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Revista Brasileira de Orientação Profissional

On-line version ISSN 1984-7270

Rev. bras. orientac. prof vol.19 no.2 Florianópolis July/Dec. 2018

http://dx.doi.org/1026707/1984-7270/2019v19n2p177 

ARTIGO

 

Avaliação da adaptabilidade de carreira em estudantes de pós-graduação Stricto Sensu

 

Career adaptability assessment in graduate students

 

Evaluación de la adaptabilidad de carrera en estudiantes de postgrado

 

 

Leonardo de Oliveira Barros; Thaline da Cunha Moreira; Gustavo Henrique Martins; Rodolfo Augusto Matteo Ambiel

Universidade São Francisco, Campinas-SP, Brasil

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

O presente estudo teve por objetivo verificar os níveis de adaptabilidade de carreira de estudantes de pós-graduação stricto sensu em função de variáveis sociodemográficas e acadêmicas. A amostra foi composta por 645 estudantes, sendo a maioria do sexo feminino (72,9%), com idades entre 21 e 56 anos. Foi aplicado um questionário desenvolvido para esta pesquisa que buscou levantar informações pessoais e acadêmicas e, a Escala de Adaptabilidade de Carreira (Career Adapt-Abilities Scale - CAAS). Os resultados mostraram que os estudantes que se disseram mais satisfeitos em estarem cursando uma pós-graduação também apresentaram maiores pontuações nas dimensões da adaptabilidade de carreira, o que pode indicar que eles tendem a lidarem melhor com as possíveis transições de carreira.

Palavras-chave: Ensino superior, avaliação psicológica, orientação profissional


ABSTRACT

The present study aimed to verify the levels of career adaptability of graduate students in function of sociodemographic and academic variables. The sample consisted of 645 students, majority female (72.9%), aged between 21 and 56 years. A questionnaire developed for this research was administered that sought to collect personal and academic information and the Career Adapt-Abilities Scale (CAAS). The results showed that students who said they were more satisfied to be in a graduate course also presented higher scores on the dimensions of career adaptability, which may indicate that they tend to cope better with possible career transitions.

Keywords: Higher education, psychological assessment, career counseling


RESUMEN

El presente estúdio tuvo por objetivo verificar los niveles de adaptabilidad de carrera de estudiantes de postgrado en función de variables sociodemográficas y académicas. La muestra fue compuesta por 645 estudiantes, siendo la mayoría del sexo femenino (72,9%), con edades entre 21 y 56 años. Se aplicó un cuestionario desarrollado para esta investigación que buscó levantar informaciones personales y académicas y, la Escala de Adaptabilidad de Carrera (Career Adapt-Abilities Scale - CAAS). Los resultados mostraron que los estudiantes que se dijeron más satisfechos en estar cursando un postgrado también presentaron mayores puntuaciones en las dimensiones de la adaptabilidad de carrera, lo que puede indicar que tienden a lidiar mejor con las posibles transiciones de carrera.

Palabras clave: Enseñanza superior, evaluación psicológica, orientación profesional


 

 

O número de discentes matriculados em programas de pós-graduação stricto sensu vem aumentando ano após ano. De acordo com dados levantados no Portal GeoCapes, em 2015, último ano analisado pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), havia no Brasil 120.050 mestrandos e 102.207 doutorandos matriculados em programas de pós-graduação (CAPES, 2017). Esses dados indicam que os estudantes universitários e os que já possuem formação superior estão apostando cada vez mais na pós-graduação como uma formação importante para alcançar aquilo que desejam para as suas carreiras. Sendo assim, torna-se relevante a investigação de quais recursos do indivíduo melhor contribuem para esse momento de transição da trajetória profissional dos pós-graduandos.

Santos, Perrone e Dias (2015) realizaram uma revisão de literatura, com o objetivo de identificar fatores influenciadores na adaptação de estudantes de pós-graduação stricto sensu, obtendo um total de 15 artigos internacionais publicados entre os anos de 2004 e 2014. As autoras identificaram que a relação do estudante com o orientador, assim como a ambientação com as demandas e normas do programa de pós-graduação e a segurança financeira são fatores importantes para que o estudante tenha uma melhor adaptação à pós-graduação. Entretanto, foi visto também que novas pesquisas mais aprofundadas sobre a temática, em especial para o contexto brasileiro, ainda são necessárias.

Ainda sobre pesquisas com estudantes de pós-graduação stricto sensu, Silva e Bardagi (2015) realizaram uma revisão de estudos brasileiros sobre essa população, publicados entre os anos de 1995 e 2015, e encontraram 35 produções científicas. Os resultados indicaram que houve equilíbrio entre delineamentos quantitativos e qualitativos. A maior parte dos artigos foi da área da Saúde, bem como a maioria teve o foco nos processos de ensino e aprendizagem na pós-graduação. Esse artigo de revisão indicou a necessidade de que em pesquisas futuras seja diversificado o foco de interesse. Sendo assim, as autoras sugerem novas agendas de pesquisas que tenham como objetivo investigar a adaptação acadêmica e o desenvolvimento de carreira dos pós-graduandos.

Nessa direção, a partir dos dois artigos descritos, foi levantada a necessidade de novos estudos brasileiros que investiguem a adaptação acadêmica e o desenvolvimento de carreira de estudantes de pós-graduação do ponto de vista empírico. Além de verificar o impacto que a relação orientando-orientador tem sobre o desenvolvimento e adaptação do indivíduo. A esse respeito, observa-se a adaptabilidade de carreira como uma variável importante a ser estudada nesse contexto. Isso se deve ao fato desse construto ter apresentado relações positivas com a adaptação acadêmica de universitários (Ambiel, Hernández, & Martins, 2016), e se tratar de um dos construtos de carreira com maior destaque no século XXI (Johnston, 2016).

A adaptabilidade de carreira é definida por Savickas (2005) como um "construto psicossocial que denota a prontidão e os recursos de um indivíduo para lidar com as tarefas de desenvolvimento profissional, atuais e iminentes, transições ocupacionais e traumas pessoais" (p. 51). Além disso, esse construto torna-se ainda mais relevante para os pós-graduandos, tendo em vista que tanto o momento de entrada quanto de saída da pós-graduação podem ser encarados como momentos de transições ocupacionais, e uma maior adaptabilidade pode tornar tais transições mais satisfatórias e fornecer uma maior sensação de bem-estar ao estudante (Koen, Klehe, & Van Vianen, 2012; Monteiro & Almeida, 2015; Ramos & Lopez, 2018; Zacher, 2014).

Além disso, a adaptabilidade de carreira é considera o construto central da Teoria de Construção de Carreira (Savickas, 2005), pelo fato desta assumir um caráter autorregulatório para os indivíduos, mediando suas disposições e comportamentos (Brown & Lent, 2016; Rossier, 2015). Diversos estudos internacionais, analisados por meio da metanálise (Rudolph, Lavigne, & Zacher, 2017), apontam a adaptabilidade como preditora de respostas adaptativas, para além do que é explicado unicamente pelas disposições. Sendo assim, evidencia-se a relevância da promoção deste construto em intervenções educacionais ou de carreira, devido ao acréscimo de resultados positivos que este construto tem demonstrado contribuir.

A adaptabilidade de carreira é dividida em quatro dimensões, sendo essas Preocupação, Controle, Curiosidade e Confiança. A Preocupação refere-se à habilidade de encarar a carreira em uma perspectiva temporal. O Controle consiste na capacidade de tomar decisões e assumir a si próprio como o responsável pela sua carreira. A Curiosidade, por sua vez, retrata a capacidade de explorar a si e aos seus ambientes, a fim de se obter o melhor ajuste entre ambos e assim tomar as decisões com mais realismo e objetividade. Por fim, a Confiança refere-se à expectativa de sucesso em encarar os desafios da carreira atuais e futuros (Savickas, 2005; Savickas & Porfeli, 2012).

No estudo de Klehe, Zikic, Van Vianen e De Pater (2011) foram verificadas condições motivadoras externas e internas que estão envolvidas na adaptabilidade de carreira. Em uma amostra de trabalhadores, verificaram que a exploração de carreira (conceito presente na dimensão curiosidade) e a satisfação podem ser consideradas atividades de caráter interno na pessoa. Um trabalhador, ao se perceber insatisfeito com o seu emprego, age proativamente em busca de novas possibilidades, instigando aspectos internos para lidar com a necessidade de adaptação profissional. Como motivadores externos, foram observadas a condição de insegurança no trabalho e a relação negativa entre o planejamento e preocupação com a carreira, que se referem a aspectos externos ao indivíduo.

Sobre as diferentes formas para se avaliar a adaptabilidade, vale destacar a Escala de Adaptabilidade de Carreira (Career Adapt-Abilities Scale - CAAS). Este instrumento, além de possuir um caráter transcultural com versões traduzidas e adaptadas para pelo menos 18 países diferentes (Farsen, Fiorini, & Bardagi, 2017), alavancou as pesquisas sobre o construto (Rudolph et al., 2017). Savickas e Porfeli (2012) publicaram a versão internacional da CAAS, realizada em conjunto com pesquisadores de 13 países. Os estudos da versão brasileira da CAAS, por sua vez, foram realizados inicialmente por Teixeira, Bardagi, Lassance, Magalhães e Duarte (2012), e posteriormente revisto por Audibert e Teixeira (2015). O instrumento avalia as quatro dimensões da adaptabilidade, por meio de 24 itens. A estrutura fatorial e os índices de precisão da CAAS foram todos satisfatórios no contexto brasileiro.

Todavia, apesar da adaptabilidade de carreira estar cada vez mais atraindo a atenção de pesquisadores ao redor do mundo, não há registros de estudos que avaliaram a adaptabilidade de carreira de estudantes de pós-graduação. Nota-se que a satisfação, em especial com a relação entre orientador-orientando, tem se mostrado uma variável importante para que o estudante de pós-graduação tenha uma melhor adaptação acadêmica (Santos et al., 2015). Portanto, a respeito da relação entre a adaptabilidade de carreira e a satisfação, é possível perceber que de modo geral há uma relação positiva entre elas, seja com a satisfação acadêmica (Duffy, Douglass, & Autin, 2015), satisfação profissional ou com o trabalho (Chan & Mai, 2015; Coetzee & Stoltz, 2015; Fiori, Bollmann, & Rossier, 2015; Koen, Klehe, Van Vianen, Zikic, & Nauta, 2010; Zacher, 2014; Zacher & Griffin, 2015), ou então satisfação com a vida (Santilli, Nota, Ginevra, & Soresi, 2014).

Nesta direção, torna-se necessário explorar quais variáveis sociodemográficas e acadêmicas contribuem para maiores níveis de adaptabilidade de carreira dos estudantes de pós-graduação, visto que o construto auxilia o estudante a lidar com as tarefas do desenvolvimento profissional, vivenciadas também no contexto da pós-graduação. Sendo assim, o objetivo do presente artigo foi verificar os níveis de adaptabilidade de carreira dos estudantes de pós-graduação stricto sensu, especificamente em função de variáveis sociodemográficas e acadêmicas como gênero, ser bolsista ou não, tipo de bolsa recebida, cursar mestrado ou doutorado, tipo de instituição, área de conhecimento, momento de execução da pesquisa, nível de satisfação em ser pós-graduando e satisfação na relação estabelecida com os orientadores.

 

Método

Participantes

Participaram 645 estudantes de Pós-Graduação Stricto Sensu de universidades brasileiras, sendo 471 (72,9%) do gênero feminino e 174 (27,1%) do gênero masculino, com idades variando entre 21 e 56 anos (M = 29,93; DP = 5,02). Em relação à Pós-Graduação, a maior parte declarou cursar mestrado acadêmico (n = 317; 49,1%), seguidos de discentes de doutorado (n = 305; 47,3%) e alunos de mestrado profissional (n = 23; 3,6%), vinculados a universidades federais (n = 382; 59,2%), estaduais (n = 187; 29%) e particulares (n = 76; 11,8%). Em termos geográficos predominaram os participantes da região sudeste (n = 326; 50,5%).

A maior concentração de estudantes se deu em Programas com conceito 5 pela CAPES (n = 200; 31%). Houve prevalência de discentes que declararam ser bolsistas (n = 472; 73,2%) e de pessoas que não exerciam outro trabalho além da Pós-Graduação (n = 412; 63,9%). Considerando as grandes áreas de conhecimento da CAPES (2017), predominaram os participantes de Ciências Humanas (n = 136; 21,1%) e de Ciências Biológicas (n = 104; 16,1%) e em menor frequência os pertencentes aos programas Multidisciplinar (n = 37; 5,7%) e de Linguística, Letras e Artes (n = 24; 3,7%).

Instrumentos

Questionário sociodemográfico (desenvolvido para esta pesquisa). Continha questões fechadas relativas a gênero, idade, estado de residência e de caracterização da Pós-Graduação, tais como, conceito CAPES, tipo de instituição, situação de bolsista. O questionário continha duas questões respondidas em escala tipo Likert de 10 pontos nos quais os participantes deveriam pontuar seu grau de satisfação em ser pós-graduando e a satisfação na relação estabelecida com os orientadores sendo que zero correspondia a total insatisfação e 10 a plenamente satisfeito.

Escala de Adaptabilidade de Carreira (Career Adapt-Abilities Scale - CAAS) (Savickas & Porfeli, 2012, versão adaptada Audibert & Teixeira, 2015). O instrumento é composto por 24 itens e tem como objetivo avaliar as competências relacionadas ao desenvolvimento de carreira. A escala é respondida em uma chave de resposta de tipo Likert de cinco pontos variando entre muito pouco (1) a plenamente (5) e divide-se em quatro fatores: Preocupação (habilidade de encarar a carreira em uma perspectiva temporal), Controle (capacidade de tomar decisões e assumir a responsabilidade pela própria carreira), Curiosidade (capacidade de explorar a si e aos ambientes no processo de tomada de decisão) e Confiança (expectativa de sucesso em encarar os desafios atuais e futuros na carreira). Cada fator contém seis itens e as pontuações possíveis variaram entre seis e 30. Em relação ao nível de confiabilidade, a escala apresentou Alfa de Cronbach variando entre 0,83 a 0,89 entre os fatores e de 0,94 na escala total.

Procedimentos

Inicialmente o projeto foi submetido ao Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade São Francisco no qual recebeu aprovação para execução (CAAE 75131917.5.0000.5514). Posteriormente, o protocolo com os instrumentos foi alocado na plataforma Google Docs contendo o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), Questionário de Identificação e a Escala de Adaptabilidade de Carreira. Os participantes só tinham acesso ao protocolo mediante concordância com o TCLE. O link da pesquisa foi divulgado em redes sociais online e em lista de e-mails de coordenadores de Pós-Graduação Stricto Sensu.

Análise de dados

As análises foram realizadas utilizando o software Statistical Package for the Social Sciences (SPSS) versão 21. Inicialmente foram realizadas estatísticas descritivas (média, desvio padrão e frequências) para caracterização da amostra e na sequência empregadas estatísticas inferenciais para verificação de diferenças nas pontuações em função das variáveis sociodemográficas e acadêmicas por meio do teste t de Student, Análise de Variância (ANOVA) e Prova de Tukey.

 

Resultados

Inicialmente buscou-se verificar o nível de adaptabilidade de carreira dos participantes. Em relação aos fatores da CAAS, as pontuações variaram de seis a 30 (que era também a variação possível do instrumento) sendo que as maiores médias foram encontradas para a dimensão Preocupação (M = 24,65; DP = 3,425) e Confiança (M = 23,91; DP = 4,324) e as menores médias para Curiosidade (M = 22,24; DP = 4,500) e Controle (M = 22,65; DP = 4,244). Em seguida, foram utilizadas estatísticas inferenciais para comparação de médias em função das variáveis sociodemográficas.

Não foram encontrados resultados com significância estatística na comparação das médias em função do gênero, ser bolsista ou não, tipo de bolsa recebida (agências federais, estaduais ou institucionais), cursar mestrado ou doutorado, do tipo de instituição (pública federal, estadual ou privada), área de conhecimento de acordo com a classificação da CAPES, momento de execução da pesquisa (inicial, intermediário ou final). Ou seja, ao se considerar todas essas variáveis, o nível de adaptabilidade de carreira dos estudantes manteve-se aproximadamente semelhante.

Na comparação em função do nível de satisfação em ser pós-graduando foram encontradas diferenças significativas tal como apresentado na Tabela 1. Para esta análise, as pontuações atribuídas pelos participantes foram classificadas em três percentis: pontuações baixas (até cinco pontos), médias (entre seis e oito pontos) e altas (de nove a 10 pontos).

Verifica-se que os participantes que declararam estar altamente satisfeitos em ser pós-graduandos apresentaram maiores pontuações em todas as dimensões da CAAS, indicando maior nível de adaptabilidade de carreira. Na sequência, buscou-se analisar possíveis diferenças nas médias em função da satisfação na relação estabelecida com os orientadores. Também nesta análise foram gerados percentis para as respostas, agrupando-as em pontuações baixas (até seis pontos), médias (entre sete e oito pontos) e altas (de nove a 10 pontos). Os resultados são apresentados na Tabela 2.

Os resultados evidenciaram que discentes que se encontravam mais satisfeitos com a relação estabelecida com os orientadores apresentaram maiores médias em todas as dimensões da CAAS, diferenciando-se daqueles com satisfação média e baixa. Os participantes com menor grau de satisfação com a relação estabelecida com seus orientadores diferenciaram-se dos demais, apresentando menor capacidade de controle frente aos domínios da carreira.

 

Discussão

O presente estudo teve como objetivo verificar o nível da adaptabilidade de carreira de estudantes de pós-graduação stricto sensu em função de variáveis sociodemográficas e acadêmicas. De forma geral, pode-se afirmar que este objetivo foi alcançado, uma vez que se trata de um estudo exploratório e que se encontraram resultados relevantes para a compreensão do construto nesta população.

Ao se verificar o nível de adaptabilidade dos participantes, verificou-se que eles apresentam uma maior habilidade para lidarem com o planejamento e preparação quanto ao próprio futuro (Preocupação) e ainda persistirem e acreditarem que podem alcançar os seus objetivos e encarar os desafios relacionados à carreira (Confiança). Em contrapartida, os pós-graduandos demonstraram uma menor tendência à exploração de oportunidades (Curiosidade) e de se sentirem responsáveis para tomarem decisões e gerenciar a própria carreira (Controle). Estes dados corroboram os achados de Zacher (2014) e Coetzee e Stoltz (2015) que em suas respectivas pesquisas verificaram que a dimensão preocupação da adaptabilidade de carreira, foi a de maior impacto nos resultados encontrados e a dimensão controle a de menor destaque.

No que diz respeito às variáveis sociodemográficas, o presente estudo buscou verificar possíveis diferenças em relação à adaptabilidade de carreira, quanto ao gênero, ser bolsista ou não, tipo de bolsa recebida, cursar mestrado ou doutorado, tipo de instituição, área de conhecimento e momento de execução da pesquisa, no entanto, não houve resultados significativos para estas variáveis. Apesar de serem características que poderiam de alguma forma diferenciar os participantes, a ausência destas discrepâncias pode estar relacionada a algumas particularidades da amostra.

No presente estudo, a maioria dos participantes se declarou bolsista ou se dedicando exclusivamente à pós-graduação, duas situações que se assemelham por estarem com as atividades apenas voltadas para os estudos. Da mesma forma, grande parte deles é proveniente de universidades federais, ou seja, eles podem vivenciar situações parecidas nos seus respectivos programas. Além disso, apesar de haver a participação de discentes de todas as áreas de conhecimento, inclusive da área de exatas além das descritas nos participantes, não houve equilíbrio amostral suficiente que permitissem aumentar o poder estatístico. Com isso, a pouca variabilidade destas variáveis pode ser responsável pela ausência de diferenças significativas entre elas.

Ao se verificar a adaptabilidade de carreira em função das variáveis acadêmicas, os resultados indicaram que os estudantes mais satisfeitos com a sua condição de pós-graduando apresentaram as maiores pontuações nas dimensões da CAAS, se diferenciando dos estudantes com baixa e média satisfação. A partir disso, é possível inferir que a satisfação está ligada à forma como as pessoas podem lidar com as transições profissionais, dificuldades e traumas relacionados a este período de desenvolvimento de carreira, de forma que ao se perceberem mais satisfeitos, os estudantes tendem a lidar melhor com estas questões profissionais e de carreira. Esses achados são concordantes com os resultados de Zacher (2014) e Zacher e Griffin (2015) e Rudolph et al. (2017), que verificaram respectivamente que a adaptabilidade de carreira exerce uma associação positiva com a satisfação profissional e ainda pode exercer um papel preditivo sobre situações adaptativas, ou seja, a prontidão de um indivíduo para lidar com a construção e desenvolvimento da sua carreira pode levá-lo a obter uma maior satisfação e sucesso na sua profissão.

Na pesquisa de Duffy et al. (2015) também foi possível verificar uma relação positiva entre adaptabilidade de carreira e satisfação acadêmica em estudantes universitários, ficando claro que quanto melhor é a forma de encarar as mudanças profissionais, mais satisfeitos academicamente eles se percebem. Mesmo que no presente estudo a satisfação investigada não seja relacionada ao ambiente acadêmico e sim à sua condição enquanto estudante de pós-graduação, os dados se assemelham ao de Duffy et al. (2015), pois os participantes ao se perceberem mais aptos a encarar os desafios da vida profissional podem vir a se tornarem satisfeitos em estar na pós-graduação e assim persistindo em busca do sucesso na sua carreira.

Assim, é possível verificar que questões internas e externas estão relacionadas à forma como as pessoas lidam com esse processo de adaptabilidade de carreira. De acordo com o que foi verificado na pesquisa de Klehe et al. (2011) há motivadores externos e internos envolvidos na adaptabilidade de carreira. No presente estudo, verifica-se que a satisfação com a própria condição de pós-graduando se caracteriza como uma fonte interna, ou seja, é necessário um processo interno de mobilização de questões e experiências pessoais que envolvem o se sentir satisfeito em estar em um curso de pós-graduação e com isso estar pronto para passar pelas mudanças profissionais.

Também se buscou avaliar nessa pesquisa a adaptabilidade de carreira quanto à satisfação com a relação dos estudantes com seus orientadores. O que pode ser observado é que aqueles que se declararam mais satisfeitos com esta relação obtiveram as maiores médias nas dimensões da CAAS, se diferenciando dos demais grupos (baixa e média satisfação). Nota-se aqui que esta relação pode ser considerada um agente externo agindo sobre a adaptabilidade de carreira, assemelhando-se aos achados de Klehe et al. (2011) quanto à existência de motivadores externos. Ainda foi verificado que os participantes que declararam estar menos satisfeitos com a relação estabelecida com o orientador se diferenciaram dos demais grupos (média e alta satisfação) na dimensão controle da CAAS. Este resultado ressalta a importância que o orientador tem para o aluno durante a sua formação, seja no mestrado ou doutorado, que vai além do papel de tirar dúvidas quanto à pesquisa desenvolvida, sendo que a relação estabelecida com ele pode ser responsável também pela sua adaptação à pós-graduação, conforme indicado por Santos et al. (2015).

Vale comentar que, embora não tenham sido levantados dados referentes à intenção de abandono da pós-graduação, pode-se considerar que os resultados encontrados indiquem uma possibilidade nessa direção. Ao se constatar que pessoas com níveis mais altos de satisfação, seja com aspectos intrínsecos ou extrínsecos, apresentam mais competência para lidar com transições e incertezas na carreira, pode-se refletir que a satisfação, seja com o fato de ser pós-graduando ou com a relação com o orientador, seja um fator protetivo quanto a um possível abandono da pós-graduação. Além disso, conhecer o nível de adaptabilidade de carreira, bem como conhecer as variáveis que possam agir neste processo, permite que estratégias de intervenção possam ser pensadas com a intenção de auxiliar os estudantes neste momento de transição de carreira e entrada para o mercado de trabalho.

 

Considerações finais

Com o intuito de se explorar a adaptabilidade de carreira em pós-graduandos, o presente estudo apresenta uma importante contribuição para a área de orientação profissional e de carreira, pois a partir desses achados é possível refletir sobre estratégias para trabalhar com este público. A especificidade dessa amostra ainda permitiu notar que poucos estudos buscaram explorar variáveis como estas em estudantes de pós-graduação, o que pôde ser constatado a partir da dificuldade em se levantar o material para a discussão dos resultados encontrados. Isso corroborou com as indicações de Santos et al. (2015) e Silva e Bardagi (2015) que relataram a necessidade de novas pesquisas com este público.

Em contrapartida, a amostra foi composta por uma quantidade satisfatória de participantes, o que pode levar à constatação de que este é um público disponível e de fácil acesso para futuros estudos. Apesar disso, uma importante limitação deste estudo se refere à pouca variabilidade da amostra em algumas variáveis, como, gênero, tipo de instituição e área de conhecimento. Tal limitação não permite refletir quanto à ausência de resultados significativos. Outra limitação pode ser atribuída às análises realizadas, que se concentram apenas em verificar as diferenças de médias quanto à adaptabilidade de carreira em função das variáveis sociodemográficas e acadêmicas. Em estudos futuros, sugere-se que novas análises sejam realizadas, para que se busque verificar outros aspectos da adaptabilidade de carreira, como o seu papel preditivo sobre a satisfação com a pós-graduação.

Assim, como agenda de pesquisa, indica-se que uma nova investigação com as variáveis sociodemográficas sejam realizadas, bem como com outros construtos, por exemplo, a autoeficácia e as habilidades sociais. Além disso, outra importante questão que deve ser explorada em estudos futuros se refere às questões relacionadas à saúde mental dos estudantes, principalmente nos que se encontram na pós-graduação. Essas novas investigações podem ampliar e levantar novas informações pertinentes sobre este período de transição acadêmica profissional.

 

Referências

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Endereço para correspondência:
Leonardo de Oliveira Barros
Rua Waldemar César da Silveira, 105, Swift
13045-210, Campinas, SP
E-mail: leonardobarros_lob@hotmail.com

Recebido 15/02/2018
1ª Reformulação 03/06/2018
Aceite Final 19/10/2018

 

 

Sobre os autores
Leonardo de Oliveira Barros é Psicólogo. Mestre e Doutorando em Psicologia com ênfase em Avaliação Psicológica pela Universidade São Francisco. Bolsista CAPES.
Thaline da Cunha Moreira é Psicóloga. Mestra e Doutoranda em Psicologia com ênfase em Avaliação Psicológica pela Universidade São Francisco. Bolsista CAPES.
Gustavo Henrique Martins é Psicólogo e Mestrando em Psicologia com ênfase em Avaliação Psicológica pela Universidade São Francisco. Bolsista FAPESP.
Rodolfo Augusto Matteo Ambiel é Docente do Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Psicologia da Universidade São Francisco.

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