orientac. prof v.10 n.2 São Paulo dic. 2009

 

ARTIGOS ORIGINAIS

 

Influência de pais nas escolhas de carreira dos filhos: visão de diferentes atores

 

Parental influence on their children’s career choice: a view of different actors

 

Influencia de padres en las elecciones de carrera de los hijos: visión de diferentes actores

 

 

Marisa Carvalho*; Maria do Céu Taveira** 1

Universidade do Minho, Braga, Portugal

 

 


RESUMO

Este estudo tem como objectivo analisar as perspectivas de pais, estudantes, professores e profissionais de orientação acerca do papel dos pais na implementação de escolhas de carreira dos seus filhos, à entrada no ensino secundário. Através do método de grounded theory foram investigadas as perspectivas de um total de 119 participantes (16 pais, 46 alunos, 34 professores e 23 profissionais de orientação) com recurso a um questionário de respostas abertas. Foram identificados os processos através dos quais os pais influenciam as escolhas de carreira assim como os efeitos desejáveis dessa mesma influência. Estes dados apontam a necessidade de expandir a intervenção vocacional, contemplando os diversos contextos de vida e o seu papel nas decisões de carreira.

Palavras-chave: Pais, Orientação vocacional, Metodologia.


ABSTRACT

This study aimed at analyzing the views of parents, students, teachers and vocational counsellors about the parents’ role in the implementation of their children’s career choice when starting high school. Based on the “grounded theory” method, the perspectives of a total of 119 participants (16 parents, 46 students, 34 teachers and 23 career counsellors) were investigated by means of an open question questionnaire. The processes of parental influence as well as the consequences of that influence were identified. The data indicated the need for expanding vocational interventions, taking into consideration the contexts of life and their role in decision making.

Keywords: Parent, Vocational guidance, Methodology.


RESUMEN

Este estudio tiene como objetivo analizar las perspectivas de padres, estudiantes, profesores y profesionales de orientación acerca del papel de los padres en la implementación de elección de carrera de sus hijos, al entrar en la enseñanza secundaria. Mediante el método de grounded theory se investigaron las perspectivas de un total de 119 participantes (16 padres, 46 alumnos, 34 profesores y 23 profesionales de orientación) con el recurso de un cuestionario de respuestas abiertas. Se identificaron los procesos por medio de los cuales los padres influencian las elecciones de carrera así como los efectos deseables de esa misma influencia. Estos datos apuntan la necesidad de expandir la intervención vocacional, contemplando los diversos contextos de vida y su papel en las decisiones de carrera.

Palabras clave: Padres, Orientación vocacional, Metodología.


 

 

A família tem sido considerada como o factor de maior influência no desenvolvimento de carreira e, especificamente, na tomada de decisão vocacional (Whiston & Keller, 2004). A investigação empírica tem evidenciado a importância que as variáveis estruturais (por exemplo, estatuto sócio-económico, meio étnico de origem e configuração familiar) e processuais (por exemplo, encorajamento parental, interacção pais/filhos, comportamento intencional) da família têm no desenvolvimento de carreira dos jovens (Schulenberg, Vondracek, & Crouter, 1984; Whiston & Keller, 2004). Além dos processos de influência parental, a literatura evidencia os resultados dessa mesma influência. Os primeiros dizem respeito aos processos considerados desejáveis para a promoção do desenvolvimento de carreira, tais como a comunicação aberta, o suporte/encorajamento e a direcção/orientação. Os segundos correspondem aos resultados de carreira considerados desejáveis como consequentes da influência parental, nomeadamente, a autonomia e a responsabilidade (Pinto & Soares, 2001; Young, Friesen, & Pearson, 1988). Assim, a qualidade dos projectos de carreira dos jovens depende das condições que os contextos familiares proporcionam, sobretudo, em termos de apoio afectivo e instrumental (Gonçalves & Coimbra, 2007; Pinto & Soares, 2001, 2002; Schultheiss, Kress, Manzi, & Glasscock, 2001; Young e cols., 2005).

Não obstante a importância da influência da família no desenvolvimento da carreira, os resultados empíricos continuam a indicar que os factores familiares não podem ser analisados isoladamente e, por isso, outros factores contextuais devem ser considerados na compreensão do desenvolvimento da carreira (Bardagi & Hutz, 2008; Fouad & Katamneni, 2008; Mouta & Nascimento, 2008; Pinto, Taveira, & Fernandes, 2003; Whiston & Keller, 2004). A escola, na figura dos professores, por exemplo, tem sido identificada como um contexto com impacto significativo na carreira (Diemer, 2007; Mouta & Nascimento, 2008; Pinto, Taveira, & Fernandes, 2003).

Ainda no que diz respeito à influência parental na carreira, a literatura tende a centrar-se nas fases de planeamento de uma decisão vocacional, e menos nas fases de implementação das escolhas (Fouad & Katamneni, 2008; Jome & Phillips, 2005; Mortimer, Zimmer-Gembeck, Holmes, & Shanahan, 2002). Ainda assim, a investigação tem evidenciado a importância de outros significativos, e, especificamente, dos pais, na fase de implementação de uma decisão (Fouad e cols., 2008; Jome & Phillips, 2005; Mortimer e cols., 2002). No sistema educativo português, o 10º ano de escolaridade corresponde ao início do ensino secundário e, potencialmente, à implementação de uma primeira escolha em termos de área escolar e profissional. As características do ensino secundário, nomeadamente em termos do regime de permeabilidade e de equivalências como formas de facilitar a reformulação do projecto escolar durante a sua frequência, põem em evidência a necessidade de compreensão e de intervenção nesta fase do processo de tomada de decisão (Carvalho, 2007; Jome & Phillips, 2005).

Tendo ainda em conta que se regista a ausência de um quadro conceptual que explique as influências recíprocas do contexto no desenvolvimento da carreira, nomeadamente no que respeita aos processos de decisão (Blustein, 2004; Fouad & Kantamneni, 2008; Jome & Phillips, 2005; Whiston & Keller, 2004), consideramos ser necessário aprofundar o papel de outros significativos nestes processos e especificamente na fase de implementação das decisões. Além do mais, torna-se igualmente importante explicar os processos através dos quais estas influências ocorrem assim como seus efeitos em termos de tomada de decisão. Este novo ângulo de análise oferece contributos importantes à construção de um modelo conceptual mais integrado e multidimensional dos processos de decisão vocacional.

Nesta linha de investigação, dando seguimento a pesquisas anteriores (Carvalho, 2007; Carvalho & Taveira, 2008), este estudo visa o aprofundamento do papel dos pais na implementação das escolhas de carreira, partindo de múltiplas perspectivas. Mais especificamente, exploram-se as perspectivas de alunos, pais, professores e profissionais de orientação sobre o papel dos pais na implementação de escolhas de carreira dos seus filhos, no 10º ano de escolaridade. Além disso, trata-se de um estudo que se enquadra numa investigação de maior amplitude que visa a construção de um modelo conceptual integrado de intervenção vocacional no ensino secundário. Deste modo, dá continuidade a estudos congéneres, oferecendo contributos à construção daquele modelo conceptual (Carvalho, 2007; Carvalho & Taveira, 2008; Pinto e cols., 2003).

 

MÉTODO

Privilegia-se uma metodologia de investigação qualitativa baseada nos procedimentos da grounded theory (Strauss & Corbin, 1994, 1998), o que resulta do interesse em contribuir para a construção de um modelo conceptual que sustente a intervenção vocacional no início do ensino secundário (Pinto e cols., 2003), através do estudo de múltiplas perspectivas acerca do papel dos pais naquela fase da carreira. Trata-se de uma opção congruente com o crescente reconhecimento da complexidade inerente às influências contextuais, em particular da família, na carreira (Fouad & Kantamneni, 2008; Schultheiss, 2003; Whiston & Keller, 2004).

Participantes

A amostra é constituída por 119 participantes (46 alunos, 16 pais, 34 professores e 23 profissionais de orientação). O grupo de alunos é constituído por 46 participantes de ambos os sexos (40% de mulheres; 60% de homens), com idades compreendidas entre os 15 e os 20 anos (M=16,60; DP=1,54), a frequentar diferentes cursos do ensino secundário (62,9% no Agrupamento 1 - Curso Científico-Natural; 2,9% no Agrupamento 2 - Curso de Artes; 5,7% no Agrupamento 3 - Curso Económico-Social; 2,9% no Agrupamento 4 - Curso de Humanidades; 25,6% em Curso Profissional de Técnico de Alimentação e Bebidas). O grupo de pais é constituído por um total de 16 participantes de ambos os sexos (62,5% de mulheres; 37,5% de homens) e com idades compreendidas entre os 35 e os 54 anos (M=43,62; DP=4,95).

O grupo de professores é constituído por 34 professores de ambos os sexos (74,3% de mulheres; 25,7% de homens) e com idades compreendidas entre os 29 e os 60 anos (M=43,76; DP=9,12) e registram entre 8 a 35 anos de tempo de serviço como docentes. O grupo de profissionais de orientação integra um total de 23 participantes de ambos os sexos (91,3% de mulheres; 8,7% de homens), com idades compreendidas entre os 23 e os 54 anos (M=35,70; DP=9) e entre 1 e 25 anos de tempo de serviço.

Material e procedimentos

Foi usado um questionário de resposta aberta (Pinto, 2000), constituído por três blocos de questões, destinados a avaliar as opiniões sobre: (a) quais devem ser os objectivos da orientação vocacional no 10º ano de escolaridade; (b) quais podem ser os contributos de diferentes intervenientes nesse processo, nomeadamente, dos próprios estudantes, dos professores e directores de turma, dos encarregados de educação e dos profissionais de orientação; (c) a capacidade agêntica de cada participante para propor um tipo de acção colaborativa no âmbito da orientação vocacional à direcção da escola secundária, que reflicta os objectivos preconizados para o seu papel pessoal neste âmbito, enquanto estudante, ou professor, encarregado de educação ou profissional de orientação, conforme o caso (Pinto e cols., 2003).

O presente trabalho centrou-se na análise das respostas transcritas à questão que remete para os contributos dos pais na implementação de escolhas de carreira no 10º ano de escolaridade.

Análise de dados

Foram adoptados os procedimentos propostos na literatura para o método de grounded theory (Fernandes & Maia, 2002; Strauss & Corbin, 1994, 1998). Esta consiste num conjunto de procedimentos sistemáticos e rigorosos de análise de informação, organizada numa sequência, que tende para uma maior complexidade e integração, com o objectivo de gerar teoria, através de um processo indutivo de produção de conhecimento (Strauss & Corbin, 1998). Estes autores propõem uma sequência de procedimentos analíticos, designados de codificação aberta, axial e selectiva (Strauss & Corbin, 1998). Os procedimentos de codificação resultam numa moldura de maior abstracção, que deriva identificação de categorias e do estabelecimento e validação de relações sistemáticas entre a categoria central e as restantes categorias, dando voz ao fenómeno em estudo (Fernandes & Maia, 2002; Pinto e cols., 2003).

O presente trabalho procurou respeitar os procedimentos sugeridos pelos autores (Strauss & Corbin, 1994, 1998). Partindo das respostas transcritas, fez-se a selecção do material relevante para a análise e a sua decomposição em unidades de análise. De seguida procedeu-se à identificação de categorias com carácter de progressiva abstração (descritivas e conceptuais) e das respectivas propriedades e dimensões, à construção de diagramas e à formulação de um modelo de análise do fenómeno. Contudo, trata-se ainda de um modelo em análise e reformulação. Para assegurar a credibilidade dos processos de codificação e de verificação, recorreu-se constantemente ao discurso dos participantes.

 

RESULTADOS

A Figura 1, relativa aos resultados globais da análise, representa o modelo ilustrativo das perspectivas emergentes sobre o papel dos pais na implementação de escolhas de carreira dos filhos no 10º ano de escolaridade. As respostas apresentadas ao longo do texto estão identificadas pelo respectivo código do grupo de pertença (A-aluno; EE-pai ou encarregado de educação; P-professor; PO-profissional de orientação) e o número de participante.

A análise das respostas indica que os pais são perspectivados como desempenhando um papel significativo no 10º ano de escolaridade. Os diferentes grupos de participantes são unânimes no reconhecimento do papel dos pais nesta fase do processo de tomada de decisão. Encontrouse, também, tipicidade inter-grupo relativamente às categorias emergentes. As respostas põem em evidência os processos através dos quais a influência parental se exerce assim como as consequências da mesma. Deste modo, os dados foram organizados em função dos processos através dos quais a influência parental ocorre e em função dos resultados da influência parental (Figura 1).

 

 

Figura 1. Esquema representativo do papel dos pais na execução de planos de carreira dos filhos.

Processos da influência parental

No que diz respeito aos processos da influência parental, os participantes afirmam que os pais exercem a sua influência, directamente, através da relação que estabelecem com os filhos, e, indirectamente, através das actividades que promovem e em que participam na sua relação com o meio.

Os participantes referem que a relação dos pais com os filhos deve ser positiva, pautada por atitudes de apoio e interesse. Os pais devem contribuir para o desenvolvimento e implementação de escolhas de carreira dos filhos através de atitudes de comunicação, apoio e acompanhamento. A comunicação é apresentada como um processo que visa esclarecer o/a filho/a relativamente às questões escolares e profissionais, alertar para dificuldades e problemas e incentivar a participação em experiências de exploração vocacional. Os pais devem “comunicar com os educandos” (EE3), “procurar explicar a importância do seu futuro profissional” (A21), “alertar os filhos para eventuais dificuldades e obstáculos que irão enfrentar no futuro” (P18) e “desmistificar o papel dos Serviços de Psicologia e Orientação (SPO’s)” (PO16).

A globalidade dos participantes afirma que os pais devem, também, apoiar os filhos, na dupla vertente afectiva e instrumental. O apoio é caracterizado em termos de aprovação, incentivo e compreensão das escolhas dos filhos. Os pais devem “apoiar os estudantes na sua escolha” (A35), “apoiar os educandos/filhos na vida escolar” (P11), “incentivá-los” (A4). O apoio pode definir-se, também, pela ajuda instrumental à resolução de problemas e concretização de opções, tal como enunciam as seguintes respostas: “apoiá-los em tudo o que se possa fazer” (EE2), “procurar ajudar os filhos nas escolhas difíceis” (A42) e “apoio nas situações mal sucedidas e de reorientação” (P22).

Os pais devem, além disso, acompanhar os filhos no dia-a-dia, nas decisões de carreira, na vida escolar e face a situações-problema. Os pais “deverão acompanhar de perto o desenvolvimento pessoal e desempenho escolar dos filhos” (A20), “atender às alterações (…)” (P15) e “estar atentos (…)” (P23).

Os participantes evidenciaram, ainda, a necessidade dos pais se informarem sobre as diversas opções escolares e profissionais, de aconselharem os filhos e de ajustarem expectativas relativamente ao seu percurso escolar e profissional. Os pais devem “ser informados pelo serviço de psicologia ou pelos directores de turma para poder ajudar os filhos a escolher o que é melhor para eles” (A17), “conhecer as fases de desenvolvimento nomeadamente aquela que o filho/educando se encontra facilitando o seu conhecimento das profissões, das alternativas, das variáveis do meio” (PO14) e “sempre que surjam dúvidas procurar saber sobre todas as áreas possíveis que interessem aos seus educandos” (P10).

Os pais podem aconselhar os filhos, especificamente, quanto à carreira, sempre que se justifique, mas respeitando e não influenciando as suas escolhas. Os pais “deverão orientá-los para uma profissão” (PO20), “sugerir opções” (P18) e “esclarecê-los sobre as saídas profissionais e escolares” (EE8). Os pais devem ajustar as suas expectativas, isto é, “não devem ter ideias pré-concebidas (…)” (P9) e “não criar grandes expectativas” (A28).

Para além das relações dos pais com os filhos, os participantes identificaram aspectos da relação dos pais com o meio como determinantes do desenvolvimento e implementação de escolhas de carreira. Assim, os pais podem contribuir, através da promoção de actividades que constituam oportunidades para os filhos explorarem o meio, nomeadamente “facilitar o acesso a experiências de trabalho como part-times (…)” (PO4) e “facultar contactos com profissionais, estabelecimentos de ensino e colegas” (P21). Podem, ainda, colaborar com a escola ou outros, no sentido de conhecerem melhor o aluno, recolherem informação, ajudarem o filho e contribuírem para a resolução de problemas. Assim, os pais deveriam ter “contacto mais directo e constante não apenas com o director de turma, mas, através deste, com os professores e SPO” (P1), “vir à escola falar com os professores de maneira a que os filhos tenham sucesso” (A30) e “em caso de dúvidas ou dificuldades, pedirem ajuda à escola” (EE16). Deveriam, ainda, “colaborar, designadamente através da Associação de Pais, com os directores de turma no planeamento, desenvolvimento e avaliação das actividades” (PO1).

Relativamente aos processos de influência parental, todos os participantes apresentam elevada incidência de respostas nas categorias de apoio, acompanhamento e colaboração dos pais com a escola. Os profissionais de orientação apresentam uma maior incidência de respostas na categoria oportunidades/experiências, aspecto também valorizado pelos professores, mas com menor incidência de respostas.

Consequências da influência parental

Relativamente aos efeitos desejáveis da influência parental, os participantes identificaram aspectos como a experiência de autonomia/responsabilidade, sentimentos de aprovação e incentivo, prazer pelo estudo, sucesso na escolha realizada e constituem condições para o desenvolvimento da carreira. Os participantes referem a necessidade dos pais criarem um “espaço para o surgimento da individualidade e autonomia das decisões” (PO4) mas “responsabilizando-os (filhos) pelas novas tarefas” (P28).

Os pais poderão contribuir para o “aluno se sentir aprovado” (A16), o “prazer de estudar” (A45) e o “sucesso na área que escolheram” (A30), permitindo “que tenham as melhores condições para desenvolver a sua carreira” (A46).

Quanto aos efeitos desejáveis da influência parental, os alunos apresentam uma maior diferenciação de respostas, o que se traduz na incidência de respostas idêntica para as diversas categorias. Os pais apresentam uma maior incidência de respostas na categoria responsabilidade. Os professores apresentam uma maior incidência de respostas nas categorias autonomia e responsabilidade. Os profissionais de orientação apresentam maior incidência de respostas na categoria autonomia.

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os resultados indicam que, quer os alunos, quer os diferentes agentes educativos, reconhecem o papel dos pais na implementação de escolhas de carreira no 10º ano de escolaridade. De um modo geral, os participantes evidenciam o reconhecimento do papel dos pais no desenvolvimento da carreira dos filhos, através da relação que com eles estabelecem e da relação com o meio (escola e comunidade). Estes resultados são consistentes com as perspectivas teóricas e empíricas da literatura vocacional que realçam o papel dos contextos no desenvolvimento da carreira (Blustein, 2004; Fouad e cols., 2008; Fouad & Katamneni, 2008; Phillips, Christopher-Sisk, & Gravino, 2001; Schultheiss, 2003; Vondracek, Lerner, & Schulenberg, 1986; Whiston & Keller, 2004).

Para além dos processos da influência parental, os participantes evidenciam os efeitos desejáveis dessa influência (autonomia, prazer pelo estudo e sucesso na área escolhida). As respostas dos participantes permitiram distinguir os processos da influência parental, consubstanciados na relação directa com os filhos (por exemplo, comunicação, apoio, acompanhamento) e na relação com o meio (por exemplo, oportunidades e experiências, colaboração com a escola), e os efeitos desejáveis dessa influência (por exemplo, autonomia/responsabilidade, sucesso na área escolhida, sentimentos de aprovação).

No que diz respeito aos processos da influência parental, a relação que se estabelece entre pais e filhos aparece nas respostas dos participantes como factor determinante, o que é coerente com as investigações no domínio (Borges, 2001; Gonçalves, 1997, 2006; Pinto & Soares, 2001, 2002). A interacção pais-filhos tem sido descrita na literatura como uma variável processual de importância no desenvolvimento da carreira (Schulenberg e cols., 1984). Destacase o papel dos padrões de interacção familiar nas escolhas vocacionais (Berríos-Allison, 2005; Hargrove, Creagh, & Burgess, 2002), evidente nas respostas dos participantes quando afirmam a necessidade do estabelecimento de relações positivas entre pais e filhos, que facilitem a autonomia e responsabilização destes. Isto é coerente com alguns estudos que põem em evidência as tarefas associadas à adolescência, a sua relação com o desenvolvimento de carreira e o papel dos pais neste processo (Berríos-Allison, 2005; Schultheiss & Blustein, 1994; Scott & Church, 2001). As atitudes de apoio, acompanhamento, comunicação parecem, na perspectiva dos participantes, contribuir para o desenvolvimento de carreira dos filhos.

Os participantes referem-se à necessidade de apoio no sentido da aceitação das acções e escolhas dos filhos, no que diz respeito ao projecto vocacional, à vida escolar e pessoal, e da disponibilidade afectiva e instrumental para suportar essas mesmas opções. Isto é coerente com os estudos empíricos que apontam o apoio e o encorajamento como uma variável de processo com impacto significativo na tomada de decisão vocacional (Berríos-Alison, 2005; Gonçalves, 2006; Phillips e cols., 2001; Pinto & Soares, 2002; Schultheiss & Blustein, 1994; Young e cols., 2005). Além disso, põe em evidência a distinção entre apoio afectivo e apoio instrumental, enunciada noutras investigações (Fouad e cols., 2008; Lent e cols., 2002; Schultheiss e cols., 2001)

O acompanhamento e aconselhamento dos filhos são, também, atitudes valorizadas pelos participantes. Estas traduzem um maior nível de envolvimento dos pais nas tarefas vocacionais dos filhos, na medida em que implicam comportamentos de monitorização e de orientação. O referido coincide com investigações que apontam que o papel dos pais no desenvolvimento vocacional pode envolver acções como aconselhar, apoiar e motivar (Gonçalves, 2006; Pinto & Soares, 2002; Young e cols., 1988).

Para além da relação dos pais com os filhos, a relação daqueles com o meio, nomeadamente, através da participação ou de promoção de actividades parece constituir uma acção significativa dos pais no sentido do desenvolvimento da carreira dos filhos. Assim, tal como referido por outros autores (Lent e cols., 2002; Schultheiss e cols., 2001; Soares, 1998), os pais poderão constituir-se como promotores de oportunidades, recursos e experiências favoráveis ao desenvolvimento da carreira dos filhos.

Estudos anteriores demonstraram, não só a influência da família na carreira, mas também a influência de outros contextos (Bardagi & Hutz, 2008; Diemer, 2007; Pinto e cols., 2003; Schultheiss e cols., 2001). A escola, na figura dos professores, tem sido identificada como um contexto com impacto significativo na carreira (Diemer, 2007). Mais especificamente, a articulação família-escola parece contribuir para o processo de decisão (Pinto e cols., 2003). Também neste estudo, as respostas dos participantes valorizam esta colaboração, o que suporta o argumento de que as variáveis familiares não podem ser vistas isoladamente quando estudamos a influência dos contextos no desenvolvimento de carreira (Phillips e cols., 2001; Whiston & Keller, 2004).

Ainda relativamente aos processos da influência parental, os participantes consideram-nos relativamente ao projecto vocacional, mas também relativamente a outras áreas de vida como a vida escolar, o desenvolvimento pessoal e a resolução de problemas. Estes dados reforçam a ideia da interacção dinâmica e complexa entre factores pessoais e vocacionais na determinação da carreira e, especificamente, no processo de decisão vocacional (Fouad & Katamneni, 2008; Phillips e cols., 2001; Schultheiss, 2003).

Conforme referido anteriormente, os participantes evidenciam também os efeitos desejáveis da influência parental. Destacam, por exemplo, a autonomia e a responsabilidade, o prazer pelo estudo e o sucesso na área escolhida como efeitos desejáveis da influência parental. Estes resultados põem em destaque a distinção na literatura entre o reconhecimento dos resultados e dos processos da influência parental na carreira (Pinto & Soares, 2001; Young e cols., 1988).

Face ao exposto, as perspectivas dos participantes acerca do papel dos pais no processo de decisão reafirmam as formulações teóricas que realçam o papel dos contextos no desenvolvimento e, especificamente, no desenvolvimento da carreira. Confirmam-se, também, neste estudo, os resultados da investigação que enunciam a relação entre variáveis familiares e variáveis vocacionais, nomeadamente, aqueles que contemplam factores de ordem diversa na explicação da complexidade do fenómeno das influências e relações humanas (Gonçalves, 2006; Pinto & Soares, 2002; Schulenberg e cols., 1984; Soares, 1998; Whiston & Keller, 2004). Além disso, deve ser objectivo da prática vocacional a sensibilização dos agentes educativos e, em particular dos pais, para as questões associadas ao desenvolvimento e implementação de escolhas de carreira e para o seu papel na qualidade do processo de escolha. Tendo em conta a importância atribuída à relação da família com o meio, é necessário alargar o foco da intervenção vocacional a outros agentes assim como a outros espaços e iniciativas (Blustein, McWhither, & Perry, 2005).

Assim, os dados apontam a necessidade de expandir a intervenção vocacional, considerando os contextos de vida e o seu papel no desenvolvimento da carreira. Deste modo, qualquer modelo conceptual que sustente a intervenção vocacional no Ensino Secundário, deve contemplar o carácter sistémico e multidimensional dos processos de tomada de decisão. Isto traduz a emergência de leituras diversas do processo de tomada de decisão, o interesse pela investigação e intervenção centradas na fase de implementação da decisão e a desejabilidade de intervenções capazes de responder às exigências de adaptabilidade à mudança (Guindon & Richmond, 2005; Harrington & Harrigan, 2006; Tien, 2007).

Algumas ressalvas relativamente aos resultados deste estudo. Em primeiro lugar, o método de recolha de dados escolhido poderá ter limitado a riqueza das respostas dos participantes. O recurso à entrevista teria permitido uma exploração mais profunda das perspectivas dos participantes assim como garantiria o carácter recorrente e dinâmico que caracteriza a metodologia da grounded theory. Em segundo lugar, a morosidade no processo de análise dos dados, o que remete para a necessidade de equipas de investigação que garantam a qualidade e a diversidade das diferentes metodologias de investigação.

Assim, é necessário continuar a investigação no trilho da complexidade das influências contextuais na carreira e, especificamente, no processo de tomada de decisão. Importa prosseguir esta linha de investigação, com recurso a modelos e metodologias de investigação diversificados (Whiston & Keller, 2004; Young e cols., 2005). Além disso, é fundamental aprofundar o conhecimento sobre o papel dos próprios alunos e de outros significativos nas decisões vocacionais (Lent e cols., 2002) e nas diferentes fases do processo de decisão (Jome & Phillips, 2005). Neste enquadramento, reforça-se a necessidade de se desenvolverem modelos conceptuais integrados de intervenção em Orientação no Ensino Secundário.

 

REFERÊNCIAS

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Recebido: 22/05/2009
1ª Revisão: 28/09/2009
Aceite final: 14/10/2009

 

 

1 Endereço para correspondência: Universidade do Minho, Campus de Gualtar. Escola de Psicologia. 4710-057, Braga, Portugal. Fone: (253) 604683. Fax: (253) 604221. E-mail: ceuta@iep.uminho.pt.

 

 

Sobre os autores
* Marisa Carvalho é Mestre em Psicologia Escolar pela Universidade do Minho, estudante de doutoramento em Psicologia Vocacional na Escola de Psicologia da Universidade do Minho, psicóloga escolar na Escola Básica 2º e 3º ciclos de Toutosa, Portugal.
** Maria do Céu Taveira é Professora Auxiliar, coordenadora do Programa de Doutoramento em Psicologia Vocacional, coordenadora da Unidade Experimental em Estratégias de Exploração da Carreira na Escola de Psicologia da Universidade do Minho.

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