SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
vol.20 issue2It is too much pressure! Perceptions about mental strain among medical studentsValidity evidences of a measure of career decision-making difficulties author indexsubject indexarticles search
Home Pagealphabetic serial listing  

Revista Brasileira de Orientação Profissional

On-line version ISSN 1984-7270

Rev. bras. orientac. prof vol.20 no.2 Florianópolis July/Dec. 2019

 

ARTIGO

 

Avaliação dos cursos de graduação em Psicologia na percepção de egressos

 

Evaluation of Academic Training in Psychology from graduates' perception

 

Evaluación de la formación en Psicología a partir de la percepción de los egresados

 

 

Luciana MourãoI; Rômulo TravassosII; Gardênia da Silva AbbadIII; Luara CarvalhoIV

IUniversidade Salgado de Oliveira, Niterói, RJ
IIUniversidade Estadual do Maranhão, São Luís, MA
IIIUniversidade de Brasília, Brasília, DF
IVUniversidade Salgado de Oliveira, Niterói, RJ

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

Este estudo objetivou avaliar a formação em Psicologia a partir da percepção de egressos em diferentes momentos de carreira. Foram realizadas 22 entrevistas individuais com três grupos de participantes: psicólogos em início de carreira; os de meio ou final de carreira; e aqueles que concluíram a graduação em Psicologia, mas não atuam na área. Adotou-se um roteiro semiestruturado para as entrevistas, que foram gravadas, transcritas e submetidas à análise de conteúdo categorial. Destacam-se nos resultados críticas à formação em função de uma perspectiva tradicional. Os egressos queixam-se do não desenvolvimento de competências em áreas como saúde pública, psicologia escolar e educacional, psicopatologia e psicologia organizacional.

Palavras-chave: competência profissional; ensino superior; graduação em Psicologia.


ABSTRACT

This study aimed to evaluate undergraduate courses in Psychology from the graduates' perception in different career stages. Twenty-two individual interviews were conducted with three groups of participants: early-stage psychologists, mid- or late-stage psychologists, and those who hold a degree in Psychology, but do not work in this area. A semi-structured script was adopted for the interviews, which were recorded, transcribed and submitted to categorical content analysis. Notable among the results are criticisms of the training in terms of a traditional perspective, oriented toward the clinical practice with focus on individual processes. The graduates complain about the lack of development of competencies in areas such as public health, school and educational psychology, psychopathology and organizational psychology.

Keywords: professional competence; higher education; undergraduate courses in Psychology.


RESUMEN

Este estudio tiene el objetivo de evaluar la formación en Psicología a partir de la percepción de los egresados en diferentes momentos de la carrera. Se realizaron 22 entrevistas individuales a tres grupos de participantes: psicólogos recién graduados, psicólogos en mitad o final de la actuación profesional; y aquellos que se graduaron pero no ejercen en el área de Psicología. Se adoptó una guía semiestructurada para realizar las entrevistas, que fueron grabadas, transcritas y sometidas al análisis de contenido categorial. En los resultados se destacaron las críticas a la formación tradicional. Los egresados se quejan del no desarrollo de competencias en áreas como salud pública, psicología escolar y educacional, psicopatología y psicología organizacional.

Palabras clave: competencia profesional; educación superior; formación del psicólogo.


 

 

Introdução

Atualmente, o Conselho Federal de Psicologia (CFP, 2016) reconhece 12 especialidades para a Psicologia: Escolar/Educacional; Organizacional e do Trabalho; de Trânsito; Jurídica; do Esporte; Clínica; Hospitalar; Psicopedagogia; Psicomotricidade; Social; Neuropsicologia; e em Saúde. Paralelamente, muitos psicólogos têm atuação em mais de uma área, conforme evidenciaram Gondim, Bastos e Peixoto (2010) e os dados disponibilizados pelo CFP (2018).

Concomitante com o surgimento de novas áreas de atuação, as demandas atuais do trabalho em Psicologia requerem uma capacidade do profissional de transitar entre o público e o privado, bem como entre o individual, o grupo e a sociedade ao seu redor (Lima & Cerveny, 2012; Mourão & Abbad, 2016). Nesse sentido, é importante que a formação desenvolva a capacidade de adaptação aos diversos e transformados contextos, dentro de uma perspectiva reflexiva (Cândido & Massimi, 2012; Yamamoto, 2012) e respaldada no ensino teórico e na edificação de uma vivência prática-crítica. O estágio e os conhecimentos práticos adquiridos por meio da experiência devem compor, portanto, o processo ensino-aprendizagem (Barletta, Fonseca, & Delabrida, 2012), assim como o conhecimento teórico – elaborado, sistemático e de caráter técnico-científico (Cruz & Schultz, 2009).

O curso de Psicologia caracteriza-se pela presença de três elementos integrados: (i) a formação básica, respaldada nos pontos de vista epistemológico, histórico e metodológico; (ii) a pesquisa, configurada pela elaboração de um projeto de trabalho que recorre às formulações teóricas e teste de realidade, e pela construção de ideias, reflexão e síntese; e (iii) as práticas em Psicologia, que são as oportunidades de estágio (Ministério da Educação [MEC], 2012). A integração de tais elementos é importante porque a formação profissional requer o desenvolvimento de competências que compreendam conhecimentos sobre o objeto e a ação (Cruz & Schultz, 2009).

Além disso, de acordo com as Diretrizes Curriculares Nacionais (DCNs) para os cursos de Psicologia, essa construção de competências deve levar em conta quatro eixos estruturantes: (i) Psicologia, Políticas Públicas e Educacionais; (ii) Psicologia e Instituições Educacionais; (iii) Filosofia, Psicologia e Educação; e (iv) Disciplinaridade e Interdisciplinaridade (Resolução Nº 5, de 15 de março de 2011). As DCNs também determinam princípios e compromissos, tais como a construção e desenvolvimento do conhecimento científico; compreensão dos múltiplos referenciais que apreendem a amplitude do fenômeno psicológico em suas interfaces com os biológicos e sociais; e o reconhecimento da diversidade de perspectivas e campos de conhecimento necessários à compreensão do ser humano.

Apesar do processo histórico e coletivo para a construção e reconstrução das diretrizes curriculares e dos esforços para melhorar os cursos de Psicologia, muitos desafios ainda permanecem nos processos formativos da área. Nesse sentido, um expressivo conjunto de autores têm apresentado reflexões acerca de problemas relativos à formação, tais como Bastos, Gondim e Rodrigues (2010), Yamamoto, Souza, Silva e Zanelli (2010), Abbad e Mourão (2010), Ziliotto, Benvenutti, Matiello e Peil (2014), Lins, Silva e Assis (2015), Mourão e Abbad (2016). A baixa qualidade da formação básica também fica evidente nos resultados do Exame Nacional de Desempenho de Estudantes – Enade (Travassos & Mourão, 2017), que apontam para uma dificuldade dos concluintes na estruturação argumentativa e no uso da língua portuguesa, com um elevado percentual de erros gramaticais e ortográficos (INEP, 2015). Há também estudos que focalizam os elementos que contribuem para a formação, como as atividades de pesquisa, extensão e monitoria (Guareschi, Wendt, & Dhein, 2011; Guedes, Motta, Sato, Scarcelli, & Sanches, 2009).

Alguns estudos sobre o tema fundamentaram-se em pesquisas empíricas, como o de Abbad e Mourão (2010) sobre o domínio de competências profissionais. A pesquisa foi realizada com 329 psicólogos distribuídos por todo o país e evidenciou lacunas na formação, com carências em qualificação técnica, associada a uma baixa capacidade de análise do contexto e do campo de atuação, bem como de investigação científica, atuação inter e multiprofissional e avaliação. Sem a combinação desses elementos, há o risco de que a atuação dos psicólogos aconteça de forma distanciada dos conhecimentos científicos da área (Yamamoto, 2012).

Para além dos eixos estruturantes, a formação precisa contemplar as distintas correntes teóricas e múltiplas possibilidades de atuação (Gondim et al., 2010). Muitas vezes os cursos de Psicologia encontram-se excessivamente conectados a uma ou a algumas áreas específicas de atuação, como a clínica, saúde e escolar/educacional (Oliveira & Guzzo, 2014). Assim, há uma lacuna na preparação para a atuação em outros contextos, como nas relações de trabalho. Como resultado, nem sempre os profissionais conseguem assumir, por exemplo, a perspectiva contraditória e conflituosa da relação capital-trabalho (Bernardo, Sousa, Garrido-Pinzón, & Souza, 2015) ou talvez não diferenciem as vertentes da Psicologia Social do Trabalho e da Psicologia Organizacional que apresentam diversidade de objetos de estudo, referenciais teóricos, propostas metodológicas e posicionamentos políticos (Bernardo, Oliveira, Souza, & Sousa, 2017).

Deve haver também uma preocupação com o contexto e com a formação na área de saúde (Hüning, Silva, Silva, & Lessa, 2013), pois o Sistema Único de Saúde (SUS), por meio da Atenção Básica e Psicossocial, Saúde da Família e serviços ambulatoriais passou a representar um importante espaço para a atuação dos psicólogos, com perspectivas de um campo que continuará crescendo. De acordo com Furtado (2012), a exigência legal de que os Centros de Referência de Assistência Social (CRAS) contratem ao menos um psicólogo, prevê a contratação de 20 a 30 mil psicólogos quando toda a rede estiver instalada. Além disso, segundo Furtado (2012), a demanda por psicólogos também é crescente em hospitais, no sistema Judiciário, no trânsito, no esporte, nas comunicações, em organizações não governamentais (ONGs), além dos tradicionais setores da educação e das organizações. Essa diversidade de contextos de atuação sinaliza a importância de uma formação plural nos cursos de Psicologia.

De forma análoga, as reflexões realizadas por Bernardes (2012) acerca das DCNs para o curso de Psicologia apontam avanços e retrocessos. O autor problematiza e propõe ressignificar os conceitos de competências/habilidades e ênfases curriculares, a partir de uma perspectiva de formação orientada para um perfil generalista, vinculado aos contextos locais de produção de práticas sociais/profissionais. Se por um lado é preciso ressaltar que as DCNs aprovadas em 2011 são consideradas positivas em função da inserção dos estudantes, desde os primeiros anos do curso, em cenários de prática; por outro, ainda não foi solucionada a demanda por uma formação mais generalista e uma prática psicológica mais pautada nos princípios do SUS (Poppe & Batista, 2012).

Observa-se, então, um conjunto de modificações ao longo dos anos, não apenas em termos de ampliação do campo de atuação, mas também em termos de concepções de aprendizagem – saindo de uma concepção ambientalista, eminentemente behaviorista, em que os conteúdos são o centro do processo, para uma nova concepção com processos cognitivos centrados no estudante e no desenvolvimento de competências e habilidades (Bernardes, 2012). Esses avanços ocorreram porque os documentos que norteiam a formação foram modificados, enfatizando aspectos relacionados ao desenvolvimento de competências e à adoção de práticas educativas centradas na figura do aprendiz. As DCNs ofereceram, portanto, uma importante contribuição como política educacional que induziu à mudança.

Assim, tem-se por um lado, uma constatação de importantes avanços na formação e novas oportunidades de atuação (Bernardes, 2012; Furtado, 2012). É o que evidencia a pesquisa realizada com docentes e coordenadores de curso da área de Psicologia, que aponta para esse surgimento de novas áreas de atuação (Travassos & Mourão, 2018). Por outro lado, a mesma pesquisa aponta para lacunas no domínio de competências daqueles se graduam em Psicologia, reforçando o questionamento sobre se os psicólogos estão preparados para o exercício da profissão – conforme refletem autores como Yamamoto e Oliveira (2010), Macedo e Dimenstein (2011), Furtado (2012); Mourão e Abbad (2016). Outros estudos também focalizam temáticas correlatas, como a identificação com a profissão, o sentido da Psicologia e a formação do psicólogo (Borges, 2013; Ferrarini & Camargo, 2012; Hüning et al., 2013; Lins et al., 2015; Mazer & Melo-Silva, 2010).

Considerando o exposto e a literatura revisada, o objetivo deste estudo foi avaliar a formação em Psicologia a partir da percepção de egressos do curso em diferentes momentos de carreira. A proposta era conhecer a avaliação que os psicólogos – após ingressarem no mercado de trabalho ou decidirem não atuar na área – fazem de sua graduação e o que podemos aprender a partir das experiências dessas pessoas.

 

Método

Participantes

A amostra foi intencional e desenhada para coletar opiniões de psicólogos que se encontravam em três situações distintas: (i) psicólogos em início de carreira (com até dois anos de atuação profissional); (ii) psicólogos que já passaram da fase inicial de carreira (com mais de cinco anos de atuação na área); e (iii) psicólogos que concluíram a formação e não exercem a profissão, considerando que estes representam um elevado percentual na Psicologia (35%, Yamamoto, 2012). A escolha desses três perfis objetivou conhecer avaliações sobre a graduação que poderiam ser distintas em função das fases e das decisões de carreira dos participantes. Para maior diversidade de opiniões, a amostra também contemplou profissionais de diferentes subáreas da Psicologia.

A lista de egressos convidados para a pesquisa foi elaborada a partir da técnica bola de neve em que os próprios participantes indicavam outras pessoas que atendiam aos critérios estabelecidos. A coleta de dados ocorreu no Rio de Janeiro, uma vez que as entrevistas foram realizadas presencialmente e este era o acesso possível aos pesquisadores. Foram feitos 28 convites e 22 foram aceitos, o que indica uma taxa elevada de retorno (79%), possivelmente porque se trata de uma temática que interessa aos participantes.

A saturação foi o critério para a definição do tamanho da amostra. Assim, inicialmente foram adotadas amostras de cinco pessoas para cada uma das três situações profissionais. A avaliação do atingimento da saturação foi feita por três juízes independentes (autores do presente artigo), tendo sido alcançada com as cinco entrevistas iniciais apenas para os psicólogos em início de carreira. Para aqueles que se encontravam na fase intermediária/final de carreira ou que não atuam na área, foi necessário expandir a amostra. Portanto, foram realizadas entrevistas sucessivas até atingir a saturação em cada um dos três perfis, totalizando 22 participantes.

O perfil etário variou de 27 a 62 anos (M = 38; DP = 9,7). Em relação ao gênero, 19 dos 22 entrevistados eram mulheres, confirmando o predomínio feminino na profissão (Bastos et al., 2010; CFP, 2018). Os participantes residiam no Rio de Janeiro e eram provenientes de nove diferentes Instituições de Ensino Superior (IES), sendo quatro públicas e cinco particulares, das quais 18 eram do Rio de Janeiro, uma de Minas Gerais, uma da Bahia, uma de São Paulo e uma de Brasília. O detalhamento das características sociodemográficas de cada entrevistado é mostrado na Tabela 1.

 

 

Instrumentos

O instrumento para a coleta de dados foi um roteiro de entrevista semiestruturado, com oito perguntas abertas, que abordavam três temáticas centrais: avaliação da formação acadêmica em termos de graduação; experiências da atuação profissional; e desafios da profissão. A proposta era de que as perguntas servissem como guia para garantir o foco e a fluidez das entrevistas, sendo novas perguntas acrescentadas, a depender das respostas obtidas. Para os entrevistados que não atuavam na área, foi acrescentada uma pergunta sobre o motivo de não atuarem no campo da Psicologia. O objetivo desse conjunto de questões era que o entrevistado fizesse uma reflexão retrospectiva do seu curso de graduação e apresentasse uma avaliação acerca dos pontos fortes e fracos do mesmo, considerando as demandas, as experiências e os desafios profissionais que teve depois de concluir o curso.

Procedimentos éticos e de coleta de dados

O projeto da pesquisa foi inscrito na Plataforma Brasil e aprovado por um comitê de ética em pesquisa (CAAE: 39704814.4.0000.5289). Na coleta de dados foram respeitados o direito à participação voluntária e o sigilo das informações individuais, sendo os trechos com nomes de instituições, professores ou qualquer outro tipo de possível identificação suprimidos para a preservação do anonimato dos participantes. Todos assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, onde constava pedido de autorização para gravação e receberam explicações verbais sobre os objetivos e a importância da gravação.

Os procedimentos de coleta de dados incluíram o agendamento e a realização das entrevistas em um laboratório de pesquisa ou na residência do entrevistado, conforme a sua disponibilidade, e sem a presença de outras pessoas. A duração média das entrevistas foi de 47 minutos, com posterior transcrição literal. Duas dificuldades merecem ser mencionadas para que possam ser consideradas por pesquisadores interessados na replicação deste estudo. A primeira diz respeito aos entrevistados que concluíram a graduação há mais de dez anos. Alguns deles tinham dificuldade de se lembrar com detalhes de algumas questões relativas ao curso. Uma estratégia, nesses casos, foi acrescentar perguntas que remetessem a pessoa aquele contexto, por exemplo, em que turno ela estudava, como ia para a universidade, se teve algum colega ou professor com quem teve mais contato. Em geral, esse tipo de abordagem funcionava para ativar a memória das pessoas. A segunda dificuldade diz respeito a manter a entrevista sem interrupções nos casos em que elas eram realizadas nas residências dos pesquisados, pois houve casos em que o entrevistado teve que insistir com pessoas da família para que não lhe interrompessem durante o processo da pesquisa.

Procedimentos de análise de dados

Foi adotada a análise de conteúdo categorial (Bardin, 2006), tendo o procedimento sido iniciado com a leitura flutuante e a realização de anotações/impressões preliminares. Uma subsequente leitura dos depoimentos levou à construção de grades de pré-categorias com marcação de algumas frases que ilustravam opiniões que emergiram das falas dos entrevistados.

Após a identificação das pré-categorias com palavras-chave, três juízes independentes realizaram a análise de presença e ausência dessas pré-categorias no discurso dos pesquisados. Os juízes foram dois doutores e um mestre em Psicologia e cada um recebeu uma cópia integral dos depoimentos transcritos, sem qualquer marcação de falas. Coube, então, aos juízes identificar as pré-categorias presentes ou ausentes em cada um dos 22 depoimentos.

Na etapa seguinte foram comparadas as diferenças entre as categorizações feitas pelos juízes e discutidas com eles as razões que levaram à classificação. Com base nessa discussão, cada juiz apresentou sua versão final de categorização, que foi considerada para fins de avaliação do critério de consistência (concordância entre os três juízes) e do critério de relevância (presença de cada categoria/subcategoria no discurso de pelo menos cinco dos 22 entrevistados). Esse número foi estabelecido com base em um critério estatístico segundo o qual as categorias de conteúdo, para serem consideradas relevantes precisavam ter sido mencionadas por pelo menos 20% dos entrevistados. Assim, esperava-se obter uma solução parcimoniosa em que as categorias de conteúdo fossem compatíveis com o número total de entrevistas, de forma a permitir uma síntese interpretativa dos resultados.

Foram relatadas as subcategorias excluídas por ausência de concordância entre os juízes e, para cada categoria/subcategoria, foram indicados os resultados referentes ao critério de relevância. Para garantir o sigilo das respostas individuais, os depoimentos ilustrativos foram identificados apenas pelo sexo, idade, tempo de atuação profissional de cada participante e subárea da Psicologia à qual se vincula (ou pelo não exercício da profissão).

 

Resultados e Discussão

A análise das respostas sobre a avaliação da graduação em Psicologia gerou quatro categorias principais de agrupamento de conteúdo, a saber: Experiências relevantes na formação; Infraestrutura; Competências mais desenvolvidas na formação; e Competências menos desenvolvidas. Em cada uma dessas categorias, um conjunto de elementos de discurso compuseram subcategorias, totalizando 25 agrupamentos de conteúdos. Algumas subcategorias de respostas foram peculiares a determinado grupo (psicólogos de início de carreira, de meio/fim de carreira ou que não atuam na Psicologia), enquanto a maioria das subcategorias esteve presente no discurso desses três grupos, como pode ser visto na Figura 1.

 

 

Apenas duas subcategorias – preparo pessoal/desenvolvimento humano e oratória/capacidade de falar em público – foram eliminadas em função de falta de concordância entre os juízes, sendo ambas relativas à categoria Competências menos desenvolvidas. Todas as demais categorias e subcategorias atenderam ao critério de consistência estabelecido. A Figura 1 evidencia que algumas temáticas foram amplamente citadas pelos entrevistados, enquanto outras foram mencionadas por um grupo menor de psicólogos (critério de relevância).

Experiências relevantes na formação

A categoria Experiências mais relevantes na formação teve oito subcategorias e o maior volume de depoimentos durante as entrevistas. A subcategoria SPA foi citada por quase todos os pesquisados (apenas um profissional que não atua na Psicologia deixou de citá -lo). O estágio também se destacou, tendo emergido do discurso de 16 dos 22 entrevistados. Dentre as outras seis subcategorias, os Relatos dos professores (11 depoimentos) e as Aulas (10), também foram bastante frequentes. Também surgiram como subcategorias relevantes: Laboratórios (8), Colegas/amigos (7), Atividades de extensão, cursos ou grupos de estudo (7) e Iniciação científica ou participação em grupo de pesquisa (6).

Os resultados confirmam que as vivências acadêmicas podem ser muito marcantes na formação em Psicologia, conforme sinalizado por Travassos e Mourão (2017). O expressivo aumento, nos últimos anos, no percentual de estudantes que participam de ações de extensão, iniciação científica e monitoria (Guareschi et al., 2011; INEP, 2015), bem como a mudança nas diretrizes curriculares que ampliam os estágios durante a formação, sinalizam para um provável incremento dessas experiências na atual formação em Psicologia. Algumas falas dos entrevistados ilustram a importância de diferentes experiências acadêmicas em seu processo de formação.

"O meu estágio na comunidade da Mangueira, foi uma experiência que foi importantíssima e, é... vou te falar uma coisa assim, o que eu mais trago da minha formação, que foi assim importantíssimo, eu sempre lembro assim que eu tive excelentes professores e supervisores, excelentes assim eu acho que em todo lugar que eu fui, é o que mais me enriqueceu... (Entrevistada 4, 36 anos, 13 anos de atuação)

"Então, quando você diz assim "formação", eu penso na minha formação como sujeito, né, e a minha formação como profissional e as experiências que de repente me marcaram, foi a dos amigos, as pessoas... que eu consegui fazer essas trocas. Professores também. Eu tive professores maravilhosos, que, assim, me estimularam muito, né? Mas eu acho que a profissão de psicólogo não é assim muito valorizada, sabe?" (Entrevistada 15, 29 anos, não atua na Psicologia)

"As aulas, sem dúvida! (...) Mas, assim, o que realmente foi mais importante, acho que foram os estágios, estágio que, que eu fiz em clínica, especialmente. As discussões que a gente fazia eram em grupo, com supervisão, então eram muito boas. Os atendimentos, alguns atendimentos... A gente fez atendimento em grupo, né? Então, você acaba aprendendo com o seu parceiro de trabalho". (Entrevistada 1, 27 anos, 2 anos de atuação)

Infraestrutura

Nos discursos dos pesquisados a categoria Infraestrutura diz respeito à existência e à manutenção de recursos audiovisuais (apontado por 12 entrevistados); salas de aula com espaço e mobiliário adequados à aprendizagem (14); a existência de laboratórios equipados (17); a presença de espaço para a prática de atendimento no âmbito dos SPA (11); e a biblioteca com quantidade e diversidade de livros para as disciplinas (9).

De um modo geral, os pesquisados oriundos de IES públicas e privadas avaliaram positivamente os aspectos de infraestrutura e os consideraram como relevantes para a formação. Tal resultado reforça a importância de a infraestrutura permanecer como um dos elementos contemplados pelo MEC na avaliação dos cursos de graduação (INEP, 2015). Nessa temática, a única diferença de resposta por grupos de entrevistados ocorreu na subcategoria Biblioteca, presente no discurso de nove pesquisados, sendo sete deles relativos aos profissionais que se encontram no meio/fim de carreira. Possivelmente, tal diferença pode ser explicada pelo fato de, nos últimos anos, a tecnologia facilitar o acesso digital a livros e artigos científicos. Alguns depoimentos ilustram as opiniões relativas à Biblioteca.

"Eu penso que eles [os livros] contribuíram bastante porque, eu estudei na Universidade [nome omitido], a biblioteca de lá era uma biblioteca, pra mim pelo menos, bastante adequada, era um ambiente silencioso, possuía os volumes, os livros que eu precisava estudar, e as salas de aula eram também, permitiam uma boa acomodação, permitiam estudar adequadamente." (Entrevistada 7, 39 anos, 9 anos de atuação).

"Na época que eu me formei, assim, havia um investimento muito grande no curso de Psicologia por parte da universidade, então, assim, nós tivemos excelentes professores, acomodações, salas ótimas, um laboratório adequado, espaço para atendimento no SPA..." (Entrevistado 12, 49 anos, 22 anos de atuação)

"A faculdade que eu estudei, a [nome omitido], é uma faculdade pequena, então, por consequência, os laboratórios, a biblioteca, a sala de informática, eram pequenas também, mas atendia a demanda do curso. A gente tinha algumas peças do encéfalo no laboratório pra poder estudar, todos os livros que eu precisei na biblioteca ou a grande maioria tinha lá". (Entrevistado 21, 33 anos, não atua na Psicologia)

Competências mais desenvolvidas

A análise categorial mostrou baixa diversidade nas competências que entrevistados consideram que mais desenvolveram. Apenas quatro novas subcategorias emergiram: Relações interpessoais (19), Psicanálise (17), Clínica (14) e Capacidade de escuta (8). Chama a atenção o fato de Relações interpessoais ser a competência presente no discurso do maior número de entrevistados. Se, por um lado, a interação representa um importante componente do processo de aprendizagem e promove uma participação ativa do aprendiz na construção do perfil profissional (Abbad & Mourão, 2010); por outro lado, esta não é uma competência específica da formação em Psicologia (INEP, 2015).

Para além disso, há uma ênfase excessiva na atuação clínica, tendo a Psicanálise um visível destaque como a competência mais desenvolvida. Esse resultado pode ter tido um destaque ainda maior pela delimitação geográfica da pesquisa, uma vez que o programa de pós-graduação em Teoria Psicanalítica da Universidade Federal do Rio de Janeiro "mantém uma liderança científica na área da psicanálise" (CAPES, 2017).

Mas o foco das competências mais desenvolvidas não se restringiu à linha teórica da psicanálise – a competência clínica, de forma mais ampla, também foi citada como uma das mais desenvolvidas ao longo da formação em Psicologia. Esse resultado confirma a prevalência dessa subárea e o estereótipo clínico de atuação profissional que vêm sendo discutidos na literatura da área (Abbad & Mourão, 2010; Gondim et al., 2010; Mourão & Abbad, 2016; Oliveira & Guzzo, 2014). Portanto, os resultados das entrevistas vão ao encontro de achados anteriores, que apontam deficiências no desenvolvimento de competências que permitam a atuação nas diversas especialidades reconhecidas para o curso de Psicologia (CFP, 2016), reiterando as reflexões de Bernardes (2012) de que as novas diretrizes curriculares atingiram apenas parcialmente os seus objetivos. Os depoimentos a seguir trazem alguns trechos de entrevistas em que os entrevistados mencionam as competências que mais desenvolveram.

"Eu tive muita psicanálise, mas não foi a linha que eu mais gostei. Eu gostava bastante da linha de Gestalt terapia, mas eu acabei tendo que estudar bastante psicopatologia, porque na minha época de estágio eu precisei muito, porque eu fui trabalhar em uma clínica psiquiátrica." (Entrevistada 5, 27 anos, 2 anos de atuação)

"Não sei bem assim o que significa competência, assim essa competência profissional que você está perguntando... O que ficou muito claro pra mim, foi essa disponibilidade da gente de escutar, sabe, essa disponibilidade de escuta... É você estar disponível e não simplesmente estar disponível, é fazer disso um diferencial profissional seu." (Entrevistada 20, 28 anos, não atua na Psicologia)

"Eu considero as competências que desenvolvi melhor, foi nas áreas que fiz estágio de atendimento clínico ao adulto e também à família. Foi bem importante e com bons supervisores, porque não adianta, assim, só a teoria. Psicologia tem muito de prática. Tem que ter a vivência, entendeu?" (Entrevistada 17, 50 anos, não atua na Psicologia)

"Durante o curso, uma das competências que mais me marcou foi a... na questão das relações mesmo, porque no curso a gente tem várias pessoas diferentes, maneiras de ser, de pensar, de agir, então aprendi a respeitar isso. (Entrevistada 18, 31 anos, não atua na Psicologia)

Competências menos desenvolvidas

Foram muitas e diversificadas as competências apontadas pelos entrevistados como pouco desenvolvidas, com destaque para as seguintes: Saúde pública/Psicologia da saúde (13); Psicologia escolar/Psicopedagogia (10); Psicopatologia/ Saúde mental (9); e Psicologia organizacional e trabalho (8). Outras competências foram citadas por pelo menos cinco entrevistados, sendo elas: Desenvolvimento infantil; Psicologia clínica; Neuropsicologia; e Dinâmica de grupo.

Essas informações acerca das competências menos desenvolvidas durante a graduação confirmam a fragilidade da formação em Psicologia que foi apontada pelos dados do Enade (INEP, 2015) e também na pesquisa com docentes da área realizada por Travassos e Mourão (2018). As dificuldades relativas a competências que permitam atuar em processos grupais e organizacionais são apontadas não apenas nos resultados do Enade, mas também em outros estudos sobre a temática (Abbad & Mourão, 2010; Bastos, Gondim, Souza, & Souza, 2011; Lins et al., 2015; Mourão & Abbad, 2016; Yamamoto, 2012). Alguns depoimentos dos entrevistados ilustram esse panorama de uma formação dirigida para os processos psicológicos individuais e, em especial, para o atendimento clínico:

"Eu só digo da clínica, com segurança. A psicologia educacional, jurídica, do trânsito, a própria organizacional e do trabalho, de maneira geral, pelo menos a formação que eu tive, não foi suficiente, então, assim, a pessoa precisa correr atrás depois, fazer algum tipo de pós, especialização, porque se não, ela não... ela fica em déficit, ela fica defasada." (Entrevistada 10, 62 anos, 35 anos de atuação).

"Senti falta de conhecer outras áreas, como, setores sociais, já que abriu muitos concursos para psicólogos em vários tipos de órgãos como jurídicos... Em postos de saúde, existem equipes multidisciplinares e a gente teve pouca oportunidade de conhecer isso aí (...) Eu até fiz estágio no fim do curso, mas foi em escola, não tem assim muito direcionamento de estágio pra saúde, pra empresa, pra trabalhar como psicólogo no jurídico, sabe? O aluno tem que agarrar o que aparecer (...) Já me falaram que agora tá tendo mais oportunidade de estágio, mas quando eu fiz era bem limitado". (Entrevistada 14, 37 anos, 6 anos de atuação)

"Sentia falta da atuação do psicólogo na área de saúde pública, a gente teve só uma matéria, pelo menos, foi a que eu tive. Na verdade, duas matérias com relação a saúde pública, que é a saúde mental e saúde pública, e uma não distingue da outra, porque são na área de saúde. Essa questão da saúde mental propriamente dita, que eu acho que fica fraco, sabe? (Entrevistada 2, 29 anos, 1 ano de atuação)

"Olha... eu gostaria de ter aprendido mais sobre psicologia organizacional. O que eu tive foi muito bom, sim, mas eu gostaria de ter recebido mais sobre isso. Foi pouco... (...) quando você vai para uma entrevista de trabalho numa organização, na área de Psicologia, você vê que você não tem o suficiente pra ingressar nesse mercado. (...) E olha que eu fiz até um estágio nessa área, mas ficava só corrigindo teste, não tinha supervisão... Faltou, sabe? Faltou assim... mais experiência, mais reflexão naquela época." (Entrevistado 3, 30 anos, 2 anos de atuação)

Vale mencionar que, apesar de a área clínica ser apontada por vários pesquisados como a competência mais desenvolvida, alguns pesquisados a indicaram como uma das competências menos desenvolvidas. É interessante observar que os seis entrevistados que citaram a deficiência na formação para o atendimento clínico distribuem-se entre os diferentes grupos de entrevistados, ou seja, psicólogos em início de carreira, profissionais que já ultrapassaram essa fase inicial e também aqueles que se formaram na área, mas decidiram não atuar na Psicologia. Os depoimentos a seguir evidenciam esse sentimento de despreparo para a atuação em clínica.

"Ainda ficou muito a desejar na parte clínica, tá? Tem assim muita teoria, eu tive muita teoria, na maioria de vezes tem uma teoria, mas a vivência não corresponde, falta prática, é pouca prática." (Entrevistado 3, 30 anos, 2 anos de atuação)

"Quando eu terminei o curso, não me sentia preparada para atender as pessoas. Eu até pensei em abrir uma clínica com uma colega, mas eu já tinha outra profissão, outro trabalho e começar na clínica não é fácil. E eu sentia que precisava de mais formação, uma especialização, alguma coisa que me desse mais firmeza para atender as pessoas." (Entrevistada 22, 45 anos, não atua na Psicologia)

"A formação me dá um nome: psicólogo. Mas não me dá a base. (...) 'Olha, quando você se formar, você já está pronta pra atender!' Foi isso o que me falaram. Ninguém me disse que eu precisava ter uma supervisão! Eu ouvi isso no consultório, mas ninguém na faculdade me falou isso. Então, isso pra mim, não contribuiu muito no meu curso. (Entrevistada 9, 45 anos, 12 anos de atuação)

"Vai até parecer engraçado, porque eu falei que a competência para atuar na clínica foi uma das que eu mais desenvolvi durante o meu curso de graduação, mas também acho que essa foi uma das que mais faltou... quer dizer, a gente vê muita coisa de clínica durante o curso, mas, quando termina, a gente percebe que faltou, sabe, faltou mesmo, faltou muito. A gente não termina preparado só com aqueles atendimentos no SPA. Não é assim: fez formação psicólogo pode abrir consultório." (Entrevistada 18, 31 anos, não atua na Psicologia)

Merece destaque, entre aqueles que não exercem a profissão de Psicologia, a avaliação de que há um despreparo dos egressos para a atuação na área clínica. Dos seis depoimentos que citaram a Psicologia Clínica entre as competências menos desenvolvidas, quatro vieram desse grupo, embora um psicólogo em início de carreira e um psicólogo em meio de carreira também tenham dado depoimentos semelhantes.

Em relação à Saúde Pública/Psicologia da saúde, observou-se uma frequência maior de citações como competência menos desenvolvida entre aqueles que estão no início de carreira (chama a atenção o fato de todos os pesquisados desse perfil terem citado essa subcategoria). Possivelmente, tal público está atento à necessidade de que a temática seja mais contemplada na formação básica porque essa área tem se expandido bastante, especialmente em função dos Centros de Atenção Psicossocial e do Programa Saúde da Família (CFP, 2018; Furtado, 2012; Poppe & Batista, 2012; Yamamoto & Oliveira, 2010).

Por fim, uma análise conjunta das respostas relativas às competências mais e menos desenvolvidas evidencia que os entrevistados percebem que o mercado de trabalho se expandiu para além da clínica. Nesse sentido, confirmam-se as reflexões de Yamamoto e Oliveira (2010), de que se multiplicaram as possibilidades de atuação em postos de trabalho de vocação mais social. Porém, a graduação em Psicologia não parece, até o momento, dar conta dessa mudança de contexto. Assim, as respostas obtidas no conjunto das categorias confirmam a urgência de se ampliar os horizontes da formação, na linha do que foi apontado por Bernardes (2012) e Travassos e Mourão (2018).

A reforma das diretrizes curriculares para a graduação de Psicologia ocorrida no ano de 2004, a despeito de ter trazido alguns ganhos para os cursos (Bernardes, 2012; Poppe & Batista, 2012), não foi suficiente para resolver os problemas centrais da formação, inclusive por ter concentrado suas preocupações com conteúdos e disciplinas (Bernardes, 2012). A formação ainda precisa de muitos avanços, sobretudo relacionados a competências cognitivas e atitudinais que servem como elementos integradores de conhecimentos filosóficos, teóricos, metodológicos e éticos (Mourão & Abbad, 2016).

Mas é preciso também ponderar que as reflexões sobre a formação e a insatisfação com os modelos atuais não são exclusividade do Brasil. Há uma mudança no contexto da profissão e da própria configuração das sociedades que têm levado a reflexões mais amplas sobre a atuação em Psicologia (Borges, 2013), considerando desafios para a formação no século XXI (Bickman & Ellis, 2017), bem como definições de novos modelos de graduação e pós-graduação em diferentes países. Nota-se que, em outros países, conforme Littlefield (2016), há trilhas educacionais de longa duração que visam capacitar profissionais para suprir as crescentes demandas da sociedade por serviços especializados em diferentes áreas da Psicologia. Há debates sobre o que deverá ocorrer em cada etapa da formação para que esse desenvolvimento profissional ocorra de acordo com uma trajetória de especialização e aprofundamento. Há também certo consenso sobre a necessidade de uma formação básica generalista para todos os psicólogos durante a graduação (bacharelado de três anos em outros países) e uma formação especializada no mestrado (em muitos países seguido à graduação e como exigência para o título de psicólogo) e no doutorado.

As diretrizes nacionais para os cursos de Psicologia, não integram a graduação com os demais níveis de formação pós-graduada, tal como ocorre em outros países (Bickman & Ellis, 2017; Littlefield, 2016), dificultando a criação de uma trilha educacional interdependente e bem articulada. Os resultados da presente pesquisa evidenciam que os cursos de graduação em Psicologia no Brasil são falhos na formação generalista. O foco no desenvolvimento de habilidades e competências muito concentradas em uma única subárea de atuação pode estar associado a uma assimilação indevida do conceito de ênfases curriculares. Essa situação torna-se mais grave, em função da escassez de ações de requalificação profissional do psicólogo ao longo da carreira (Abbad & Mourão, 2010) e da inexistência de políticas públicas que ampliem as oportunidades de acesso desses psicólogos aos programas de pós-graduação stricto sensu, e que facilitem a construção de itinerários formativos mais consistentes e integrados.

 

Considerações finais

O presente estudo teve por objetivo avaliar a formação em Psicologia a partir da percepção de egressos do curso em diferentes momentos de carreira. Os resultados obtidos apontam para uma formação ainda deficiente, voltada majoritariamente para a clínica como já havia sido sinalizado por Gondim et al. (2010), sem atender às mudanças e demandas do mundo do trabalho e com baixo desenvolvimento de competências relativas aos processos psicológicos grupais e organizacionais ou competências de pesquisa científica e de atuação multidisciplinar – sendo que essas duas últimas sequer aparecem nos discursos dos pesquisados. Esta pesquisa confirma resultados de outros estudos que também encontraram indícios de fragilidades nos cursos de graduação em Psicologia no Brasil (Lisboa & Barbosa, 2009; INEP, 2015; Travassos & Mourão, 2017). O fato de ter incluído na pesquisa não apenas egressos que atuam como psicólogos, mas também os que decidiram não atuar na área, apontou alguns insights que ajudam a entender por que cerca de um terço dos que concluem a graduação não fazem seu registro no CFP e não exercem a profissão. Os resultados sugerem que alguns deles não se sentem seguros para atuar como psicólogos e avaliam que a graduação não os preparou de forma consistente (nem mesmo para a subárea clínica, que é reconhecida por eles como a mais enfatizada nos cursos), conforme constatado em alguns depoimentos. Houve também alguns depoimentos de falta de oportunidade para atuar na área ou da pouca valorização da profissão. Contudo, os discursos de alguns dos que não atuam na área era pouco articulado, com dificuldades para discorrer sobre os fenômenos associados à Psicologia. Nesse sentido, fica o questionamento sobre o quanto alguns desses entrevistados possuíam condições e conhecimentos mínimos necessários ao ingresso em cursos de graduação em Psicologia.

Entre as principais conclusões do estudo estão as lacunas no desenvolvimento de competências profissionais, com uma demanda de maior interação entre conhecimento teórico e vivência prática, embora com experiências muito ricas – na percepção dos egressos – em relação aos SPAs mantidos pelas IES. As experiências de estágio também foram citadas entre as mais relevantes da graduação, reforçando a discussão sobre a necessidade de compatibilização entre teoria e prática ao longo da formação. Assim, chama a atenção o fato de as categorias com maiores citações serem justamente aquelas voltadas para a atuação prática durante a formação, quer seja nos SPAs (citado por 21 entrevistados – 95%), quer seja pelos estágios (mencionado por 16 entrevistados – 73%).

O fato de o conteúdo central das competências mais desenvolvidas estar no atendimento clínico, com destaque para competências interpessoais e psicanálise, sugere que a formação, a despeito das alterações ocorridas há mais de uma década em suas diretrizes, precisa se pensar e se modernizar. Há um distanciamento entre o que é ensinado nos cursos e o que é demandado pelo mercado de trabalho. Embora a maioria da atuação profissional dos psicólogos permaneça na área clínica, ela responde atualmente por cerca da metade da atuação de quem se formou em Psicologia (Gondim et al., 2010), nesse sentido, há um considerável desfalque de competências para todos aqueles que pretendem atuar em outras subáreas.

Nesse sentido, entre as implicações oriundas do presente estudo, devem ser destacadas a necessidade de revisão dos projetos pedagógicos, tanto no sentido de construir maior interface entre teoria e prática, como no sentido de ampliar os conhecimentos em processos psicológicos que vão além do indivíduo e do contexto clínico. A formação do ponto de vista epistemológico e social também carece de reflexões, pois evidencia-se a adesão a determinadas correntes teóricas – em especial a psicanálise – em detrimento de uma visão mais ampla que permita aos estudantes realizar escolhas profissionais mais fundamentadas.

Entre as limitações deste estudo está o fato de incluir apenas 22 profissionais e todos residentes no estado Rio de Janeiro. Em que pese o fato de os resultados obtidos encontrarem ressonância em diversos estudos sobre a formação em Psicologia realizados em outros estados ou com abrangência nacional, seria importante que novas pesquisas considerassem amostras mais amplas de egressos, quer seja no número de pessoas ouvidas, quer seja na abrangência geográfica do estudo. Também seriam indicadas pesquisas focalizando o processo de desenvolvimento profissional dos psicólogos, considerando não apenas a formação graduada, mas experiências que tiveram ao longo da carreira, os elementos que mais contribuíram para a sua aprendizagem durante o exercício profissional e as possíveis barreiras que identificaram no exercício da profissão.

 

Referências

Abbad, G. S., & Mourão, L. M. (2010). Competências profissionais e estratégias de qualificação e requalificação. In A.V. B. Bastos, & S. M. G. Gondim (Orgs.). O trabalho do psicólogo no Brasil (pp. 380-401). Porto Alegre: Artmed.         [ Links ]

Bardin, L. (2006). Análise de conteúdo. (L. de A. Rego & A. Pinheiro, Trads.). Lisboa: Edições 70. (Obra original publicada em 1977).         [ Links ]

Barletta J. B., Fonseca A. B. Z, & Delabrida, N. C. (2012).A importância da supervisão de estágio clínico para o desenvolvimento de competências em terapia cognitivo-comportamental. Psicologia: Teoria e Prática,14(3), 153-167. Recuperado de http://pepsic.bvsalud.org/pdf/ptp/v14n3/v14n3a13.pdf, acesso em 20/10/2017.         [ Links ]

Bastos, A. V. B., Gondim, S. M. G., & Rodrigues, A. C. A. (2010). Uma categoria profissional em expansão: quantos somos e onde estamos? In A. V. B. Bastos, & S. M. G. Gondim (Orgs.). O trabalho do psicólogo no Brasil (pp. 32 - 44). Porto Alegre: Artmed.         [ Links ]

Bastos, A. V. B., Gondim, S. M. G., Souza, J. A. J., & Souza, M. P. R. (2011). Formação básica e profissional do psicólogo: uma análise do desempenho das IES no Enade. Avaliação Psicológica, 10(3), 313-347. Recuperado de http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1677-04712011000300006&lng=pt&tlng=, acesso em 10/01/2018.         [ Links ]

Bernardes, J. S. A. (2012). Formação em Psicologia após 50 anos do Primeiro Currículo Nacional da Psicologia: alguns desafios atuais. Psicologia: Ciência e Profissão, 32(num.esp.), 216-231. doi: 10.1590/S1414-98932012000500016        [ Links ]

Bernardo, M. H., Oliveira, F., Souza, H. A., & Sousa, C. C. (2017). Linhas paralelas: as distintas aproximações da Psicologia em relação ao trabalho. Estudos de Psicologia (Campinas), 34(1), 15-24. doi: 10.1590/1982-02752017000100003        [ Links ]

Bernardo, M. H., Sousa, C. C., Garrido-Pinzón, J. H., & Souza, H. A. (2015). A práxis da psicologia social do trabalho: reflexões sobre possibilidades de intervenção. In M. C. Coutinho, O. Furtado, & T. R. Raitz (Orgs.), Psicologia social e trabalho: perspectivas críticas (pp.16-39). Florianópolis: Abrapso.         [ Links ]

Bickman, L., & Ellis, H. (Eds.). (2017). Preparing psychologists for the 21st century: Proceedings of the National Conference on Graduate Education in Psychology. Routledge.         [ Links ]

Borges, V. C. (2013). Desafios para o futuro da Psicologia: contribuições da Psicologia na construção do conhecimento no século XXI. Psicologia: Ciência e Profissão, 33, 14-23. Recuperado de http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1414-98932013000500003&lng=en&tlng=pt., em 10/01/2018.         [ Links ]

Cândido, G. V., & Massimi, M. (2012). Contribuição para a formação de psicólogos: análise de artigos de Carolina Bori publicados até 1962. Psicologia Ciência e Profissão, 32(num.esp.), 246-263. doi: 10.1590/S1414-98932012000500018.         [ Links ]

Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - Capes (2017). Ficha de Avaliação de Programas Acadêmicos. Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Programa Teoria Psicanalítica. Recuperado de https://sucupira.capes.gov.br/sucupira/public/consultas/avaliacao/viewPreenchimentoFicha.jsf?idFicha=7272&popup=true, acesso em 28/01/2018.         [ Links ]

Conselho Federal de Psicologia (2018). Levantamento de informações sobre a inserção dos psicólogos no mercado de trabalho brasileiro. Recuperado de http://www2.cfp.org.br/infografico/quantos-somos/, em 15/01/2018.         [ Links ]

Conselho Federal de Psicologia (2016). Resolução Nº 03, de 05 de fevereiro de 2016. Altera a Resolução Nº 013/2007, que institui a Consolidação das Resoluções relativas ao Título Profissional de Especialista em Psicologia e dispõe sobre normas e procedimentos para seu registro. Recuperado de https://site.cfp.org.br/wp-content/uploads/2016/04/Resolu%C3%A7%C3%A3o-003-2016.pdf, em 18/12/2017.         [ Links ]

Cruz, R. M., & Schultz, V. (2009). Avaliação de competências profissionais e formação de psicólogos. Arquivos Brasileiros de Psicologia, 61(3), 117-127. Recuperado de http://pepsic.bvsalud.org/pdf/arbp/v61n3/v61n3a13.pdf, acesso em 20/10/2017.         [ Links ]

Ferrarini, N., & Camargo, D. (2012). O sentido da Psicologia e a formação do psicólogo: um estudo de caso. Psicologia & Sociedade, 24(3), 710-719. doi: 10.1590/S0102-71822012000300024         [ Links ]

Furtado, O. (2012). 50 anos de Psicologia no Brasil: a construção social de uma profissão. Psicologia: Ciência e Profissão, 32(num. esp.), 66-85. doi: 10.1590/S1414-98932012000500006        [ Links ]

Gondim, S. M. G., Bastos, A. V. B., & Peixoto, L. S. A. (2010). Áreas de atuação, atividades e abordagens teóricas do psicólogo brasileiro. In S. M. G. Gondim, & A. V. B. Bastos (Orgs.). O Trabalho do Psicólogo no Brasil. (pp. 174-199), Porto Alegre: Artmed.         [ Links ]

Guareschi, N. M. de F., Wendt, G. W., & Dhein, G. (2011). As atividades de pesquisa, extensão e monitoria na formação em Psicologia. Avaliação Psicológica, 10(3), 387-403. Recuperado de http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1677-04712011000300009&lng=pt&tlng=pt, acesso em 23/11/2017.         [ Links ]

Guedes, C. F., Motta, C. G., Sato, F. G., Scarcelli, I. R., & Sanches, P. R. P. (2009). Ensino, Pesquisa e Extensão na Formação em Psicologia: a experiência na Bandeira Científica. TransFormações em Psicologia, 2(2), 32 - 50. Recuperado de http://pepsic.bvsalud.org/pdf/transpsi/v2n2/a02.pdf, acesso em 20/10/2017.         [ Links ]

Hüning, S. M., Silva, A. K., Silva, W. V. N., & Lessa, F. M. S. (2013). Formação em saúde nos cursos de Psicologia em Alagoas. Revista Psicologia em Estudo, 18(1),157-167. doi: 10.1590/S1413-73722013000100016         [ Links ]

Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira – Inep (2015). Relatório do Exame Nacional de Desempenho de Estudantes – Ano 2012 - Curso de Psicologia. Recuperado de http://download.inep.gov.br/educacao_superior/enade/relatorio_sintese/2012/2012_rel_psicologia.pdf, acesso em 23/11/2017.         [ Links ]

Lima, M. J., & Cerveny, C. M. O. (2012). A competência social do Psicólogo: estudo com profissionais que atuam em instituições. Psicologia: Ciência e Profissão, 32(2), 284-303. doi: 10.1590/S1414-98932012000200003        [ Links ]

Lins, L. F. T., Silva L. G., & Assis, C. L. (2015). Formação em Psicologia: perfil e expectativas de concluintes do interior do Estado de Rondônia. Gerais: Revista Interinstitucional de Psicologia, 8(1), 49-62. Recuperado de http://pepsic.bvsalud.org/pdf/gerais/v8n1/v8n1a05.pdf, acesso em 20/10/2017.         [ Links ]

Lisboa, F. S. & Barbosa, A. J. G. (2009). Formação em Psicologia no Brasil: um perfil dos cursos de graduação. Psicologia: Ciência e Profissão, 29(4), 718-737. doi: 10.1590/S1414-98932009000400006        [ Links ]

Littlefield, L. (2016). Psychology Education and Training: A future model. Australia Psychology Society. Recuperado de https://www.psychology.org.au/inpsych/2016/april/feature/, acesso em 23/01/2018.         [ Links ]

Macedo, J. P., & Dimenstein, M. (2011). Expansão e interiorização da Psicologia: reorganização dos saberes e poderes na atualidade. Psicologia: Ciência e Profissão, 31(2), 296-313. doi: 10.1590/S1414-98932011000200008        [ Links ]

Mazer, S. M., & Melo-Silva, L. L. (2010). Identidade profissional do psicólogo: uma revisão da produção científica no Brasil. Psicologia: Ciência e Profissão, 30(2), 276-295. Recuperado de http://pepsic.bvsalud.org/pdf/pcp/v30n2/v30n2a05.pdf, acesso em 20/10/2017.         [ Links ]

Mourão, L., & Abbad, G. (2016). As lacunas de competências na formação em Psicologia e os riscos para a atuação profissional. In A. B. Soares, L. Mourão, & M. P. E. Mota (Orgs.). O estudante universitário brasileiro: características cognitivas, habilidades relacionais e transição para o mercado de trabalho. Curitiba: Appris.         [ Links ]

Oliveira, P. S. & Guzzo, R. S. L. (2014). A formação do psicólogo no Brasil: compromissos com a realidade? Anais do XIX Encontro de Iniciação Científica, Campinas, SP, Brasil. Anais... Campinas: PUC-Campinas, 1-6. Recuperado de file:///C:/Users/romul/Downloads/2014812_171245_216507370_resesu%20(1).pdf, acesso em 20/10/2017.         [ Links ]

Poppe, A. R. S., & Batista, S. H. S. S. (2012). Formação em Psicologia no Contexto das Diretrizes Curriculares Nacionais: Uma Discussão sobre os Cenários da Prática em Saúde Psicologia Ciência e Profissão, 32(4), 986-999. doi: 10.1590/S1414-98932012000400016         [ Links ]

Resolução Nº 5, de 15 de março de 2011. (2011). Brasília, DF: Ministério da Educação. Recuperado de http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_docman&view=download&alias=7692-rces005-11-pdf&Itemid=30192        [ Links ]

Travassos, R., & Mourão, L. (2017). Resultados do Enade e Avaliação da Formação em Psicologia. Avaliação Psicológica, 16(3), 318-327. doi: 10.15689/ap.2017.1603.12576         [ Links ]

Travassos, R., & Mourão, L. (2018). Lacunas de Competências de Egressos do Curso Psicologia na Visão dos Docentes. Psicologia: Ciência e Profissão, 38(2), 233-248. doi: 10.1590/1982-3703004472016        [ Links ]

Yamamoto, O. H. (2012). 50 anos de profissão: responsabilidade social ou projeto ético-político? Psicologia: Ciência e Profissão, 32(num. esp.), 6-17. doi: 10.1590/S1414-98932012000500002        [ Links ]

Yamamoto, O. H., & Oliveira, I. F. (2010). Política Social e Psicologia: uma trajetória de 25 anos. Psicologia: Teoria e Pesquisa, 26, 9-24. doi: 10.1590/S0102-37722010000500002         [ Links ]

Yamamoto, O. H., Souza, J. A. J de, Silva, N., & Zanelli, J. C. (2010). A formação básica, pós-graduada e complementar do psicólogo no Brasil. In A. V. B. Bastos , & S. M. G. Gondim (Orgs.), O trabalho do psicólogo no Brasil, Porto Alegre: Artmed.         [ Links ]

Ziliotto, D. M., Benvenutti, J., Matiello, M., & Peil, S. (2014). Concepções e expectativas de estudantes de Psicologia sobre sua futura profissão. Gerais: Revista Interinstitucional de Psicologia, 7(1), 82-92. Recuperado de http://pepsic.bvsalud.org/pdf/gerais/v7n1/v7n1a08.pdf, acesso em 20/10/2017.         [ Links ]

 

 

Endereço para correspondência:
Luciana Mourão
Rua Marechal Deodoro, 217 – 2º andar – Centro
Niterói – Rio de Janeiro
CEP: 24030-060
Fone: (21) 98886.6764
E-mail: mourao.luciana@gmail.com

Recebido: 31/01/2018
1ª Reformulação: 20/06/18
Aceito: 20/01/2020

 

 

Sobre os autores:
Luciana Mourão é Doutora em Psicologia pela Universidade de Brasília, professora da Universidade Salgado de Oliveira, Programa de pós-graduação em Psicologia, Niterói – Rio de Janeiro – Brasil
E-mail: mourao.luciana@gmail.com
Rômulo Travassos é Doutor em Psicologia pela Universidade Salgado de Oliveira, professor da Universidade Estadual do Maranhão – Departamento de Administração, São Luís – Maranhão – Brasil
E-mail: romulo.travassos.silva@gmail.com
Gardênia da Silva Abbad é Doutora em Psicologia pela Universidade de Brasília, professora da Universidade de Brasília, Programa de pós-graduação em Psicologia Social, do Trabalho e das Organizações, Brasília – Distrito Federal – Brasil
E-mail: gardenia.abbad@gmail.com
Luara Carvalho é Mestre em Psicologia pela Universidade Salgado de Oliveira, Niterói – Rio de Janeiro – Brasil
E-mail: luacrc@hotmail.com

Creative Commons License