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Revista Brasileira de Orientação Profissional

versão On-line ISSN 1984-7270

Rev. bras. orientac. prof vol.11 no.2 São Paulo dez. 2010

 

ARTIGO ORIGINAL

 

O supervisor educacional no contexto da educação a distância

 

The educational supervisor in the context of distance education

 

El supervisor educacional en el contexto de la educación a distancia

 

 

Fabio Scorsolini-CominI, 1 ; David Forli InocenteII; Alberto Borges MatiasIII; Manoel Antônio dos SantosIV

IUniversidade Federal do Triângulo Mineiro, Uberaba-MG, Brasil
IIInstituto de Ensino e Pesquisa em Administração, INEPAD, Brasil
IIIUniversidade de São Paulo, FEARP, Ribeirão Preto-SP, Brasil
IVUniversidade de São Paulo, FFCLRP, Ribeirão Preto-SP, Brasil

 

 


RESUMO

O objetivo da pesquisa foi analisar a atuação dos supervisores de ensino de um instituto multidisciplinar, no contexto da educação a distância. Por meio de um estudo de caso, foram analisadas as descrições de cargo desses profissionais. Em termos de suas funções, destacou-se que o supervisor é responsável por atividades operacionais e também estratégicas, sendo que houve uma ênfase em sua atuação como gestor e como detentor de competências gerenciais, bem como de aspectos técnicos, em detrimento de suas funções educacionais e seu papel político. Destaca-se a necessidade de maior espaço para a discussão acerca da atuação neste contexto, favorecendo a assunção de uma identidade profissional comprometida com os pressupostos da sociedade do conhecimento.

Palavras-chave: educação a distância, avaliação de cargo, administração educacional, formação profissional


ABSTRACT

The aim of this paper was to analyze the performance of educational supervisors at a multidisciplinary institute in the context of distance education. The job descriptions of educational supervisors were analyzed in a case study. Their functions included operational and strategic activities, with emphasis on their managerial skills and the technical aspects at the expense of their educational functions and political role. The study highlights the need for more room for discussion about educational supervisors, encouraging the assumption of a professional identity committed with the propositions of the knowledge society.

Keywords: distance education, job evaluation, educational management, career education


RESUMEN

El objetivo de la investigación ha sido analizar la actuación de los supervisores de enseñanza de un instituto multidisciplinario, en el contexto de la educación a distancia. Por medio de un estudio de caso se analizaron las descripciones de cargo de esos profesionales. En lo que concierne a sus funciones se destacó que el supervisor es responsable por actividades operativas y también estratégicas, y que hubo un énfasis en su actuación como gestor y como poseedor de competencias gerenciales, así como de aspectos técnicos, en detrimento de sus funciones educacionales y de su papel político. Se destaca la necesidad de mayor espacio para la discusión acerca de la actuación en este contexto, favoreciendo la asunción de una identidad profesional comprometida con los presupuestos de la sociedad del conocimiento.

Palabras clave: educación a distancia, evaluación de cargo, administración educacional, formación profesional


 

 

Há alguns anos, a educação a distância (EAD) só era conhecida do grande público por iniciativas como o Telecurso 2000 e o Instituto Universal Brasileiro, cursos desenvolvidos por meio da televisão e de apostilas distribuídas via correspondência, respectivamente. Em 1995, foi criada a Associação Brasileira de Educação a Distância (ABED), sociedade científica voltada para o desenvolvimento da educação aberta, flexível e a distância (Formiga & Litto, 2009). Impulsionada por esse movimento, a EAD ampliou seu escopo de formação e passou a fazer parte de quase todos os níveis educacionais, com concentração mais expressiva no ensino superior, na qual vem sendo alvo de diferentes pesquisas. Esses estudos tanto buscam oferecer maior delimitação teórica para a área, quanto tratam de sua implementação como ferramenta de ensino e interação (McBrien, Jones, & Cheng, 2009), sua influência na construção de novos paradigmas educacionais (Bohadana & Valle, 2009; Coiçaud, 2001), sua utilização em treinamento, desenvolvimento e educação (TD&E) (Granito, 2008; Zerbini & Abbad, 2009), na formação de professores (Moran, 2009) e no desenvolvimento de comunidades (West & Jones, 2007).

Nesse contexto, atualmente vem sendo discutido não apenas como é aprender a distância, qual o perfil dos alunos que buscam esse tipo de formação e como eles são efetivamente formados. O que emergem são questionamentos, também, acerca dos profissionais que trabalham nessa modalidade de ensino, com prevalência de estudos sobre os chamados tutores de EAD (Maggio, 2001). Segundo levantamentos de Scorsolini-Comin (2009) e Vieira, Almeida e Alonso (2003), há poucos trabalhos que discutem efetivamente como se dá a gestão nessas modalidades, quem são esses gestores, como eles são formados e quais são as suas atribuições específicas em relação à EAD. Predominam estudos sobre a gestão relacionada à tecnologia e não aos aspectos educacionais (Barreto, 2001; Catapan, 2001; Mallmann & Catapan, 2007; Perry, Timm, Ferreira Filho, Schnaid, & Zaro, 2006; Testa, Luciano, & Freitas, 2001).

É no bojo dessa lacuna que se começa a pensar na função do supervisor de ensino no contexto da EAD, figura que teve origem na educação presencial. Presencialmente, este profissional era formado em habilitação específica nos cursos de Licenciatura em Pedagogia, ou em nível de pós-graduação em Supervisão Educacional (Freitas, 1999). Conforme destacado por Nogueira (2005), os contornos da figura do supervisor educacional são bastante amplos e diversificados em nosso contexto de ensino. Esta autora destaca que, historicamente, na formação e na ação do supervisor educacional, prevaleceu a técnica sobre o conteúdo, e os procedimentos sobre os aspectos políticos, em detrimento dos fins educacionais. Essa característica, no entanto, seria intencional justamente pelo fato de se priorizar o comprometimento desse profissional com a visão de mundo e de educação conservadora, segundo os interesses do sistema vigente e o ideário da classe dominante.

Em sua abordagem crítica do problema, Nogueira (2005) enfatiza a dimensão política da atuação, apregoando que o supervisor deve se colocar como "supervisor-educador" (p. 28), não devendo se concentrar apenas na realidade de sua escola ou de seu sistema de ensino, mas "compreender e ultrapassar a percepção da escola brasileira na sociedade capitalista, de modo a situá-la no contexto de uma nova sociedade" (Nogueira, 2005, p. 28). Essa nova visão da sociedade contemporânea deve, necessariamente, abrir espaço para a discussão do supervisor de ensino em outros contextos que não o presencial. Para Chacur (2008) e Horta (2007), considerando a posição central da sociedade da informação e do conhecimento, este profissional deve atuar cada vez mais no sentido de propiciar aprendizagens instigadoras, ambientes que desenvolvam as potencialidades e capacidades dos alunos e que tenha na liderança uma ação positiva. Desse modo, a ação supervisora deve receber o respaldo da instituição educacional, para que possa ser uma ação voltada ao contexto em que vivemos, uma ação reflexiva e crítica em face a um campo em rápida transformação.

Devemos destacar que o profissional formado pela educação presencial e com atuação neste segmento tem perfil, formação e atribuições distintas do supervisor na EAD, como será discutido no decorrer do presente estudo. Por definição, a EAD apresenta-se como um modelo baseado na separação física entre alunos e educadores, no qual há possibilidade de comunicação síncrona ou assíncrona entre as partes envolvidas (Almeida, 2003; Alves & Nova, 2002; Chaves, 1999; Inocente & Scorsolini-Comin, 2009; Keegan, 1991; Moran, 2002). Segundo Gameiro (2008), essas características sugerem o uso de ferramentas tecnológicas para que os processos educacionais, baseados em agentes dispostos espacialmente separados, e a disseminação de informação implicada, possam ser concretizados. Até meados da década de 1990, as tecnologias tradicionais de emissão rápida de informações - primeiro com o advento do rádio e, posteriormente, da TV, aliadas ao envio de materiais via correio - impulsionaram essa modalidade de educação, ao permitirem a disseminação dos conteúdos e o acesso por parte de uma substancial massa de alunos em diferentes localidades (Almeida, 2003; Scorsolini-Comin, Gameiro, Inocente, & Matias, 2009; Zuin, 2006). Segundo Freitas, Ghedine e Testa (2006), a EAD apresenta-se como um produto adequado às novas exigências do mercado de trabalho, à medida que exige a qualificação contínua de funcionários como forma de obtenção de vantagem competitiva para as empresas, sobretudo para as de grande porte, cada vez mais atreladas às escalas globais de mercado, com seu pessoal cada vez mais disperso geograficamente. De acordo com Carvalho e Abbad (2006), nos processos de treinamento, desenvolvimento e educação, o uso de recursos multimídia tem crescido de forma significativa, principalmente pela possibilidade de acesso simultâneo a muitas pessoas fisicamente distantes. Diversas organizações, até mesmo as de caráter educacional, perceberam a EAD como meio eficaz de ensino, em que custos e distâncias poderiam ser reduzidos, com manutenção de qualidade na aquisição/apropriação dos conhecimentos nesse novo cenário. Devemos destacar que a EAD vem sendo utilizada, inclusive, para a formação de professores presenciais, notadamente da educação básica (Barreto, 2001, 2002), em programas incentivados pelo Ministério da Educação e Cultura. Um exemplo é o Portal do Professor, que é um espaço para troca de experiências entre professores do ensino fundamental e médio. Trata-se de um ambiente virtual com recursos educacionais, que facilitam e dinamizam o trabalho dos professores com vídeos, fotos, mapas, áudio e textos. É por essa plataforma que também é possível conhecer outros programas de capacitação em níveis municipal, estadual e federal.

Obviamente, com a disseminação de cursos e treinamentos pela EAD, vem sendo colocada a necessidade de qualificação de profissionais capazes não apenas de lidar com as tecnologias de ensino, como também atuar nesse modelo, que possui formas de interação, de entrega de conteúdo e de desenvolvimento do processo educativo bem particulares (Alves & Nova, 2002; Lévy, 1999). Entre os profissionais que estão atuando neste contexto, destaca-se a figura do supervisor de ensino. Embora este cargo seja derivado da estrutura escolar presencial como habilitação em cursos de Pedagogia ou em cursos de pós-graduação em Supervisão Educacional (Freitas, 1999), na EAD ele assume não apenas funções diferentes, mas é concebido como uma figura imprescindível na operacionalização do processo educativo.

Especificamente neste estudo de caso, analisaremos a função do supervisor de ensino no contexto da EAD, descrevendo suas especificidades, não com o intuito estreito de compará-lo com o supervisor educacional do ensino presencial apenas, uma vez que este último já possui uma atuação consagrada em nosso sistema educacional. No caso da EAD, a definição de suas funções ainda se apresenta em aberto, o que coloca a necessidade de se constituir uma literatura sólida na área, com investigações que apontem caminhos e, principalmente, coloquem em discussão os desafios de se pensar a gestão em cursos a distância.

 

Objetivo

Analisar a atuação dos supervisores educacionais de um instituto multidisciplinar de ensino, no contexto da educação a distância, em termos de suas funções, características e especificidades.

 

Método

Trata-se de um estudo de caso, fundamentado no enfoque qualitativo de pesquisa (Peres & Santos, 2005). O caso selecionado situa-se no âmbito de um instituto de ensino multidisciplinar que atua na área de educação a distância (EAD), com sede em uma cidade do interior do Estado de São Paulo. Este instituto foi criado em 2003 por professores vinculados a diferentes instituições de ensino superior e, desde então, desenvolve cursos na modalidade a distância para mais de 5000 alunos em todo o país, notadamente para grandes empresas. O foco de sua atuação está na oferta de cursos de MBA a distância nas áreas de Administração de Organizações, Finanças e Desenvolvimento Sustentável. Também são desenvolvidos cursos presenciais de curta duração para empresas de pequeno e grande porte. Em termos de estrutura organizacional, possui cerca de 70 colaboradores, entre funcionários, consultores e estagiários. Esses profissionais estão divididos em quatro áreas distintas, supervisionadas por quatro diferentes profissionais: (a) Monitoria, Tutoria e Secretaria Acadêmica (atendimento ao aluno, acompanhamento de desempenho de alunos e professores); (b) Produção (criação e revisão de materiais didáticos); (c) Planejamento, Programação e Controle da Produção (controle de prazos, cronogramas e atividades do ambiente virtual); (d) Desenvolvimento (produção de novas tecnologias e plataformas customizadas). Além disso, conta com um corpo docente associado da ordem de 200 professores sem vínculos empregatícios com a instituição.

O estudo de caso se subdivide em dois componentes: um descritivo e outro, empírico.

(a) Estudo descritivo: Nesse componente serão analisados os desenhos de cargo (ou descrições de cargo) dos supervisores de ensino do referido instituto, compreendendo os objetivos de cada cargo, funções específicas e formação necessária. O objetivo dessa análise é compreender de que modo são explicitadas as funções de cada supervisor, descrevendo as especificidades desses cargos no contexto da EAD. A análise central deste estudo é baseada nessas descrições de cargo, que subsidiarão as discussões acerca da formação dos profissionais supervisores de ensino no contexto da EAD.

(b) Estudo empírico: Participaram deste componente 50 estagiários do instituto investigado, todos alunos regularmente matriculados em uma universidade pública do interior do estado de São Paulo. Os estagiários estão separados por áreas dentro do instituto. Assim, participaram 22 estagiários da área de Monitoria e Tutoria, 15 da área de Produção, nove da área de Planejamento, Programação e Controle de Produção e quatro da área de Desenvolvimento. O número de estagiários respondentes por área é proporcional à dimensão de cada área.

Foram utilizados os dados de um questionário de avaliação desenvolvido por pesquisadores do próprio instituto. Este questionário ainda se encontra em fase de desenvolvimento, sendo que ainda não foram realizados os testes de confiabilidade, validade e adequação psicométrica. Neste artigo, reportaremos os dados de um primeiro estudo piloto. A opção pela utilização desta avaliação deve-se ao fato de que será explorada apenas uma das questões, em caráter complementar à avaliação das descrições de cargo. A avaliação foi realizada apenas com estagiários, uma vez que o instrumento foi desenvolvido com o objetivo de conhecer a percepção destes respondentes acerca do trabalho na organização. A escolha dos estagiários e não de funcionários deveu-se ao fato de que se trata de uma organização composta predominantemente por estagiários, o que destaca também o caráter formador do instituto.

Os questionários de autopreenchimento foram aplicados individualmente, sendo a identidade dos participantes preservada. A avaliação abrangeu todos os aspectos do estágio, a saber: tempo de duração, formação do estagiário, conhecimentos adquiridos durante o curso universitário, conhecimentos adquiridos durante o estágio, satisfação com o estágio, avaliação das competências desenvolvidas, dos desafios e possibilidades a partir da realização do mesmo, experiência em EAD, impacto do estágio na formação profissional, entre outros aspectos.

Os dados foram tabulados e analisados com o auxílio do software SPSS para Windows®, versão 13.0. Especificamente neste estudo, abordar-se-á apenas uma questão do instrumento, justamente aquela que faz menção ao trabalho do supervisor de ensino. Uma vez que cada área é composta por um supervisor e sua equipe de estagiários, julgou-se pertinente que estes avaliassem seus superiores. Desse modo, o instrumento em questão foi utilizado como recurso complementar na discussão da atuação desses supervisores, na medida em que a análise principal será realizada a partir de suas descrições de cargo, como destacado no subitem (a) do Método. Os estagiários avaliaram os supervisores de cada área. Cada estagiário avaliou apenas o seu supervisor direto, ou seja, da sua área. Para completar tal instrumento foram necessários entre 15 e 20 minutos. Foi esclarecido que essa atividade seria realizada em caráter voluntário pelos estagiários e que uma eventual recusa em participar do estudo não prejudicaria a continuidade de suas atividades junto ao instituto.

 

Resultados e Discussão

Estudo descritivo

Na experiência relatada no presente estudo, a supervisão de ensino ocorre de modo descentralizado, especificamente em quatro áreas: (a) Monitoria e Tutoria; (b) Produção; (c) Planejamento, Programação e Controle de Produção; (d) Desenvolvimento. A área de Desenvolvimento não será analisada neste trabalho, uma vez que se trata de uma subdivisão recente e cuja supervisão também é responsável pela coordenação das demais áreas. Assim, serão investigadas as três primeiras áreas, já consolidadas na organização. O supervisor de ensino ocupa um papel fundamental na organização dos cursos a distância, na medida em que esses profissionais coordenam atividades operacionais junto aos seus estagiários e equipes, ao mesmo tempo em que participam do processo estratégico de planejamento e organização dos cursos, ou seja, exercem a função de gestores de área, administrando, inclusive, os recursos financeiros destinados à área em cada projeto.

Em linhas gerais, a área de Monitoria e Tutoria é responsável pela secretaria acadêmica dos cursos, respondendo às dúvidas dos alunos por meio eletrônico, realizando o acompanhamento de notas e de desempenhos, controlando os requerimentos e oferecendo suporte tecnológico e metodológico aos alunos.

A área de Produção é responsável pelo desenvolvimento dos materiais didáticos dos cursos, ou seja, apostilas, videoaulas, materiais instrucionais, e também cuida da manutenção do ambiente virtual de aprendizagem (AVA). A área também é responsável pelo controle de qualidade na produção desses materiais, desde a demanda inicial até a entrega e disponibilização aos alunos.

A área de Planejamento, Programação e Controle da Produção é responsável pelo início de cada projeto/curso. Ao receber a proposta de um novo curso, é este setor que planeja a execução em termos das demais áreas envolvidas, cronogramas de implantação, recursos disponíveis, prazos de produção e programação dos materiais nos ambientes virtuais de aprendizagem. Além disso, a área possui a função de controle dos materiais produzidos por outras áreas em termos de prazos e atenção ao planejamento delineado pela equipe de ensino.

Essas três áreas são supervisionadas por três profissionais. Cada área conta com uma equipe própria de estagiários. Para descrever as funções específicas desses profissionais, partiremos dos desenhos de cargo elaborados pela equipe de Gestão de Pessoas do instituto em parceria com os próprios supervisores. Nesse sentido, devemos destacar o trabalho coletivo presente nessa elaboração conjunta, o que evidencia tanto uma abertura para que a função do supervisor possa ser refletida e vista em termos mais amplos, como também o desconhecimento, por parte da área de Gestão de Pessoas, das atribuições específicas do cargo.

A Tabela 1 compila os objetivos desses três cargos de supervisão aqui analisados.

Por essa breve descrição, nota-se que a Supervisão de Monitoria e Tutoria é a única que denota um claro compromisso com a qualidade dos cursos ofertados, sendo que as descrições dos objetivos dos outros dois cargos se concentram na execução de tarefas delegadas às áreas. Devemos pontuar que a qualidade na oferta de serviços educacionais a distância é compreendida, na maioria das vezes, como a satisfação dos alunos em relação aos materiais e ao curso, conforme destacado por Moran (2009) e Mallmann e Catapan (2007). O que podemos perceber é a clara distinção entre essas três funções em termos de seus objetivos, sendo uma concentrada no desenho inicial do curso ou projeto, a outra com foco na operacionalização da proposta (execução) e uma voltada para o atendimento ao aluno, em seu acompanhamento acadêmico e suporte tecnológico e de secretaria ao longo do curso.

A seguir, a Tabela 2, Tabela 3 e Tabela 4 compilam as funções específicas de cada um desses cargos.

Pela análise dessas três descrições de cargo, cada qual elaborada pelo seu respectivo supervisor, juntamente com a área de Gestão de Pessoas, percebe-se a diferença no tratamento dos objetivos e funções de cada cargo, aqui discriminados de acordo com a área. A descrição do cargo de Monitoria e Tutoria se concentra com maior minúcia em todas as atividades desempenhadas pela supervisão de ensino, contemplando até mesmo a descrição de algumas atividades específicas, como a elaboração de manuais. As descrições das outras duas áreas trazem aspectos mais gerais do trabalho do supervisor, não especificando muitas das tarefas realizadas por essas áreas. A construção do desenho de cargo revela a heterogeneidade dessas funções de supervisão, que traduz a diversidade que coexiste com - e constrói, de modo conjunto - a execução dos projetos em EAD.

Assim, devemos destacar que a identidade do supervisor se constrói não apenas a partir de seu trabalho diário e das funções efetivamente executadas, mas também pelo modo como os supervisores registram as suas funções e compreendem a sua atuação dentro do macro-fluxo de ensino do instituto. A compreensão de suas funções a partir da leitura dessas atividades é relevante para delinear as concepções, valores e saberes relacionados à figura de supervisor de ensino, figura que se mostra um pouco distante do que habitualmente se observa nas redes públicas e privadas de ensino regular e presencial, com maior delimitação de funções e também dos desafios envolvidos. No contexto do ensino presencial, as funções dos supervisores estão mais relacionadas à área burocrática, o que requer um bom nível de domínio do conhecimento acerca da legislação educacional vigente, políticas públicas de educação, entre outros (Horta, 2007). Embora desempenhem funções pedagógicas de orientação, por exemplo, privilegia-se a execução de políticas e alinhamento das instituições à legislação. Além disso, é necessário que esses profissionais tenham uma experiência anterior em docência para atuarem como supervisores educacionais nas redes públicas de ensino, uma vez que as atividades de supervisionar e orientar são derivadas da atuação docente (Freitas, 1999; Scheibe & Aguiar, 1999). Neste estudo de caso, podemos observar que as atividades de docência e orientação, mesmo em EAD, não estão presentificadas nas descrições de cargo, nem mesmo na formação específica necessária, como abordaremos na sequência.

A Tabela 5 resume os conjuntos de conhecimentos necessários para cada cargo de supervisão.

Por esta descrição, alguns pontos podem ser elucidados. Nota-se que o domínio de ferramentas de informática é fundamental para o desempenho dessas funções de supervisão. Outro ponto se refere ao domínio de Língua Portuguesa, uma vez que a comunicação prioritária, no contexto da EAD, se faz por meio da linguagem escrita. Nas áreas de supervisor de Produção e de Planejamento e Programação, observa-se que é colocado como um dos pontos necessários ao desempenho da função a experiência acadêmica com publicações científicas, bem como envolvimento anterior com atividades de pesquisa, o que pode ser constatado pelas normas e técnicas na confecção de trabalhos científicos, bem como o domínio de conhecimentos básicos em estatística.

Aqui deve ser pontuado que essas duas áreas (Produção e Planejamento e Controle) lidam não apenas com a produção de materiais didáticos, como também com a elaboração de pesquisas de satisfação junto aos alunos e demais profissionais envolvidos nesses cursos de EAD. Assim, é fundamental que os supervisores adquiram intimidade com o manuseio dessas ferramentas e com a linguagem própria à atividade acadêmica. Embora não apareça no desenho de cargo, devemos destacar que a Supervisão de Monitoria e Tutoria lida diariamente com trabalhos científicos, pois coordena os Trabalhos de Conclusão de Curso (TCC), sendo desejável que esse conhecimento seja incorporado também à prática diária desse profissional.

No que concerne à formação desses profissionais, destaca-se a necessidade de que possuam ensino superior completo. Para a supervisão de Monitoria e Tutoria, essa formação pode ser em qualquer área, pela descrição de cargo. Para a supervisão de Produção e de Planejamento e Programação, delimita-se essa formação para os cursos de Psicologia, Pedagogia, Administração e Letras. Para os três cargos, é desejável que os profissionais possuam pós-graduação em alguma área do conhecimento, notadamente Administração e/ou Educação.

O que pode ser destacado nesse sentido é que, pelas concepções expressas nesse documento, as profissões que estariam mais fortemente relacionadas à supervisão de ensino na área de EAD seriam a de administrador e a de educador. Isso é relevante, uma vez que, no ensino presencial, a formação em Educação (Licenciatura) é um pré-requisito para se ocupar um cargo de supervisão. No contexto de EAD, nesta experiência descrita, a formação em Educação é desejável, embora não seja prioritária. Em contrapartida, o envolvimento do profissional na área de Administração é apresentado no documento com uma relevância semelhante. Isso pode ser fruto da expansão da EAD e de sua incorporação no dia a dia das pessoas, ou seja, a EAD tornou-se uma realidade cada vez mais presente na vida das pessoas e a própria formação acaba se desenvolvendo e se transformando nesse contexto. Outra possibilidade de leitura é a de que a educação esteja cada vez mais sendo vista como um produto, passando por um processo de mercantilização que destaca o lucro, a produtividade e agilidade, e não necessariamente a qualidade dos serviços educacionais prestados (Hill, 2003). A ausência de uma qualificação específica em educação pode ser um indicativo de descompromisso com a formação que se coloca em pauta. Como podemos falar em educação ou em formação qualificada se não conhecemos a área? Apesar de os profissionais possuírem experiência na área educacional, pontuamos que a formação, em nível de graduação e/ou de pós-graduação, pode contribuir para o adensamento dos conhecimentos, para a apropriação de novos recursos e para a produção de práticas que empreguem resultados robustos de pesquisas fortuitas na área de educação, em consonância com o pensamento de Freitas (1999) e Catapan (2001).

Assim, na experiência em apreciação, os supervisores de ensino são gestores, o que demanda sólida formação e/ou conhecimentos avançados em Administração, tanto quanto formação em Educação e áreas correlatas. Independentemente desse aspecto, é dada ênfase à experiência acadêmica e à produção científica, destacados nos três cargos como desejável. Isso coloca a necessidade de que os conhecimentos em gestão e em educação sejam constantemente colocados em diálogo, tendo em vista o campo acadêmico de aplicação interdisciplinar e a formação dos alunos por meio da EAD.

Para finalizar a análise dos desenhos de cargo dos supervisores de ensino, em termos das habilidades requeridas, devemos destacar a boa comunicação, pois esta é a ferramenta básica que orienta um curso na modalidade a distância (Coiçaud, 2001; Maggio, 2001). A boa comunicação deve ocorrer não apenas entre o supervisor e seus pares - ou com seus superiores, mas também com os alunos e professores, bem como com os estagiários e as equipes de execução. Outra característica importante é o trabalho em equipe, na medida em que as três áreas trabalham de modo integrado. Apesar de cada uma possuir suas funções específicas, como abordado anteriormente, devemos atentar para o fato de que o trabalho de cada uma está intimamente relacionado ao bom desempenho de sua área par.

Assim, o correto início do trabalho da área de Planejamento e Programação vai dar subsídios para que a área de Produção desenvolva os recursos e materiais demandados pelo curso, possibilitando que a área de Monitoria e Tutoria estabeleça os devidos contatos com os tutores e também com os alunos dos cursos. Assim, é a integração das áreas e o diálogo permanente entre os supervisores que possibilitam a gestão desses cursos a distância, devidamente orientados pela figura do Coordenador de Ensino e do Gerente de Ensino que, na experiência relatada no presente estudo, atuam mais na área estratégica da EAD.

A prevalência de atividades operacionais e técnicas sobre as de conteúdo na EAD corroboram os apontamentos de Nogueira (2005) sobre como vem se constituído o supervisor educacional no ensino presencial brasileiro. A atuação focada nesses aspectos tem como principal componente a separação entre uma atuação mais reflexiva - com reais possibilidades de ser transformadora - e uma de caráter mais tecnicista, centrada em procedimentos, que não prepara o profissional para uma visão mais global tanto de sua realidade como das implicações de sua intervenção em cada contexto. Desse modo, podemos vislumbrar um processo semelhante ao que ocorre na educação presencial, o que dificulta que esses profissionais se posicionem como "supervisores-educadores" e também se percebam como agentes de transformação social.

Estudo empírico

Esse componente é parte de uma pesquisa que visa a compreender e delinear de que modo os estagiários avaliam a experiência em EAD e sua repercussão para a formação profissional (Scorsolini-Comin, 2009). Um dos aspectos investigados nessa pesquisa se refere à avaliação da figura do supervisor de ensino. Portanto, como o objetivo deste trabalho é descrever e analisar a figura do supervisor educacional no contexto da EAD, utilizaremos em caráter complementar os resultados dessa avaliação realizada pelos estagiários desse instituto multidisciplinar de ensino.

Participaram da pesquisa 50 estagiários que atuaram na instituição de 2005 a 2009. Os estagiários foram divididos em quatro áreas: (a) Monitoria e Tutoria (n = 22); (b) Produção (n = 15); (c) Planejamento, Programação e Controle da Produção (n = 9); (d) Desenvolvimento (n = 4). Devemos destacar que essa última área não foi contemplada na análise dos desenhos de cargo, pois é uma função, na experiência relatada, ocupada cumulativamente com a função de Coordenação de Ensino. Como forma de isolar os possíveis vieses decorrentes dessa situação, optou-se pela descrição das outras três áreas supervisionadas do ensino. Devemos destacar que a porcentagem de estagiários participantes por área foi proporcional à quantidade de estagiários que efetivamente atuavam nessas áreas. Assim, a área de Monitoria e Tutoria concentrou a maior parte de estagiários desse instituto analisado.

No questionário administrado aos participantes, eles deveriam avaliar o desempenho do seu supervisor (supervisor de ensino da área), julgando a supervisão como "Insuficiente", "Regular", "Boa" ou "Excelente". Esses critérios também foram adotados para o restante das perguntas do questionário. Os dados mostram que todas as áreas de ensino receberam boas avaliações em termos da figura dos supervisores. A melhor avaliação foi creditada à área de Monitoria e Tutoria (72% dos estagiários avaliaram a supervisão como "excelente"), seguida das áreas de Produção (60% dos respondentes avaliaram a supervisão como "excelente"), Planejamento e Programação (33%) e Desenvolvimento (25%). Obviamente, como o objetivo deste artigo não é avaliar a percepção dos estagiários acerca de suas experiências profissionais neste instituto, a avaliação do supervisor ficou restrita a uma única pergunta. No entanto, destacamos que essa avaliação é um primeiro passo para futuros estudos e também em outras instituições, a fim de que se possam relacionar experiências e diferentes contextos organizacionais, na busca por uma delimitação da figura do supervisor educacional em EAD. Cabe destacar que a área de Monitoria e Tutoria foi a primeira criada na área de ensino do instituto. Naquela ocasião, essa área era responsável por uma série de atividades que não estavam diretamente relacionados ao monitoramento de alunos e à supervisão dos tutores dos cursos. As demais áreas foram criadas a partir das demandas emergentes da Monitoria e Tutoria e com o avanço dos cursos oferecidos.

Concluindo a análise do componente empírico do estudo, um dos pontos centrais na análise da figura do supervisor na EAD se refere, na experiência aqui descrita, à função formadora do supervisor, uma vez que ele atua diretamente na formação profissional dos estagiários, não apenas delegando funções operacionais típicas de cada área, mas também acompanhando a evolução e desenvolvimento desses futuros profissionais. Isso pode ser visto em paralelo ao que ocorre com o supervisor na educação presencial, em sua função de orientação pedagógica de equipes de professores e também de alunos (Freitas, 1999; Scheibe & Aguiar, 1999). Se pensarmos na comparação com o ensino presencial tradicional, não há a figura do estagiário com esse tipo de vivência - com funções operacionais e estratégicas, ligado diretamente ao supervisor de ensino, uma vez que a estrutura administrativa do ensino regular trabalha essencialmente com profissionais formados e contratados, seja por meio de concurso público, processo seletivo ou terceirização. Assim, poder-se-ia indagar: como esses profissionais da educação tradicional avaliariam os seus supervisores? Obviamente, devemos ter cautela ao estabelecer comparações entre esses modelos, uma vez que eles partem de premissas diferentes e ocorrem dentro de lógicas específicas que nem sempre podem ser transpostas de uma realidade para outra, embora possa (e deva) ocorrer um diálogo entre essas modalidades.

Assim, a EAD defronta-se não apenas com a possibilidade, mas também com a necessidade de que o supervisor de ensino atue na formação e na orientação da equipe de estagiários, promovendo uma reflexão não apenas acerca da prática profissional, mas também sobre a EAD enquanto campo de atuação e de construção de saberes e possibilidades educacionais.

Embora não faça parte do objetivo deste trabalho, destaca-se que os estagiários na área de ensino são provenientes de cursos não necessariamente vinculados à educação, o que reforça a tese de que esse campo é plural e permeável às mais diferentes contribuições, como mencionado por Moran (2009). Assim como se mostra amplo o escopo dos profissionais formados na e pela EAD, é plural a concepção de supervisão educacional nesta modalidade, uma vez que o profissional não apenas deve conhecer adequadamente os aspectos teóricos e práticos de seu trabalho e de seu cargo, mas também ter uma visão sistêmica de sua atuação, quer seja ela diretamente ligada ao ensino ou à formação de profissionais no contexto da EAD.

 

Considerações finais

A figura do supervisor educacional nas redes públicas e particulares de ensino (Chacur, 2008; Horta, 2007) ocupa uma função bem distinta da que é praticada no contexto privado da educação a distância. Obviamente, isso varia de acordo com cada Estado da União e o modo como se organiza o ensino nessas instâncias. Por se tratar também de uma questão de nomenclatura de cargos, devemos ter em mente a importância de se refletir sobre o que é supervisionar o ensino, suas práticas e desenvolvimento.

Que requisitos teóricos e técnicos são necessários para formar um supervisor? Que conhecimentos esse profissional deve dominar? Quais as suas atribuições e de que modo ele pode contribuir para o desenvolvimento de diversas questões educacionais? E quando pensamos no contexto da EAD, campo em que muito menos é produzido e pesquisado a respeito - o que se explica, em parte, pelo fato de ser uma nova modalidade de atuação, embora em franca expansão - qual seria a função do supervisor e quais os pré-requisitos para que ele ocupe esse cargo? Pelos dados discutidos no presente estudo, não há apenas uma resposta a ser dada a esse questionamento.

A função de supervisionar na EAD, pelo que foi apresentado neste estudo de caso, está diretamente atrelada tanto a funções mais estratégicas quanto operacionais, ou seja, o supervisor é aquele que executa trabalhos mais diretamente relacionados aos alunos, como revisão de documentos a que eles têm acesso, além de participar também da tomada de decisões em relação aos diferentes cursos, por exemplo, suas táticas, normas, procedimentos e a própria condução dos projetos.

A diversidade de formação dos supervisores também permite destacar que o cargo requer de seu ocupante experiência na área de gestão, e não necessariamente formação educacional específica, o que consideramos adequado para a possível tomada de decisão, mas, por outro lado, inadequado por não permitir que a gestão seja pautada em princípios educacionais, os quais demandam (ou dependem) de uma formação específica na área. Podemos perceber, portanto, que a função de gestor, na experiência apresentada, acaba se sobrepondo a de educador, o que poderia reforçar uma visão de educação a distância mais alinhada às necessidades do mercado e não aos objetivos educacionais, como abordado por Hill (2003).

Discute-se, nessa vertente, que o supervisor é formado e se forma não apenas com a aquisição de conhecimentos específicos de sua área, mas também atuando na gestão de projetos, no desenvolvimento de modelos educacionais e preservando o foco nas necessidades do aluno em seu processo de aprendizagem (Granito, 2008; Moran, 2009). Aproximando-se do contexto mais educacional e menos empresarial, permite-se que esse profissional não apenas conheça diferentes realidades, mas possa levar a sua realidade e seus conhecimentos para outras pessoas, construindo com elas, no contexto das relações que estabelece, uma forma de ser administrador, educador, profissional, ou seja, um modo de constituir sua subjetividade.

Como apontado na literatura (Scorsolini-Comin et al., 2009; Vieira et al., 2003), esse processo de formação se caracteriza como um fértil campo de investigação no âmbito de um programa de pós-graduação, do qual emergem novas questões a serem investigadas, considerando que nesse campo os estudos devem se desenvolver dentro de princípios éticos, em um horizonte de liberdade e respeito à diversidade, propiciando a aprendizagem e a produção de conhecimentos, os quais realimentam a formação. Criam-se, assim, novos patamares da espiral da aprendizagem das organizações envolvidas e de todos os participantes: docentes, pesquisadores, gestores e demais profissionais (Catapan, 2001; Testa et al., 2001).

É importante que os educadores, administradores e supervisores não pensem em sua atuação apenas como um trabalho voltado para um indivíduo ou uma instituição, como se estes vivessem isolados e não tivessem laços com a realidade social, construindo-a de forma ativa, ao mesmo tempo em que são construídos por ela. Felizmente, avaliar os modelos de gestão em cursos de educação a distância é uma atividade em expansão. A formação de supervisores capazes de administrar e pensar criticamente a educação é um desafio em nossa sociedade (Bohadana & Valle, 2009; Chacur, 2008), mas ao mesmo tempo inaugura um campo aberto para que iniciativas sejam empreendidas com criatividade, embasamento teórico, experiência e, principalmente, com responsabilidade ética (Almeida, 2003; Moran, 2009).

A formação de supervisores educacionais no contexto da EAD, bem como a necessidade desses conhecimentos em cursos de Pedagogia ou de pós-graduação em supervisão ou administração educacional, devem atravessar e direcionar novas pesquisas em torno da gestão do ensino superior. Mais do que abordar essa possibilidade de atuação, é preciso atentar para o modo como a própria formação profissional está sendo dinamizada no atual cenário da sociedade da informação (Gameiro, 2008), levando à criação de novos cursos, novas formas de se relacionar com a aprendizagem e outras possibilidades de intervenção e construção de uma identidade na área educacional. Essa discussão contemporânea não aparece claramente destacada em trabalhos nacionais, como por exemplo os estudos realizados por Nogueira (2005), Freitas (1999) e Scheibe e Aguiar (1999), mas pode e deve ser estimulada e explorada em investigações futuras.

Um desafio que se coloca é delinear um campo mínimo de conhecimentos necessários para a formação de profissionais para poderem atuar na EAD. O que se percebe é que esses profissionais são, em sua maioria, formados pelo modelo presencial, como pouco ou nenhum contato com a EAD, o que os coloca diante da construção de um modo de ser profissional orientado por um paradigma que reclama outros olhares e novas interpretações. É preciso que esses novos profissionais que assumem a função de supervisores de ensino também assumam um compromisso social em suas carreiras, voltando-se para uma intervenção crítica e transformadora de nossas condições de ensino a partir da EAD. Esta gama de conhecimentos e reflexões permite contribuir para a formação de supervisores e gestores comprometidos não com uma visão tecnicista do que é a educação (Nogueira, 2005), mas com uma visão que respeita a diversidade, a pluralidade, a democratização do saber e a melhoria contínua das condições educacionais. Ou seja, uma visão comprometida com alguns dos pilares da contemporaneidade, que tem exigido que se repense e reescreva tais princípios educacionais em nossa sociedade (Moran, 2009).

Extrapolando as concepções de Nogueira (2005), ligadas à educação presencial, acreditamos que os supervisores devem se posicionar, a fim de que possam ser, de fato, agentes de transformação da realidade social vigente, na luta por uma nova política nacional de supervisão educacional e pelo comprometimento com uma concepção de sociedade e de educação que possa transitar por múltiplos campos semânticos e virtuais na sociedade do conhecimento. Retomando Bohadana e Valle (2009), em um estudo em que discutem a quem a EAD se destina, devemos buscar, com esse paradigma educacional, uma ruptura em relação ao estabelecido, embora não se saiba ao certo em relação a quê e em favor de quem. Essa busca suscita a assunção da identidade do novo supervisor educacional, comprometido com esse processo de transformação em curso. Na esteira dessas mudanças, identidades estão em jogo, o que faz desse processo um desafio fascinante.

 

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Recebido: 17/11/2009
1ª Revisão: 07/04/2010
2ª Revisão: 23/08/2010
Aceite Final: 26/08/2010

 

 

Sobre os autores
Fabio Scorsolini-Comin é Professor do Instituto de Educação, Letras, Artes, Ciências Humanas e Sociais da Universidade Federal do Triângulo Mineiro (IELACHS-UFTM). Psicólogo, Mestre e Doutorando em Psicologia pela Universidade de São Paulo. Especialista em Supervisão Educacional e em Administração Escolar.
David Forli Inocente é Mestre em Administração de Organizações pela Universidade de São Paulo. Gerente de Ensino do Instituto de Ensino e Pesquisa em Administração.
Alberto Borges Matias é Professor Titular da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo.
Manoel Antônio dos Santos é Psicólogo, Mestre e Doutor em Psicologia pela Universidade de São Paulo. Docente da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo.
1 Endereço para correspondência: Instituto de Educação, Letras, Artes, Ciências Humanas e Sociais da Universidade Federal do Triângulo Mineiro (IELACHS-UFTM). Av. Getúlio Guaritá, 159, 38025-440, Uberaba-MG, Brasil. Fone: 34 33185944. E-mail: scorsolini@psicologia.uftm.edu.br

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