SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
vol.11 número21A juventude universitária na contemporaneidade: a construção de um serviço de atenção em saúde mental para estudantesO sabiá e sua memória de elefante índice de autoresíndice de assuntospesquisa de artigos
Home Pagelista alfabética de periódicos  

Mental

versão impressa ISSN 1679-4427versão On-line ISSN 1984-980X

Mental vol.11 no.21 Barbacena jul./dez. 2017

 

ARTIGOS

 

Formação interprofissional em saúde e o acolhimento a situações limites: compreensão do fenômeno do suicídio

 

Interprofessional education in health and the refuge to extreme situations: comprehension of the phenomenon of suicide

 

Formación interprofesional en salud y la recepción de situaciones límites: comprensión del fenómeno del suicidio

 

 

Renata Alves da CostaI; Maria Inês Badaró MoreiraII

IUniversidade Federal de São Paulo (UNIFESP); Mestranda no Programa de Pós-Graduação Interdisciplinar em Ciências da Saúde.
IIUniversidade Federal de São Paulo (UNIFESP); Professora no Depto. de Políticas Públicas e Saúde Coletiva e no Programa de Pós-Graduação Interdisciplinar em Ciências da Saúde.

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

Trata-se de uma pesquisa sobre o processo de formação do psicólogo e suas implicações na compreensão do fenômeno do suicídio. Pretende-se revelar a importância da formação interprofissional para o manejo de situações limites, destacando o comportamento suicida. A coleta de dados foi realizada por meio de entrevistas semiestruturadas com os estudantes do último ano do curso de Psicologia e foi feita a análise de conteúdo do material. Os dados indicam que, apesar da inovadora proposta de formação interprofissional da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP) propiciar subsídios para que seus estudantes enfrentem diversos desafios em seu campo de trabalho, ainda há necessidade de maior aproximação e suporte diante de sofrimentos psíquicos graves e situações limítrofes de alta complexidade como o suicídio. Conclui-se que este estudo pode vir a colaborar com transformações positivas no acolhimento ao revelar os desafios para condução de um plano de cuidados para pessoas que vivenciem essas situações nos serviços de saúde.

Palavras-chave: formação em Psicologia; cuidado em saúde; ensino; suicídio; saúde mental.


ABSTRACT

This research is about the psychologist’s training process and its implications in the comprehension of the suicide’s phenomenon. It is intended to reveal the importance of the interprofessional education to handling extreme situations focusing on the suicidal behavior. The data collection was conducted through semi-structured interviews with students of the final year of Psychology with the material content analysis. The data indicate that despite the innovative proposal to providing the interprofessional education of Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP) grants to the students a way to face many challenges in their work field, there is still need for greater approximation and support facing severe psychic suffering and borderline situations of high complexity as suicide. It is concluded that this study can contribute to positive changes in the host to reveal the challenges to guiding a care plan to the people that experience these situations in the health services.

Keywords: training in Psychology; health care; education; suicide; mental health.


RESUMEN

Se trata de una investigación sobre el proceso de formación del psicólogo y sus implicaciones en la comprensión del fenómeno del suicidio. Se pretende mostrar la importancia de la formación interprofesional para el manejo de situaciones límites, destacando el comportamiento suicida. Los datos fueron recogidos por medio de entrevistas semiestructuradas con los estudiantes del último año del curso de Psicología y fue realizado un análisis de contenido del material. Los datos indican que, a pesar de la innovadora propuesta de formación interprofesional de la Universidad Federal de São Paulo (UNIFESP) de propiciar subsidios para que sus estudiantes se enfrenten a diversos desafíos en su campo de trabajo, todavía existe una necesidad de mayor aproximación y apoyo frente a sufrimientos psíquicos graves y situaciones limítrofes de alta complejidad como el suicidio. Se concluye que este estudio podría contribuir con transformaciones positivas en la acogida al revelar los desafíos para llevar a cabo un plan de cuidados para personas que experimentan estas situaciones en los servicios de salud.

Palabras clave: formación en Psicología; cuidado de la salud; enseñanza; suicidio; salud mental.


 

 

1 INTRODUÇÃO

1.1 Comportamento suicida e formação do psicólogo

O comportamento suicida é um processo complexo pelo qual uma pessoa passa até chegar ao ato do suicídio em si, o que inclui a sua ideação e o seu planejamento até a ação (BRASIL, 2006). Segundo dados da Organização Mundial da Saúde (OMS), o suicídio é considerado um problema mundial de saúde pública — em 2003, cerca de 900 mil mortes foram registradas no mundo. Esse problema está entre as 3 maiores causas de morte entre jovens de 15 a 35 anos (BRASIL, 2006). Os mesmos dados revelam que, ao se analisar a taxa de suicídio por habitantes, o Brasil é considerado um país com baixo índice de ocorrências; porém, em números absolutos, a quantidade de mortes torna-se expressiva: está entre os dez países com maiores números absolutos de casos.

A Rede de Atenção Psicossocial (RAPS), instituída pela Portaria n.º 3088/2011, tem como finalidades a criação, a ampliação e a articulação de diferentes pontos de atenção à saúde em um desenho complexo de rede de cuidados para pessoas com sofrimento psíquico (BRASIL, 2011). Segundo o Ministério da Saúde (MS) (BRASIL, 2013), a Atenção Básica (AB) é a porta de entrada para o Sistema Único de Saúde (SUS), pois abrange a promoção e a proteção da saúde e a prevenção de agravos com o objetivo de desenvolver a atenção integral. Representa o primeiro acesso ao sistema, inclusive daqueles que demandam um cuidado em saúde mental. Desse modo, as práticas de AB são imprescindíveis ao cuidado na medida em que se voltam para necessidades individuais e coletivas em busca do resgate da singularidade dos usuários de saúde, compreendendo suas potencialidades, de forma a romper com práticas excludentes e patologizantes para abordagem do sofrimento psíquico.

Para o MS (2013), é estratégico que se inicie o cuidado em saúde mental pela equipe da AB, por sua proximidade e facilidade de acesso ao usuário — assim, é comum que os profissionais passem a lidar cotidianamente com situações de sofrimento psíquico intenso. Não raramente, a abordagem dessa clientela suscita dúvidas e receios na equipe que deveria acolhê-la, portanto, o cuidado em saúde mental é ainda timidamente realizado pelas equipes de AB, gerando um encaminhamento compulsório a serviços especializados — como Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) — e, consequentemente, uma saturação nos atendimentos desses. Com isso, perde-se a oportunidade de trabalhar em rede pelo matriciamento dos serviços.

Os princípios fundamentais da articulação entre atuações da saúde mental e AB se dirigem ao território em ações de corresponsabilização pelo cuidado construído com os CAPS. O CAPS é o articulador e ordenador do cuidado às pessoas com demandas decorrentes de sofrimento psíquico por meio de Projetos Terapêuticos Singulares (PTS), realizados em parceria com a AB. Cabe ao CAPS a regulação dos diferentes pontos da RAPS (BRASIL, 2011). Segundo os dados do MS (2016), até 2015, havia 2.328 serviços da modalidade CAPS habilitados. Devido à complexidade do fenômeno, uma tentativa de suicídio mobiliza o trabalhador da saúde a se articular com outros profissionais para composição da rede.

É comum que o sujeito que tentou suicídio viva forte ambivalência no que se refere a dar fim à própria vida e ao desejo de ser ajudado. Segundo Figueiredo et al. (2012), o trabalho exige dos profissionais de saúde, não apenas sensibilidade e empatia, mas boa formação e planejamento de intervenções grupais e individuais. O olhar atento do psicólogo como profissional de saúde se faz valer nessa dinâmica; ele necessita sentir-se seguro e amparado em sua formação para que possa dar o suporte necessário aos usuários de saúde mental que padecem por demandas de tamanha complexidade. É preciso debater as questões que permeiam o tema para uma atenção integrada e para a desmistificação de preconceitos, compreendendo o sujeito em sua subjetividade e integralidade.

O Conselho Federal de Psicologia vê necessidade de se repensar o papel do psicólogo e a sua atuação na área da saúde — especialmente nos serviços públicos — para que se atente aos determinantes sociais sobre o processo de saúde e cuidado. Para uma mudança efetiva tornou-se imprescindível reformular os cursos (CFP, 2006). A formação em Psicologia estava, historicamente, desconectada do trabalho nas políticas públicas desde sua regulamentação e institucionalização, em 1962, sendo alvo de preocupação dos profissionais da área. O perfil individualista e privatista dos atendimentos não satisfazia as necessidades das camadas populares. Assim, a atuação desse profissional tornou-se alvo de críticas, as quais levaram à busca por novas formas de ação (BOARINE; BORGES, 2009). Nos últimos anos, os profissionais desse núcleo têm atuado em maior consonância com essas políticas, além de protagonizar inovações com uso de tecnologias leves (MERHY, 2004) reconhecidamente pautadas na escuta, no acolhimento e no cuidado em saúde.

Para Figueiredo (1996), a formação em Psicologia deveria resguardar-se como campo múltiplo, com inúmeras possibilidades no que diz respeito às reflexões teóricas e filosóficas, na metodologia e na prática. A formação, portanto, não deve se dar de forma engessada, mas deve propiciar diálogos, questionamentos e reflexões, de maneira que se amplie as possibilidades de atuação ao se considerar o sujeito em sua dimensão biopsicossocial. Cabe também à formação promover posturas e visões de mundo que potencializem os sujeitos, reinventem saberes e rompam com as lógicas excludentes.

Tendo em vista tais questões, buscou-se refletir sobre a formação acadêmica de novos profissionais de saúde a partir da apreensão da complexidade dos fenômenos do sofrimento psíquico, especificamente o comportamento suicida. Teve-se como cenário uma proposta de formação em Psicologia inserida em plano pedagógico comum junto aos demais núcleos de conhecimento do campo da saúde da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP).

1.2 Uma proposta de formação de psicólogos em equipe interprofissional para a saúde

O Projeto Político Pedagógico em que se insere essa formação em Psicologia foi implementado em 2006, com a premissa da educação interdisciplinar na formação em saúde, do desenvolvimento de competências comuns para o trabalho em equipe interprofissional, da integralidade no cuidado e do aprofundamento em pontos específicos de cada núcleo de conhecimento. Atualmente, são oferecidos sete cursos: Nutrição, Psicologia, Fisioterapia, Terapia Ocupacional, Educação Física, Serviço Social e Bacharelado em Ciências do Mar, garantindo-se em todos esses a perspectiva interprofissional.

Para as profissões de saúde, a diretriz principal é o ensino em serviço com intervenções em equipes de serviços de saúde. Alguns de seus princípios direcionadores são: a indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão; as práticas profissionais como eixo norteador do projeto pedagógico; a interdisciplinaridade; a postura ativa do estudante na construção do conhecimento — tendo o docente o papel de mediador no processo ensino-aprendizagem —; a integração com a comunidade; e a pesquisa como propulsora do ensino e da aprendizagem. Dessa forma, a universidade firma um compromisso com a saúde pública e a necessidade da população e, ao romper com modelos disciplinares rígidos, amplia seus cenários de atuação e aprendizagem, integrando saberes (UNIFESP, 2006).

O ensino é divido em dois eixos principais: específico e comum. O comum diz respeito à formação de maneira ampliada e se subdivide em três eixos: "O Ser Humano em sua Dimensão Biológica", "O Ser Humano em seu Contexto Social" e "Aproximação ao Trabalho em Saúde". Nesses, as turmas são mistas, com alunos de todos os cursos — com exceção de Ciências do Mar, que segue proposta diferente —, e trabalha-se de forma interdisciplinar. O eixo específico — "Aproximação a uma Prática Específica em Saúde" —, por sua vez, refere-se ao conteúdo exclusivo de cada curso, seguindo suas Diretrizes Curriculares Nacionais. Essa nova proposta rompe com o ensino tradicional centrado em disciplinas e direciona-se para a formação de um perfil profissional que vá de encontro às reais necessidades da comunidade. O conteúdo é dado por meio de módulos que concentram áreas temáticas afins, sendo que os quatro eixos se articulam entre si (UNIFESP, 2006).

O eixo comum "O Ser Humano em sua Dimensão Biológica" constitui-se por dois núcleos: o primeiro trabalha o conhecimento biológico necessário a um profissional para atuação na área da saúde, e o segundo, mais específico, é onde se aprofundam conhecimentos a partir das necessidades de cada curso. Os módulos dos eixos comuns "O Ser Humano e sua Inserção Social" (IS) e "Aproximação ao Trabalho em Saúde" (TS) ancoram-se nas Ciências Humanas e Sociais e buscam a ampliação da percepção das necessidades e dos cuidados ao considerar a subjetividade do sujeito, buscando compreender a implicação das práticas sociais e as dimensões da vida humana — educação, trabalho, condições de vida, subjetividade, relações sociais — nas concepções de saúde/doença e na formação em saúde, superando uma visão fragmentada do sujeito e do adoecimento. Os conceitos de saúde e educação são compreendidos de forma ampliada, dando densidade às discussões e aumentando as possibilidades de ação.

O eixo comum TS se desenvolve com atividades teórico-práticas nos serviços e prevê a formação de profissionais com capacidade de reflexão crítica e ampla sobre os processos de saúde, doença e cuidado, não se restringindo ao tratamento de um sintoma, mas enxergando o indivíduo em sua totalidade. Esse eixo reforça a importância de uma postura ativa do indivíduo no processo de responsabilização pelo seu próprio cuidado e a capacidade em analisar o contexto sociocultural no qual se insere. Dessa forma, esse profissional se fará apto à elaboração de um projeto terapêutico singular que explore possibilidades de ação e considere a realidade e a condição do usuário do serviço (CAPOZZOLO et al., 2014). Esse eixo instrumentaliza o estudante para o relacionamento pessoal com o usuário/cliente e com os demais profissionais de saúde e o sensibiliza aos diferentes modos de vida e ao olhar e diálogo com o outro ao aproximá-lo da realidade social por meio de permanente articulação teórico-prática (UNIFESP, 2006).

Já o eixo específico "Aproximação a uma Prática Específica em Saúde" aborda o conteúdo específico de cada profissão. O curso de Psicologia tem a duração de cinco anos e ocorre em período integral; prima por uma visão integral da saúde ao considerar o sujeito em sua dimensão biopsicossocial, traz saúde, clínica e intervenção de forma articulada e indissociável, objetivando a formação de profissionais capacitados à prática da promoção à saúde e produção científica nessa área, aptos a problematizar situações vivenciadas no cotidiano das práticas de atenção à saúde. São trabalhadas questões como a história da profissão, as áreas de atuação e suas especificidades, a prática profissional, a ética, as diferentes abordagens teóricas, a forma que se dão as relações em diferentes contextos, o desenvolvimento humano, a psicologia relacionada à política, entre outras (UNIFESP, 2006).

Desde a implantação do SUS, em 1988, houve a preconização da integralidade no cuidado e a adoção de uma concepção ampliada do conceito de saúde, o que impactou diretamente a formação profissional, revelando a necessidade de mudança no currículo dos cursos para que esses viessem a se adequar às novas propostas. Apesar disso, somente a partir dos anos 1980, os psicólogos passaram a atuar nas Unidades Básicas de Saúde (UBS). Ainda que até a década de 1990 muitos psicólogos estivessem inseridos nas equipes de saúde, não havia tradição ou referência para atuarem no campo da saúde, o que os levaram a replicar práticas individualizantes e privatistas (SILVA, 1992; DIMENSTEIN, 2000; CARVALHO; YAMAMOTO, 2002).

No atual modelo preconizado pelo SUS, busca-se não apenas o mero aplacamento dos sintomas, mas a manutenção do bem-estar da pessoa em suas diferentes esferas; abandona-se a ideia dualista entre corpo e mente e retorna-se a um modelo complexo, que prima pela integralidade da pessoa. Essa perspectiva considera a vida constituída por diferentes esferas — as quais são interdependentes, influenciam uma a outra —, bem como as vivências da pessoa. Essas esferas são as diversas dimensões do ser biopsicossocial, como a família, o trabalho, os amigos, a comunidade, o bem-estar físico e psicológico, entre tantas outras questões que vão interagir entre si e levar aquela pessoa a criar uma identidade própria. Nessa perspectiva, o sofrimento é visto como uma ameaça de ruptura dessa integridade, uma força que desestabiliza uma ou mais esferas e acaba por afetar todo o sistema. Assim, a doença é vista como um fenômeno que atua sobre a complexidade do ser, configurando-se em uma nova esfera para inteirar o conjunto, afetando todo o indivíduo (BRASIL, 2013).

Diferentes estudos sobre o modelo de formação adotado por essa instituição indicam oportunidades em que os estudantes, desde o primeiro ano, vivenciam experiências práticas de cuidado em equipes interprofissionais, nas quais o cuidado é compreendido como um exercício em saúde compartilhado entre diferentes saberes, incluindo o saber do próprio usuário que dele demanda (ROBLE et al., 2012; MEDEIROS et al., 2014). Uma pesquisa realizada por Souto, Batista e Batista (2014) sobre a formação em Psicologia na UNIFESP verificou, por meio de relatos dos estudantes, a mesma percepção relatada pelos entrevistados desta pesquisa: o reconhecimento da importância do conhecimento interdisciplinar e integrado, do trabalho interprofissional e da humanização e integralidade no cuidado do usuário de saúde, considerando o campus como referência nesse aspecto, como altamente comprometido com as propostas de formação e atuação preconizadas pelo MS para atuação no SUS.

Tendo em vista o desafio de formação de novos profissionais para a área de saúde, cabe-nos investigar como se deu esse processo de formação, focando-nos na delicada temática do suicídio, um tema que comumente desperta certo receio e mitificação entre os estudantes. O objetivo deste artigo foi apresentar dados da investigação realizada com os concluintes do curso de Psicologia de 2014 da UNIFESP – Campus Baixada Santista, atentando principalmente aos conceitos e cuidados relacionados ao suicídio.

 

2 MÉTODO

Esta é uma pesquisa de caráter qualitativo. A entrevista semiestruturada foi utilizada como técnica de levantamento de dados. Esse modelo de entrevista baseia-se em um roteiro flexível elaborado pelo pesquisador, que facilita a abordagem e assegura que as hipóteses e os pressupostos serão abordados na conversa, ao mesmo tempo em que permite ao entrevistado trazer conteúdo que não fora previsto na elaboração do roteiro e, consequentemente, possibilita a formulação de novas hipóteses (MINAYO, 2010). As entrevistas foram gravadas em mídia digital e transcritas literalmente para a realização da análise de conteúdo das mesmas.

O método interpretativo utilizado neste trabalho foi a Análise de Conteúdo (BARDIN, 2011), que consiste na extensa leitura e sistematização do conteúdo apresentado para a caracterização e categorização de seus conteúdos, considerando- se a literatura pertinente ao tema. O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa, sob o Parecer n.º 749.908, de 13 de agosto de 2014.

 

3 ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS DADOS

Participaram desta pesquisa os 38 alunos concluintes do curso de Psicologia da UNIFESP – Campus Baixada Santista do ano de 2014. A amostra foi composta por jovens com idade entre 21 e 28 anos, sendo 31 do sexo feminino e 7 do sexo masculino.

Quanto ao objeto de estudo desta pesquisa — a abordagem e o cuidado ao indivíduo que apresenta comportamento suicida —: dentre os 38 entrevistados, 18 tiveram contato com esse tema em equipamentos de saúde e quase a totalidade — 35 alunos — afirmou que o suicídio foi insuficientemente abordado como temática específica, tratado em seu conjunto como sofrimento humano. Uma das possibilidades de análise de ausência dessa discussão pode estar em limitações pessoais e dificuldades em se trabalhar com a morte que se dá pelo próprio desejo da pessoa. Outra hipótese seria de que, dentre muitos sofrimentos psíquicos intensos, o profissional de Psicologia deveria se preparar para acolher o sofrimento independente de que nome ele tenha. Outra possibilidade ainda seria de que o tema está vinculado ao tabu que cerca o suicídio, relacionado a ideia de que falar sobre ele despertaria desejos pessoais da própria morte.

Eu acho que é um tema bem delicado, porque ele suscita uma série de questões que, às vezes, você não vai conseguir lidar [...] (A 02).

A gente discute temas como a morte em alguns contextos, mas o suicídio em si não é abordado (A 07).

Ainda que seja permeada por mitos, a vida de muitos participantes os expõem a ter contato muito próximo com o tema. Vinte e nove entrevistados afirmaram ter contato ou conhecerem alguém próximo que havia tentando o ato contra si. Entre eles, foram relatados nove casos na própria família — com os pais, avós, tios, primos —, inclusive com eles mesmos. Aqueles que tiveram situações com pessoas próximas relataram que a vida tende a se desestabilizar, necessitando buscar novos significados para a compreensão dessa perda.

Esse efeito é tão significativo que ter se relacionado com alguém que tirou sua própria vida faz-se um dos principais fatores de risco para o suicídio. Enquanto algumas famílias se veem convivendo sob o constante temor do suicídio de um ente querido, vivenciando, principalmente, os sentimentos de impotência e fracasso, outras sequer notam os sinais; em ambos os casos costuma-se relatar sentimentos de raiva e culpa, medo, tristeza, ansiedade, vergonha e saudades (CFP, 2013). Nos casos em que a família já lutara, por inúmeras vezes e por um longo período, contra o desejo e as tentativas de morte de uma pessoa, encontrando-se emocionalmente desgastada e fragilizada, pode ser que a consumação do suicídio traga um misto de alívio atrelado à culpa.

Ao se refletir sobre a postura e os sentimentos despertados diante de alguém que tentara suicídio ou de seus familiares e sobre como acreditavam que essa posição viria a interferir em sua atuação profissional, foram expressos sentimentos de medo e insegurança, disposição a uma postura acolhedora, empatia, inconformismo — dificuldade em admitir que uma pessoa seja capaz de dar fim à própria vida — e impotência — o sentimento de raiva/revolta foi relatado uma única vez. É importante considerar que alguns estudantes que já tiveram casos de suicídio/tentativa de suicídio na família, que outrora relataram sentimentos de raiva, revolta e inconformismo, na atualidade, na condição de "quase-profissionais", relatam a ressignificação do que sentiam frente à pessoa com tentativa de suicídio — principalmente, pelo fato de se imaginarem em uma relação profissional. Outros também colocaram que a formação em Psicologia os levou a um olhar mais sensível em relação a diversos aspectos do sofrimento psíquico, incluindo a dessa temática em particular.

A expectativa em relação a esses profissionais de Psicologia inseridos no campo da saúde é de que desenvolvam ações de cuidado integral, seja em relação à pessoa que tentou/se suicidou, seja em relação aos familiares — em geral, o luto por suicídio se dá com maior sofrimento se comparado a uma morte por doença ou acidente. Uma pequena parcela expressou claramente que seus sentimentos estavam em consonância com a que se espera de um profissional da Psicologia:

Eu tenho um pouco de receio [...], pois querendo ou não, é uma escolha da pessoa, [...] e até que ponto a gente como profissional tem obrigação [ou direito] em intervir... é uma escolha dela. Querendo ou não, a gente pode auxiliar, a gente pode influenciar, mas obrigar a pessoa a continuar suportando o que levou ao suicídio, não. Eu acho que muitas vezes essa é uma forma [de atuação] muito abrupta... é simplesmente evitar que ela cometa suicídio e "pronto, acabou, missão cumprida!". Mas dá o respaldo que a pessoa precisa para não tentar cometer suicídio outras vezes (A 22).

Parte considerável dos entrevistados expressou ambivalência no que diz respeito à postura que acreditam ser correta e aos sentimentos despertados diante dessa temática:

Eu vou muito no sentido de defender a vida, só que nesse ponto eu não tenho clareza, porque ao mesmo tempo que eu acho que a pessoa tem que ter o direito de escolher se ela quer continuar vivendo ou não, eu não consigo lidar com o "não quero viver". Eu, em teoria, defenderia o direito da pessoa escolher, mas na prática, o "não querer viver" me afeta muito e me faz querer que a pessoa viva (A 02).

A proposta da formação desses participantes é ancorada na experiência e no cotidiano dos serviços de saúde, em contínua articulação entre os problemas da vida prática e a conceitualização teórica, retornando para as experiências práticas. Busca-se romper com a fragmentação das atividades, recriando e compartilhando saberes com profissionais de diferentes áreas e até mesmo com os próprios usuários — entre as ferramentas utilizadas, encontram-se as narrativas, os diários de campo, a coordenação de grupos temáticos, o PTS, a leitura e discussão de textos, a reunião com as equipes do serviço de saúde para discussão de casos, entre outras.

Durante os módulos teórico-práticos do eixo TS, os estudantes são inseridos em comunidades com alta vulnerabilidade social e muitos de seus paradigmas e preconceitos são confrontados ao se depararem com outra realidade. Dessa forma, eles têm a oportunidade de investir em um problema real — as ações dos alunos são amparadas por um professor que acompanha as atividades nos serviços. Propõe-se conhecer as limitações do usuário e trabalhar como um propulsor no processo de sua autonomia no que se refere ao seu próprio cuidado, desconstruindo crenças e resignificando sua condição (CAPOZZOLO et al., 2014). Nesse processo, o estudante é colocado a paulatinamente superar suas próprias limitações e a assumir uma postura ativa, construindo uma escuta sensível ao se atentar ao discurso dos usuários e suas reais necessidades e a experienciar os desafios cotidianos e as potências de sua profissão.

Essa experiência de módulos comuns, aprofundados no eixo específico da Psicologia, tem reflexos importantes para o futuro profissional de saúde. Por estarem inseridos nas equipes de saúde, os alunos vêm construindo um trabalho no sentido do acolhimento e do cuidado, da construção de vínculos com usuários, familiares e ações territoriais, inclusive. Até por isso, a intensidade de afetações é relatada comumente, pois não estão isentos de compartilhar as emoções vividas pelos familiares da pessoa que tira/tenta tirar a própria vida.

Quando solicitados a citar sinais que acreditassem indicar intenção suicida, foram mencionados: o sentimento de desesperança/falta de perspectivas futuras; a depressão; a verbalização direta da intenção de se suicidar; o isolamento social; a tristeza profunda/estar deprimido — sem necessariamente se configurar um quadro depressivo; o discurso da pessoa de uma forma geral; ver sua própria vida como um estorvo; a ocorrência de um evento traumático; o pesquisar ou a necessidade da pessoa em conversar sobre a temática do suicídio, bem como tentativas anteriores de suicídio; outros transtornos, como esquizofrenia e transtorno afetivo bipolar; as mudanças repentinas no comportamento; os avisos e as cartas de despedida; e a automutilação e a compra de instrumentos para a realização do ato. Cinco entrevistados disseram não conseguir identificar nenhum sinal.

Segundo dados trazidos em um debate propiciado pelo Conselho Federal de Psicologia – CFP (2013), quando um indivíduo se suicida, cerca de seis a dez pessoas de seu convívio social sofrem forte impacto emocional, social e até econômico — número que aumenta caso consideremos, além da família, os amigos, os colegas do trabalho, da escola, do grupo religioso e os vizinhos. Para o CFP, a prevenção do comportamento suicida deve ser levada em conta desde a infância pela família, escola e comunidade, por meio da desconstrução do tabu em torno da morte, da valorização da vida e da preparação para o enfrentamento de dificuldades. Desse modo, também é primordial conseguir abordar e cuidar dos familiares.

Dos 38 entrevistados, todos reconhecem a RAPS como um local privilegiado para a busca de cuidados. A maior parte citou como serviços de acolhimento os CAPS, os hospitais gerais, o Centro de Valorização da Vida (CVV) e as UBS. Foram citados outros serviços especializados em saúde mental, o Serviço Escola de Psicologia e ONGs. A ação dos agentes comunitários de saúde e o matriciamento foram lembrados por três entrevistados. Por meio da rede se faria um acolhimento inicial em serviços como escola, assistência e atenção básica, pois esses têm maior contato com os usuários e, teoricamente, maiores condições de identificar as necessidades desses e, caso seja preciso, realizar os devidos encaminhamentos:

[...] a atenção básica faz parte da rede de saúde, então se a atenção básica identifica uma tentativa de suicídio ou ideação suicida, é papel do equipamento buscar com aquela pessoa e contatar o CAPS [...] encaminhar, mas acompanhar, porque a atenção básica é quem que tá ali no território, deve tentar entender a situação, ter um cuidado mais próximo, fazer um matriciamento com o CAPS (A 30).

A Estratégia de Saúde da Família é o serviço prioritário da AB, pelo seu acesso e conhecimento do território e suas demandas, bem como pela proximidade e possibilidade de vínculo com os usuários dos serviços. Apesar disso, é comum que os profissionais demonstrem insegurança e dúvidas quando se trata do atendimento de pessoas com demanda em saúde mental. O apoio para esse tipo de caso é dado aos serviços por meio do Núcleo de Apoio à Saúde da Família (NASF), em que equipes compostas por profissionais de diferentes áreas dão suporte em atendimento para determinado número de unidades — é também por meio do NASF que atua o psicólogo. Inserido nesse serviço, o psicólogo tem a possibilidade de intervir no modelo da Clínica Ampliada, o que lhe possibilita maior acesso ao usuário e potência em suas ações; por exemplo, nas visitas domiciliares pode conhecer melhor as demandas do território, de sua família e comunidade, o que lhe potencializaria na criação de um plano terapêutico singular ao analisar quais as esferas afetadas e preservadas, as possíveis causas do adoecimento e as possíveis formas de atuação. Nesse sentido, intervir sobre a sociodinâmica de um território é intervir sobre a vida de seus habitantes, pois trata-se também de uma esfera mutável, que se reconstrói nas relações, adquirindo características próprias (BRASIL, 2013).

Dos 38 entrevistados, apenas 5 se mostraram confiantes para fazer esse tipo de acolhimento, seja por já terem tido contato e a experiência ter sido satisfatória ou por não considerarem essa temática um desafio maior que outras relacionadas:

Eu acho que a gente está apto a atender qualquer tipo de caso, só que isso não significa que a gente tem de antemão estratégias elaboradas ou que a gente tenha passado durante as aulas com técnicas que contemplassem todo e qualquer tipo de demanda, pois a formação que a gente tem aqui nos convoca a estabelecer e criar dispositivos de improviso. Acho que essa questão está bem marcada aí durante a graduação, a gente teve que improvisar, seja nas idas de campo, seja nas relações com os usuários (A 21).

A atual necessidade de formação em Saúde exige um processo de aprendizagem capaz de explorar a teoria e a prática interdisciplinar, tendo por base a educação e as políticas públicas, e como objetivo final a produção de cuidado — inclui-se nesse processo a prevenção, pósvenção e promoção à saúde. Demandas não podem ser satisfeitas por um modelo estático, rígido; elas exigem formação permanente, flexível, que integre diferentes áreas e profissionais, que seja atenta às reais necessidades dos serviços, em que haja a articulação e valorização de diferentes saberes, firmando, assim, o processo da interdisciplinaridade. Ainda é comum encontrar profissionais formados sob uma perspectiva reducionista de fragmentação do saber, em que a educação interprofissional é negligenciada. No modelo de educação interprofissional, diferentes profissionais aprendem juntos sobre as formas e possibilidades de atuação um do outro, visando à complementaridade e à integralidade das ações e, consequentemente, potencializando o cuidado — prioriza-se, dessa forma, o trabalho em equipe interdisciplinar.

Foi ressaltada a angústia diante de uma situação que envolve suicídio, principalmente no caso de a pessoa revelar a intenção de tirar sua vida no momento do atendimento com o psicólogo. Ao longo da entrevista, dois estudantes que sofreram por casos de suicídio na família afirmaram que suas experiências pessoais lhes deram subsídios para trabalhar os sentimentos advindos dessa condição:

Não me considero preparado, mas tenho certa bagagem e história de vida pessoal; eu acredito que eu teria uma postura muito mais acolhedora, tanto com a pessoa quanto com os familiares. Mas eu acredito também, não pensando só na formação em Psicologia, mas pensando na formação em saúde proporcionada pelo eixo comum, que a gente pode ter uma conduta diferenciada com essas pessoas, um olhar humanizado, pensando na integralidade do cuidado para as pessoas (A 07).

Surgiram reflexões sobre a dificuldade em lidar com a morte, a deslegitimação do direito de morrer e do discurso da pessoa — achar que ela só quer "chamar a atenção" —, a tentativa de se evitar o suicídio a qualquer custo, o fato de os serviços de saúde mental só atentarem ao paciente caso considerem que haja algum transtorno psiquiátrico associado, a falta de interesse por parte dos serviços e a desvalorização do sofrimento:

Acho que tem ainda muitas visões moralistas, mas que elas não aparecem muito, porque as pessoas sabem, de certa forma, que você dizer algo que culpabiliza a pessoa ou que coloca ela no lugar de "coitado" não é o correto, não é o que se espera de um profissional de saúde, então aparece pouco, mas a gente lê nas entrelinhas uma certa moralização [...] é um tema que muitas vezes fica como tabu, e essas pessoas não se colocam no lugar de cuidador, de quem quer entender aquele sofrimento, quer entender aquilo e não passa para esfera do cuidado, às vezes (A 30).

Frente a situações vivenciadas pelos estudantes em seus campos de prática e estágio, sete entrevistados afirmaram ser essa uma questão muito relativa, variante de acordo com o profissional ou a instituição em questão. Foi destacado o desespero dos profissionais diante de uma situação limítrofe e a comoção da equipe diante desses casos. Falou-se sobre a grande empatia por parte de alguns profissionais e o preconceito por parte de outros.

Eu vejo que ainda existe uma questão de preconceito, a sensação que eu tenho é que as pessoas tratam a pessoa que teve uma tentativa de suicídio como um covarde, como alguém que desistiu (A 31).

Um dos entrevistados trouxe ainda a questão do preconceito em relação à família do paciente nos casos em que se julga que a desordem dessa influenciou na tentativa ou no ato suicida. Muitas vezes, os familiares ficam marcados por estigmas culturais, religiosos e sociais, que culpabilizam as pessoas em torno do sujeito que tira sua própria vida. Essa demanda poderia ser também abordada em outros equipamentos por diferentes profissionais:

O que eu vejo muito no hospital é que normalmente se tem pena da família e culpabilizam o paciente. A não ser nos casos em que a família tenha alguma questão, se está sendo acompanhada pelo Conselho Tutelar, CREAS, a família já tenha alguma questão social, algum problema do tipo, aí eles culpabilizam a família também, mas não deixam de culpabilizar o paciente (A 37).

Para o Conselho Federal de Psicologia (2013), evitar falar sobre o assunto dificulta a elaboração do sofrimento — essa hesitação pode se dar tanto por parte da pessoa em luto quanto pelas pessoas que compõem sua rede social e que se sentem constrangidas e confusas quanto se devem ou não conversar a respeito. Desse modo, a necessária articulação da Rede de Saúde é notória, pois, assim, poder-se-ia entrar em contato com os familiares nos diversos serviços, acolher a queixa desses e construir um plano de cuidados que, de fato, também os envolvam. Uma alternativa seria a realização de reuniões de grupo de famílias em equipamentos territoriais, nos quais as dificuldades são compartilhadas e acolhidas, onde a dor pode ser resignificada e também onde há a possibilidade de se desfazer mitos em torno do tema — um trabalho que pode ser realizado em qualquer um dos pontos da RAPS, não somente em serviços de saúde.

 

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Pelo depoimento dos estudantes, o projeto da UNIFESP, pautado por práticas integradas e de caráter interdisciplinar, proporcionou-lhes um processo de formação focado na produção de cuidado, que considera o sujeito em sua dimensão biopsicossocial e os prepara para enfrentar desafios. Há sustentada reflexão sobre diferentes equipamentos que poderiam acolher o sofrimento intenso, inclusive em casos limítrofes, como o debatido neste artigo. Apesar disso, ficou evidente a necessidade de se abordar temáticas específicas que se colocam como desafios em nossa sociedade — consequência disso é a sensação comum de não estar preparado para o acolhimento de casos que envolvam suicídio. Explorar temas como esse seria um convite para o cuidado ampliado à saúde.

Outro fator que chamou atenção na pesquisa foi a influência do percurso individual do entrevistado em seu posicionamento atual, pois afirmaram que, apesar do grande sofrimento, sua formação permitiu transformar a experiência pessoal em importante processo de rompimento com seu próprio sofrimento e ideias concebidas anteriormente. Os participantes, pela experiência de formação em serviço e a vivência no cotidiano profissional, compreenderam que lidam não somente com a dor do usuário, mas com a complexidade do sofrimento, inclusive a ambivalência de sentimentos na família e na equipe de saúde. Defendem também o trabalho articulado em rede e a composição de ações no território, uma vez que a dificuldade de lidar com a finitude leva, muitas vezes, à rejeição do discurso da pessoa que deseja dar fim à própria vida; sobrevém a sensação de impotência e tende-se a negar que aquele sentimento exista no outro.

Independente do equipamento em que desenvolveram suas atividades, os estudantes afirmam que a escuta atenta e interessada se mostra como principal aliada, pois a partir desse processo busca-se a resignificação dos sentimentos e a ampliação de visões. Assim, o sujeito poderia buscar outras saídas que não o suicídio — e, independente do que escolha nesse momento, ao menos foram-lhe abertas outras possibilidades. Dessa forma, é demandado ao profissional a atenção ao cuidado, de modo que esteja realmente interessado no sofrimento da pessoa, que atente à sua história e a como seu sofrimento afeta outras dimensões de sua vida. Essa postura é derivada de uma experiência transformadora, um trabalho diário e constante de buscar a compreensão da complexidade do sofrimento da pessoa.

Compreende-se que não há modelo de formação profissional que consiga abarcar todas as situações e dificuldades durante o percurso da graduação. Há que se desconstruir partes para acessar aberturas que possibilitem a compreensão do sofrimento e das dimensões da vida das pessoas por ele afetadas. O percurso se faz pela busca de novos caminhos, novos saberes, pelo despertar de novas dúvidas. Novos desafios surgem após a transposição dos velhos problemas; são os novos barcos no mar: podem perder a direção, às vezes teimam em parar, mas apesar das intempéries, seguem.

 

REFERÊNCIAS

BARDIN, L. Análise de Conteúdo. Lisboa, Portugal: Edições 70, 2011.         [ Links ]

BOARINI, M. L.; BORGES, R. F. O psicólogo na atenção básica à saúde. Psicologia: Ciência e Profissão, v. 29, n. 3, p. 602-613, 2009.         [ Links ]

BRASIL, Ministério da Saúde. Prevenção do suicídio: manual dirigido a profissionais das equipes de saúde mental. Organização Pan-Americana da Saúde. Estratégia Nacional de Prevenção do Suicídio, 2006.         [ Links ]

BRASIL. Ministério da Saúde. Portaria nº 3.088, de 23 de dezembro de 2011. Disponível em: <http://www.sejudh.mt.gov.br/documents/412021/3643910/Portaria±MS±n% C2%BA±3088-11±-±RAPS±-±Rede±de±Aten%C3%A7%C3%A3o±Psicossoci al.pdf/c8df878b-d174-4a04-8798-3446187f166c>. Acesso em: 10 mar. 2014.         [ Links ]

BRASIL. Ministério da Saúde. Saúde mental. Cadernos de Atenção Básica, n. 34. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Departamento de Ações Programáticas Estratégicas. Brasília: Ministério da Saúde, 2013.         [ Links ]

BRASIL. Ministério da Saúde. Saúde Mental no SUS: Cuidado em Liberdade, Defesa de Direitos e Rede de Atenção Psicossocial. Relatório de Gestão 2011/2015. Secretaria de Atenção à Saúde. DAPES. Coordenação Geral de Saúde Mental, Álcool e Outras Drogas. Brasília: Ministério da Saú         [ Links ]de, 2016.

CAPOZZOLO, A. A. et al. Narrativas na formação comum de profissionais de saúde. Trabalho, Educação e Saúde, Rio de Janeiro, v. 12, n. 2, p. 443-456, maio/ ago. 2014. doi: http://dx.doi.org/10.1590/S1981-77462014000200013.         [ Links ]

CARVALHO, D. B.; YAMAMOTO, O. H. Psicologia e políticas públicas de saúde: anotações para uma análise de experiência brasileira. Psicologia para América Latina, revista eletrônica, p. 1-8, 2002.         [ Links ]

COMBINATO, D. S.; QUEIROZ, M. S. Morte: uma visão psicossocial. Estudos de Psicologia, Natal, v. 11, n. 2, p. 209-216, 2006. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1413-294X2006000200010&lng=pt&nrm=iso>. Acesso em: 02 maio 2014.         [ Links ]

CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA. Suicídio e os desafios para a psicologia. Brasília: CFP, 2013. Disponível em: <http://site.cfp.org.br/wp-content/uploads/2013/12/Suicidio-FINAL-revisao61.pdf>. Acesso em: 30 out. 2014.         [ Links ]

CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA. I Fórum Nacional de Psicologia e Saúde Pública: contribuições técnicas e políticas para avançar o SUS. Relatório Final. Rio de Janeiro: CFP, 2006. Disponível em: <http://site.cfp.org.br/wp-content/uploads/2007/05/relatorio_saude_publica_final.pdf>. Acesso em: 02 maio 2014.         [ Links ]

DIMENSTEIN, M. A cultura profissional do psicólogo e o ideário individualista: implicações para a prática no campo da assistência pública à saúde. Estudos de Psicologia, v. 5, n. 1, p. 95-121, 2000.         [ Links ]

FIGUEIREDO, A. E. B. et al. Impacto do suicídio da pessoa idosa em suas famílias. Ciência & Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, v. 17, n. 8, ago. 2012. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1413-81232012000800010&lng= pt&nrm=iso>. Acesso em: 11 jan. 2014. doi: http://dx.doi.org/10.1590/S1413-81232012000800010.         [ Links ]

FIGUEIREDO, L. C. A preparação do psicólogo: formação e treinamento. In: ______. Revisitando as Psicologias: da epistemologia à ética das práticas e discursos psicológicos. São Paulo: Vozes, 1996. p. 113-122.         [ Links ]

MEDEIROS, M. A. T.; BRAGA-CAMPOS, F. C.; MOREIRA, M. I. B. A integralidade como eixo da formação em proposta interdisciplinar: estágios de Nutrição e Psicologia no campo da Saúde Coletiva. Revista de Nutrição, Campinas, v. 27, n. 6, p. 785-798, 2014. doi: http://dx.doi. org/10.1590/1415-52732014000600012.         [ Links ]

MERHY, E. E. O ato de cuidar: a alma dos serviços de saúde. In: Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde. Departamento de Gestão da Educação na Saúde. SUS Brasil: cadernos de textos. Brasília: Ministério da Saúde, 2004. p. 108-137. (Série B – Textos Básicos de Saúde).

MINAYO, M. C. S. O desafio do conhecimento: pesquisa qualitativa em saúde. 12. ed. São Paulo: Hucitec, 2010.         [ Links ]

ROBLE, O. J.; MOREIRA, M. I. B.; SCAGLIUSI, F. B. A educação física na saúde mental: construindo uma formação na perspectiva interdisciplinar. Revista Interface: Comunicação, Saúde e Educação, v. 16, n. 41, p. 567-577, 2012. doi: http://dx.doi.org/10.1590/S1414-32832012005000033.         [ Links ]

SOUTO, T. S.; BATISTA, S. H.; BATISTA, N. A. A educação interprofissional na formação em Psicologia: olhares de estudantes. Psicologia: Ciência e Profissão, v. 34, n. 1, p. 32-45, 2014. doi: 10.1590/S1414-98932014000100004.         [ Links ]

SILVA, R. C. A formação em psicologia para o trabalho em saúde pública. In: SATO, L. (Org.). Psicologia e Saúde: repensando práticas. São Paulo: Hucitec, 1992. p. 25-40.         [ Links ]

UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO PAULO. A educação interprofissional na formação em saúde: a competência para o trabalho em equipe e para a integralidade no cuidado. Projeto Político Pedagógico – Campus Baixada Santista. Santos, 2006.

 

Endereço para correspondênciaI
Avenida José Jacob Seckler, 920, apto. 22 – Bloco 11 –
Jd. Praia Grande, Mongaguá, SP.
CEP: 11730-000.
E-mail: alvesdacosta.renata@gmail.com

Endereço para correspondênciaII
Silva Jardim, 136 –
Vila Mathias, Santos, SP.
CEP: 11030-400.
E-mail: mibadaro@gmail.br

Artigo recebido em: 13/08/2016.
Aprovado para publicação em: 22/11/2016.

Creative Commons License