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Revista Brasileira de Orientação Profissional

versión impresa ISSN 1679-3390versión On-line ISSN 1984-7270

Rev. bras. orientac. prof vol.17 no.1 Florianópolis jun. 2016

 

ARTIGOS ORIGINAIS

 

COnciliação trabalho/família em organizações de excelência

 

Work-family balance in organizations of excellence

 

Conciliación entre trabajo y familia en las organizaciones de excelencia

 

 

Patrícia Moura e SáI; Femida HamidII

IUniversidade de Coimbra/Universidade do Minho, Coimbra/Braga, Portugal
IIGalp Energia, Lisboa, Portugal

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

O presente trabalho identifica as práticas de conciliação trabalho/família adotadas por organizações de excelência e analisa o potencial papel impulsionador da Qualidade Total, enquanto filosofia de gestão que valoriza o envolvimento dos colaboradores. O estudo baseia-se num inquérito por questionário aplicado a uma amostra de organizações distinguidas como as "melhores para trabalhar" em Portugal. Os resultados mostram que, mesmo neste nicho, algumas medidas de conciliação são ainda pouco utilizadas, nomeadamente aquelas que implicam maiores recursos financeiros. Embora as organizações reconheçam a importância da conciliação, poderão estar a desvalorizar o impacto de algumas disfunções organizacionais que a sua ausência provoca. A implementação de referenciais da Qualidade, em especial das normas ISO, parece estar moderadamente associada com níveis mais elevados de conciliação.

Palavras-chave: Condições de trabalho, Família, Gestão de qualidade total, Qualidade de vida no trabalho


ABSTRACT

The current study identifies the work/family balance (WFB) practices adopted by organizations committed to excellence and analyses the role of Total Quality Management as a potential driver, given the importance it gives to people involvement. The study is based on a questionnaire survey administered to a sample of organizations distinguished as "best for work" in Portugal. Findings show that, even among this group, some measures of WFB are still rare, in particular those that involve greater financial resources. Although the organizations recognize the importance of WFB, they undervalue the impact of some organizational dysfunctions caused by high levels of work/ family conflict. The implementation of quality frameworks, in particular ISO standards, seems to be moderately associated with higher levels of WFB.

Keywords: Working conditions, Family, Total quality management, Quality of life at work


RESUMEN

En el presente trabajo se identifican las prácticas de conciliación entre trabajo y familia adoptadas por organizaciones de excelencia y se analiza el papel facilitador de la Calidad Total, como filosofía de gestión que valora la implicación de los colaboradores. El estudio se basa en un cuestionario aplicado a una muestra de organizaciones distinguidas como "mejores para trabajar" en Portugal. Los resultados muestran que, inclusive en este segmento de organizaciones, algunas medidas de conciliación aún son poco utilizadas, en particular aquellas que exigen un mayor volumen de recursos financieros. Aunque las organizaciones reconocen la importancia de la conciliación, pueden estar desconsiderando el impacto de algunas disfunciones organizacionales que su ausencia provoca. La utilización de referencias de calidad, en particular las normas ISO, parece estar moderadamente asociada a niveles de conciliación más elevados.

Palabras clave: Condiciones de trabajo, familia, gestión de la calidad total, calidad de vida en el trabajo


 

 

A sustentabilidade das organizações que operam numa economia globalizada exige a compatibilização entre o controle de custos e a satisfação das necessidades, necessariamente distintas, de um conjunto alargado de stakeholders. De entre estes, os trabalhadores representam um grupo da máxima importância.

As mudanças demográficas em muitos países desenvolvidos, em particular da Europa, criaram uma sociedade mais envelhecida e com uma proporção crescente de famílias não tradicionais (Costa, 2012). Note-se que, de acordo com Holden (2010), as famílias tradicionais compreendem tendencialmente as situações em que os menores são educados simultaneamente pelos dois progenitores, pelo que os casos de monoparentalidade, avós como pais, homoparentalidade e famílias de acolhimento representam exemplos típicos de famílias não tradicionais. O mundo do trabalho também mudou significativamente, especialmente ao longo das últimas três décadas, em que a participação das mulheres no mercado de trabalho aumentou substancialmente entre os países industrializados da OCDE (Gornick, Heron, & Eisenbrey, 2007). Também em Portugal, a participação feminina no mercado de trabalho reforçou-se, atingindo os 60% no ano 2000, ao mesmo tempo que a proporção de casais com filhos que trabalhavam a tempo inteiro se situava nos 67% (Guerreiro, Lourenço, & Pereira, 2006).

Consciente das dificuldades geradas por este cenário, a União Europeia lançou na década de noventa e nos primeiros anos do novo século diretivas que visam a criação de ambientes de trabalho "amigos das famílias", com o fomento de práticas como a flexibilização dos horários de trabalho, a assistência familiar e a proteção ao emprego. Algumas destas práticas parecem hoje estar em causa em muitos países em função do modo como os governos têm respondido às crises económica e financeira, apostando no abaixamento dos custos de trabalho e na redução do Estado Social. Os trabalhadores dos países desenvolvidos enfrentam, neste novo contexto, pressões acrescidas para dar apoio financeiro e emocional aos seus familiares mais vulneráveis, o que torna as questões de conciliação trabalho/família particularmente acutilantes.

Num estudo recente, Costa (2012) enfatiza a importância de olhar para os desafios da conciliação entre o trabalho e a família num horizonte que extravasa as tradicionais preocupações das famílias com menores a cargo, uma vez que se identificam hoje como muito relevantes as dificuldades das famílias com dependentes idosos ou deficientes a cargo. Acresce que a baixa taxa de fecundidade,rondando em Portugal, segundo dados do Instituto Nacional de Estatística (2011), os 1,37 filhos por mulher, exige que se pense em estratégias para lidar com o problema. Existindo obviamente um conjunto de fatores na sua génese, não pode ser negada a importância de programas que facilitem a conciliação de responsabilidades profissionais e familiares.

O conceito de "organização amiga da família" tem vindo a ser introduzido na literatura. Segundo Marshall e Barnett (1994), uma organização amiga da família auxilia os seus trabalhadores a superar as pressões de conciliar a vida profissional e familiar, oferecendo-lhes um conjunto de soluções para além das estabelecidas por lei. Chinchilla e Moragas (2009) sustentam que algumas organizações superam mesmo esta perspetiva tornando-se "familiarmente responsáveis". O conceito de empresas familiarmente responsáveis encerra em si a ideia de que as empresas devem promover práticas que permitam que cada funcionário cumpra plenamente com os seus deveres pessoais e sociais, tanto na vida profissional como na vida familiar (Dulk & Peper, 2007, pp. 51-70, citado por Costa, 2012). Nestas, as famílias são entendidas como verdadeiros stakeholders.

No atual contexto econômico e financeiro, oferecer aos trabalhadores melhores oportunidades para lidar com o conflito trabalho/família pode ser uma estratégia eficaz de melhorar o moral e a satisfação, na ausência de possibilidades de aumentar as remunerações. A compatibilização com equilíbrio das exigências da vida profissional e familiar é um antecedente importante da satisfação com o trabalho e do empenhamento (Berg, Kallenberg, & Applebaum, 2003). Acresce ainda que a implementação de práticas de conciliação pode ter um elevado retorno por via da melhoria de reputação e imagem aos olhos de clientes e da sociedade.

Não existem muitos estudos que reportem a utilização dos mecanismos de conciliação trabalho/família previstos e, quando existem, geralmente correspondem a estudos de caso ou a confinam-se a pequenas amostras. Os estudos realizados tendem a mostrar que a implementação de muitas das práticas de conciliação não é generalizada e que as organizações públicas e as grandes empresas estão tipicamente na vanguarda (Dex & Smith, 2002). Adicionalmente, alguns trabalhos chamam a atenção para os baixos níveis de utilização das medidas existentes por parte dos trabalhadores elegíveis (Saltzstein, Ting, & Saltzstein, 2001), facto que levanta inevitáveis dúvidas quanto à forma como os mecanismos são implementados e divulgados.

A presente investigação tem fundamentalmente dois objetivos: (a) identificar os principais mecanismos adotados pelas organizações que foram recentemente distinguidas em Portugal como "melhores empresas para trabalhar" para reduzir as tensões trabalho/família; e (b) analisar a influência que a Gestão da Qualidade pode ter na promoção de tais práticas.

Ao analisar a relação entre a Gestão da Qualidade e a adoção de práticas amigas da família, o estudo contribui para a literatura existente, na medida em queé escassa a investigação que analisa o impacto de práticas de Gestão da Qualidade sobre a motivação, a satisfação e o compro-missodos trabalhadores (Liu & Liu, 2015) e virtualmente inexistentes os trabalhos que estudam especificamente as consequências da Gestão da Qualidade na conciliação trabalho/família.

Numa investigação recente conduzida em Portugal, Teixeira e Nascimento (2011) caracterizaram as implicações subjacentes às medidas de conciliação trabalho/ família adotadas por cinco empresas. O presente estudo tem a vantagem de alargar consideravelmente a amostra utilizada e expandir também o quadro de análise ao considerar o papel da Qualidade Total na adoção de medidas que visam reduzir o conflito entre as responsabilidades profissionais e familiares.

Com base no trabalho empírico realizado é possível fornecer às organizações algumas indicações sobre possíveis medidas de conciliação a implementar, sensibilizando-as para os benefícios que delas decorrem, e, indiretamente, chamar a atenção para a necessidade das distinções de "melhor empresa para trabalhar" contemplarem de forma mais clara a avaliação das práticas de conciliação.

A situação portuguesa: enquadramento legal

A proibição da discriminação e o reconhecimento dos direitos especiais aos trabalhadores com responsabilidades familiares estão patentes em documentos internacionais, como a Convenção Europeia dos Direitos Humanos, a Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia ou as Convenções da Organização Internacional do Trabalho. Na Europa, foi essencialmente a partir da década de setenta que se iniciou a luta pelo reconhecimento de direitos como a proteção da maternidade, licenças pagas, proteção legal contra o despedimento, assistência à família, entre outros, os quais ficaram solidamente consagrados quando a Carta Comunitária dos Direitos Fundamentais foi revista de acordo com os princípios do Tratado de Lisboa (União Europeia, 2010).

A Constituição da República Portuguesa consagra no artigo 59° n° 1b) o direito dos trabalhadores "à organização do trabalho em condições socialmente dignificantes, de forma a facultar a realização pessoal e a permitir a conciliação da atividade profissional com a vida familiar". O Código de Trabalho (aprovado pela Lei n°. 7/2009 de 12 de Fevereiro e, mais recentemente, alterado pela Lei n°. 120/2015, no que se refere aos direitos de maternidade e paternidade) define medidas em termos de salários, diferentes tipos de contratos, organização dos tempos de trabalho, férias, processos de contratação, despedimentos, proteção da parentalidade e assistência à família.

As modalidades mais comuns de promoção da conciliação entre vida profissional e vida familiar incluem (Guerreiro et al., 2006): criação de serviços de acolhimento de crianças, criação de serviços de prestação de cuidados a idosos, licenças para pais e mães trabalhadores/ as, incentivo à maior participação do pai na vida familiar, flexibilização da organização do trabalho.

Vale a pena referir que algumas medidas de conciliação são obrigatórias por lei. Tal é nomeadamente o caso das licenças de maternidade e paternidade. De acordo com a Lei n° 7/2009, de 12 de Fevereiro, os trabalhadores têm direito a licença em situação de risco durante a gravidez, interrupção da gravidez, licença parental, licença parental complementar, adoção, dispensa da trabalhadora grávida, puérpera ou lactante por motivos de proteção da sua saúde. A legislação contempla também a dispensa para consultas pré-natal, avaliação para adoção, amamentação ou aleitação. Além disso, a proteção da parentalidade atribui direito a faltas para assistência a filho ou a neto, licença para assistência a filho com deficiência ou doença crónica. A última alteração, publicada na Lei n.° 120/2015 estabelece que o gozo da licença pelo nascimento de um filho (ou pela adoção) "pode ser usufruído em simultâneo pelos progenitores entre os 120 e os 150 dias", ao mesmo tempo que define que é "obrigatório o gozo pelo pai de uma licença parental de 15 dias úteis, seguidos ou interpolados, nos 30 dias seguintes ao nascimento do filho, cinco dos quais gozados de modo consecutivo imediatamente a seguir a este".

Entre o leque de medidas possíveis para a flexibilização do trabalho encontram-se (Guerreiro et al., 2006): a redução efetiva das horas de trabalho de modo a que a relação entre vida profissional e vida familiar seja mais equilibrada, o ajustamento e flexibilização do tempo de trabalho negociando o mínimo de horas de trabalho/ano ou instituindo bancos de horas, a compactação das horas de trabalho semanal em moldes que permitam o aumento dos dias livres para descanso e para a vida familiar e a adoção de modalidades de teletrabalho. A Lei n.° 120/2015 veio consagrar especificamente que "o trabalhador com um filho até 3 anos tem direito a exercer a atividade em regime de teletrabalho, quando este seja compatível com a atividade desempenhada e a entidade patronal disponha de recursos e meios para o efeito".

Alterações introduzidas no Código de Trabalho na sequência do programa de assistência internacional a que o país esteve sujeito, que incluíram o aumento dos horários de trabalho, a redução dos dias feriado ou a flexibilização dos vínculos laborais, levantam bastantes preocupações. Parte destas alterações foram revertidas pelo XXI Governo Constitucional, que entretanto entrou em funções. Ao mesmo tempo, é ainda evidente o défice de infraestruturas de apoio à família, como sejam serviços de acolhimento e prestação de cuidados a crianças - em particular creches para crianças com idade inferior a 2 anos - serviços de apoio a idosos dependentes e os chamados serviços de proximidade (Guerreiro et al., 2006).

Assim, pode-se genericamente afirmar que em Portugal, nos anos mais recentes, a uma maior flexibilidade na organização do tempo se juntaram níveis acrescidos de incerteza nas relações de emprego. Os efeitos combinados destas transformações sobre a conciliação trabalho/ família são ainda difíceis de estimar.

Perspetivas sobre a conciliação trabalho/família e a responsabilidade social das empresas

A respeito do conflito trabalho/família, existem, segundo Edwards e Rothbard (2000), várias teorias, inseridas em três grandes visões: a da complementaridade, a da compensação e a da instrumentalidade. Uma das teorias mais interessantes é a da spillover (ou da reciprocidade), segundo a qual o que corre bem (ou mal) numa das esferas influencia claramente a outra. A ideia de conflito decorre, em boa medida, da hipótese de escassez dos recursos (Greenhaus, Allen, & Spector, 2006). Contudo, a ela se opõe a designada hipótese expansionista, a qual assume que o desempenho de múltiplos papéis poderá gerar uma rede de ganhos significativos, dado que, mesmo que os indivíduos gastem energia e tempo, poderão usufruir de ganhos psicológicos, monetários ou outros (Marks, 1977 e Sieber, 1974, citados por Pimenta, 2011).

Como Grawitch, Gottschalk e Munz (2006) notam, o equilíbrio trabalho/família é uma das cinco categorias de práticas adotadas pelos "ambientes de trabalho saudáveis" juntamente com o desenvolvimento dos trabalhadores, a saúde e segurança, o reconhecimento e o envolvimento dos funcionários. Os "ambientes de trabalho saudáveis" são entendidos como essenciais para atrair e reter os melhores trabalhadores, melhorar as relações empregador/ empregado e elevar o moral dos funcionários (Grawitch et al., 2006; Saltzstein et al., 2001). A aposta no desenvolvimento destes ambientes de trabalho é também legitimada pela teoria dos recursos, que sustenta que as vantagens competitivas fundamentais resultam de combinações de recursos (como é o casos das politicas de conciliação trabalho/família) que são dificilmente imitáveis (Perry-Smith, & Blum, 2000).

Segundo Appelbaum, Bailey, Berg e Kalleberg (2005, citado por Costa, 2012) existem dois tipos de políticas de conciliação trabalho/família: as políticas que permitem a criação de serviços de apoio familiar e as políticas que permitem aos funcionáriosum maior controlo sobre o tempo de trabalho e maior flexibilidade em termos de horários. De acordo com Dex e Smith (2002), as iniciativas de conciliação podem ser agrupadas em cinco categorias principais: 1. gestão das horas de trabalho (job sharing, part-time, e horário flexível). 2. licenças (parentais, sabáticas, etc.), 3. teletrabalho ou trabalho a partir de casa, 4. assistência financeira (abonos, subsídios de maternidade), e 5. serviços de apoio a dependentes (crianças ou idosos). Uma vez que nenhuma destas modalidades é intrinsecamente superior às outras, destinando-se à satisfação de necessidades potencialmente distintas, é recomendável que as empresas adotem combinações destas (Perry-Smith, & Blum, 2000).

Uma corrente da literatura (ex. William, 1994 e Pfeffer, 1994, citados por Grawitch, 2006; Perry-Smith & Blum, 2000; Osterman, 1995) sugere que a eficácia de diferentes práticas de conciliação depende de diversos fatores, tais como o seu alinhamento com a estratégia da organização, a estrutura e a natureza do trabalho. Há, por outro lado, que reconhecer que existem restrições à implementação de certas medidas em diversas empresas. Tal é o caso, por exemplo, da flexibilização dos tempos de trabalho, que, como sublinhado por Costa (2012), está condicionada à natureza do trabalho, às necessidades do negócio, e à disponibilidade da tecnologia.

Genericamente, as preocupações com a redução do conflito trabalho/família enquadram-se na perspetiva de Responsabilidade Social Empresarial (RSE) assente na teoria dos stakeholders (Freeman, 1994; Jones, 1995), a qual implica que a organização tenha em conta os interesses das várias partes interessadas na definição das suas atividades.

Rever e discutir o conceito de RSE está fora do âmbito do presente artigo, pelo que se apresenta apenas umadas definições possíveis com o objetivo de identificar uma potencial fundamentação para a adoção de práticasde conciliação trabalho/família. O Livro Verde, "Promover um Quadro Europeu para a Responsabilidade Social" (2001), lançado pela Comissão Europeia, define responsabilidade social como uma prática voluntária que permite contribuir para uma sociedade mais justa e equilibrada. Neste sentido, é necessário ultrapassar aquilo que a legislação define nesta matéria. As práticas de conciliação entre o trabalho e a família, enquanto integradas no conceito de responsabilidade social, devem assentar numa base voluntária, estimulando o desenvolvimento do negócio, bem como o bem-estar dos colaboradores.

O elo entre a Qualidade e a conciliação trabalho/família

Embora existam muitas definições de Gestão pela Qualidade Total (GQT), existe um considerável consenso no que se refere à identificação dos seus princípios fundamentais, os quais são enunciados na norma ISO 9000:2015 (APCER, 2015): foco no cliente, liderança, comprometimento das pessoas, abordagem por processos, melhoria, tomada de decisão baseada em evidências e gestão de relacionamentos.

Alguns argumentos sustentam a ligação entre GQT e RSE. De facto, todos os modelos da Qualidade contemplam critérios de avaliação organizacional que refletem os impactos económicos, sociais e ambientais das atividades das organizações. O surgimento das normas ISO 26000 (IS0, 2010) mostra claramente que as preocupações com a responsabilidade social são hoje parte da agenda da Qualidade. A implementação destas normas estabelece objetivos e metas claras, exigindo que todos estejam cientes das práticas de responsabilidade social adotadas pela organização e obrigando-a a medir e auditar os resultados alcançados. Com base nos princípios propostos nas normas ISO 26000, muitos países desenvolveram referenciais nacionais para a certificação dos sistemas de RSE implementados pelas organizações. Em Portugal, tal é o caso da norma NP 4469-1 (CRIS, 2012). Para além destas, também as normas SA 8000 atestam o compromisso das organizações com os valores éticos (CRIS, 2012).

Acresce que tanto a GQT como a RSE requerem um forte empenhamento das lideranças e uma cultura organizacional que as promovam. Rosenthal e Masarech (2003) destacam que as organizações de elevado desempenho têm por norma uma cultura organizacional baseada em valores como: o foco no cliente, o respeito pelas pessoas (funcionários, clientes e parceiros), integridade, transparência, trabalho em equipa, iniciativa e paixão pelo trabalho. As preocupações com a RSE são, assim, parte integrante dos valores das organizações excelentes.

A GQT abarca um conjunto de princípios de gestão que, na sua globalidade, se relacionam com uma nova cultura organizacional na qual o envolvimento dos trabalhadores (através do trabalho em equipa, da valorização das ideias de melhoria, do aumento da autonomia e do feedback) é essencial. No entanto, como Liu e Liu (2012) destacam, o efeito das práticas de Gestão da Qualidade na vida dos trabalhadores é um tópico ainda pouco estudado. Em linha com o sugerido por Osterman (1995) é expectável que as organizações que procuram implementar sistemas de elevado desempenho, incorporando o envolvimento dos funcionários e as políticas de Qualidade, estejam mais propensas a adotar programas de conciliação.

O presente estudo tem como objetivos: (a) conhecer as práticas de conciliação trabalho/família implementadas em organizações de excelência; e (b) perceber até que ponto a adoção de referenciais da Qualidade contribui para a implementação de tais práticas. Face aos argumentos levantados na literatura, propõe-se o modelo de análise sumariado na Figura 1.

 

 

Sugere-se, portanto, que a implementação da Qualidade promove a adoção de práticas de responsabilidade social. Por seu turno, estar orientada para a Qualidade e para a responsabilidade social gera na organização um compromisso com a qualidade de vida dos trabalhadores e com o tratamento justo e equitativo. Este compromisso deverá ter um retorno em termos de melhoria do desempenho e de uma redução de disfunções organizacionais (como o absentismo, falta de pontualidade, stress, baixas médicas e erros).

No âmbito do modelo de análise, as dimensões diretamente estudadas são:

1. O nível de adoção de um conjunto pré-estabelecido de práticas de conciliação, tendo em conta se eram ou não aplicadas e qual a proporção de trabalhadores que delas podiam beneficiar;

2. A perceção relativa às disfunções organizacionais existentes (avaliada numa escala de Likert de cinco pontos);

3. O nível de compromisso da organização com a Qualidade, avaliado com base na implementação das normas ISO 9000. Embora esta seja uma simplificação óbvia, é importante lembrar que, como referido anteriormente, as normas ISO assentam explicitamente num conjunto de princípios base de Qualidade Total.

 

Método

Participantes

Tendo em conta o objetivo de investigar as práticas de conciliação trabalho/família nas designadas 'organizações de excelência', analisando, em especial, o impacto do compromisso com a Qualidade Total, a amostra foi constituída por empresas que receberam em 2011 a distinção de 'melhores empresas para trabalhar', vulgarmente atribuída por editoras bem conhecidas (Exame, Human Resources Portugal, ISCTE Business School e Jornal Económico, Revista Human, Revista Pessoal).

Algumas empresas aparecem em mais do que um ranking, pelo que foi necessário evitar redundâncias. Assim, a amostra foi composta por 130 organizações, as quais terão todas sido distinguidas com pelo menos um galardão. Após a aplicação do instrumento de pesquisa obtiveram-se 45 respostas, a que corresponde uma taxa de 35%. Destas, 11 tiveram de ser eliminadas, dada a elevada proporção de informação em falta. Assim, a análise de dados que se segue é baseada em 34 respostas.

A amostra participante no estudo é maioritariamente constituída por empresas de média dimensão (empregando entre 50 e 250 trabalhadores). Adicionalmente, a maioria das organizações representadas no estudo são de serviços, muitos deles classificados como "serviços profissionais". A indústria "tradicional" tem um peso de apenas 18%, enquanto as organizações que operam na área das tecnologias da informação correspondem a 30% da amostra. Esta elevada proporção é facilmente explicada se atendermos a que empresas neste setor são internacionalmente sistematicamente destacadas como "as melhores para trabalhar".

Observando o perfil dos trabalhadores das organizações (veja-se a Tabela 1), é possível notar que as habilitações são genericamente elevadas e que dominam os colaboradores jovens (com menos de 40 anos).

Esta presença forte de áreas de atividade fortemente inovadoras e com uma força de trabalho altamente qualificada fornece um contexto teoricamente favorável à implementação da Gestão da Qualidade e da conciliação entre a vida profissional e pessoal.

Instrumento

Para responder ao objetivo estabelecido, foi desenhado e aplicado um inquérito por questionário, o qual foi remetido aos diretores de Recursos Humanos de um conjunto de empresas a operar em Portugal e que foram recentemente distinguidas como 'melhores empresas para trabalhar'. A aplicação de um questionário autoadminis-trado permitiu cobrir de uma forma sistematizada uma diversidade de tópicos e obter uma vasta quantidade de informação tipicamente dispersa, adequando-se a uma contabilização e comparabilidade do fenómeno em estudo.

Na identificação das escalas e indicadores a utilizar foram revistos instrumentos existentes com objetivos de certa forma semelhantes, tais como o Índice de Empresas Familiarmente Responsáveis (Deloitte & AESE, 2010) e o Barómetro de Responsabilidade Social das Organizações e Qualidade (Seabra, Rolo, & Vieira, 2007). O questionário incluiu 36 questões (algumas de resposta fechada e outras aberta, conforme o que se pretendia apurar com cada pergunta) agrupadas em 6 secções: 1. características das organizações (dimensão, setor, etc.); 2. características da força de trabalho (qualificação, idade, género); 3. per-ceções quanto ao desempenho da organização; 4. políticas e práticas implementadas (quanto à conciliação trabalho/ família e aos Sistemas da Qualidade); 5. opinião acerca da relevância dos tópicos em apreço e perspetivas quanto ao futuro; e 6. perfil dos inquiridos.

Na secção (4) estão incluídos os seguintes aspetos:

1. Medidas de conciliação trabalho/família implementadas e grau em que estão disponíveis para todos os trabalhadores ("questão exemplo" - assinale relativamente à prática 'horário laboral flexível' a que melhor descreve a situação da sua empresa: a) não existe; b) alguns trabalhadores podem beneficiar; c) a maioria dos trabalhadores pode beneficiar; d) todos os trabalhadores podem beneficiar; e) não aplicável neste setor de atividade):

2. Barreiras à adoção de medidas de conciliação ("questão exemplo" - indique as duas principais razões pelas quais a sua organização não implementa mais medidas de conciliação trabalho-família (pergunta aberta));

3. Disfunções organizacionais sentidas("questão exemplo" - "Na minha organização o stress é considerado uma disfunção organizacional muito grave: a) discordo totalmente; b) discordo; c) nem discordo, nem concordo; d) concordo; e) concordo plenamente);

4. Normas da Qualidade usadas e certificação;

5. Ações de responsabilidade social;

6. Prémios e distinções alcançadas.

Procedimentos de Coleta de Dados

Com o intuito de avaliar o instrumento de pesquisa e de o aprimorar, realizou-se um pré-teste do questionário. Nesse âmbito, foram aplicados cinco questionários a especialistas ouresponsáveis da área de recursos humanos de empresas não pertencentes à amostra do estudo. Desse processo, resultaram alguns refinamentos. O questionário foi acompanhado de uma carta de apresentação, a qual justificava a relevância do estudo e assegurava o carácter anónimo do questionário, enfatizando que apenas se iriam reportar resultados agregados.

A versão final do questionário foi enviada a 130 organizações e remetida ao responsável pela Gestão de Recursos Humanos (GRH). A recolha de dados teve lugar entre junho e agosto de 2012. O questionário foi enviado por correio eletrônico e podia ser respondido online. Para o efeito, utilizou-se o software Survey Monkey. Antecedendo o envio do link do questionário, contactou-se telefonicamente todas as empresas pertencentes à amostra. Este procedimento visouo contacto direto com o responsável da GRH, clarificando o assunto e solicitando a colaboração através da indicação do seu correio eletrónico direto.

Três semanas após o envio do link foi expedido um lembrete eletrónico às organizações que ainda não tinham respondido ao questionário. Nas semanas seguintes, foram feitos novos contatos telefônicos no sentido de aumentar a taxa de resposta, a qual se fixou nos 32%.

Procedimentos de Análise

A análise quantitativa efetuada teve por finalidade a mensuração das variáveis escolhidas, procurando, fundamentalmente reportar frequência de incidências e correlações estatísticas.A análise dos dados obtidos na aplicação do questionário, baseada na elaboração de tabelas e gráficos, apoiou-se fundamentalmente no Microsoft Office - Excel, tendo-se pontualmente recorrido ao SPSS (versão 20). Utilizaram-se para a análise dos resultados, essencialmente matrizes condensadas de dados em folhas de EXCEL, efetuando as respetivas análises com o auxílio da estatística descritiva. Pontualmente, foram aplicados testes não paramétricos para comparação das características de subgrupos da amostra. A opção pelos testes não paramétricos decorre dos seus menores requisitos no que respeita às características da distribuição dos dados (Pereira, 2008, p. 166).

 

Apresentação e discussão dos resultados

O panorama das organizações inquiridas no que respeita à implementação da Qualidade revela que 25 das 34 organizações participantes exibem pelo menos um tipo de certificação (vinte delas adotam a norma ISO 9001:2008). Assim, 59% das organizações premiadas como "melhores empresas para trabalhar" tem o seu Sistema de Gestão da Qualidade certificado de acordo com a norma ISO 9001, sendo esta proporção particularmente elevada entre as grandes empresas (quase 90%). Já no que se refere aos sistemas de responsabilidade social, apenas duas das organizações (6%) têm um certificado NP 4469-1. Na leitura deste baixo número, dever-se-á ter em conta que o referencial é ainda recente (foi publicado pela primeira vez em 2008) e que muitas das empresas participantes afirmam ter intenções de o adotar num futuro próximo.

Talvez mais surpreendente seja o facto da esmagadora maioria das organizações identificadas como sendo melhores locais de trabalho reconheça que a adoção de práticas de conciliação trabalho/família esteja numa fase embrionária (56%) ou não faça mesmo parte da agenda (6%). Consequentemente, só para 38% dos respondentes as práticas de conciliação têm já um considerável nível de maturidade.

O questionário listava um conjunto de práticas de conciliação e pedia que os inquiridos indicassem se tais práticas estavam implementadas nas organizações e em que extensão. Como se observa na Tabela 2, e em linha com estudos anteriores (Deloitte & AESE, 2010) horários flexíveis e autorizações para ausentar-se do posto de trabalho por emergências familiares sem aviso prévio são as modalidades de conciliação mais comuns. O trabalho a tempo parcial é uma das modalidades mais adotadas (dois terços das organizações inquiridas oferecem-na). A melhoria dos esquemas de trabalho em tempo parcial pode ser uma alternativa importante para que os funcionários possam, por um período longo ou curto, dedicar mais tempo à família em condições de paridade, com uma perda salarial que não deve ser mais do que proporcional, podendo, com alguma facilidade, passar de um regime a outro.

Contrariamente, iniciativas mais informais (como a organização de atividades desportivas ou formações para a gestão de tempo, por exemplo) ou que requerem investimentos consideráveis (como a disponibilização de creches) são medidas pouco praticadas pelas organizações estudadas. Efetivamente, apenas 9% das organizações têm estruturas próprias de apoio às crianças ou atribuem aos seus trabalhadores outros tipos de apoio à infância, como subsídios para pagar creches ou a contratação de serviços para a prestação de cuidados para os filhos dos seus colaboradores. Talvez mais surpreendente seja o facto de apenas cerca de metade das entidades concederem aos funcionários a possibilidade de estenderem as suas licenças parentais para além do estipulado por lei.

Apesar de o nível médio de implementação das medidas se situar em torno dos 60%, o que não deixa de ser um resultado bastante positivo, deve ser salientado que implementação e uso efetivo são dois conceitos diferentes.

Efetivamente, é reconhecido pela literatura (e.g. Padgett, Gjerde, Hughes, & Born, 2005) que os trabalhadores só utilizam de facto as medidas de conciliação trabalho/família existentes quando a organização fomenta uma cultura de suporte à sua utilização.

A Tabela 3 sintetiza as barreiras enunciadas pelas organizações para a não implementação de mais medidas de conciliação trabalho/família. Como seria expectável, constrangimentos financeiros foi o motivo evocado por mais de metade das organizações que responderam à questão. Ao olhar para as questões financeiras associadas à adoção das medidas de conciliação, as empresas estarão provavelmente, em linha com o sugerido por Lobel (1999, citado por Costa, 2012), a ignorar ou desvalorizar os custos com absentismo, rotatividade, desmotivação e perda do potencial humano que o stress e o conflito familiar geram nos trabalhadores. Para 38% das organizações entrevistadas, os obstáculos relacionam-se com a "Natureza do Negócio".

O inquérito aplicado procurou igualmente conhecer a perceção das organizações quanto às disfunções potencialmente geradas pela tensão subjacente à gestão da relação trabalho/família. Estas incluem: o absentismo, a falta de pontualidade, o work-alcoholism, o stress e a fadiga. Tal como evidenciado na Tabela 4, todas estas consequências são reconhecidas como muito gravosas pelas organizações participantes no estudo, com particular destaque para a fadiga.

Para complementar esta análise, foi avaliada a correlação existente entre o número de medidas de conciliação implementadas na organização e as disfunções sentidas. O resultado do coeficiente de Pearson (r = -0,088) indica uma relação negativa, como se esperava, mas fraca. Algumas pesquisas anteriores (e.g. Leite, 2006) sugerem uma associação negativa forte entre as políticas de conciliação e as disfunções organizacionais, que não foi possível evidenciar no presente estudo.

Por fim, com o objetivo de analisar a relação entre a adoção de medidas de conciliação e a implementação de referenciais da Qualidade (normas ISO em particular), construiu-se a Tabela 5. Dada a especial relevância das normas mais ligadas à gestão de Recursos Humanos, procurou-se avaliar se nas organizações que as utilizam o nível de implementação de medidas de conciliação era mais elevado. Considerou-se também interessante analisar as organizações pelo número de prémios de receberam, distinguindo as que só receberam um prémio e as que receberam mais do que um. Note-se que, como explicado anteriormente, para constarem da amostra todas as organizações terão sido distinguidas com pelo menos um galardão.

Como se pode observar, nem sempre à implementação de referenciais da Qualidade parece corresponder uma maior adoção de medidas de conciliação trabalho/família. De facto, se nos casosda possibilidade de prolongamento das licenças de paternidade ou de assistência a um familiar, as empresas certificadas apresentam uma taxa de adoção superior (64% e 80%, respetivamente, face a 33% e 67% nas empresas não certificadas), outras situações existem (veja-se, por exemplo a flexibilização de horários) em que a situação é inversa. Para avaliar estatisticamente as diferenças nos níveis de adoção entre os dois grupos (certificadas versus não certificadas) aplicou-se o teste Qui-Quadrado. Devido ao tamanho reduzido da amostra não foi possível encontrar diferenças estatisticamente significativas.Vale a pena notar ainda que são poucas as organizações certificadas pelas normas - NP 4469-1, OHSAS 18001, SA 8000, Investors in People, NP 4457 e NP 4427 pelo que os resultados têm de ser interpretados com especial cuidado. Ainda assim, os resultados sugerem que algumas das organizações que utilizam estas normas mais ligadas à Gestão de Recursos Humanos e à Responsabilidade Social Interna não implementam medidas de conciliação trabalho/família de forma consolidada.

 

Considerações Finais

A importância da implementação de medidas de conciliação entre as esferas da vida profissional e pessoal está com frequência presente nos discursos de dirigentes políticos, especialmente entre os países mais desenvolvidos, onde os problemas da baixa natalidade e do envelhecimento são mais prementes. O presente artigo analisa intencionalmente uma amostra tendencialmente favorável à implementação de "medidas amigáveis da família", constituída por organizações que foram distinguidas nos últimos anos como "as melhores para trabalhar" em Portugal. Paralelamente, pretendeu-se avaliar a importância da Qualidade como um potencial indutor da adoção destas medidas. Neste sentido, a investigação apoiou-se num inquérito por questionário administrado a um conjunto de 130 organizações reconhecidas como "excelentes" das quais se obteve 34 respostas válidas.

Pela dimensão da amostra utilizada e, em especial, pelas características assumidamente distintivas da mesma, a extrapolação dos resultados obtidos para o universo das organizações que operam em Portugal deve ser encarada com particular cuidado. Os resultados do estudo indicam que as organizações não adotam extensivamente as medidas identificadas como importantes na conciliação trabalho/família, ainda que os níveis de implementação de diversas medidas, acima dos 60% em vários casos, reflitam claramente o facto de estarmos perante organizações sensibilizadas para a temática e especialmente bem sucedidas no que se refere à implementação de práticas de Gestão de Recursos Humanos.

Por outro lado, ainda que existam alguns indícios de uma associação entre a implementação de referenciais da Qualidade e a maior propensão para adotar medidas de conciliação, especialmente no que se refere às licenças, não foi possível encontrar diferenças estatisticamente significativas entre o grupo das empresas e certificadas e o grupo de empresas que não implementaram estes referenciais da Qualidade. Para além da dimensão da amostra, para estes resultados poderá estar a contribuir o facto de estarmos perante organizações que, independentemente da implementação de referenciais da Qualidade, estão num patamar elevado de desenvolvimento de práticas de GRH (como os galardões recebidos comprovam), pelo que a implementação de normas per si pode não ser um facto tão decisivo.

O trabalho desenvolvido contribui não só para colmatar a falta de estudos empíricos que avaliem a implementação de mecanismos de conciliação trabalho/família com base em amostras de alguma dimensão, como mostra o interesse de incluir a adoção destas praticas conciliatórias nas auditorias/avaliações da Qualidade, mormente daquelas que conduzam à atribuição de prémios de Excelência. Efetivamente, a análise dos princípios da Qualidade Total remete claramente para uma maior atenção à responsabilidade social interna. O conhecimento da relação entre práticas de Qualidade Total e de conciliação trabalho/família, para que a presente investigação contribui, poderá vir a sensibilizar as organizações para os benefícios de colocar as necessidades dos trabalhadores no centro das preocupações.

No futuro, para melhor investigar o impacto diferenciador da Qualidade poder-se-á comparar a adoção das medidas de conciliação trabalho/família nas organizações "excelentes" e naquelas que não obtiveram qualquer distinção/reconhecimento. Adicionalmente, será interessante captar as perceções dos funcionários quanto às medidas de conciliação existentes e quanto à postura de responsabilidade social interna das organizações. Por fim, é de sublinhar que a disponibilização de medidas de conciliação por si só não basta, sendo necessário dar sinais claros de que a organização não discrimina de alguma forma os colaboradores que delas usufruam.

 

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Endereço para correspondência:
Patrícia Moura e Sá
Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra
Avenida Dias da Silva, 165, 3004-512
Coimbra, Portugal
E-mail: pmourasa@fe.uc.pt

Recebido 16/02/2016
1a Revisão 15/07/2016
Aceite Final 22/09/2016

 

 

Sobre as autoras
Patrícia Moura e Sá é Professora Auxiliar na Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra e Investigadora do Centro de Investigação em Ciências Políticas da Universidade do Minho. As suas principais áreas de investigação são a Medição da Performance Organizacional, a Qualidade em Serviços Públicos e a relação entre a Qualidade e a Inovação.
Femida Hamid é Mestre em Gestão pela Universidade de Coimbra e Analista Financeira no Departamento de Engenharia e Gestão de Projetos (DEGP) da Galp Energia, S.A.

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