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Pensando familias

Print version ISSN 1679-494X

Pensando fam. vol.18 no.1 Porto Alegre June 2014

 

ARTIGOS

 

Lealdades invisíveis: coparticipação da família no ato infracional

 

Invisible loyalties: family co-participation in offense

 

 

Cláudia Mara Boseto Cenci1, I, II; Juliana Fisch Teixeira2, III; Luiz Ronaldo Freitas de Oliveira3, II, IV

I Doutoranda em Psicologia Clínica pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul PUC/RS
II Professora da Faculdade Meridional - IMED
III Pós Graduanda em Psicopatologia e Dependência Química pela Unisãopaulo/ SP
IV Doutorando em Psicologia Clínica pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos - UNISINOS/RS

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

O objetivo do artigo consiste em investigar acerca das lealdades invisíveis presente nas relações familiares de dois adolescentes que estão cumprindo medida socioeducativa em um CASE. É um estudo qualitativo exploratório, baseado no genograma familiar, e sustentado pelo referencial teórico sistêmico. A violência cometida por adolescentes passou a ser recorrente e por isso chama a atenção da população. A literatura aponta que a transgressão de menores está associada às leis que protegem o infrator e pela falência dos valores e ensinamentos familiares. Os resultados demonstraram que a família é o alicerce na constituição do sujeito e o comportamento dos adolescentes, autores de ato infracional, são resultados das lealdades invisíveis.

Palavras-chave: Lealdades invisíveis, Família, Adolescente infrator.


ABSTRACT

The aim of the paper is to investigate about this invisible loyalties of family relationships of two teenagers who are serving in a socio-educational measures CASE. It is an exploratory qualitative study, based on the family genogram, and sustained by systemic theoretical framework. Violence committed by teenagers became applicant and therefore draws the attention of the population. The literature indicates that minor transgression is associated with laws that protect the offender and the bankruptcy of family values and teachings. The results showed that the family is the foundation in the constitution of the subject and the behavior of adolescents, authors of an offense, the results are invisible loyalties.

Keywords: Invisible loyalties, Family, Adolescent offenders.


 

 

Introdução

Atualmente as diferentes formas de violência são apresentadas de maneira banal pela mídia e as notícias atraem os olhares da população. Alguma forma de violência sempre existiu na humanidade, tendo períodos de maior evidência e períodos de calmaria. A criminalidade juvenil é foco de interesse quando produz impacto, quando as crianças e/ou adolescentes cometem atos infracionais graves. A discussão sobre os adolescentes autores de atos infracionais se configura como sintoma social contemporâneo e há necessidade de pesquisas que busquem entender a dinâmica familiar dos adolescentes infratores. No Brasil não há muitos estudos empíricos referentes à violência na adolescência, geralmente ela é associada a questões de classes sociais e não são investigados outros determinantes presentes na ocorrência dos atos infracionais na adolescência.

Estudar as lealdades invisíveis nos proporcionará um conhecimento sobre a influência da família no comportamento dos adolescentes em seu cotidiano e quais as consequências psicológicas desta influência. Os adolescentes infratores assumem a responsabilidade por suas transgressões, sendo eles os atores de suas vidas, porém existe uma organização familiar que os constituem na sua subjetivação. A escolha do tema se deu a partir da constatação de que por intermédio da família se dá a transmissão de valores e deveres frente à sociedade. Nos casos estudados fica subentendido, no comportamento dos adolescentes, o desejo da família de seguir o legado infracional.

Os meios de comunicação, por meio de notícias sobre violência juvenil, evidenciam a ocorrência de ilícitos praticada por adolescentes tem crescido rapidamente. Cada vez mais adolescentes e jovens estão sendo institucionalizados em Centros de Atendimentos Socioeducativos (CASE). Esta pesquisa não tem a pretensão de esgotar a discussão em torno do tema, mas contribuir significativamente com a comunidade científica, uma vez que provocará debate acerca do tema e a reflexão sobre a influência da família de origem no comportamento do adolescente infrator.

 

Contextualizando as lealdades invisíveis

A lealdade pode ser determinada em termos morais, filosóficos, políticos e psicológicos. É descrita como a atitude de confiança dos indivíduos em relação ao objeto da lealdade. Estabelecem-se entre os membros de uma família, que ficam conectados as solicitações também inconscientes de seus antepassados, conduzindo-os a uma fidelidade que muitas vezes vai contra seus desejos. Constitui-se com base na formação de mitos e segredos e pode permanecer por mais de uma geração. E o não cumprimento com as obrigações geradas por esse laço cria sentimentos de culpa (Nagy & Spark, 1983; Souza & Carvalho, 2010).

A lealdade invisível é uma forma inconsciente de honrar nossos ancestrais. Em algumas famílias é possível observar a repetição de doenças, transgressões, uso de drogas e mortes violentas. Esses comportamentos são repetidos de maneira inconsciente e escondidos de trás de feridas secretas (Souza & Carvalho, 2010).

Conforme Nagy & Spark (1983) a formação de uma aliança depende de vários fatores, o mais importante é a capacidade da família em comprometer cada membro, de forma individual a investigar suas relações disfuncionais e alcançar um acordo consensual ao menos em um ou mais objetivos. Um exemplo de lealdade é aquela em que os familiares proíbem a conduta marginal/delinquente, mas sem saber dão aprovação, oferecendo uma confirmação de identidade negativa como principal opção relacional para o filho. Segundo os autores, as famílias possuem suas próprias leis, em forma de expectativas compartilhadas e não ditas. Assim, a lealdade como atitude individual envolve identificações com o grupo, valida a relação com os outros membros, gera confiança, confiabilidade, responsabilidade a um determinado compromisso.

Adolescência e família

A família é considerada uma referência afetiva para os adolescentes autores de atos infracionais. Entretanto, o desemprego, a violência, o uso abusivo de drogas lícitas ou ilícitas, privações de todas as ordens e separações de casais são percebidos por esses jovens, como fatores do afastamento familiar (Castro & Guareschi, 2008). A família é responsável pelo desenvolvimento da criança e do adolescente e uma família que deixa de realizar suas funções parentais provoca graves consequências no desenvolvimento biopsicossocial da criança ou adolescente (Trentin, 2011).

Para Batista, Oliveira e Pires (2011) a família é o primeiro sistema no qual o indivíduo interage, cada membro possui uma posição e um papel socialmente definido, que reproduz sua organização funcional. A família é responsável pelo cuidado físico e psíquico da criança, contudo nem sempre essa função de proteção é cumprida e torna-se palco de muitas violências.

O sintoma apresentado por um dos membros da família, segundo Penso e Costa (2008) podem ser percebidos como uma manifestação que estabelece relação com a dinâmica familiar, pois tem uma função no sistema e para o sistema. O ato infracional começa a ser analisado como um sintoma de toda a família, sendo visto como uma maneira de enfrentar os conflitos. Tal comportamento tem a função de denunciar as falhas do sistema familiar e social e indicar a necessidade de mudança no funcionamento. Assim, o ato infracional pode ser entendido como uma comunicação que protege segredos e indica sofrimento ligado à história dos pais em suas famílias de origem.

Adolescente infrator

A violência em sua expressão banalizada atinge quase todas as gerações e classes. O fenômeno da violência perdeu a exclusividade da autoria por adolescentes pobres das periferias das grandes cidades e se generalizou denunciando o caos na sociedade como um todo (Oliveira & Rosa, 2010).

O primeiro lugar onde há a busca por ordem é dentro da família, porém se esta falhar, o próximo caminho será procurar os limites em ambientes externos, como a escola, a igreja e a sociedade. Contudo, se nenhum desses locais satisfizer as expectativas da criança ou adolescente, ele recorrerá a instituições mais severas, como a justiça, a polícia ou o hospital. E se no caminho essas dificuldades se acumularem, o delito vai se estabelecer como um conflito de vida, como pedido de ajuda, um grito por socorro (Trentin, 2011). Contudo, o surgimento da delinquência na adolescência está vinculado às dificuldades na comunicação e às características relacionadas à dinâmica familiar, mais do que aos aspectos de personalidade ou a fatores ambientais, como divórcio, ou número de filhos (Penso & Costa, 2008).

O curso de vida dos menores infratores, geralmente, é marcado por uma série de faltas e exclusões. Ao cometer o ato infracional parece ser uma tentativa de pertencer, de fazer parte do mundo e de existir. Ao ser autor de uma transgressão, o adolescente passa a ter um olhar sobre ele, e desta forma será acolhido pelo sistema jurídico e de assistência social (Castro, 2005).

De acordo com Nardi e Dell’Aglio (2010), o adolescente infrator é considerado um indivíduo exposto a diversas situações de risco, como crises nos vínculos familiares e sociais, contribuindo para o aparecimento de condutas antissociais, descritas como atitudes de desrespeito e violação dos direitos alheios. O manejo e as técnicas utilizadas pelos pais na educação dos filhos atuariam como um dos principais determinantes da delinquência. Além dos problemas vivenciados pelo jovem infrator dentro do ambiente familiar, os grupos de amigos também são apontados como potencializadores de atividades ilícitas. A vivência de qualquer modo de violência, seja na família, comunidade ou escola, assim como o consumo de drogas e o baixo rendimento escolar são situações de risco às quais o adolescente estará exposto. Contudo, são seres humanos, com seus pontos fracos e fortes, tentando viver da melhor forma possível, pois a transmissão geracional é consequência de um processo de transmissão que perpassa várias gerações e que só poderá ser alterado por meio do conhecimento de sua história (Penso & Costa, 2008).

 

Método

O delineamento deste estudo é de caráter qualitativo, exploratório e descritivo, tendo como foco a investigação acerca das lealdades invisíveis presentes nas relações familiares de adolescentes que estão cumprindo medida socioeducativa em um CASE. Considera-se que investigar qualquer forma de interação humana implica, invariavelmente, abordar o que há de mais profundo nas relações. Assim, o método que se mostra mais adequado para tal processo é a pesquisa qualitativa, por se tratar de um nível de realidade não quantificável, uma vez que aborda aspectos tais como significados, aspirações, crenças, motivos, valores e atitudes (Minayo, 2007).

O estudo teve como critério de inclusão membros de duas famílias de adolescentes que cumprem medida de internação em um CASE, sendo indicadas pela psicóloga do local. Após a indicação foram contatados por telefone, informados dos objetivos do estudo e convidados a participar da pesquisa. O estudo foi desenvolvido observando os preceitos éticos da Resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde (Brasil, 1997), sendo aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade Meridional, com o parecer 455.365/2013.

A coleta de dados foi realizada na Clínica Escola da Faculdade Meridional. Onde, por meio da constituição do genograma, cada membro da família foi solicitado que informasse sua posição na família de origem, idade, ocupação laboral, falecimentos e contassem a história da família com foco na relação com o ato infracional. As atividades de constituição do genograma foram gravadas e posteriormente transcritas. O genograma consiste num desenho gráfico da vida familiar objetivando o levantamento de informações a respeito dos integrantes da família e de suas relações geracionais, constituindo-se numa ferramenta de avaliação sistêmica (McGoldrick, Gerson & Petry, 2012).

Para avaliar as informações constituídas no genograma foi utilizada a análise de conteúdo temática. A análise de conteúdo é um conjunto de técnicas empregadas no processo de análise das comunicações. Inclui procedimentos sistemáticos e objetivos que permitem a inferência de conhecimentos a partir do conteúdo das mensagens analisadas. Para que seja possível tal análise faz-se necessário que as ideias sejam categorizadas em unidades de textos (Bardin, 2009).

A partir do material coletado foram aprofundadas as seguintes categorias:

a) Transgeracionalidade da transgressão;

b) Transgressão como resolução de conflitos.

Apresentação das famílias

Participaram do estudo duas famílias cujas características principais são apresentadas abaixo. Com a finalidade de proteger a identidade dos participantes os nomes citados serão fictícios apenas para fim de caracterização dos sujeitos.

Família 1

A família 1 é constituída por Maria, mãe de Dorival (o adolescente), seu padrasto Agenor, e seus dois irmãos, Mário e Bárbara. Maria relata que seu pai foi assassinado, quando buscava um irmão em um baile, onde ocorreu uma briga e ele acabou sendo morto, porém a história da morte nunca foi esclarecida pela família de Maria. O primeiro ato infracional de Dorival foi o tráfico de drogas, praticado também por seus tios e pelo irmão mais velho. Por conta do tráfico de drogas, Dorival cometeu um homicídio para ter o controle da “boca de fumo”. Maria relata que Dorival não a obedecia e a partir da morte do pai fez o que quis, mas respeitava e seguia as ordens do irmão mais velho, Geremias. Refere que os dois filhos sempre obedeceram ao pai e que hoje falam com orgulho sobre os atos do pai, querendo seguir o legado deixado pelo genitor.

Abaixo está a representação gráfica (genograma) da família 1:

 

 

Família 2

Cristovão foi criado por sua avó Ludimila desde os seus seis meses. Conheceu o pai, porém não foi registrado pelo mesmo. Mantinha contato com Irene, sua mãe, mas residiu com ela apenas alguns meses durante 18 anos. Ludimila verbaliza que Cristovão é muito carinhoso com todos da família principalmente suas irmãs e sua mãe. Ele tem em sua história familiar a prisão da avó, do avô e de seus três tios por tráfico de drogas. Também já cumpriu pena pelo mesmo motivo e sua mãe foi detida por furtos. O ato pelo qual Cristovão responde e está no Centro de Atendimento Socioeducativo foi o homicídio de seu padrasto, que segundo Ludimila era violento com a mãe, com a irmã mais nova e com o próprio Cristovão.

Abaixo está a representação genograma da família 2:

 

 

Discussão

Na sequencia serão apresentadas as duas categorias emergentes da análise das entrevistas realizadas: (a) Transgeracionalidade da transgressão e (b) Transgressão como resolução de conflitos.

Transgeracionalidade da transgressão

Evidenciou-se na realização das entrevistas com as famílias a questão da transgeracionalidade da transgressão, pois o pai de Dorival cometeu crimes, assim como alguns tios e seu irmão mais velho que está preso pelo homicídio que foi cometido em conjunto com Dorival. Percebe-se por meio do genograma a repetição transgeracional na família de Cristovão, pois a avó, o avô materno, a mãe, e os três tios maternos já estiveram presos por delitos semelhantes.

A partir do relato das famílias entrevistadas ficou evidente que a transgressão foi transmitida de uma geração para a outra como um valor a ser seguido, como algo “bom”, sendo as famílias coparticipantes do ato infracional. A coparticipação familiar no ato infracional é esclarecida por Trentin (2011), quando esclarece que as famílias promovem o desenvolvimento dos seus descendentes através da educação que transmitem ensinamentos que servirão para toda a vida.

Constata-se que a ocupação dos pais é referência de grande importância para seus descendentes. Pais que são fisicamente e/ou afetivamente ausentes, violentos e até mesmo, criminosos são exemplos para as crianças e adolescentes. A criminalidade cometida pelos pais tende a ser transmitida aos filhos, preservando o legado familiar de comportamentos desviantes antissociais, conforme se evidenciou no genograma.

Outro aspecto relevante que emergiu das entrevistas refere-se à dinâmica relacional do adolescente com sua família de origem. As famílias não relatam nenhum episódio de violência física ou verbal no qual os adolescentes estivessem diretamente envolvidos. Entretanto, essa violência foi presenciada pelo adolescente, pois estava envolvido na dinâmica familiar. A mãe de Dorival (família 1) relata que ele não a obedecia, porém nunca levantou o tom de voz ou a agrediu fisicamente. A avó de Cristovão (família 2) verbaliza que ele é muito carinhoso com todos os seus familiares, tios, avô, avó, mãe e irmãs, que tem um cuidado e respeito com todos.

Cabe ressaltar que, através do relato das famílias entrevistadas, evidencia-se que a transgressão modificou-se nas gerações, tornando-se mais acentuada e intensa, pois Cristovão e Dorival estão no Centro de Atendimento Socioeducativo por homicídios e na história familiar há tráfico de drogas e assalto. Ambos adolescentes antes de praticarem o homicídio, já haviam se envolvido com o tráfico de drogas.

Transgressão como resolução de conflitos

A teoria da aprendizagem social, segundo Gallo e Williams (2005), pressupõe que os valores e as condutas agressivas dos adultos servem como normas a serem seguidas e imitadas pelos filhos. Muitos dos desvios às normas podem ser explicados em razão das informações que o indivíduo tem acesso e a importância dada a essas informações. Por isso, adolescentes que não esperam obter o que desejam por meio legítimo talvez utilizem estratégias violentas para demonstrar seu descontentamento ou para alcançar seus objetivos. Os autores ainda afirmam que a maioria dos heróis de filmes violentos justifica seu comportamento por estar em defesa de valores ligados à família, governo e território.

A resolução de conflitos através da transgressão fica evidente no relato da família de Dorival que é traficante de drogas, tinha uma situação conflituosa em seu bairro, onde outros traficantes estavam vendendo e disputando “território” com ele. Dessa forma, para então poder controlar a “boca de fumo” e não perder os clientes e nem seu espaço, ele matou o outro traficante como aviso para que parassem de revender naquele local.

Já Cristovão tinha um conflito com seu padrasto, que agredia fisicamente sua mãe e sua irmã. Sua mãe estava nesse relacionamento há nove anos, e nunca havia registrado queixa de agressão, ou pediu qualquer tipo de ajuda aos familiares ou à justiça, porém Cristóvão ao descobrir que o padrasto tinha espancado sua mãe outra vez, procurou tirar satisfação e resolver o conflito matando o padrasto.

Nos dois relatos os adolescentes utilizaram da transgressão para a resolução do conflito, sendo estas as estratégias aprendidas em seu âmbito familiar. Não buscaram racionalmente alternativa para resolver a situação de violência, sendo a transgressão e o homicídio a única maneira de solucionar a problemas.

 

Considerações finais

A presente pesquisa teve o intuito de entender a maneira como a família consente, a partir da transmissão de valores, o ato infracional do adolescente. Percebeu-se que as famílias apresentaram dificuldade de verbalizar sua história, por ser difícil admitir que uma pessoa da família tivesse cometido um homicídio. O sistema no qual os adolescentes cumprem medida socioeducativa de internação, também não permitiu o estudo com os adolescentes infratores, repetindo a negação e a dificuldade de lidar socialmente com o ato infracional.

Os adolescentes cresceram em um âmbito familiar que impõem obstáculos para o desenvolvimento, tais como: não oferecem opções adequadas para resolução de conflitos, apresentam um ambiente no qual o delito faz parte do cotidiano e evidencia-se uma imposição de como eles devem agir e pensar, as maneiras de resoluções de problemas possíveis de acordo com seus valores, direitos e deveres no sistema familiar. Ao cometer o ato infracional e ingressar numa instituição socioeducativo, o sujeito depara-se com um ambiente que deveria proporcionar a ressocialização e a recuperação dos adolescentes, mas em função da sua estrutura organizacional o ambiente apresenta ambivalência nas ações e na leitura das necessidades específicas das pessoas que cumprem medida socioeducativa de internação.

Os adolescentes, que perante a sociedade são criminosos, que não tiveram a oportunidade de se desenvolver plenamente, ao retornar à familiar e à comunidade, reforçarão por meio das lealdades invisíveis a maneira de resolução de conflitos inadequada socialmente, repetindo a partir de um novo ato infracional o comportamento internalizado, mantendo-os num ciclo de institucionalização e em conflito com a Lei.

Quando as participantes da pesquisa foram questionadas sobre o que pensavam acerca do ato infracional, não demonstraram espanto com o fato de o filho cometer uma infração, mas relataram que “isso não se faz”, e que nunca pensaram na possibilidade de um deles tomar uma atitude dessas. A aceitação do ato infracional, por parte da família, demonstrava a falta de investimento no cuidado com o adolescente, refletindo a máxima social circundante que os rotula de ‘criminosos incuráveis’, dificultando a oportunidade de mudança.

 

Referências

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Endereço para correspondência
Cláudia Mara Boseto Cenci
E-mail: claudia.cenci@imed.edu.br

Juliana Fisch Teixeira
E-mail: julianafischt@gmail.com

Luiz Ronaldo Freitas de Oliveira
E-mail: ronaldo@imed.edu.br

Enviado em: 22/05/2014
1ª revisão em: 24/07/2014
Aceito em: 30/07/2014

 

 

1 Psicóloga, Doutoranda em Psicologia Clínica pela PUC/RS, Professora da Faculdade Meridional - IMED.
2 Psicóloga - Pós Graduanda em Psicopatologia e Dependência Química pela Unisãopaulo/ SP.
3 Psicólogo, Doutorando em Psicologia Clínica pela UNISINOS/RS, Professor da Faculdade Meridional - IMED.