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Mental

versão impressa ISSN 1679-4427versão On-line ISSN 1984-980X

Mental v.5 n.8 Barbacena jun. 2007

 

RESENHAS

 

 

Jordana de Paula da Silva; Naiara Guimarães Gasparoni*

Universidade Presidente Antônio Carlos - Brasil

 

 

LA TAILLE,Yves de. Moral e Ética: dimensões intelectuais e afetivas. Porto Alegre: Artmed, 2006. 192 p. ISBN 85-363-0659-9

Yves de La Taille, professor do Instituto de Psicologia da USP, estudioso da chamada Psicologia Moral e também autor do livro Vergonha, a ferida moral, reuniu seus conhecimentos para escrever Moral e Ética: dimensões intelectuais e afetivas.

O livro reúne as leituras, pesquisas e reflexões de Yves de La Taille e trabalha com uma nova perspectiva de moral e ética. O autor mostra que esses conceitos surgem desde cedo na vida do indivíduo.

A obra está dividida em três capítulos. O primeiro, intitulado Moral e Ética, tem como objetivo apresentar conceitos úteis para a compreensão das ações morais. Nele são avaliadas as relações entre razão e afetividade para que se possam diferenciar os conceitos de moral e de ética. Para isso, La Taille se utiliza de quatro abordagens representativas da Psicologia Moral: Emile Durkheim, a de Sigmund Freud, a de Jean Piaget e a de Lawrence Kohlberg. Os dois primeiros autores estão ligados às questões afetivas dos comportamentos morais. Já os dois últimos enfatizam a questão racional e aproximam a moral da igualdade, da reciprocidade e da justiça.

Durkheim afirma que as condutas morais se dão pelo sentimento do sagrado, inspirado pela sociedade, ou seja, o obedecimento aos mandamentos de um ser superior, temido e desejado. Para Freud, a consciência moral tem raízes inconscientes, que pode se explicar por forças afetivas. Piaget, por sua vez, procurou identificar o que seria comum aos indivíduos. No que concerne ao desenvolvimento moral, identificou dois estágios: heteronomia (respeito às figuras de autoridade) e autonomia (separação da obediência que se tem na heteronomia). Kohlberg complementou a teoria de Piaget sobre o desenvolvimento da moral, que, para ele, ocorre devido ao desenvolvimento da razão.

O autor ainda analisa as raízes epistemológicas das palavras ética e moral. Ele esclarece que por moral devemos entender o fenômeno social, e por ética, a reflexão filosófica.

Para aprofundar sua análise, La Taille distingue plano moral de plano ético. O primeiro se trata de uma realidade psicológica, que se manifesta pelo dever, pela obrigatoriedade. Desta forma, a ética contém a moral, pois cabe à moral regrar a vida em sociedade.

Entre as virtudes abordadas na obra, apresenta-se a justiça, que inspira igualdade, e a eqüidade, que implica tornar iguais os diferentes. O autor se refere também à generosidade, virtude altruísta que consiste em dar ao outro o que lhe falta, e, por fim, à honra, que exige reconhecimento e respeito do ser humano, estabelecendo a qualidade de suas ações.

No capítulo dois, intitulado Saber fazer moral: a dimensão intelectual, o autor afirma que o "saber fazer moral" interessa tanto à moral em si quanto à ética e, nesse sentido, não é possível defender uma ética sem moral. Segundo La Taille, a tarefa da razão é interpretar as ações; ela deve estar presente para "calcular" e prever suas conseqüências. Para o agir moral, deve-se conhecer regras, princípios e valores morais, mas a ação moral independe do conhecimento e deve considerar a consciência dos valores subjetivos rumo a um projeto de vida e de felicidade que move as ações. A cultura em que vivemos dificulta o pensamento crítico e renovador. O conhecimento de novas culturas aprimora nossa moral e oferece novas oportunidades para o pensar.

O autor Yves de La Taille aborda o tema do equacionamento moral afirmando que o indivíduo deve ter conhecimento de regras, princípios e valores morais, analisá-los e hierarquizá-los para a tomada de decisão. Para o equacionamento moral não existe somente uma opção de moral correta, e esse equacionamento se traduz pela reflexão. Juntamente com ele devem estar presentes a sensibilidade moral e a percepção das dimensões morais que não se apresentam com clareza. A sensibilidade moral está ligada ao espírito de justiça.

O desenvolvimento do juízo moral, exposto no livro está de acordo com as teorias de Jean Piaget e Lawrence Kohlberg. Os autores postulam que o desenvolvimento moral se dá por estágios, que estão presentes desde a infância, nos dos traços de moralidade. São eles: a anomia, a heteronomia e a autonomia.

A anomia corresponde ao estágio em que a criança ainda não conhece a moralidade. A heteronomia se dá por duas vias: a compreensão das regras e sua fonte de legitimidade. A autonomia refere-se à justiça e ao respeito mútuo. Kohlberg retoma as idéias de Piaget e redefine os estágios em níveis pré-convencional, convencional e pós-convencional. No nível pré-convencional, a criança responde aos rótulos de bom ou ruim, certo ou errado, de acordo com as conseqüências de suas ações. No nível convencional, a criança responde às expectativas da família, de acordo com as vivências sociais. No nível pós-convencional, ela infere as dificuldades e faz grande esforço para definir valores próprios, independentes das autoridades.

No terceiro e último capítulo, O querer fazer moral: a dimensão afetiva, Yves de La Taille relata que o sentimento moral de obrigatoriedade é composto e alimentado por outros sentimentos. Esse capítulo contém duas partes: a primeira, que fala sobre o despertar do senso moral, trabalha com o papel da afetividade desde o surgimento da moralidade; a segunda parte retrata a construção do auto-respeito.

Os sentimentos abordados no livro e analisados em crianças são o medo e o amor. Tais sentimentos inspiram respeito. Assim, a criança respeita seus pais porque sente por eles, ao mesmo tempo, medo e amor em uma relação de autoridade. Para haver confiança em alguém é preciso considerar a moralidade que essa pessoa possui. Dessa forma, honra e auto-respeito estão relacionados com o merecer confiança, e esta, por sua vez, implica a dimensão moral.

A simpatia será abordada pelo autor em termos de sensibilidade por idéias e sentimentos alheios e não no sentido de ser agradável. De acordo com o autor, a simpatia não pode ser imposta, mas deve estar ligada a atos de generosidade que permitam explicar as atitudes morais.

A indignação se refere ao conteúdo preciso da moral, a justiça. É através da indignação que o indivíduo se coloca como sujeito de direitos.

O autor coloca a culpa como sentimento genuinamente moral. A capacidade de sentir culpa está relacionada ao ato de assumir responsabilidades e perceber-se como sujeito moral.

A vergonha é o último sentimento analisado. O autor considera que ela está, ao mesmo tempo, nos planos ético e moral e é responsável pelo auto-respeito. Esse sentimento aparece desde os dois anos de idade. Segundo La Taille, aquele que a sente possui imagem negativa de si próprio, ou seja, sente vergonha do que é. A vergonha é um sentimento inerente a todo ser humano; o que muda e diferencia a vergonha de pessoa para pessoa é a experiência de senti-la.

O livro ainda disponibiliza um apêndice que fala sobre a pesquisa Os valores de jovens de São Paulo. Nela, participam 5.160 alunos de instituições particulares e públicas de Ensino Médio. A pesquisa contextualiza o pensamento de jovens em relação à influência que sofrem de pais e de professores, no que diz respeito à formação moral e ética, e conclui que estão em estado de anomia.

Moral e Ética: dimensões intelectuais e afetivas é indicado aos que procuram informações sobre os conteúdos de ética e moral, aos profissionais de Psicologia (visto que trabalham com o conceito de Psicologia Moral) e até mesmo ao público leigo. Escritos em linguagem de fácil compreensão, os muitos exemplos e as pesquisas trazidas pelo autor colaboram para o entendimento das dimensões de moral e ética.

 

 

*Alunas do 5º período de Psicologia da UNIPAC - Ubá

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