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Revista Brasileira de Orientação Profissional

versão On-line ISSN 1984-7270

Rev. bras. orientac. prof vol.12 no.1 São Paulo jun. 2011

 

ARTIGO

 

Educação para a Carreira: concepções, desenvolvimento e possibilidades no contexto brasileiro1

 

Career Education: concepts, development and possibilities of the field in the Brazilian context

 

Educación para la Carrera: concepciones, desarrollo y posibilidades en el contexto brasileño

 

 

Izildinha Maria Silva Munhoz2; Lucy Leal Melo-Silva

Universidade de São Paulo, FFCLRP, Ribeirão Preto-SP, Brasil

 

 


RESUMO

A Educação para a Carreira é uma modalidade de orientação de carreira desenvolvida de forma sistemática, em todos os níveis de educação, em muitos países. Este artigo objetiva contribuir para a compreensão desta modalidade de intervenção ao apresentar uma revisão da literatura, visando compreender o contexto de seu desenvolvimento, concepções e modelos, assim como o papel de professores e psicólogos na intervenção. A sistematização da produção do conhecimento sobre Educação para a Carreira poderá contribuir para viabilizar reflexões que possam gerar programas de intervenção no contexto brasileiro, por meio de estratégias curriculares infusivas, aditivas ou mistas. Tais programas poderão auxiliar os jovens a adquirirem competências-chave para um positivo desenvolvimento da carreira e democratizar o acesso à orientação vocacional, atualmente restrita a poucos.

Palavras-chave: educação para a carreira, orientação vocacional, infusão curricular, professores


ABSTRACT

Career Education is a type of career guidance developed systematically in the education context in many countries. This article aimed to contribute to the understanding of this type of intervention providing a review of the literature trying to understand the context of the development, concepts, models of the field, and also the role played by teachers and psychologists in interventions. The systematization of knowledge about Career Education may facilitate discussions that may lead to intervention programs in the Brazilian context, by means of infusive, additive and mixed curricular strategies. Such programs may help young people to acquire the key competences for a positive career development and to democratize access to vocational guidance, currently restricted to a few.

Keywords: career education, vocational guidance, curriculum infusion, teachers


RESUMEN

La Educación para la Carrera es una modalidad de orientación de carrera desarrollada de forma sistemática, en todos los niveles de educación, en muchos países. Este artículo trata de contribuir para la comprensión de esta modalidad de intervención al presentar una revisión de la bibliografía, buscando comprender el contexto de su desarrollo, concepciones y modelos, así como el papel de profesores y psicólogos en la intervención. La sistematización de la producción del conocimiento sobre Educación para la Carrera podrá contribuir para hacer viables reflexiones que puedan generar programas de intervención en el contexto brasileño por medio de estrategias curriculares integradoras (de infusión), aditivas o mixtas. Tales programas podrán auxiliar a los jóvenes a adquirir competencias clave para un positivo desarrollo de la carrera y democratizar el acceso a la orientación vocacional actualmente restricta a pocos.

Palabras clave: educación para la carrera, orientación vocacional, infusión curricular, profesores


 

 

As mudanças sociais, iniciadas no século XX e que continuam a acontecer de forma acelerada no início do século XXI, têm afetado de modo particular as relações entre educação, formação e emprego. O contexto de trabalho na contemporaneidade exige, ainda mais, que os trabalhadores demonstrem um conjunto cada vez maior de competências, envolvendo conhecimentos, habilidades e atitudes para lidar com a carreira de forma eficaz. A aprendizagem ao longo da vida impõe-se de forma inequívoca, assim como as mudanças na carreira, que deixa de ser considerada como um conjunto de postos que a pessoa deveria galgar dentro de uma organização de trabalho, com uma progressão funcional conhecida e hierarquizada, ao longo da vida e, de certa forma, garantida pelas instituições/organizações.

O contexto educacional tem importante papel a desempenhar para ajudar os indivíduos a enfrentarem as novas exigências da sociedade pós-moderna, seja no mundo do trabalho, para atender às novas demandas do mercado, seja para o desempenho dos outros papeis que desempenham ao longo da vida. A escola, como lugar de aprendizado, convivência e formação, apresenta-se como espaço privilegiado para o desenvolvimento de hábitos, atitudes, valores, habilidades e pensamento crítico. E pode contribuir para que jovens e crianças se tornem cidadãos bem (in)formados neste mundo bombardeado continuamente com muitas informações, exigências e apelos ao consumo.

Diante deste quadro de referência, a Educação para a Carreira, modalidade de orientação para a carreira a ser desenvolvida de forma sistemática no contexto escolar, tem sido considerada cada vez mais importante no quadro geral das intervenções de carreira em vários países (Watts & Sultana, 2004). Sua implantação no contexto escolar brasileiro poderá ajudar os jovens a adquirirem competências-chave para um positivo desenvolvimento da carreira e democratizar o acesso à orientação vocacional, atualmente restrita a poucos. Este artigo tem como objetivo contribuir para a compreensão desta modalidade de intervenção, ao: (a) apresentar uma revisão da literatura sobre Educação para a Carreira, visando compreender o contexto de seu desenvolvimento, conceitos e modelos, (b) identificar modelos e estratégias de Educação para a Carreira desenvolvidos em diferentes países, (c) compreender o papel dos professores e dos psicólogos na execução da Educação para a Carreira e (d) refletir sobre as possibilidades de inserção da Educação para a Carreira no contexto educacional brasileiro.

 

Método

Para a revisão da literatura foram consultados os indexadores BIREME, ERIC, INDEX PSI, Ingentaconnect, LILACS, Portal Capes, Portal UNEVOC, Portal MEC, PsycARTICLE, Science Direct e Sibinet, de 1990 a 2009. Foram usados como descritores os termos: career education, vocational guidance, professional guidance, career guidance, professional choice e education and work (também em espanhol e português). Os artigos encontrados (699) foram analisados em seus resumos e filtrados para eliminar duplicidades e restringirem-se àqueles referentes a discussões sobre a teoria e a prática em Educação pra a Carreira (46). A partir das citações e referências dos textos encontrados, novos artigos, livros, teses e dissertações foram consultados, resultando em 64 publicações analisadas para o presente estudo. Os resultados encontrados permitiram delinear os fundamentos da Educação para a Carreira e como tem sido sua implementação em diferentes países, identificando críticas e potencialidades para a realidade brasileira.

Assim sendo, a síntese dos resultados do estudo de revisão foi organizada em três seções. A primeira seção, intitulada: "O movimento de Educação para a Carreira e seus desdobramentos", visa a responder aos objetivos um e dois. A segunda seção: "Educação para Carreira: o papel dos professores e do psicólogo" visa ao terceiro objetivo, e a terceira seção: "A inserção da Educação para a Carreira no contexto educacional brasileiro" consiste em uma tentativa de refletir sobre o quarto objetivo.

 

Resultados

O Movimento de Educação para a Carreira e seus desdobramentos

Segundo Herr (2001), durante o século XX houve um clamor nos Estados Unidos por reformas educacionais que reduzissem a distância entre educação e vida profissional. Tais críticas se estenderam para as práticas de orientação para a carreira, voltadas para as escolhas educacionais e ocupacionais. Esse quadro de insatisfação gerou um movimento no qual se pretendia relacionar educação e trabalho - a Educação para a Carreira (Career Education), iniciado por Sidney Marland Jr. e desenvolvido por Kenneth Hoyt e outros, ambos comissionados na Secretaria de Ensino dos Estados Unidos (USOE) entre 1970 e 1982.

A atenção destes pesquisadores se voltou para a elaboração de um projeto de lei a ser submetido ao congresso americano, para promover uma reforma educativa que tivesse como eixo central o trabalho. Nesse contexto, a Educação para a Carreira foi compreendida como:

Um esforço do sistema educativo e de toda a comunidade dirigido a contribuir para a reforma educativa ajudando as pessoas com atividades na sala de aula, a relacionar educação e trabalho e a adquirir competências gerais para um positivo desenvolvimento da carreira, de forma a permitir a cada um fazer do trabalho, remunerado ou não, uma parte significativa do seu estilo de vida (Hoyt, 2005, p. 24).

Apesar dos esforços em se chegar a uma concepção de Educação para a Carreira, esta definição ainda hoje não é um consenso e sua prática envolve vários tipos de intervenções e em diferentes momentos da vida escolar. Entretanto, Hoyt (2005) considera que esta definição evidencia quatro elementos fundamentais a qualquer concepção de Educação para a Carreira: o conceito ampliado de trabalho, a infusão curricular, o desenvolvimento de hábitos e atitudes de trabalho e o conceito de colaboração.

O conceito de trabalho é abrangente e entendido como o esforço contínuo, consciente, remunerado ou não, dirigido a produzir benefícios socialmente aceitáveis para si mesmo e/ou para os outros (Brown, 2003; National Career Development Association [NCDA], 2008; Niles & Harris-Bowlsbey, 2005). Nesse sentido, constituem trabalho não apenas aquele remunerado, como a profissão, mas também as atividades dirigidas a vários objetivos, em diferentes papeis e contextos ao longo da vida, tais como voluntariado, lazer, trabalho realizado em casa e atividades escolares. Assim, o estudo é considerado trabalho e a sala de aula um lugar de trabalho, onde professores e alunos são trabalhadores. Esta concepção de trabalho e de estudo é um dos principais pilares da Educação para a Carreira.

A infusão curricular refere-se à disseminação transversal nos conteúdos curriculares, em todos os níveis escolares, de questões sobre os valores, conhecimentos e atitudes relevantes ao desenvolvimento vocacional e da carreira. A Educação para a Carreira é considerada por Hoyt (1995, 2005) uma fusão entre o processo de ensino-aprendizagem e o processo de desenvolvimento vocacional. King (2007) sugere que temas como responsabilidade, consciência de carreira, pontualidade, habilidade de ouvir e prestar atenção, saber se avaliar e aprender com os erros devem ser desenvolvidos tanto para a aprendizagem escolar como para o futuro desempenho na profissão. A questão da infusão curricular será discutida posteriormente, mas para o momento basta dizer que ela é tão atraente quanto difícil de executar.

Quanto aos hábitos e atitudes em relação ao trabalho, vários autores defendem, sob bases teóricas ou de pesquisa, que eles começam a se desenvolver na infância (Hartung, Porfeli, & Vondraceck, 2005; Magnuson & Starr, 2000; Rodrígues-Moreno, 2008; Watson & McMahon, 2005). Da mesma forma, considera-se que os contextos nos quais as pessoas convivem, como família e escola, têm influência marcante sobre o desenvolvimento da carreira (Ferreira, Santos, Fonseca, & Haase, 2007; Patton, 2005; Pinto, Taveira, & Fernandes, 2003; Vondracek, 2001; Young & Collin, 2004).

A questão da colaboração entre a escola e a comunidade ocupacional ou profissional é considerada vital por Hoyt (2005), mas o sentido de colaboração é de uma parceria na qual a autoridade, a responsabilidade e a avaliação sejam efetivamente divididas, conjuntas. O envolvimento da comunidade não é apenas para ajudar, mas também assumir responsabilidades no planejamento, treinamento, execução e avaliação. Um Programa de Educação para a Carreira exitoso depende em muito de parcerias bem estabelecidas.

A implantação da Educação para a Carreira, tal como defendida por Hoyt (2005) não obteve o sucesso que seus idealizadores esperavam e o projeto de reforma educativa foi rejeitado em 1982. Entretanto, o movimento plantou as sementes de um modelo que vem sendo adotado por outros países, com diferentes formas de execução, mas sempre com um enfoque desenvolvimentista e educacional.

Organizações internacionais como o UNEVOC (International Project on Technical and Vocational Education) e a OCDE (Organisation for Economic Co-operation and Development) realizaram estudos que ressaltaram a importância da Educação para a Carreira em diversos países da Europa, América do Norte, Austrália e Sudeste Asiático (Conger, 1994; OECD, 2004; UNEVOC, 1997; Watts, 2001; Watts & Sultana, 2004). Segundo estes documentos, a Educação para a Carreira é cada vez mais oferecida "não apenas para ajudar os jovens a fazer as escolhas imediatas que enfrentam, mas também para proporcionar os fundamentos da aprendizagem e do desenvolvimento da carreira ao longo da vida" (Watts & Sultana, 2004, p. 111).

Na publicação da OECD (2004) há um capítulo destinado às práticas de orientação para a carreira voltadas aos jovens nas escolas e destaca que os programas inseridos no currículo, como a Educação para a Carreira, atendem melhor a atual "ênfase na aprendizagem ao longo da vida e na empregabilidade sustentada" (p. 43). O documento apresenta um anexo que descreve como a Educação para a Carreira, dentro do currículo escolar, é desenvolvida em catorze países.

A partir deste documento e de autores de diferentes países, como Herr (2008), Hoyt (1995, 2005) e Wickwire (2005), dos Estados Unidos; de Jenschke (2002), da Alemanha; de Diéguez e González (1995) e Rodrígues-Moreno (2008), da Espanha, e de Watts (2001), do Reino Unido, pode-se observar que os Programas de Educação para a Carreira variam em relação: (a) aos conteúdos que abordam, em função dos objetivos estabelecidos; (b) à estrutura ou forma como são inseridos no currículo; (c) ao nível de ensino a que se destinam e (d) aos métodos e recursos utilizados.

Os conteúdos nos programas de Educação para a Carreira diferem em função dos objetivos propostos e das prioridades em diferentes países. Na Alemanha, desde a década de 70, foi inserido no currículo o tema "Preparação para o Mundo do Trabalho" (Arbeitslehre) que se refere a uma introdução geral sobre o mundo do trabalho e a vida adulta. As metas pedagógicas estão relacionadas ao desenvolvimento para a empregabilidade, estratégia de aprendizagem ao longo da vida e flexibilidade (Jenschke, 2002; OECD, 2004)

Na França, a Educação para a Carreira está amplamente difundida nas escolas primárias e secundárias com objetivos, em geral, cognitivos. Dentre estes estão: (a) a aprendizagem para explorar e entender a função e a organização das empresas e o papel dos trabalhadores; (b) o entendimento dos vínculos entre indivíduos e ocupações e (c) o desenvolvimento de estratégias para buscar informações e tomar decisões (Guichard & Huteau, 2002; Jenschke, 2002).

Na Espanha há obrigatoriedade da oferta de orientação para a carreira em todo o sistema escolar e na educação de adultos com o objetivo de ajudar os alunos a valorizarem o trabalho - remunerado ou não - como uma parte integrante do seu estilo de vida, segundo o modelo proposto por Hoyt (1995, 2005) e adaptado por Rodrígues-Moreno (1995, 2008). No Reino Unido, a Educação para a Carreira tem quatro metas principais: (a) estimular o autoconhecimento; (b) proporcionar o conhecimento das oportunidades educacionais e profissionais; (c) aprender a decidir e (d) aprender a lidar com as transições (Watts, 2001).

Nos Estados Unidos, Hoyt (2005) identificou dez competências básicas com que o movimento de Educação para Carreira deve contribuir para desenvolver: (a) habilidades acadêmicas básicas de matemática e de comunicação oral e escrita; (b) bons hábitos de estudo; (c) o desenvolvimento e a utilização de um conjunto de valores de trabalho; (d) a compreensão do trabalho organizado como fazendo parte de um sistema; (e) o conhecimento de si mesmo e conhecimento das oportunidades educativas e profissionais disponíveis; (f) habilidades para tomar decisões na carreira; (g) competências para procurar, obter e manter um emprego; (h) disponibilidade para utilizar o tempo livre de forma produtiva, através de trabalho não remunerado, incluindo voluntariado e trabalho em casa ou na estrutura familiar; (i) habilidades e atitudes para lidar com preconceitos e estereótipos que atuam como determinantes da completa liberdade de escolha da carreira; e (j) atitudes de humanização do local de trabalho.

Em Portugal, os Serviços de Psicologia e Orientação foram implantados nas escolas a partir da década de 70 no ensino primário e secundário como um programa abrangente de orientação escolar e profissional. Dentre os objetivos estabelecidos para esses serviços destacam-se: (a) apoiar alunos no processo de desenvolvimento da sua identidade pessoal e do seu projeto de vida, (b) planejar e executar atividades de orientação escolar e profissional através de programas e ações de aconselhamento em nível individual e de grupo; (c) colaborar com outros serviços tendo em vista a organização de informação e orientação profissional e (d) desenvolver ações de informação e sensibilização dos pais e da comunidade em geral no que respeita à problemática que as opções escolares e profissionais envolvem (Taveira, 2003).

Quanto à estrutura, Watts (2001) identifica quatro modelos básicos de programas de Educação para a Carreira: (a) modelo extracurricular (extra-curricular model); (b) modelo de disciplina própria (specific enclosed model); (c) modelo integrado a uma disciplina mais geral (extended enclosed model) e (d) infusão/ modelo integrado ao currículo (infusion /integrated model).

No modelo extracurricular a Educação para a Carreira acontece como um curso à parte com atividades diversas como seminários profissionais, visitas a centro de informação profissional, módulos em pequenos cursos projetados para ajudar os estudantes a atingirem objetivos mais imediatos ou pontuais, como tomar decisões educacionais e/ou profissionais. A Educação para a Carreira ainda pode ser inserida no currículo como uma disciplina própria, integrada no horário escolar, num programa sistemático de desenvolvimento profissional com duração superior a um ano, sob a orientação de um professor ou de um orientador profissional. A Educação para a Carreira pode ainda ser parte de uma disciplina mais geral, como educação pessoal, para a saúde e social, ministrado pelo professor da matéria ou ainda por um orientador profissional.

As estratégias infusivas são a pedra angular da Educação para a Carreira, mas também o seu maior desafio (Guichard, 2001; Hoyt & Wickwire, 2001; Jenschke, 2002; OECD, 2004; Pinto et al., 2003; Rodrígues-Moreno, 1995, 2008). Para Guichard e Huteau (2002), a infusão, quando sistematicamente conduzida, tem a "vantagem de se abrir os ensinos à vida, mas comporta igualmente um risco, o de introduzir nos ensinos um utilitarismo excessivo" (p. 292). Segundo Rodrígues-Moreno (2008), nas estratégias infusivas é feita uma planificação transversal nos currículos escolares para facilitar a integração ao mundo do trabalho. Entretanto, para a autora, não é fácil integrar os conceitos vocacionais nos currículos dos distintos países em enfoques educativos, apesar do aumento significativo de bibliografia e programas iniciados por Sidney Marland Júnior e desenvolvidos por Kenneth Hoyt (Hoyt, 2005), na Secretaria de Ensino dos Estados Unidos entre 1970 e 1982.

Königstedt (2008) refere que a integração de objetivos vocacionais no currículo escolar exige que a escola se reorganize enquanto instituição e em relação aos esforços de todos os implicados no processo de formação integral dos alunos, tais como pais, professores, especialistas e comunidade. Para Rodrígues-Moreno (2008) esta é a grande questão: como motivar os professores e demais educadores para a integração da orientação nas atividades convencionais e na vida regular da escola: "Até que ponto estão dispostos a iniciar uma autêntica inovação educativa, com os problemas e esforços coletivos que a mesma comporta?" (p. 37).

Segundo o relatório da OECD (2004), mesmo nos países onde a Educação para a Carreira é obrigatória, a infusão frequentemente implica em rejeição por parte dos professores, que não querem tomar tempo dos assuntos acadêmicos para tratar de questões vocacionais. As experiências na Áustria e na Noruega mostram que o modelo de infusão requer um alto nível de coordenação e apoio para ser efetivo e, além disso, é preciso oferecer aos alunos recursos para que juntem os "pedaços" de informações em um todo que lhes faça sentido, pois alguns alunos necessitam de atendimento individual. Na Noruega a obrigatoriedade foi suspensa para aliviar a carga de trabalho dos professores.

Tais dificuldades, porém, não devem ser impedimentos para que se inclua a infusão em programas de Educação para a Carreira. Ao contrário, os autores defendem que se busquem formas de diminuí-los. Na Alemanha, segundo Jenschke (2002), para realizar a Preparação para o Mundo do Trabalho os professores têm recebido treinamento especial e são auxiliados, em parte, por orientadores profissionais do Instituto Nacional do Trabalho, vinculado ao Ministério do Trabalho.

Nos Estados Unidos, Gysbers e Lapan (2001) elaboraram um programa de orientação abrangente/ compreensivo (comprehensive) no qual além das atividades de infusão existe uma disciplina, opcional, aos alunos que ainda precisarem de mais informações ou apoio, conduzido por um orientador treinado. Nos modelos de tipo abrangente, as competências a serem desenvolvidas referem-se tanto ao domínio vocacional como pessoal (American School Counseling Association [ASCA], 1997; Hache, Redekopp, & Jarvis, 2000, Organization for Economic Co-Operation and Development [OECD], 2005a). A preocupação básica é o planejamento individual do estudante para desenvolver, analisar, avaliar e reavaliar, periodicamente, suas metas e planos educacionais, ocupacionais e pessoais, de forma a ajudá-lo a refletir sobre quem efetivamente ele é capaz de tornar-se.

Desta forma, desenvolver um Programa de Educação para a Carreira, tal como preconizam seus defensores, não significa prescindir de orientadores profissionais, pois sua presença, quando devidamente qualificados, é fundamental para suporte aos professores. Segundo Baptista e Costa (2004), cabe ao psicólogo/orientador vocacional "criar condições para que a Educação para a Carreira se concretize através de um verdadeiro plano de ação que ultrapasse a intervenção em momentos pontuais do desenvolvimento" (p. 179) e, caso seja necessário, atender aos alunos e alunas que precisarem de atenção específica em relação ao seu desenvolvimento vocacional ou pessoal.

Em relação ao nível de ensino em que a Educação para a Carreira deve ocorrer, há uma forte tendência para que se iniciem ainda nos primeiros anos do ensino fundamental, ajudando no planejamento educacional e da carreira, pois os conceitos de "eu" e de trabalho começam a ser estruturados nesta etapa da vida (Watts, 2001). Mas nem sempre é assim que ocorre. Segundo o relatório da OECD (2004) o mais comum é concentrar a Educação para a Carreira nas séries iniciais do ensino médio, com o foco mais na escolha, contraditoriamente às concepções de aprendizagem ao longo da vida e das transições na carreira.

De qualquer forma, a maneira como a Educação para a Carreira é alocada no currículo determina quais estudantes serão envolvidos. Na Alemanha, a Educação para a Carreira é oferecida também na educação superior, em programas pré-vocacionais para grupos de jovens entre 16 e 19 anos, nos cursos para adultos em situação de novas escolhas de carreira e na pós-graduação, como um módulo separado de gerenciamento de carreira em um seminário de habilidades específicas, tais como autoapresentação e elaboração do currículo (Jenschke, 2002).

Os métodos utilizados nos programas de Educação para a Carreira também variam, mas sempre com ênfase nas abordagens pedagógicas em grupos. Dois modelos são os mais utilizados: (a) o cognitivo: que acontece por meio da transmissão de informações pelos professores e (b) experiencial: baseado em situações vivenciais, como dinâmicas de grupo, simulações, contato com profissionais e visitas a instituições, fábricas, empresas ou Centros de Informação Profissional. Cada um produz uma gama diferente de resultados e tem também diferentes implicações para o papel do professor/orientador e para o treinamento requerido para prepará-los para suas tarefas (Jenschke, 2002; Vilhjalmsdottir, 2007; Watts, 2001).

No modelo cognitivo, os recursos mais utilizados são os impressos que propõem a utilização de material informativo sobre os estudos e as profissões, mas existem também iniciativas de se criar materiais para serem desenvolvidos nas escolas, como livros didáticos para apoiar as atividades de Educação para a Carreira, como ocorre em Portugal (Leitão & Paixão, 1998a, 1998b; Pinto, 2003) e nos Estados Unidos (King, 2007).

Outro recurso utilizado é o sistema de elaboração de perfis (profiling) e portfólio (OECD, 2004). A elaboração destes materiais requer que os indivíduos desenvolvam e mantenham os registros em relação ao desempenho acadêmico, planos educacionais e de carreiras, que podem começar nas séries iniciais ou mais tarde. Na Austrália ajudam os alunos a identificarem as competências relacionadas ao trabalho que estão desenvolvendo através dos vários conteúdos escolares. Watts (2001) cita experiências, na Inglaterra e na França, com um professor/tutor acompanhando o aluno, durante os anos escolares, no seu desenvolvimento de carreira. Periodicamente, ambos fazem anotações em uma pasta sobre suas realizações e a definição de novos objetivos a curto e longo prazos.

No modelo vivencial, que pode ser oferecido integrado ao cognitivo, podem ser empregados recursos de informática, como o Real Game (http://www.realgame.org/) e o Blueprint for Life Work Designs (http://www.blueprint4life.ca/) ou em módulos de atividades vivenciais, como no método ADVP - Ativação do Desenvolvimento Vocacional e Pessoal (Pelletier, Bujold, & Noiseux, 1979).

Nos países europeus é comum e recomendado que os programas de Educação para a Carreira estabeleçam pontes com o mundo do trabalho através da organização de experiências para ajudar os alunos a desenvolverem as próprias perspectivas acerca do mundo do trabalho e de suas preferências em termos profissionais (OECD, 2004, 2005b). As iniciativas envolvem experiências no próprio local de trabalho (work experience), observação de trabalhadores (work shadowing), visitas ao local de trabalho, simulações (work simulation) - como mini-empresas ou ainda um esquema de tutoria (mentoring) de adultos para jovens em processo de escolha e/ou planejamento da carreira. Estas experiências são consideradas fundamentais nos programas de Educação para a Carreira e sua efetivação está intimamente ligada ao desenvolvimento de parcerias com a comunidade laboral.

Outro exemplo de "boas práticas" em Educação para a Carreira citadas em OECD (2004, 2005b) é a interação entre a escola e Centros de Orientação para a Carreira e/ou Informação Profissional e/ou Empregos. São exemplos conhecidos no Brasil, os CIEEs (Centros de Integração Escola-Empresa) e em Portugal a Cidade das Profissões. Estes centros, por estarem mais vinculados ao mercado de trabalho, podem oferecer um apoio expressivo aos programas desenvolvidos na Educação para a Carreira. Além desses locais há necessidade de se avaliarem os sites de informação profissional para que também possam ser usados como ferramentas auxiliares.

A respeito da avaliação dos programas de Educação para a Carreira, Huteau (2001) aponta que não existem muitas evidências empíricas, mas os resultados se mostram positivos. Os dados indicam que as intervenções educacionais influenciam na representação das trajetórias possíveis e dos empregos, além de que os estudantes participantes se mostram mais bem informados. Por outro lado, os resultados desejados no desenvolvimento de programas de Educação para a Carreira estão relacionados tanto a habilidades gerais do processo ensino-aprendizagem, como ao desenvolvimento vocacional.

Os trabalhos de Gomes e Taveira (2001) e Hughes e Karp (2004) relatam pesquisas que evidenciaram uma estreita ligação entre desenvolvimento vocacional e desempenho acadêmico. Königstedt (2008) apresenta outros dados que correlacionam sucesso acadêmico e prevenção de problemas de transição e abandono escolar, principalmente em modelos do tipo compreensivo (Gysbers & Lapan, 2001). Tais dados "suportam a importância do desenvolvimento de programas compreensivos destinados ao desenvolvimento vocacional dos alunos e, como consequência, do seu desenvolvimento e sucesso acadêmico" (Königstedt, 2008, p. 34).

Em relação às críticas aos programas de Educação para a Carreira, Patton (2005) considera que, em geral, os programas precisam ser reformulados em relação a três questões fundamentais: (a) enfatizar as construções subjetivas que os indivíduos fazem de si mesmo, das pessoas e dos ambientes profissionais e não apenas o enfoque no pareamento indivíduo-profissão, como base em tipologias que não são universais; (b) não ter como foco as necessidades do mercado de trabalho apenas, direcionando os alunos em função destas necessidades e (c) a despeito de toda a literatura, os programas ainda retratam a tradicional tomada de decisão da carreira, considerada como um processo linear, racional, onde dados derivados objetivamente são usados como base e pouca atenção é dada à complexidade do indivíduo e às influências dos sistemas. Irving (2010) também critica a falta de coerência entre as proposições básicas da Educação para a Carreira em seus aspectos teóricos e nas proposições para a prática.

Segundo o autor supracitado, em geral, a Educação para a Carreira, pelo seu enfoque educacional, tem se pautado pelos princípios liberalistas, do individualismo, da igualdade de oportunidades e da liberdade de escolha, acrescidos das concepções neoliberalistas que atribuem ao indivíduo a responsabilidade pela administração da sua carreira e sucesso (ou fracasso). Neste contexto, a falta de sucesso é então atribuída à falta de tenacidade e às características pessoais.

Para Irving (2010) não se tem discutido nos programas de Educação para a Carreira questões sobre: (a) a discussão e a reflexão crítica sobre o mercado de trabalho e as práticas de emprego; (b) a consideração da carreira como uma construção sociopolítica em constante evolução; (c) a exploração de possibilidade de carreiras alternativas e (d) o potencial para os desafios e mudanças da situação. Para lidar com essas questões, o autor defende a Educação para a Carreira como "uma perspectiva que envolva uma dimensão política na preparação de estudantes para um ativo e crítico engajamento democrático em todos os aspectos da vida" (p. 59).

Portanto, educar para a carreira é muito mais que preparar para o trabalho ou para o mercado. Em um país pleno de desigualdades sociais, culturais e econômicas como o Brasil, essas considerações são extremamente relevantes e devem servir de alerta e de direcionamentos em relação à implantação da Educação para a Carreira.

Educação para Carreira: o papel dos professores e do psicólogo

No modelo de Hoyt, de estratégias infusivas, os professores desempenham um papel fundamental, pois "são eles que, por meio do currículo e de uma forma intencional e sistemática, têm de oferecer informações e atividades que promovam o desenvolvimento da carreira dos seus alunos" (Gomes & Taveira, 2001, p. 33). Entretanto, como observado anteriormente, as estratégias infusivas apresentam muitas dificuldades (Jenschke, 2002; OECD, 2004; Watts, 2001; Watts & Sultana, 2004).

Um estudo sobre a influência dos professores no desenvolvimento vocacional dos estudantes foi realizado em Portugal, por Pinto et al. (2003). Por meio dos dados obtidos com alunos e professores, observaram que os professores influenciam no desenvolvimento vocacional dos alunos, de três modos: (a) influência geral do professor nos alunos, em termos pessoais, científicos e pedagógicos; (b) influência em relação à ação mais específica do professor no âmbito da sua disciplina e (c) através da cooperação do professor com outros agentes educativos e da comunidade.

Também em Portugal, Gomes e Taveira (2001) encontraram que uma porcentagem significativa de professores reconhece a importância de lidar com o tema, mas não se sentem capacitados para trabalhar objetivos de Educação para a Carreira e evidenciam a necessidade de aprofundar os conhecimentos sobre desenvolvimento vocacional e mundo do trabalho. Para Mouta e Nascimento (2008), a percepção desta realidade pelos professores é fonte de angústia e ansiedade frente à falta de oportunidade (tempo ou conteúdo) e do sentimento de incapacidade, para tratar com o aluno de questões vocacionais.

As autoras consideram que os professores, qualquer que seja o seu conteúdo curricular, exercem uma influência importante na elaboração dos projetos vocacionais de seus alunos, pois são figuras importantes na formação e preparação dos jovens para a vida de trabalho. Desta forma, faz sentido "depositar nos professores algumas expectativas no que se refere à facilitação do processo através do qual o projeto social e pessoal da educação se repercute no projeto vocacional e de vida dos seus alunos" (Mouta & Nascimento, 2008, p. 89).

Como estratégia para ajudar os professores, as referidas autoras idealizaram um projeto de consultoria sobre questões vocacionais, realizado por um psicólogo com o objetivo de ajudar os professores a compreenderem como o desenvolvimento vocacional ocorre, e assim promover melhorias na qualidade de suas atividades educativas para poder responder às necessidades vocacionais. Para as autoras, a presença de um psicólogo é fundamental, pois o processo de consultoria visa proporcionar:

(...) uma oportunidade para que cada um, de acordo com o seu projeto profissional, explore a abrangência e os limites da sua intervenção nesta área e defina claramente aquele que será o seu compromisso com a promoção do desenvolvimento vocacional dos seus alunos no contexto das suas aulas e do seu papel docente, conferindo intencionalidade a algumas das ações que já realiza, nomeadamente em termos de exploração direta, como por exemplo: visitas de estudo (Mouta & Nascimento, 2008, p. 90).

A inserção de atividades de Educação para a Carreira nas escolas passa necessariamente pelos professores a despeito das estratégias em que elas forem estruturadas, pois os professores desempenham um papel importante no desenvolvimento pessoal e vocacional de seus alunos (Munhoz, 2010; Pinto et al., 2003; Silva, 2010). Por estarem próximos dos alunos, ao longo da educação básica, tornam-se referências, não só como modelos de profissionais, mas também como fonte de apoio para as dúvidas e preocupações vocacionais dos alunos. Nesse sentido, Pinto et al. (2003) sugerem incluir no currículo de formação dos professores "módulos relativos à natureza do processo vocacional ao longo da vida, à relação de complementaridade entre os processos de desenvolvimento acadêmico e de desenvolvimento vocacional e à influência do professor na promoção do desenvolvimento vocacional dos estudantes" (p. 54).

A inserção da Educação para a Carreira no contexto educacional brasileiro

Na realidade brasileira, o tema da Educação para a Carreira é relativamente novo, sendo o termo Career Education às vezes traduzido como Educação Profissional (Jenschke, 2002; Lisboa, 2002), o que pode levar a confusões com a modalidade de educação e preparação para uma atividade ocupacional ou formação profissionalizante, denominada oficialmente Educação Profissional (Ministério da Educação e do Desporto, 1999). O que é relativamente conhecido no Brasil, enquanto prática e teoria, denomina-se orientação vocacional e/ou orientação profissional, corpo de conhecimentos que, na escola brasileira, seguiu os passos dos modelos desenvolvidos internacionalmente, denominados Vocational Counseling, com as intervenções sendo realizadas por pedagogos e, principalmente psicólogos, com pouca ou nenhuma participação dos professores nesse processo.

Por outro lado, têm aumentado os estudos sobre a importância da escola nos projetos vocacionais dos alunos. A necessidade de que a orientação vocacional/orientação profissional aconteça nas escolas é reconhecida no cenário brasileiro (Melo-Silva, Lassance, & Soares, 2004; Munhoz, 2010; Silva, 2003, 2010; Uvaldo & Silva, 2001, 2009; Valore, 2003).

Valore (2002) apresenta contribuições importantes para a realização de programas de orientação profissional em grupo na escola pública para alunos do ensino médio. A autora destaca a importância de se pensar na orientação profissional como um campo de atuação interdisciplinar, que envolva psicólogos, pedagogos e outros profissionais, como sociólogos, economistas e administradores. Segundo Valore (2003) a escola, com seu objetivo teórico de preparar para a vida, precisa fazer uma articulação das competências que se propõe a desenvolver, com o universo de trabalho.

A análise de algumas propostas de implantação de programas de orientação vocacional no contexto educacional evidenciou a necessidade e a dificuldade de se trabalhar com os professores nas escolas (Affonso & Sposito, 2002; Pereira, 2000). Lucchiari (1993) relata dificuldades para conseguir o apoio e o interesse dos professores, que afirmam não dispor de tempo para integrar-se a mais uma atividade, além da sobrecarga que existe. Tais afirmações são confirmadas no estudo de Munhoz (2010), assim como o fato de que os professores reconhecem a importância da inserção da temática vocacional no currículo dos alunos e referem ao fato de que tais temas são comumente discutidos em sala de aula de modo não intencional e/ou sistemático.

A necessidade de apoio aos professores é reforçada por Pereira (2000) ao descrever um programa de orientação profissional desde a alfabetização até o ensino médio, com atividades integradas a disciplinas e trabalhadas pelos professores, na educação infantil e ensino fundamental, e pelo psicólogo no ensino médio. O papel da escola como um dos agentes na construção da escolha profissional dos alunos e a influência dos professores nesse processo são as conclusões do estudo de Affonso e Sposito (2002), Carvalho e Marinho-Araujo (2010), Munhoz (2010) e Lucchiari (1993). Desta forma, a Educação para a Carreira representa uma alternativa importante para responder aos anseios por programas de orientação para a carreira mais abrangentes e adequados o contexto escolar brasileiro, que deve envolver tanto professores como psicólogos e/ou orientadores profissionais.

 

Considerações finais

O campo da psicologia vocacional está inserido na articulação entre o mundo do trabalho e o mundo da Educação e tem como preocupação predominante compreender como se dão as escolhas dos indivíduos em relação aos diferentes tipos de trabalho existentes. O objetivo básico destes estudos é ajudar os indivíduos na tomada de decisão de carreira e/ou de uma ocupação que deverá lhes oferecer condições de sobreviver e desenvolver-se, como pessoa e como cidadão. É um campo sujeito a muitas críticas, pois se sabe que a "distribuição" dos postos de trabalho na sociedade não é, essencialmente, uma escolha do indivíduo, mas é multideterminada pela estrutura social, ou seja, por fatores dependentes do capital social, econômico e cultural, além dos fatores individuais.

A esse cenário precisa ser acrescido o atual contexto de trabalho do mundo pós-moderno - complexo, imprevisível, exigente e determinante de várias mudanças nos modos de ser e de viver das pessoas, inclusive em suas carreiras. Diante do exposto e sendo a Educação para a Carreira uma proposta de orientação para a carreira inserida no currículo escolar, que busca relacionar educação, trabalho e carreira, percebe-se não somente a sua importância, como também a sua complexidade.

No contexto brasileiro, segundo a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Brasileira (Lei No. 9.394, 1996), a educação escolar deve estar vinculada ao mundo do trabalho e à prática social; assim, a orientação para o trabalho deve fazer parte dos conteúdos da educação básica e fornecer os meios para os alunos progredirem no trabalho em estudos posteriores. Entretanto, a orientação vocacional no Brasil ainda está muito restrita às práticas clínicas, com procedimentos voltados para a escolha profissional e privilegiando as classes mais abastadas.

A importância de debater este tema no Brasil é que a Educação para a Carreira se apresenta como um modelo de intervenção adequado ao contexto atual da sociedade pós-moderna, tecnológica e globalizada e contempla, com seu enfoque educativo, a possibilidade de abranger um número expressivo de crianças e jovens, atualmente desprovidos de intervenções que ajudem a articular educação e trabalho, fazer escolhas mais conscientes e se prepararem para ter empregos e empregabilidade. Em seus trabalhos, Hoyt (1995, 2005) sempre defendeu a ideia de que os conteúdos escolares deveriam ter como eixo central o trabalho. Não é esta a posição das autoras deste artigo.

O que se concebe, para o contexto brasileiro, é que o trabalho seja considerado um tema transversal ao currículo desde as séries iniciais do ensino fundamental - tal como Ética, Saúde, Meio Ambiente, Pluralidade Cultural e a Orientação Sexual. Por outro lado, que se amplie/efetive sua importância no ensino médio, para além das escolhas ocupacionais/profissionais. O modelo que se defende para o contexto escolar brasileiro é de um programa que, de preferência, insira os conceitos relativos ao desenvolvimento vocacional no currículo, sob a supervisão de um orientador especializado, com a colaboração de um grupo de apoiadores, como professores, pais e outras pessoas da comunidade.

Desta forma, pretende-se contribuir para a preparação dos jovens para um engajamento democrático, ativo e crítico em todos os aspectos da sua vida pessoal, social e profissional. Mas é preciso ter em mente que, além do crescimento pessoal, é preciso lutar pela construção de uma sociedade mais justa e inclusiva.

 

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Recebido: 28/12/2010
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ª Revisão: 22/03/2011
Aceite final: 06/04/2011

 

 

Sobre as autoras
Izildinha Maria Silva Munhoz é Psicóloga e Pedagoga. Doutora em Psicologia pelo Programa de Pós-Graduação em Psicologia da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo.
Lucy Leal Melo-Silva é Professora Doutora do Departamento de Psicologia da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo, editora da Revista Brasileira de Orientação Profissional, bolsista de Produtividade em Pesquisa do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).
1 Estudo baseado no recorte do levantamento bibliográfico realizado para a elaboração da Tese de Doutorado da primeira autora, orientada pela segunda, junto ao Programa de Pós-Graduação em Psicologia da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras (FFCLRP) da Universidade de São Paulo.
2 Endereço para correspondência: Rua Bento Ferreira, 486, apto. 801, 38060-240, Uberaba-MG, Brasil. E-mail: nimunhoz@terra.com.br

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