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Mental

Print version ISSN 1679-4427On-line version ISSN 1984-980X

Mental vol.5 no.9 Barbacena Nov. 2007

 

RESENHAS

 

 

Camila da Silveira Ferreira*

Universidade Presidente Antônio Carlos - Brasil

 

 

GOMES, Isabel Cristina. Uma clínica específica com casais: contribuições teóricas e técnicas. São Paulo: Escuta/Fapesp, 2007. 124 p. ISBN: 978-85-7137-260-3.

A psicóloga Isabel Cristina Gomes é doutora em Psicologia Social pela USP e professora associada da Universidade. Atua na área de psicoterapia psicanalítica com casais, trabalhando especialmente com os temas sintoma e família. Isabel é autora de diversos artigos, tais como: As relações de poder na família: um estudo de caso envolvendo a violência psicológica (2003), O casal e a família: abordagens possíveis sobre as questões dos conflitos maritais e dos sintomas nos filhos como emergentes da relação conjugal disfuncional (2003), A avaliação psicológica infantil denunciando os conflitos do casal parental (2003) e das obras: O sintoma da criança e a dinâmica do casal (1998) e Uma clínica específica com casais: contribuições teóricas e técnicas (2007).

A obra Uma clínica específica com casais: contribuições teóricas e técnicas é o resultado de uma pesquisa (tese de livre docência) desenvolvida na Clínica Escola "Durval Marcondes" da Universidade de São Paulo (USP) por Isabel Cristina e estagiários, aos quais a autora se refere como "futuros terapeutas de casal e de família". Essa pesquisa se iniciou em 1998 como uma proposta interventiva aos pais, ou ao casal, embasada em um referencial teórico de psicoterapia breve psicanalítica, que engloba o diagnóstico familiar, a psicoterapia familiar e o diagnóstico infantil.

Especificamente, esse trabalho teve como objetivo enfocar a dinâmica das relações conjugais e familiares. A autora parte dos sintomas apresentados pelos filhos, levados até ela pelo casal. Na maioria dos casos, a psicóloga diagnostica os problemas e faz a análise terapêutica do casal ou de toda a família.

Isabel aponta que os sintomas apresentados pela criança, em muitos casos, são resultados do tipo de relação vivenciada pelos pais, ou seja, as crianças, de forma geral, são apenas o espelho das dificuldades e dos problemas apresentados pelo casal. Assim, a atuação do terapeuta deve focalizar pontos como a saúde mental dos membros parentais, os papéis ocupados na família por seus membros, a patologia da relação conjugal, os papéis sociais do homem e da mulher na sociedade contemporânea, o aprendizado de mudanças e a criatividade conjugal (p. 54). Essa intervenção é necessária para atingir os objetivos de restituição ou de estabelecimento de boas condições de convívio e de manutenção familiar, além de tirar da criança o papel de "doente" e transformar a demanda em atendimento ao casal, fazendo-os aceitar a verdadeira situação em que se encontram.

Suas análises se baseiam, de modo geral, em casais que apresentam sintomas de alcoolismo (apenas um dos cônjuges), em conflitos edípicos, em problemas familiares sérios como a ocorrência de doenças graves (em um dos cônjuges), perda de filho, violência doméstica, casais com filhos adotivos, entre outros. Esses sintomas se fundamentam em diferentes pontos, como, por exemplo, problemas transgeracionais: "a história familiar herdada das gerações anteriores faz-se presente na formação do psiquismo do indivíduo" (p. 57). Dessa forma, exige-se uma readaptação do casal, pois a estabilidade no casamento depende da flexibilidade com a qual cada um responde suas diversas necessidades.

Isabel discorre, em sua obra, sobre os diversos casos clínicos por ela analisados. Relata-os, em sua maioria, desde a chegada do casal ao consultório (muitas vezes estimulado pelo o que diziam ser "o problema apresentado pela criança"), passando pela avaliação da criança até chegar à descrição de todos os aspectos da psicoterapia com o casal, além de tecer considerações a respeito do indivíduo no contexto da família. Para suas análises psicoterapêuticas (que têm durações diferenciadas), a autora fundamenta-se na psicanálise e tem, como alicerces principais, as teorias de Freud e Winnicott, além de outros autores que fortalecem e ampliam as idéias freudianas e da psicanálise vincular. A autora ainda complementa seus estudos com fundamentos psicossociais que direcionam as mudanças ocorridas na sociedade atual.

Por fim, a autora relata que, diante das dificuldades apresentadas pelos casais, o terapeuta deve se adequar aos limites deles, aceitando as falhas, os ganhos e até mesmo o fato de quererem desistir do trabalho de análise, sem que isso venha a prejudicar seu próprio modo de agir, que deve ter como foco principal a elucidação dos problemas do casal, por meio da indicação de caminhos que solucionem ou amenizem as dificuldades vividas.

Isabel acredita que o papel do terapeuta é melhorar a interação do casal, valorizar seus comportamentos positivos, desenvolver suas habilidades de resolução de problemas, mudar determinados padrões de comportamento e de crenças no relacionamento. Essas conquistas levariam o casal a encontrar a satisfação conjugal, por meio da ação, ou seja, o terapeuta deve agir para melhorar significativamente a comunicação, o entendimento mútuo e até mesmo a vida sexual, bem como a harmonia da família.

É necessário fortalecer tais bases, já que, além dessas questões, o casamento é influenciado pelas condições socioeconômicas do mundo pós-moderno. Nele tem havido quebra de valores, antes tidos como verdadeiros dogmas (hoje se observam separações, novos casamentos, filhos que passam a ter "novos irmãos", o que não era comum em tempos passados). Há, também, a destruição de paradigmas e a presença do consumismo, fatores que não só desestruturam o casal, como toda a família, causando sofrimento geral, principalmente à criança.

A psicóloga encerra a obra apresentando os principais resultados obtidos nas terapias, destacando o papel e a importância do terapeuta no auxílio à busca pelo equilíbrio conjugal e observando que, acima de tudo, esse profissional é um ser humano com qualidades e limitações e também se encontra cercado pelas pressões e nuances do mundo moderno.

 

 

*Aluna do 8º período de psicologia da Unipac - Ubá

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