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Revista Brasileira de Orientação Profissional

versão On-line ISSN 1984-7270

Rev. bras. orientac. prof vol.11 no.1 São Paulo jun. 2010

 

ARTIGOS ORIGINAIS

 

Modelo transteórico de mudança: Contribuições para o coaching de executivos

 

The transtheoretical model of change: Contributions to executive coaching

 

Modelo transteórico de cambio: Contribuciones al coaching de ejecutivos

 

 

Germano Glufke Reis* 1; Lina Eiko Nakata** 2

Fundação Getúlio Vargas, São Paulo-SP, Brasil

 

 


RESUMO

O coaching de executivos tem sido cada vez mais empregado pelas organizações. Embora haja um número expressivo de praticantes nesse mercado, há uma grande carência de modelos teóricos e de pesquisas. Em decorrência disso, tem sido apontada a necessidade de se lastrear o coaching em evidências empiricamente mais consistentes, ainda que incorporando contribuições de conhecimentos já existentes nas ciências comportamentais e sociais. Além disso, a mudança comportamental tem sido tema recorrente, nas diferentes abordagens empregadas, mesmo que de orientações distintas. Neste contexto, alguns autores têm sugerido que o Modelo Transteórico de Mudança seja adaptado para o processo de coaching; tanto por ser um modelo direcionado à mudança comportamental, como pelo fato de ter forte sustentação empírica. Esse modelo caracteriza os seis estágios que ocorrem em todo processo de mudança comportamental: pré-contemplação, contemplação, preparação, ação, manutenção e término. Este artigo teórico examina possíveis contribuições e limitações do modelo, se aplicado ao processo de coaching de executivos.

Palavras-chave: Coaching de executivos, Orientação ocupacional, Modelo transteórico de mudança.


ABSTRACT

Executive coaching has been widely employed in organizations. Although there is a growing number of practitioners in this market, there is still a substantial lack of theoretical models and research in it. Because of this, some authors have argued for a need of supporting the coaching process on more consistent and empirically tested evidences, even through the embodiment of already existing knowledge, from the behavioral and social sciences. Besides that, behavioral change has been a recurrent theme in many coaching processes, even when based on distinct approaches. In this context, some authors have suggested that the Transtheoretical Model of Change be adapted for the coaching process, both for its focusing on behavioral changes and for being supported by substantial empirical research. This model includes the six stages that take place in every process of behavioral change: precontemplation, contemplation, preparation, action, maintenance, and termination. This theoretical article analyzes possible contributions and limitations of the model, when applied to executive coaching.

Keywords: Executive coaching, Occupational guidance, Transtheoretical model of change.


RESUMEN

El coaching de ejecutivos ha sido cada vez más empleado por las organizaciones. Aunque hay un número significativo de practicantes, en este mercado, hay una gran carencia de modelos teóricos y de investigación. Como consecuencia, se ha señalado la necesidad de basar el coaching en evidencias empíricamente más consistentes, aun incorporando contribuciones de conocimientos existentes en las ciencias comportamentales y sociales. Además, el cambio comportamental ha sido tema recurrente en los diferentes abordajes empleados, aunque de orientaciones distintas. En este contexto algunos autores han sugerido que el Modelo Transteórico de Cambio se adapte al proceso de coaching; tanto por ser un modelo dirigido al cambio comportamental como por el hecho de tener fuerte sustentación empírica. Este modelo caracteriza las seis etapas que ocurren en todo proceso de cambio comportamental: precontemplación, contemplación, preparación, acción, mantenimiento y término. Este artículo teórico examina posibles contribuciones y limitaciones del modelo, si se aplica al proceso de coaching de ejecutivos.

Palabras clave: Coaching de ejecutivos, Orientación ocupacional, Modelo transteórico de cambio.


 

 

O coaching de executivos tem recebido atenção crescente por parte de organizações e executivos (Diedrich, 1996; Kampa-Kokesch & Anderson, 2001; Crofts, 2007; Johnson, 2007; Yu, 2007) e também de estudos de caráter acadêmico (Thach, 2002; Joo, 2005; Jones, Rafferty, & Griffin, 2006; Gray, 2006; Boyatzis, Smith, & Blaize, 2006; Parker, Hall, & Kram, 2008). Na prática, é um mercado que tem movimentado, no mundo, grandes somas: já foi estimado algo em torno de um bilhão de dólares, com tendências de crescimento (Corporate Therapy, 2003).

Trata-se, no entanto, de uma área na qual a prática e os praticantes encontram-se em número muito maior do que o de teorias e pesquisas consistentes (Joo, 2005; Grant & Cavanagh, 2004; Feldman & Lankau, 2005), o que pode, inclusive, dificultar os avanços do conhecimento a ela relacionados. Sherman e Freas (2004) reforçam essa constatação, afirmando que o coaching de executivos é uma espécie de faroeste: uma fronteira empolgante e efervescente, cheia de possibilidades, mas ainda inexplorada e repleta de riscos e oportunismo. Perspectivas, definições e mesmo a formação (e competências) do coach ainda necessitam maiores esclarecimentos e investigação. Joo (2005) ressalta que essa profissão tem sido exercida por profissionais com os mais diversos perfis: psicoterapeutas, ex-executivos, advogados, atletas, entre outros. Ascama (2004), apresenta indicativos (embora não generalizáveis), de que tal diversidade possa estar ocorrendo também no Brasil.

Recentemente vem sendo defendida a necessidade de uma prática de coaching “baseada em evidências”, ou seja, lastreada pelos melhores conhecimentos empíricos disponíveis, aliados à expertise do coach (Grant & Cavanagh, 2004; Stober, Wildflower, & Drake, 2006). Tal proposta – que é uma resposta à prática estritamente pragmática, intuitiva, de auto-ajuda e/ou baseada no bom-senso – esbarra no desafio de que o coaching, como campo de conhecimento específico, encontra-se ainda em sua “infância” (Joo, 2005): ainda há muito a ser estudado. Assim, boa parte do conhecimento empírico necessita ser importado da produção de outros campos, das ciências comportamentais e sociais.

Nesse contexto, alguns autores têm chamado atenção para a potencial contribuição do Modelo de Mudança Transteórico à prática do coaching (Grant, 2006; Stober et al., 2006). Esse modelo, desenvolvido para o contexto clínico nos anos 1980, tem por objetivo promover mudanças comportamentais e apresenta consistente respaldo investigativo (Prochaska, Norcross, & Diclemente, 1994; Petrocelli, 2002; Yoshida, 2002). Recentemente, tem sido adaptado para outras aplicações, distantes da prática clínica, como em situação de mudança organizacional (Prochaska, Prochaska, & Levesque, 2001) e para a estruturação de determinados programas em cursos de gestão de negócios (Tyler & Tyler, 2006). Dado que o coaching freqüentemente visa algum tipo de mudança comportamental (Kilburg, 1996; Joo, 2005), a potencial contribuição deste modelo torna-se especialmente relevante.

O objetivo deste artigo teórico é apresentar os principais componentes que caracterizam o modelo, examinando as suas possíveis contribuições e limitações, se aplicado ao processo de coaching de executivos. Como ponto de partida, o artigo oferece uma sucinta caracterização do que é esse tipo de coaching, comentando as principais abordagens empregadas e a relevância da mudança comportamental nesse contexto; a partir desse pano de fundo, examina o modelo transteórico. Dessa forma, propõe-se a indicar possíveis pontos de partida e hipóteses para pesquisas e, também, a inspirar reflexões nas organizações que têm investido no coaching e entre os próprios participantes do processo: coaches e coachees.

 

Coaching de executivos: uma breve caracterização

Na visão de Kilburg (1996) o coaching de executivos envolve uma relação de ajuda, na qual o coach emprega metodologias comportamentais para ajudar um gestor de uma empresa (o coachee). Há um objetivo nessa relação: contribuir para que o coachee alcance metas previamente identificadas por ambos, visando melhoria de desempenho, maior satisfação pessoal e, como desdobramento, melhorias nos resultados organizacionais. De forma geral, essa definição está alinhada a outras encontradas na literatura (Thach & Heinselman, 1999; Flaherty, 1999; Lyons, 2000; Thach, 2002), sendo que as intervenções promovidas pelo coaching podem abordar diferentes níveis de profundidade: algumas são direcionadas à melhoria do desempenho, focando questões práticas, específicas e objetivas do trabalho; outras agem de maneira mais profunda, explorando a dinâmica psicológica do coachee, aproximando-se da prática psicoterapêutica (Thach, 2002; Bluckert, 2005; Bartlett, 2006). De todo modo, é comum que as diferentes propostas mencionem algum tipo de mudança comportamental como elemento presente nesse processo.

Joo (2005), com base em ampla revisão bibliográfica, situa o processo de coaching em um modelo integrativo mais amplo (Figura 1), onde também devem ser considerados fatores antecedentes (características do coach e do coachee, bem como o suporte da organização) e os resultados/desdobramentos alcançados: proximais/diretos (autoconhecimento, mudança comportamental e aprendizagem) e distais (resultados organizacionais e individuais). No processo, especificamente, são fatores chave o tipo de abordagem adotada, a relação coach-coachee e a disponibilização de feedback.

 

 

Figura 1. Modelo conceitual para o sucesso do coaching de executivos. Fonte: adaptado de Joo (2005).

Segundo Joo (2005), alguns enfoques do coaching, influenciados por uma perspectiva proveniente do aconselhamento psicológico, enfatizam mais o autoconhecimento; outros, com uma perspectiva de consultoria organizacional, concentram-se mais no aprendizado. As duas ênfases, no entanto, tendem a potencializar mudanças comportamentais, que são resultados proximais e, como conseqüência, desdobram-se em resultados individuais e organizacionais (resultados distais). Essa constatação reforça o tema da mudança comportamental como um elemento relevante e recorrente – explícita ou implicitamente – em diferentes abordagens. Nesse sentido, a utilização de estratégias que se propõem a guiar e apoiar mudanças comportamentais, tal como o modelo transteórico discutido neste trabalho, parecem ter importância no cenário da prática do coaching.

 

Abordagens

Peltier (2001) descreve cinco tipos de abordagens empregadas no coaching de executivos. Elas podem ser caracterizadas da forma descrita a seguir.

Psicodinâmica: de influência psicanalítica, explora o inconsciente e estados psicológicos internos. Explora mecanismos de defesa, história familiar, passado, transferência, entre outros. Um exemplo é a utilização da psicanálise no contexto do coaching (Brunner, 1998).

Comportamental: trabalha com princípios da terapia comportamental, explorando fatores reforçadores e punitivos, intrínsecos e extrínsecos. Tal orientação é possível observar, por exemplo, no trabalho de Skiffington e Zeus (2003). Também pode englobar perspectivas correlatas, que enfatizam comportamentos observáveis.

Centrada na pessoa: processo de auto-compreensão sem a intervenção direta do coach, alicerçada em uma relação terapêutica empática e de confiança.

Terapia cognitiva: emprega o pensamento consciente do cliente para identificar pensamentos distorcidos e/ou irracionais. Há, também, abordagens “cognitivas-comportamentais” (Neenan & Dryden, 2002).

Sistêmicas: ancoradas, por exemplo, em perspectivas empregadas em psicoterapia familiar, considera a dinâmica de interação do coachee com inúmeros atores da realidade organizacional. Insere-se aí, por exemplo, o trabalho de Orenstein (2000, 2002) que investiga, conjuntamente, influências do inconsciente individual, das dinâmicas e fronteiras intra e inter-grupos e da organização, nos comportamentos do coachee.

Outra abordagem, não mencionada por esses autores, envolve a utilização de conhecimentos das teorias de educação de adultos (Jackson, 2004; Reis, 2007), em especial a prática reflexiva, enfocando o aprendizado a partir da experiência (Schön, 1983; Boud & Walker, 1990) e a reflexão crítica que visa a revisão de pressupostos e perspectivas pessoais (Mezirow, 1991; Gray, 2006; Reis, 2007).

Brockbank e Mcgill (2006), por outro lado, ampliam esse mapeamento de abordagens, apoiando-se no clássico trabalho de Burrell e Morgan (1979) sobre os quatro paradigmas que norteiam as teorias e práticas organizacionais. Propõem organizar as diferentes abordagens em torno de dois eixos: um relacionado à dimensão “perspectivas de realidade” (eixo subjetivismo-objetivismo) e outro relacionado à dimensão “resultados da aprendizagem” (eixo equilíbrio-transformação). O primeiro eixo vai de uma visão de que há uma realidade objetiva externa e controlável (com relações de causa e efeito observáveis por métodos das ciências naturais) enfatizando mais os aspectos racionais do coaching (objetivismo), a uma visão que se concentra mais no mundo psicológico do coachee e na construção social de sua realidade (subjetivismo). O segundo eixo vai da preservação do status quo (equilíbrio) à transformação pessoal e social (nas estruturas de poder, pressupostos, valores, “discurso dominante”,por exemplo) (transformação).

Dessa forma, propõem um “mapa” que diferencia as abordagens normalmente empregadas (Figura 2).

 

 

Figura 2. Mapa das abordagens de coaching. Fonte: adaptado de Brockbank e McGill (2006).

Daí, resultam os seguintes grupos de abordagens, que podem ser adotadas em função dos objetivos organizacionais e dos participantes.

Funcionalista: prioriza o entendimento da organização como realidade objetiva, dá ênfase ao desempenho, a intervenções pragmáticas, dá menor ênfase a elementos emocionais e subjetivos e não envereda pelo questionamento de pressupostos e reflexão crítica, de forma a preservar o equilíbrio e status quo organizacional. Há menor preocupação em se investigar a vida pessoal do coachee. É uma abordagem “racional, objetiva e instrumental (...)” (Brockbank & McGill, 2006, p. 95). Focada em desenvolvimento de determinadas competências, emprega, intensamente, avaliações e feedback. Pode empregar, também, modelos de atuação pré-definidos e estuturados como o GROW (goal, reality, options, will to act) (Whitmore, 1996) e FLOW (Flaherty, 1999).

De engajamento/alinhamento: reconhece o mundo subjetivo do coachee e trabalha a partir daí, em uma postura não diretiva, que não enfatiza tanto questões como a do poder, preservando o status quo organizacional. De influência humanista, é freqüentemente adotada na organização para alavancar o desempenho em contextos de mudança, nos quais pode haver resistência. Os autores ressaltam: “o coaching de engajamento visa persuadir o cliente a adotar os objetivos de aprendizagem da organização ou sistema” (Brockbank & Mcgill, 2006, p. 96). Também pode empregar feedback mas, aqui, há um espaço maior para emoções e para questões individuais.

Revolucionário: de orientação materialista marxista, tem uma perspectiva objetiva (o universo subjetivo docoachee é secundário) e o propósito central de mobilizar o indivíduo, por meio da persuasão e debate racional, para um entendimento mais claro da realidade, conduzindo a uma mudança radical da sociedade. Essa abordagem é considerada inadequada para o contexto organizacional, dado o seu caráter altamente disruptivo e radical (Brockbank & Mcgill, 2006); daí o fato de não ser empregada pelas empresas.

Transformativo/Evolucionário: também considera elementos do universo subjetivo do coaching, suas premissas, experiências e motivações, observando dimensões sociais e de poder que podem interferir no aprendizado, possibilitando observar e questionar o “discurso dominante” e empreender reflexões críticas e transformadoras sobre paradigmas pessoais, além de trabalhar o desempenho cotidiano. Procura-se “(...) desafiar os clientes a olharem além dos seus horizontes imediatos e a transformarem a visão que têm do sistema no qual vivem e trabalham” (Brockbank & McGill, 2006, p. 203). Nesse sentido, busca-se condições para a revisão de “perspectivas de significados” (Mezirow, 1991).

Em relação ao cenário de abordagens apresentado, o modelo transteórico não deve ser considerado como mais uma abordagem ou como uma teoria específica. Na realidade, foi concebido como uma proposta de integração teórica e deve ser visto como um modelo geral de mudança, baseado em múltiplos estágios, sendo que estes foram evidenciados por meio de pesquisas empíricas (Prochaska et al., 1994). Essas etapas de mudança podem ser trabalhadas, segundo o modelo, por meio da utilização de diferentes processos, estratégias e ferramentas.

Assim, é possível que o modelo possa acomodar abordagens de coaching com características bastante distintas. De fato, a sua utilização já foi proposta para intervenções com características “funcionalistas” (Grant, 2006) e o modelo também tem sido relacionado a propostas transformadoras, de reflexão crítica, tal como a aprendizagem transformativa (Moore, 2005), que é o tipo de perspectiva que caracteriza as propostas “transformativas/evolucionárias” para o coaching.

 

O Modelo de Mudança Transteórico

Em linhas gerais, o Modelo de Mudança Transteórico delineia o caminho percorrido por uma pessoa em qualquer processo de mudança comportamental, quer seja impulsionado e gerenciado por ela mesma, quer seja em função (ou com o apoio) de agentes/elementos externos. Por “mudança” entenda-se “qualquer atividade que você inicia para ajudar a modificar a sua maneira de pensar, sentir ou comportar-se” (Prochaska et al., 1994, p. 25).

No início, os proponentes do modelo – Prochaska, DiClemente e demais pesquisadores - investigavam diferentes processos de mudança, envolvidos tanto em iniciativas pessoais como em contextos terapêuticos (Prochaska, Velicer, Guadagnoli, Rossi, & DiClemente, 1991). Identificaram que esses processos podem envolver vários tipos de iniciativas e práticas, tais como: tomada de consciência, reavaliação de si mesmo, engajar-se em relações de ajuda, gerenciar recompensas e reforços, reavaliação do ambiente, entre outras. Aos poucos observaram que as mudanças ocorriam conforme um certo padrão, percorrendo um conjunto geral de etapas. Concentraram-se, então, em pesquisar tais etapas, no intuito de testar a sua aplicabilidade em intervenções terapêuticas.

Conforme o modelo, a evolução das mudanças depende da consciência que a pessoa tem do que necessita mudar, do problema que necessita enfrentar: um determinado hábito, por exemplo (tal como dar-se conta de que precisa parar de fumar, de que esse hábito reflete-se na saúde). Elas também demandam mobilização e empenho pessoais e ocorrem ao longo do tempo, gradativamente, em um percurso que envolve estágios subseqüentes: dar-se conta do problema, mobilizar-se para a mudança, iniciar ações relacionadas ao problema e assim por diante. Segundo o modelo transteórico, as etapas da mudança podem ser caracterizadas como a seguir.

Pré-contemplação: momento no qual a pessoa não tem intenção de mudar em um futuro próximo; ela não percebe essa necessidade ou a importância que uma determinada mudança poderia ter para certos aspectos de sua vida.

Contemplação: nesta etapa a pessoa pensa na possibilidade de mudar, reconhece que há uma questão a ser enfrentada e que ela é relevante, mas ainda não tomou nenhuma iniciativa para tal.

Preparação: quando há um comprometimento com a mudança, traduzindo-se na intenção de realizar mudanças em um futuro próximo e, algumas vezes, já na implementação de pequenas mudanças (mas que, em geral, não chegam a ser duradouras). Há maior elaboração da questão enfrentada e o aquecimento para agir na direção da mudança.

Ação: nessa etapa a pessoa toma decisões e esforça-se ativamente para colocar em prática novos comportamentos e atitudes. Há um esforço nesse sentido e as ações decorrentes podem ser observadas: há evidências concretas de que determinados objetivos estão sendo buscados e/ou alcançados.

Manutenção: ativamente, a pessoa esforça-se, ao longo do tempo, para consolidar o que alcançou, evitando retomar comportamentos anteriores. Realiza iniciativas e estratégias com vistas à consolidação das mudanças alcançadas.

Término: quando os novos comportamentos tornam-se freqüentes e estáveis.

Esses estágios indicam diferentes níveis de prontidão de uma pessoa, para empreender e consolidar mudanças. Isso significa que, para que uma mudança comportamental ocorra, é preciso que todo esse percurso seja percorrido. Por outro lado, se um indivíduo não está pronto para avançar para um novo estágio, isto implica, em linhas gerais, em resistência, e resulta na pessoa estacionar na etapa em que já se encontra. Daí decorre a necessidade de se adotar estratégias específicas para cada etapa, adequando-as ao grau de prontidão de cada um.

Originalmente desenvolvido e testado para a prática clínica – nesta, vem sendo empregado como guia para tratamento de fumantes, em casos de drogadição, em aconselhamento e psicoterapias breves, entre outros – o modelo transteórico é lastreado por uma base relevante de pesquisa (Prochaska & DiClemente, 1983; Prochaska et al., 1991; Prochaska, Norcross, & DiClemente, 1994; Yoshida, 2002; Petrocelli, 2002). Os estudos empíricos têm dado força ao modelo, reforçando a validade das etapas que o compõem. De fato, observa-se que todo processo de mudança pessoal, mesmo que conduzido com sucesso pelo próprio indivíduo, fora de contextos terapêuticos, também transita pelas etapas descritas (Prochaska et al., 1994; Moore, 2005), o que confere a todo processo de mudança comportamental um importante elemento (auto)motivacional: em todos os casos é preciso haver intenção, vontade e mobilização da própria pessoa, para que alguma mudança seja possível. Além disso, o suporte ambiental também pode ser elemento essencial, em diversos casos.

É importante notar que a progressão dessas etapas não é necessariamente linear, envolvendo retrocessos (Yoshida, 2002), saltos de uma etapa para outra (Prochaska et al., 1994), quebras (interrupções) e sobreposições entre elas. Ou seja, o encadeamento entre elas parece-se mais com uma espiral, do que com uma linha contínua. Além disso, em algumas dimensões (um determinado comportamento, por exemplo) a pessoa pode encontrar-se em uma etapa inicial (pré-contemplação) enquanto que, em outra, situa-se em estágios mais avançados (ação).

A maleabilidade do modelo tem estimulado a sua adoção em diferentes contextos, distantes do objetivo terapêutico, tais como em situações de mudança organizacional (Prochaska, Prochaska, & Levesque, 2001) e como estrutura para o desenvolvimento de programas que requerem algum tipo de mudança atitudinal/comportamental por parte dos alunos, como em cursos que debatem questões éticas nos negócios (Tyler & Tyler, 2006). Mais recentemente, alguns autores têm argumentando que esse modelo, se adaptado, poderia servir de referência também para a estruturação do processo de coaching (Grant, 2006; Stober et al., 2006). No entanto, esse debate é recente e encontra-se em seu estágio inicial.

 

Possíveis implicações do modelo para o coaching de executivos

Uma contribuição do modelo transteórico refere-se à utilização dos estágios de mudança para se pensar o próprio processo do coaching: o grau de consciência que o coachee tem de determinada questão, em cada etapa, e o nível de disposição que tem para lidar com ele, certamente impactam o processo. Quando o objetivo do coaching demanda a revisão e mudança de comportamentos, o modelo pode ser um guia para a identificação das ações, estratégias e ferramentas mais apropriadas para cada situação, na direção de mudanças sustentáveis; até mesmo a postura do coach na relação com o coachee (Yoshida, 2002), pode requerer ajustes ao longo do caminho. Algo que o modelo enfatiza é que diferentes pessoas podem estar em diferentes estágios e, em função disso, avançarão na mudança de diferentes maneiras.

Nesse sentido é interessante notar que Thach (2002) identificou, em um estudo de caso, que a prática defeedback 360 graus aliada ao coaching pode promover melhorias de 55-60% na eficácia das lideranças de uma organização; naquele caso observou-se que os gestores que alcançaram os maiores avanços foram aqueles que buscaram ativamente, por conta própria, novos feedbacks. Esse estudo evidencia o quanto, em uma intervenção dessa natureza, as reações dos participantes podem ser distintas: alguns mobilizam-se e agem; outros não se comprometem da mesma maneira. Essas diferenças muito provavelmente têm alguma influência nos resultados alcançados; é possível, também, que os participantes encontrem-se em diferentes patamares dos estágios de mudança (alguns na pré-contemplação e outros na preparação, por exemplo), o que pode impactar a maneira como cada um lida com a situação de feedback e coaching. A autora não faz essa análise (por estar fora do escopo proposto), mas o nível de prontidão para a mudança de cada um, para lidar com os temas tratados naquele processo, pode ter sido um dos fatores relevantes para o seu desdobramento: é possível que algumas pessoas ainda não identificassem necessidades de mudanças (aquelas no estágio de pré-contemplação), enquanto outras já eram capazes de definir e empreender ações de mudança (as que se encontravam nos estágios de preparação e ação), por exemplo.

Como ressaltam Prochaska e Prochaska (1999), a razão das pessoas não mudarem não é porque elas não podem, não querem, ou não sabem como fazê-lo; a questão é como fornecer o suporte mais adequado, dado o nível de prontidão em que elas se encontram. Esse fato tem estimulado, inclusive, a utilização de instrumentos que permitam identificar em qual estágio da mudança a pessoa está, em relação aos temas focados. Uma forma é o uso de um questionário validado para esse fim (Mcconnaughy, Prochaska, & Velicer, 1983), já traduzido e validado também no Brasil (Yoshida, 2002), sendo que esta versão não é indicada para o coaching e para o contexto organizacional, uma vez que se destina à prática terapêutica. Outros autores colocam que é possível fazer este mapeamento por meio de observação, do próprio diálogo (Petrocelli, 2002), da proposição de situações e casos para análise (Tyler & Tyler, 2006): as próprias impressões e posições trazidas pelo coachee dão pistas sobre o estágio em que está e sobre a sua prontidão, permitindo que se escolha a estratégia mais indicada para cada situação.

De fato, o modelo transteórico possibilita algumas reflexões que podem contribuir com a estruturação do processo de coaching e com a escolha de diferentes estratégias para cada etapa da mudança, como a seguir.

Pré-contemplação. Neste estágio o coachee não tem a percepção clara de elementos como os impactos profissionais de certos comportamentos, necessidades de desenvolvimento de determinadas competências e/ou a existência de gaps de desempenho; o coachee também pode não compreender a relevância e impactos negativos relacionados a determinados comportamentos (Tyler & Tyler, 2006). Nesse caso, pode não ser percebida a necessidade de mudança, o que implica em resistências (Moore, 2005) ou em menor mobilização para o coaching, o que fragiliza (e até inviabiliza) o processo. Por outro lado, pode haver alguma mobilização, mas acompanhada de maior clareza com relação a determinadas necessidades de mudança e menor com relação a outras. Estratégias apropriadas para esse estágio devem contribuir para uma conscientização quanto a possíveis problemas e suas potenciais soluções, lidar com emoções envolvidas (receios das conseqüências ou de possíveis insucessos, por exemplo) e permitir observar impactos positivos das mudanças no ambiente organizacional (Prochaska et al., 2001).

Nesse contexto, situações de feedback tendem a alavancar novos pontos de vista e a evidenciar questões que antes não eram percebidas pelo coachee; o feedback contribui para que ele perceba melhor, por exemplo, os seus comportamentos e os impactos que têm sobre os outros (Brockbank & McGill, 2006). De fato, muitos contextos de coaching empregam processos de feedback como ponto de partida (Orenstein, 2002; Joo, 2005), inclusive envolvendo múltiplas fontes, como na avaliação 360 graus (Orenstein, 2000; Thach, 2002; Reis, 2003). Em alguns casos, ofeedback pode, inclusive, promover a emergência de “dilemas desorientadores” (Mezirow, 1991, 2008; Reis, 2007), que colocam em xeque pressupostos e levam ao questionamento de premissas pessoais, motivando a pessoa a empreender uma revisão de suas perspectivas.

Outra estratégia que contribui para a exploração de áreas turvas e para o desenvolvimento de um olhar mais atento sobre características pessoais e sobre a forma como se interage com o ambiente organizacional é a utilização de instrumentos de aferição de estilos profissionais, tipos psicológicos e/ou de preferências no trabalho. Vários deles vêm sendo apresentados na literatura nas últimas décadas (Mccann & Margerison, 1989; Bergamini, 1993; Casado, 1998), e a utilização de tais ferramentas pode, potencialmente, contribuir para a evolução do estágio de pré-contemplação para o de contemplação, uma vez que sensibilizam o coachee (ou candidato a coachee) para a possibilidade e importância da auto-observação e para uma investigação reflexiva de suas potencialidades e necessidades de desenvolvimento. Também explicitam relações existentes entre dimensões como: características pessoais, motivações, comportamentos e desempenho profissional.

Contemplação. Neste estágio, espera-se que o profissional esteja mais consciente de determinadas questões e apresente abertura para novas oportunidades (Tyler & Tyler, 2006). Há uma prontidão maior para engajar-se no processo: o coachee identifica necessidades e interessa-se mais em rever comportamentos e competências profissionais. Cabe aí explorar objetivos pessoais, valores, focos da mudança esperada (Petrocelli, 2002) e a importância que a mudança tem para o sucesso do próprio profissional (Prochaska et al., 2001).

Potencialmente, é a partir dessa etapa que o coachee procura espontaneamente o processo, pelas razões mais variadas, como ilustra Orenstein (2000), ou é a partir dela que tira maior proveito dessa oportunidade, se ela lhe é apresentada. Aí as condições podem estar mais favoráveis para um auto-exame e observação mais cuidadosa também do ambiente no qual o executivo atua. Muito provavelmente, estratégias como as citadas para o estágio anterior (feedback, avaliação 360 graus, análises de estilos comportamentais e de preferências, por exemplo), também cabem nesta etapa. No entanto, deve-se notar a disponibilidade e o comprometimento do coachee que encontra-se na fase de contemplação são bastante distintos. Neste caso tende a ocorrer um maior interesse e exploração, mesmo que nem todas as variáveis envolvidas nas questões identificas pelo coachees estejam claras.

Nesta etapa as condições são mais propícias para a introdução de práticas reflexivas (Jackson, 2004; Reis, 2007) mais elaboradas, incluindo a reflexão crítica, sobre premissas e perspectivas pessoais (Mezirow, 1990; Gray, 2006), quando for o caso. Também podem ter lugar reflexões antes e depois das experiências profissionais e o estímulo à reflexão na prática (Schön, 1983; Boud, Keogh, & Walker, 1985; Boud & Walker, 1990; Boud, Cressey, & Docherty, 2006). Esse exame possibilita identificar e compreender melhor relações entre variáveis, motivos de comportamentos e os impactos destes. Nesse sentido,feedbacks com múltiplas fontes podem contribuir para uma reflexão sobre as diferentes relações que interferem na atuação individual e que são influenciadas por ela. Cabem aí, evidentemente, contextualizações: o contexto de carreira, dinâmica política, objetivos organizacionais, entre outras.

Nesse cenário de exploração, uma outra abordagem que pode ser bastante rica é a realização de observações no local de trabalho, pelo coach (Orenstein, 2000). Trata-se, evidentemente, de prática bastante delicada e que deve cercar-se de cuidados; além disso, não é viável para todos. No entanto, podem produzir subsídios sólidos sobre diversos elementos que estão presentes na atuação do profissional.

Preparação. Neste estágio espera-se que o participante do processo, no caso o coachee, assuma um firme compromisso com a mudança, acreditando que possa realizá-la; aqui é tomada a decisão para agir (Prochaska et al., 2001).

A partir do exame das questões que o levaram ao processo de coaching, implicações destas questões tornam-se mais evidentes; também as possíveis causas e necessidades (e benefícios potenciais) de novas ações, novos comportamentos e/ou do desenvolvimento de certas competências vão tornando-se mais claros. Aqui, Petrocelli (2002), citando Groth-Marnat, sugere, como forma de estimular o comprometimento, a exploração de fatores a favor e contra a mudança. Trata-se de balancear decisões: um processo de dar peso aos prós e contras da mudança, identificando a relevância relativa de cada um (Velicer, Diclemente, Prochaska, & Brandenberg, 1985; Prochaska et al., 1994), sendo que da contemplação para a preparação os prós vão se tornando cada vez mais evidentes, dando força à etapa seguinte (ação). Outro recurso apontado por Petrocelli (2002), com base naqueles autores, é a análise de forças e fraquezas, que podem ajudar a identificar estratégias específicas de ação.

A partir dessas explorações, vão clareando-se os focos e, principalmente, são identificadas possíveis ações para que a mudança seja implementada. Como desdobramento, iniciativas individuais já vão sendo colocadas em prática nesta etapa. Assim, é o momento propício para um planejamento, para a definição de objetivos mais precisos, identificando possíveis estratégias a serem testadas; é o momento para o desenvolvimento de um plano de ação (Grant, 2006).

Ação. O agir envolve uma dinâmica de auto-regulação, de forma que o coachee vai gerenciando os seus recursos pessoais e interpessoais com vistas à realização dos objetivos a que se propôs. Bandura, citado por Grant (2001), enumera alguns processos chave na mudança e auto-regulação direcionada a objetivos: auto-observação (observar a si mesmo e ao ambiente), auto-avaliação (avaliar a si mesmo, continuamente, considerando a relação com o ambiente) e auto-reação (realizar mudanças nas ações para atingir um objetivo).

No avanço da “preparação” para a “ação”, o movimento de autorregulação torna-se central. Segundo a descrição de Grant (2001), inicialmente devem ser definidos os objetivos e elaborado um plano de ação que, a seguir, será implementado e monitorado, de forma que os resultados alcançados possam ser avaliados e analisados sistematicamente ao longo do percurso. Dessa forma, viabilizam-se ajustes finos e, também, o realinhamento de objetivos e ações propostos inicialmente. Esse processo é cíclico: objetivos, plano e ações voltam a ser examinados continuamente, para que haja uma aproximação gradativa aos melhores resultados possíveis. O que não está dando certo é mudado; o que tem alcançado sucesso é mantido (Grant, 2001, p. 3).

Manutenção. O modelo transteórico caracteriza a manutenção como um momento bastante especial, sujeito a retrocessos e recaídas, até que seja alcançado o término do processo de mudança. O esforço individual é chave nessa etapa, mas a interação deste com determinadas condições ambientais e suporte externo pode ser relevante em diversos casos, para que os comportamentos se consolidem. Em particular, são ressaltados elementos como o gerenciamento de recompensas (intrínsecas e extrínsecas) e a necessidade de relações de suporte (Prochaska, Prochaska, & Levesque, 2001). No caso do coaching, tais considerações enfatizam, por um lado, a necessidade de se adotar, nas organizações, mecanismos que possibilitem o monitoramento contínuo dos avanços pelo coachee (Thach, 2002); por outro, enfatizam a importância de se alinhar e integrar os processos individuais com sistemas mais amplos de gestão de pessoas, planejamento de carreira e desenvolvimento gerencial (Cacioppe, 1998; Vicere & Fulmer, 1998; Gray, 2006; Weiss & Molinaro, 2006). Assim, outros atores relevantes (gestores, mentores, pares, entre outros) podem ter importância no processo, articulando feedback, suporte, recursos e/ou recompensas. Essa necessidade da participação da organização, no entanto, pode representar um grande desafio para esse estágio, tal como será discutido mais adiante.

 

Limitações à aplicação do modelo transteórico no contexto do coaching

Apesar das possíveis contribuições do modelo para o conhecimento e prática do coaching, há também certas limitações que podem ser enumeradas. Quanto ao próprio modelo transteórico, Bowles (2006) coloca que, apesar da sua estrutura ter sido validada, ele ainda demanda refinamentos em sua operacionalização, desenvolvimento e nas definições que apresenta. Quanto à sua aplicação no coaching, há ainda a necessidade de se estudar o modelo dentro das condições e características específicas dessa situação, na qual o objetivo não é terapêutico e há a expectativa de que as mudanças comportamentais tenham um desdobramento no universo profissional e organizacional do coachee. Conseqüentemente, as adaptações, sínteses e conexões teóricas propostas neste trabalho ainda demandam uma investigação no campo.

Alguns questionamentos podem ser levantados e eles têm significado não só para a análise do modelo transteórico, mas, também, para o coaching de forma geral. Este modelo, por si só, deixa em aberto esses pontos; são os seguintes:

Que tipos de comportamentos podem efetivamente ser mudados pelo coaching? Ainda há uma falta de evidências que contribuam para responder a essa questão, embora a mudança comportamental seja tema recorrente nos trabalhos sobre coaching (Joo, 2005). Talvez a proposta de Waldroop e Butler (1996) contribua como ponto de partida para a elucidação desse ponto: esses autores argumentam que o coaching tende a apresentar melhor resultado quando focado em comportamentos menos freqüentes e relacionados a situações específicas; já comportamentos fortemente arraigados, muito freqüentes e relacionados a características de personalidade, segundo os autores, são mais difíceis de mudar.

Em que medida é possível esperar que a organização dê o suporte necessário a etapas críticas (de ação e manutenção) para a mudança? Essas etapas são delicadas, por demandarem uma interação entre o esforço individual e o suporte ambiental: a mudança comportamental freqüentemente requer a participação consistente da organização, para que se evitem recaídas. No entanto, é comum observar que o coaching de executivos ocorre totalmente focado no processo individual, desconectado de sistemas e estratégias de gestão de pessoas. De fato, há um risco grande de se responsabilizar integralmente o coachee por suas mudanças, desconsiderando até mesmo forças políticas que interferem em suas ações, o que é mais típico em abordagens do tipo “de engajamento” (Brockbank & Mcgill, 2006).

Por outro lado, é preciso observar que o modelo transteórico descreve uma evolução ideal de etapas, mas estas podem apresentar nuances e dinâmicas específicas (idas e vindas, por exemplo), em cada indivíduo. Dessa forma, não é possível encará-lo como um modelo prescritivo. Além disso, ele não descreve em detalhes todos os processos e recursos que devem ser utilizados nocoaching; certamente há uma amplitude de abordagens e recursos técnicos que poderiam ser acomodados nos diferentes estágios de mudança.

 

Considerações Finais

Uma implicação importante que se desdobra do modelo de mudança transteórico refere-se à própria aplicabilidade do coaching no contexto organizacional: do ponto de vista desse modelo, pode ser que nem todos estejam prontos para o coaching (no caso, por exemplo, de pessoas que estão na fase de pré-contemplação); ou, melhor, que nem todos estejam preparados do mesmo modo para ocoaching, dados os diferentes níveis de prontidão que podem ser encontrados.

É provável que esse aspecto explique, por exemplo, os resultados encontrados por Thach (2002), que estudou a evolução dos participantes de um processo de feedback e coaching realizado por uma empresa, em um programa de desenvolvimento de lideranças. Com base naquele trabalho, nota-se que podem haver diferenças nas reações dos participantes de um processo dessa natureza. Na ocasião, algumas pessoas evidenciaram mudanças comportamentais pronunciadas, enquanto outras não responderam da mesma maneira. É possível que o estágio no qual cada um dos participantes se encontrava (pré-contemplação, contemplação, preparação etc.), com relação às questões de liderança abordadas, tenha influenciado os resultados do processo implementado por aquela empresa.

Do modelo desdobra-se a constatação de que não faz sentido tratar os participantes de processos dessa natureza como se todos estivessem, por exemplo, nos estágios de preparação ou ação, partindo logo para a confecção de planos de ação. Resta saber em que medida essa dinâmica é considerada (e gerenciada) nas iniciativas de coaching que estão ocorrendo nas empresas, uma vez que ela pode influenciar os resultados alcançados com esses processos. Por ora, o que se observa é que a literatura não tem dado ênfase a esse tipo de diferenciação. Talvez esteja, aí, um tema interessante para futuras investigações.

No contexto desta análise teórica, o modelo em questão parece trazer contribuições interessantes, especialmente no que tange à identificação de níveis de prontidão – de forma a situar os coachees em diferentes estágios da mudança – e no sentido de orientar estratégias mais adequadas a cada etapa. Alguns exemplos e possibilidades foram propostos aqui, mas ainda há a necessidade de estudos específicos.

Outra constatação propiciada pelo modelo refere-se à necessidade de se estruturar iniciativas de coaching de executivos de maneira a vinculá-las a práticas mais amplas de gestão de pessoas. A partir de determinado ponto, algumas mudanças almejadas somente se cristalizam se encontram o ambiente mais adequado e o suporte necessário. Nesse sentido, as expectativas quanto a resultados proximais e distais do coaching deveriam levar em conta também essa variável.

Por outro lado, a adequação e validação dos instrumentos de aferição do grau de prontidão – questionários de estágios de mudança – para a situação do coaching, pode ser de interesse para trabalhos futuros; tais instrumentos poderiam contribuir não só com pesquisas, mas também com a atuação de praticantes (permitindo adequar estratégias de ação a cada etapa) e, também, com as próprias organizações, possibilitando o gerenciamento de iniciativas de coaching em função dos diferentes estágios de mudança presentes entre os coachees. Tais instrumentos também permitiriam observar a evolução dos participantes e analisar estatisticamente a distribuição dos coachees em torno das diferentes etapas da mudança, viabilizando práticas organizacionais de desenvolvimento de pessoas mais focadas ao perfil de cada grupo.

A maleabilidade do modelo transteórico, que permite a sua acomodação mesmo a abordagens distintas, parece ser um ponto positivo; no entanto, o risco de estimular um ecletismo simplista e superficial – que costure perspectivas conceitualmente incompatíveis, dando forma a uma colcha de retalhos – deve ser observado. Porém, seria interessante aprofundar a análise das possíveis contribuições do modelo para outras práticas organizacionais que, assim como o coaching, podem requerer algum tipo de mudança comportamental, tal como nos casos de programas de desenvolvimento de lideranças e de processos de mudança organizacional.

 

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Recebido: 9/03/2009
1ª Revisão: 07/01/2010
Aceite final: 08/02/2010

 

 

1 Endereço para correspondência: Rua Toneleiros 199/221, Cond. San Conrado/ Sousas, 13104-182, Campinas-SP, Brasil. Fone: (19) 9233-6631. E-mail: germano.reis@fgv.br.
2 Agradecimento à Capes pelo apoio institucional.

 

 

Sobre os autores
* Germano Glufke Reis é psicólogo, professor da Fundação Getúlio Vargas/Escola de Administração de Empresas de São Paulo (FGV/EAESP) e das Faculdades de Campinas (Facamp) e doutorando em Administração pela Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo (FEA/USP).
** Lina Nakata é professora da Escola Superior de Administração e Gestão (ESAGS). É graduada, mestre e doutoranda em administração de empresas pela Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo (FEA/USP).

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