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Pensando familias

versão impressa ISSN 1679-494X

Pensando fam. vol.18 no.2 Porto Alegre dez. 2014

 

ARTIGOS

 

Crenças parentais sobre o autismo e sua evolução no processo de comunicação diagnóstica1

 

Parental beliefs about autism and it’s evolution in the diagnostic communication process

 

 

Márcia Rejane Semensato ; Cleonice Alves Bosa

 

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

Esse estudo investigou as crenças parentais sobre o autismo no período da comunicação do diagnóstico do filho. O processo de comunicação do diagnóstico foi realizado em entrevistas ao longo de quatro meses, posteriormente submetidas à Análise de Conteúdo. Durante esse processo os pais conversaram sobre a avaliação, o diagnóstico, as possibilidades de intervenção, etc. Os dados indicaram que os pais puderam significar as informações recebidas dos profissionais e falar sobre suas concepções e crenças acerca destas informações e do que observaram na avaliação diagnóstica. Os resultados desse estudo corroboram a importância da investigação das crenças parentais na elaboração do programa de atendimento ao filho e à família. Além disso, as crenças parentais mostraram-se importantes para a compreensão do processo de elaboração do diagnóstico que os pais passam. Essa investigação também enfatizou a importância da comunicação do diagnóstico de autismo como um processo e não se restringir a uma entrevista informativa.

Palavras-chave: Crenças, Crenças parentais, Autismo.


ABSTRACT

This study investigated the parental beliefs about the son's autism in the diagnostic communication period. The communication of the diagnosis was performed in a process which lasted four months in interviews later analised by Content Analysis. During this process the parents received information about the evaluation, the diagnosis, the possibilities of interventions, etc. They also were able to atribute meaning to the information they received from the professionals as well discuss their beliefs about this information and their observations during the diagnostic evaluation. The results of this study corroborate the importance of research of parental beliefs for child care and family programs. In addition, parental beliefs were important for the understanding of the elaboration process of the diagnosis that parents experience. This research also emphasized the importance of the diagnostic communication as a process not restricted to an informative interview.

Keywords: Beliefs, Parental beliefs, Autism.


 

 

Introdução

O autismo é uma condição considerada estressante para os pais (Oppenheim, Dolev, Koren-Karie, Sher-Censor & Salomon, 2007; Schmidt & Bosa, 2007); isto em função da extensão e seriedade dos comprometimentos e em função de acompanhar a família durante todo o seu ciclo vital. Além disto, trata-se de um distúrbio de etiologia ainda pouco conhecida, o que estimula que as crenças, inclusive as dos pais, preencham essas lacunas. As crenças parentais, por sua vez, têm sido vistas como influências importantes nas decisões que os pais tomam após o diagnóstico de autismo do filho, como por exemplo, nos tratamentos de escolha (Dardennes, et al., 2011; Anbar, Dardennes, Prado-Netto, Kayec & Contejean, 2010; Harrington, Patrick, Edwards & Brand, 2006) e na forma de compreensão de atitudes e comportamentos da criança. Por esta razão, estudos que investiguem as crenças parentais sobre autismo e a mudança nessas crenças são importantes contribuições para a compreensão do processo que os pais passam na elaboração do diagnóstico do filho e nas suas decisões relativas a esse diagnóstico. Assim sendo, nesse artigo apresenta-se as crenças e concepções de um casal de pais no momento da comunicação do diagnóstico de autismo do filho e a evolução dessas concepções ao longo dos primeiros quatro meses em que foram acompanhados em um processo de comunicação do diagnóstico.

Crenças e parentalidade

As crenças podem ser definidas como representações mentais simbólicas acerca de fatos, pessoas, condições do mundo, mas também de nossas condições internas, configuradas como expectativas, desejos, motivações, conflitos, sentimentos e aspirações (Krüger, 2004). A crença é considerada um aspecto subjetivo do comportamento. Assim sendo, o conteúdo informativo das crenças, sejam as individuais, familiares, sociais, etc. pode não corresponder objetivamente aos fatos as quais se refiram, mas a uma compreensão particular acerca desses fatos.

Em termos gerais, as crenças são reconhecidas como influências importantes na compreensão das pessoas acerca do mundo, seus acontecimentos, eventos, etc. De fato, como afirmou Pinker (2004), todos tem uma teoria da natureza humana; e essas teorias estão implícitas nas decisões que são tomadas e que direcionam, entre outras coisas, a maneira de criar os filhos, a forma como os pais controlam o comportamento, os objetivos e valores parentais. Em consonância com esse posicionamento, Biasoli-Alves (2000) e Moura, et al. (2004) afirmam que os valores e crenças compartilhados pelos pais sobre o desenvolvimento do filho influenciam o comportamento e as práticas parentais, além de afetar as interações que são estabelecidas com as crianças. As crenças parentais são de tamanha relevância que o sistema de crenças de um casal é situado atualmente como um aspecto chave na resiliência familiar. Isto porque esse sistema envolve valores, convicções, atitudes, etc., que influenciam as respostas emocionais, decisões e ações das pessoas (Walsh, 2006). Para essa autora, as crenças proveem coerência e organizam a experiência permitindo aos membros da família fazer sentido de suas situações de crise.

Crenças parentais sobre autismo

As crenças parentais acerca do autismo vêm sendo recentemente investigadas, com base principalmente na hipótese da influência do sistema de crenças na sua interpretação dos eventos e consequentemente em suas decisões. Em 2006, Harrington, et al., pesquisaram crenças sobre etiologia, diagnóstico e tratamento do autismo em 62 casais norte americanos, pais de crianças com autismo. O principal instrumento foi um questionário que investigou quando notaram problemas desenvolvimentais no filho, quando se lembravam de que um profissional da saúde lhes falou sobre o diagnóstico de autismo, o quão confiante eles eram em relação ao médico que cuidava da criança na sua habilidade de reconhecer o autismo, se eles acreditavam que algo pode ter causado ou contribuído para o autismo da criança e em caso positivo, como essa crença mudou sua atitude em relação a prover rotina de cuidados de saúde para seu filho. Os resultados principais indicaram que quanto à etiologia, as crenças parentais mais frequentes relacionavam o autismo a imunizações, predisposição genética ou exposição da mãe a fatores ambientais. Além disso, a maior parte dos pais (75%) expressou pouca ou nenhuma confiança na habilidade do pediatra para reconhecer os sintomas iniciais do autismo. Os dados obtidos permitiram a compreensão de que a percepção de uma demora no diagnóstico pode reduzir a confiança nos profissionais e isso tende a incrementar a busca, pelos pais, de terapias alternativas para o filho (Harrington, et al., 2006). Em 2009, um estudo de King, Baxter, Rosenbaum, Zwaigenbaum e Bates (2009), através da análise qualitativa de entrevistas com familiares de crianças com autismo, concluiu que a presença de otimismo dos pais sobre o autismo do filho está relacionada a crenças que permitem sentimentos de esperança e de controle e, por outro lado, a falta de respostas sobre a etiologia do autismo estimula que os pais preencham essas lacunas adotando teorias não comprovadas de causação.

Outras pesquisas focando as crenças familiares especificamente sobre a etiologia do autismo também encontraram uma associação entre crenças sobre a causa do autismo e as decisões parentais. No estudo de Dardennes et al. (2011), por exemplo, a crença no papel causal das experiências traumáticas na primeira infância estava relacionada a uma probabilidade diminuída para tratamento em terapia comportamental para o filho. Tendo em vista essas correlações encontradas, os autores enfatizaram que o autismo é um domínio onde estudos sobre a percepção dos pais acerca do transtorno são muito importantes tanto de um ponto de vista teórico quanto prático. Em geral, apesar de poucos estudos na área contemplarem esse tema ainda, a análise dos dados dessas pesquisas permitiu concluir que as crenças têm importantes reflexos nas escolhas de tratamento para os sintomas principais do autismo (Dardennes et al.; 2011, Harrington et al., 2006; King et al., 2009).

Em termos das crenças parentais especificamente sobre a etiologia do autismo, no estudo de Dardennes et al, 2011 e de Wang, et al., 2011, com pais de crianças com autismo entre dois e cinco anos, as crenças de causa mais frequentes eram as genéticas, ambientais e de gravidez, enquanto que problema com a parentagem foi a crença menos citada. Semelhantes resultados foram encontrados na pesquisa de revisão da literatura de Herbert e Koulouglioti, publicada em 2010. As crenças dos pais de crianças com autismo sobre a etiologia dessa condição foram pesquisadas em artigos de 1995 a 2009 no Medline, PsychInfo, Ovid e PubMed, utilizando os seguintes descritores: autism, autistic disorder, beliefs, culture, parents, attitudes, and perceptions. A revisão de treze artigos indicou que as principais crenças dos pais sobre a causa do autismo, incluíam fatores genéticos, eventos ligados ao nascimento e influências ambientais no período da primeira infância. A conclusão deste estudo, consoante com os resultados de pesquisas apresentadas anteriormente, também foi que as crenças dos pais refletem nas decisões sobre cuidados de saúde no futuro e planejamento familiar. Assim sendo, os estudos apresentados ressaltam a importância que os profissionais explorem as crenças parentais durante o processo de planejamento do tratamento.

As crenças sobre autismo também vem sendo enfocadas quanto ao aspecto cultural (Ecker, 2010; Ravindram & Myers, 2013; Chirdkiatgumchai, et al, 2010). A pesquisa de Ecker (2010), por exemplo, investigou crenças culturalmente construídas sobre o autismo em famílias da Coreia do sul, China, Paquistão, Bangladesh e Israel. Na Coreia do Sul, por exemplo, existe a ideia de que o autismo seja curável e possa ser resultado de uma punição por pecados antigos da família, negligência da mãe em relação à criança, ou "fantasmas maus". Estas crenças foram apontadas como influência grande na decisão de diversas famílias de saírem da área urbana e se mudarem para área rural, a fim de isolar-se. Segundo Ravindran e Myers (2013), os estudos transculturais sobre o autismo mostram que os profissionais não podem assumir que há atitudes e práticas universais acerca do autismo por parte dos pais, o que sugere que as crenças parentais precisam ser levadas em consideração nas propostas de intervenção nas diferentes famílias. Além disto, pode se ressaltar a importância de estudos contextualizados em população brasileira, tendo em vista que as crenças, além de questões pessoais e familiares, são influenciadas pelo contexto e cultural das quais os casais fazem parte.

Considerando que o autismo é um estressor potencial para a família, que as crenças dos pais são importantes nas interpretações que fazem dessa vivência e no impacto do diagnóstico de autismo em suas vidas e que essas interpretações podem estar relacionadas às decisões parentais acerca da família, especialmente do filho, esse estudo tem como objetivo identificar as crenças de um casal sobre o diagnóstico de autismo do filho de forma prospectiva e a mudança dessas ao longo do processo de comunicação do diagnóstico. Esperava-se que, com base na análise das narrativas produzidas pelos casais durante as entrevistas, fossem identificadas mudanças nas crenças predominantes e que estas mudanças fossem acompanhadas de significação das vivências e busca de alternativas coerentes com as crenças. No presente estudo, as crenças parentais foram definidas como as ideias e concepções dos pais acerca dos temas de Filho, Autismo e Família durante quatro entrevistas no processo de comunicação do diagnóstico de autismo, ao longo de quatro meses.

 

Método

Delineamento e participantes

Realizou-se um estudo de caso (Stake, 1994) de caráter qualitativo cujos participantes foram um casal que possui um filho com 39 meses em avaliação por suspeita de diagnóstico de autismo. Fabio2 (41 anos) tem uma filha de 14 anos, do casamento anterior, ele trabalha no serviço público e tem ensino médio; Lurdes (39 anos) tem dois filhos de um casamento anterior, uma menina de 18 anos e um menino de 16 anos. Ela trabalha com serviços de limpeza e tem ensino fundamental incompleto. O filho Pedro tem 39 meses (3 anos e 3 meses) e é o único filho do casal, que está casado há dez anos.

Procedimentos

Os participantes foram encaminhados às pesquisadoras quando foram explicados os procedimentos e preenchido o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido por ambos os cônjuges3. Duas entrevistas iniciais serviram para contextualizar a família. A partir destas foi preenchida uma Ficha de Dados Sociodemográficos e de Desenvolvimento da criança (NIEPED, 2004). Após o período de um mês da avaliação dos aspectos comportamentais da suspeita de autismo do filho, foram utilizadas quatro entrevistas clínicas conjuntamente com o casal, como parte do processo de comunicação diagnóstica. Esses encontros duraram aproximadamente uma hora cada, com periodicidade quinzenal, com exceção da última que foi realizada num intervalo de dois meses. As entrevistas foram gravadas em áudio e posteriormente transcritas.

Materiais e instrumentos4

Ficha de Dados Sociodemográficos e Desenvolvimento: Constavam informações sobre participantes e caracterização da família (dados de identificação, escolarização, história do casal e da família, etc.), a história clínica da criança em avaliação e a percepção dos pais acerca do desenvolvimento do filho desde a gestação.

Roteiro de entrevista sobre a elaboração do diagnóstico: Este roteiro, com questões abertas visava discutir aspectos da avaliação do filho, bem como dúvidas, ideias e sentimentos dos pais. A primeira entrevista visou a discutir a experiência em relação à devolução da avaliação comportamental e eventuais dúvidas sobre o parecer psicológico. As demais deram continuidade a essa discussão, focando nos pensamentos, sentimentos e dúvidas do processo avaliativo global, incluindo as experiências com os demais exames realizados (p. ex.: médico, fonoaudiológico, laboratorial)5.

 

Análise dos dados

Os dados derivados das duas primeiras entrevistas foram utilizados na caracterização do caso. Os dados das quatro entrevistas de devolução foram analisados qualitativamente e submetidos a uma análise de conteúdo (Bardin, 2008; Laville & Dionne, 1999), levando em consideração os temas e as categorias contextualizadas nos relatos parentais, bem como categorias derivadas de estudo anterior (Semensato, 2013). A unidade de análise utilizada foi a unidade de sentido e a análise das categorias ocorreu de forma interpretativa. A análise ocorreu tanto transversalmente, em cada entrevista com o casal, quanto longitudinalmente, a fim de compreender o processo vivido pelos pais através das crenças e concepções parentais e as mudanças destas ao longo do tempo.

 

Resultados

Os resultados estão apresentados ressaltando a evolução ao longo dos encontros, tendo em vista as categorias analisadas sobre as crenças parentais: crenças sobre Características e desenvolvimento do filho; Hipóteses sobre as dificuldades do filho (etiologia do autismo); Impacto das dificuldades do filho; Processo de avaliação; Relação do casal; Vivência da paternidade/ maternidade. As categorias temáticas estão apresentadas pelo seu significado e exemplificadas por relatos parentais, como segue:

Crenças sobre as características e desenvolvimento do filho: Esta categoria refere-se à descrição dos pais de como é o seu filho em termos de características e de desenvolvimento.

E16: Pedro foi descrito pelos pais como uma criança saudável. Ambos ressaltaram o desenvolvimento da fala de Pedro no período da avaliação (p. ex. M: ele tá falando algumas outras coisas,...). O atraso da fala, para a mãe, foi causado pelo fato do filho ser mimado; para Fabio o atraso da fala gera uma imaturidade emocional no filho, pois reduz sua tolerância à frustração: e aí ele fica brabo e começa a chamar atenção (se batendo). Relatam que Pedro gosta de brincar, no entanto, Fabio ressalta que ele interage menos com as crianças na escola, trazendo exemplos disto. O primeiro sinal de alteração percebido pelos pais no desenvolvimento de Pedro foi o atraso da fala. Na segunda entrevista (E2) predominaram as crenças na evolução principalmente da compreensão e do vocabulário. Pedro foi descrito como uma criança afetiva, muito ativa. Também foi descrito por ambos como mau humorado, o que para os pais explica a irritação dele com barulhos e o quanto se incomoda com pessoas. Os pais ressaltaram as habilidades dele na exploração dos brinquedos e melhora das estereotipias: aquela coisa que ele tinha de ficar correndo de um lado pro outro sem fazer nada, Aí aquilo parou.. (M). Como primeiro sinal de alteração percebido, nessa entrevista a mãe recordou da preocupação que tinha com o choro excessivo já quando Pedro era bebê: ele nunca aceitou mudanças [M]. Na terceira entrevista (E3) a concepção de que o problema principal seria o atraso da linguagem, gradualmente, para o pai, passou a ser a dificuldade na interação: O Pedro interage com os outros dificilmente..., não sei se é um mundo a parte que ele não participa... ele tá sempre fora (P). A mãe discordou desta concepção:... ele não tem nada, ele é bem normal, tirando a questão da fala...[M]. Na última entrevista realizada (E4) o filho foi descrito também com ênfase nas potencialidades na interação, linguagem e brinquedo. Os pais estavam mais observadores: brincar assim desenvolveu horrores, a gente já tem noção do que ele tá brincando... ele já desenha bonecos, bota a boca, já tão tomando forma, antes não tinham [M]. A compreensão do brinquedo de faz de conta do filho os animou: Ele me levou pra brincar com ele na rua pegou os bonecos e pegou um pra ele e deu um pra mim e fazia um movimento... como se estivesse forcejando muito para puxar o boneco pra cima... [M] ... tá inventando coisas, que passam pela cabeça [P]. A busca de sentido para diversos comportamentos do filho foi constante no casal e algo que compartilham, mesmo com diferentes opiniões na descrição do filho.

Primeiras hipóteses sobre as dificuldades do filho: Essa categoria refere-se à crença dos pais acerca de como explicam as dificuldades do filho e sobre a etiologia do autismo. Inicialmente os pais quase não falaram explicitamente sobre autismo, mas da dificuldade do filho, a não ser nas dúvidas do pai sobre a hereditariedade do autismo. Na primeira entrevista (E1), as hipóteses alternativas foram hiperatividade e uma dificuldade emocional por ser mimado. Para Fabio as dificuldades seriam de outra ordem, por exemplo, neurológicas: a possibilidade de ser uma coisa neurológica, qual é a chance de ser alguma coisa ligada à epilepsia?... Lurdes, por sua vez, insistia: (Pedro) é normal em casa, em comparação com outras crianças. Na segunda entrevista (E2) mantiveram-se se as mesmas divergências nas suas concepções sobre a origem das dificuldades de Pedro. Porém ambos relataram se preocupar por ser pais "velhos" e a crença de que pais velhos não dão conta de uma criança (M). No final da segunda entrevista pela primeira vez apresentam uma crença partilhada da sua compreensão sobre o autismo, como um bloqueio de comunicação. Na terceira entrevista (E3) a hipótese de hiperatividade foi apresentada pela mãe. Não foram trazidas outras crenças sobre o tema na quarta entrevista (E4).

Impacto das dificuldades do filho: Essa categoria se refere às reações dos pais ao diagnóstico, no que tange a pensamentos e sentimentos relatados por estes e às primeiras atitudes tomadas. Houve uma mudança marcante nesse aspecto ao longo das entrevistas: passaram a falar de suas concepções sobre o autismo, o foco passou para o investimento do desenvolvimento do filho e crenças de que a diferença de Pedro não fosse algo transitório. Na primeira entrevista (E1) Fabio, diferente de Lurdes, relatou uma série de temores: to bem preocupado. Na segunda entrevista (E2) Lurdes continuou a apresentar crenças envolvendo uma negação ativa do conjunto das dificuldades de Pedro: tirando a questão da fala não tem com o que se preocupar. Apesar das divergências nas crenças de ambos, algumas medidas foram tomadas pelos pais neste período, como estimular Pedro a brincar mais. Na terceira entrevista (E3) os relatos sobre sentimentos se intensificaram:... nessas semanas eu que fiquei muito atacada,... até a gente saber o que que é de fato o que ele tem [M]. A crença da mãe, no entanto, é que o vínculo com o filho pode tranquilizar: acho que pelo menos eu agora to mais tranquila... o bom é estar com ele mesmo, tendo ou não problema. Nessa entrevista os pais falaram de uma sequencia de confusões que dificultaram a marcação de consultas e exames, mas simultaneamente, a crença de que não estavam postergando algo e que as decisões precisavam ter um foco no filho, mais especificamente, no que fosse melhor para Pedro: A gente quer saber logo até pra ver se tem algum tratamento, medicamento (M). Na quarta entrevista (E4), as sensações de tristeza e decepção foram marcantes: um pouquinho de tristeza. Todo mundo quer que o filho seja (normal)... [P]. Para ambos, essas sensações começaram a ser atenuadas ao ter um nome para a dificuldade do filho: na verdade a gente se salvou mais depois da gente saber realmente o que é... tá diagnosticado [P]. Ter um nome, no entanto, traz outras dúvidas, que vão desde o desenvolvimento de Pedro, sobre as atitudes deles como pais, até o autismo. Fabio se preocupou com a autonomia de Pedro no futuro: qual é a chance dele ser concretamente independente?. No caso de Lurdes, os temores estão em outra esfera, se eles não foram negligentes ao esperar: Eu achei que a gente talvez tenha sido um pouco desleixado com o Pedro, não sei, se antes teria mudado alguma coisa se a gente tivesse procurado antes... As dúvidas dos pais, de fato, informam sobre crenças subjacentes que eles têm, como por exemplo, o temor de Fabio de que o filho não seja independente no futuro, o que é diferente para Lurdes: Eu acho que até a fase de independência da gente o Pedro já vai estar praticamente normal... É claro que é lento né. As crenças dos pais acerca de doença e de cura apareceram desde a primeira entrevista.

Os pais se perceberam com uma mudança na qualidade da sua observação das crianças: Eu acho que a gente percebe mais quando a gente começa a vivenciar [M]. Também puderam começar a explorar novos interesses do filho, que eles se percebem descobrindo, principalmente no brinquedo: a gente até comprou aquela furadeira que ele gostou [M]. Assim buscaram entender o que eles crêem ser melhor para o jeito de Pedro: o que dá certo pra um não vai dar pra outro... [P]. Por fim, eles começaram a refletir acerca de outras questões, como por exemplo, a avaliar que escolas seriam melhores para o jeito de Pedro e para crianças com autismo, pensar que atendimentos Pedro necessitaria e como consegui-los, bem como a busca de informações e apoio de outras fontes, como por exemplo, de um grupos de pais. Desde o início, no entanto, o casal apresentou dificuldades nas inciativas para agilizar a resolução de problemas:...numa escolinha que tinha atendimento bem especializada pro caso dessas crianças... quando o Fabio ligou uma semana antes ela falou que aquela semana não estava atendendo pra visita né e aí a semana que a gente foi lá tinha que marcar hora... Aí que nós não conseguimos daí falar [M].

Processo de avaliação: Essa categoria temática refere-se a dúvidas despertadas no processo de avaliação, a relatos sobre os profissionais envolvidos neste período e às múltiplas avaliações necessárias. Inicialmente Fabio contava mais com a equipe e relatou dar carta branca aos profissionais. Lurdes no último encontro (E4) evidenciou uma sensação de amparo na relação com os profissionais ao mencionar a conversa com uma pessoa cujo filho está com dificuldades semelhantes: eu disse quem sabe tu espera eu falar com as psicólogas que eu levei o Pedro? Fabio também pode falar de suas dúvidas já na primeira entrevista (E1) de comunicação diagnóstica: qual a relação do autismo com patologias familiares, com epilepsia, e sobre a existência de intervenções para o desenvolvimento da fala e sobre a relação com dificuldades dele na infância. Na segunda entrevista (E2), a dúvida compartilhada pelos pais foi qual a extensão da dificuldade do filho. Na terceira (E3) apareceram dúvidas sobre estar no "caminho certo" na avaliação, quando a mãe conversou com uma psicóloga que ela conhece, que lhe disse: ao meu ver o Pedro não tem nada de autismo... ela trabalhou com várias crianças, mas aí ela viu o Pedro um instante ali, que ela olhou, ficou admirada do guri. Neste período o pai trouxe crenças sobre saúde, doença e tratamento: quem acha a doença, acha a cura. Por fim pais relataram importância de saber o nome autismo e de ter o processo documentado: eu disse que eu já tenho um laudo, eu já sei o que o Pedro tem [M].

Relação do casal: Essa categoria contém relatos do casal acerca de sua relação. Os relatos foram escassos, pois mesmo ao ser perguntado, as respostas pouco comunicavam verbalmente. Falaram sobre ser difícil conversar e da divergência de opiniões. A relação coparental foi permeada pelas preocupações de ambos com incertezas sobre diagnóstico do filho e as dificuldades na comunicação do casal: a visão que ele tem eu não tenho na verdade (M). Nesse período eles relataram não concordar em determinados assuntos, mas que conversavam. Alterações de como tentam lidar com isto se deram a partir do terceiro encontro, quando contam diálogos sobre as questões envolvendo Pedro, um primeiro momento que a expressão a gente, por exemplo, foi utilizada. Por fim, os aspectos da coparentalidade foram ressaltados, com conversas sobre que seria melhor para Pedro e como cuidá-lo.

Vivência da paternidade/maternidade: Essa categoria envolve relatos sobre pensamentos e sentimentos da maternidade ou da paternidade. Esses relatos envolveram a tendência a culpabilização do pai expressa nas primeiras entrevistas. O sentido que o pai atribuiu ao se culpabilizar foi uma identificação com o filho e entendimento deste. Os relatos maternos envolveram sua crença do que é a maternidade: Ser mãe é ser advogada, médica, psicóloga, professora(M). A questão da idade dos pais foi trazida como algo difícil para Lurdes ao ser confundida com uma avó e o medo da relação da idade deles com as dificuldades do filho. Nas últimas entrevistas, outros relatos envolveram a comparação dos filhos: o outro demorou um pouquinho mais pra falar, mas não demorou tanto, com 3 anos ele conversava direto, assim, então ele é diferente em tudo [M]. A outra comparação que surgiu foi do pai com o filho e a dúvida sobre ser autista: a pessoa pode ser autista a vida inteira e não saber? Eu faço movimentos repetitivos... esses dias me peguei fazendo isso... [P]. Um outro relato envolveu a observação da mãe sobre o sofrimento da filha, que está ansiosa e muito preocupada com irmão: eu acho que ela fica tão ansiosa quanto a gente, porque ela sai, ela vê outras crianças...[M]. A vivência da maternidade ou paternidade ainda envolveu relatos sobre a relação com a infância dos pais, principalmente de Fabio, sobre as suas dificuldades na infância (p. ex: histórico de sintomas de TOC, acumulação de lixo, desligamentos), o que explicou algumas de suas preocupações em relação ao filho: toc é uma coisa que passa de mãe pra filho, de pai pra filho?.

 

Discussão

Nas entrevistas de comunicação do diagnóstico o processo iniciou com o foco nas crenças sobre a pessoa do filho. Posteriormente as concepções sobre o autismo entraram em cena e por fim, o processo se encerrou resgatando quem é Pedro. Neste processo a condição dos pais de observar Pedro melhorou significativamente ao longo dos quatro meses, conforme avaliação deles e corroborado pelos exemplos trazidos por eles. Este crescimento por parte dos pais foi facilitado pela sua crença no potencial do filho.

Os resultados deste estudo foram consistentes com a premissa de que as crenças influenciam as decisões tomadas pelos pais (Dardennes, et al., 2011; Anbar, et al., 2010; Harrington, et al., 2006). Os resultados revelaram que algumas crenças mudaram ao longo das primeiras semanas, alterando a compreensão do que lhes foi comunicado; isso se deu à medida que a vivência foi significada e compreendida por eles. As alterações no conteúdo e qualidade das crenças foram evidentes nas diversas categorias analisadas, mas principalmente nas que se referiam ao Impacto do autismo e ao Processo de avaliação. Nessas categorias os relatos evidenciaram mudanças na reação e na sua percepção das reações à avaliação e ao autismo. Também foi evidente a mudança no foco ao longo dos quatro meses: das dúvidas sobre a avaliação para dúvidas e reflexões com o foco no filho. A proximidade com um profissional que acompanhe este processo pode ser um grande facilitador para os pais e, consequentemente para a vida da criança e da família. Tendo em vista as hipóteses da influência das crenças nos sentimentos, pensamentos e atitudes das pessoas, as crenças de familiares de crianças com autismo em diferentes contextos e culturas tem sido recentemente alvo do interesse de profissionais da área médica (geneticistas, pediatras, clínicos gerais) e da psicologia, a fim de planejar programas de tratamento para essas crianças (Dardennes et al.; 2011, Anbar et al, 2010; Harrington, et al., 2006; Miller, Schreck, Mulick & Butter, 2012). Além disto, as crenças provem de um material que, na clínica, os profissionais têm acesso no período do diagnóstico de uma criança, os relatos parentais. Esses resultados reforçam a importância de que a comunicação do diagnóstico seja realizada de fato, como um processo e não um único momento no qual os pais recebam a informação sobre o autismo.

As crenças sobre doenças são representações importantes na medida em que fornecem uma base para interpretar sintomas e atribuir lhes um significado. Em geral os relatos forneceram vários indicativos da qualidade desta vivência e das crenças do casal participante neste momento, como por exemplo, (1) das expectativas positivas em relação ao filho, (2) expectativas negativas em relação ao(a) parceiro(a) como fonte de apoio recíproco, (3) dos principais temores dos pais sobre o futuro do filho, principalmente quanto ao grau de autonomia, (4) do que os pais esperam de um tratamento, inclusive da possibilidade de cura, (5) das expectativas que cercam dar um nome a dificuldade como sendo dar uma chance de cura, (6) das expectativas do que signifique ter um laudo como se sentir mais seguro enquanto "portador" de um conhecimento, etc.

As crenças foram fontes de informação principalmente no que tange a busca de um significado para o diagnóstico de autismo de seu filho. No caso apresentado, os pais tiveram pouco consenso nas suas concepções principalmente na primeira entrevista de comunicação do diagnóstico, fato que se atenuou posteriormente. Havia duas versões distintas: o pai em busca da confirmação de algum diagnóstico e a mãe em busca da confirmação de que tudo se resolveria sem qualquer tipo de intervenção profissional. De forma coerente com suas concepções iniciais, ele participou com mais informações relevantes sobre as dificuldades de Pedro, enquanto a mãe "defendeu" a sua crença da não existência de alterações significativas na primeira entrevista. Em se tratando de autismo, as crenças podem funcionar como "teorias" dos pais sobre o diagnóstico e sobre o transtorno, bem como as possibilidades de cada um dos parceiros e do casal de lidar com o diagnóstico e das expectativas futuras com respeito ao filho. Esse tipo de crenças parece ter reflexos na compreensão do filho, nas práticas educativas e nas escolhas do tratamento para a criança (Dardennes, et al., 2011, Anbar, et al., 2010; Harrington, et al., 2006; Miller, et al., 2012; Ravindran & Myers, 2012; Selkirk, McCarthy, Lian Schimmenti & LeRoy, 2009) e na adesão ao tratamento (Sperry & Sharfranske, 2004).

Com o transcorrer das entrevistas, as crenças parentais também podem ser mais bem significadas pelos profissionais, ao ter acesso a outras informações. Exemplo disto foi, por um lado a "certeza" do pai acerca de um diagnóstico também envolvia crenças subjacentes, como a de que ele podia ser "autista" e que identificava o filho consigo e por parte da mãe, que tinha que defender a normalidade do filho, tendo em vista a fragilidade dela: sem saber o que pensar e o que fazer. O mesmo aconteceu nas crenças sobre cura, que impulsionavam ainda mais a busca de Fabio pelo diagnóstico do filho: a crença de quem acha a doença acha a cura, achar uma doença (para os dois) poderia representar achar a cura. A influência das crenças nos objetivos atribuídos aos tratamentos, como por exemplo, que a intervenção certa levará a cura tem repercussões nas atitudes dos pais frente ao plano de tratamento para a criança (Dardennes, et al., 2011, Anbar, et al., 2010; Harrington, et al., 2006; Miller, et al., 2012; Ravindran & Myers, 2012; Selkirk, et al., 2009).

O momento da comunicação de um diagnóstico tal como o autismo, cujo tratamento não se dá através de uma prescrição e que não pode ser eliminado, é um momento descrito como devastador para muitos casais. A sensação de perda de suas concepções e verdades pode ser muito forte, dando início de um processo de luto (Oppenheim, et al., 2007) pela trajetória que eles imaginavam fazer com este filho e que agora terá que ser revista a fim de melhor atender as necessidades da criança. Assim, pode se compreender o percurso de Fabio e Lurdes. Relataram sensações de medo, tristeza, ansiedade, num processo de elaboração das perdas do que imaginavam para Pedro. De fato, esse processo de luto é natural nas famílias que enfrentam problemas que necessitem diversas alterações na vida dos pais e do sistema familiar, tais como doenças crônicas e transtornos do desenvolvimento e esse luto tem sido associado a uma boa elaboração do diagnóstico (Oppenheim, et al., 2007). As crenças, portanto, são interpretações que, impulsionem ou não os casais, funcionam como indicativos do processo deles e permitem que os planos terapêuticos, por exemplo, possam contemplar tanto os recursos como as fragilidades do casal; assim por um lado, contempla a crença deste casal na capacidade de desenvolvimento de Pedro, e por outro lado, o sofrimento materno pela crença de ter sido negligente.

Pareceu importante para os pais afirmarem e estabelecerem que Pedro não se resumia ao Autismo. Esse ressaltar quem é o filho e a crença nos seus potencias tem sido avaliadas como estratégias importantes para os pais lidarem com o diagnóstico (Hines, Balandin & Togher, 2012). Estratégias utilizadas neste momento por parte dos pais podem ser fontes de sensação de estranheza pelas equipes. Compreender essas estratégias e as crenças, no entanto, propicia maior empatia para com os pais. Desde a primeira entrevista os pais tiveram essa necessidade de atribuir sentido a comportamentos do filho. Posteriormente, os relatos evidenciaram isto em relação ao autismo e ao seu próprio comportamento. A atribuição de sentido é um aspecto do sistema de crenças e, no caso de Fabio e Lurdes, parece ter funcionado como o propulsor. Foi o primeiro processo do casal e o processo que ocorreu a cada nova informação ou observação.

Por vezes, é possível que ao tomar contato com essas crenças os profissionais avaliem por corrigi-las imediatamente pelo temor que os pais não aceitem o diagnóstico. Os dados, no entanto, revelaram que o casal, com o passar do tempo, foi capaz de rever algumas das concepções e que não só a aceitação, mas a compreensão do diagnóstico trata-se de um processo e como tal, é gradual. De fato, há evidências que as preocupações parentais sobre o diagnóstico de autismo são diferentes dependendo do momento (Guinchat, et al., 2012).

Tendo em vista que as histórias sobre as situações de vida das pessoas são interpretações sobre estas vidas baseadas em suas crenças, as crenças, sejam as individuais, de casais, ou familiares são importantes fontes para sua compreensão do diagnóstico de algum membro da família, no caso, do filho e seu entendimento de quem é o filho e o sentido de suas características.

É importante ressaltar que as famílias são capazes de se adaptar bem ao fato de ter uma criança com deficiência, e que, embora a maioria dos pais experimente decepção, estresse e preocupações frente ao diagnóstico de deficiência em um filho, isto pode ser considerado natural nesta circunstância. No caso do autismo, um potencial estressor, ressalta-se a importância da família poder falar sobre esse momento, trazer suas crenças e concepções, o que pode facilitar uma ressignificação dessa vivência (Gagnebin, 2006) e, além disso, pode influenciar em como os pais vão se movimentar neste período.

 

Considerações finais

Este artigo lançou bases para uma investigação sobre a importância das crenças parentais no processo de elaboração parental do diagnóstico de autismo de um filho. O papel das crenças frente a este processo foi tanto o de proteger dos sentimentos desagradáveis quanto o de buscar sentido a fim de criar seu entendimento frente ao que ouviram dos profissionais. A evolução e alterações nas crenças em período tão pequeno mostrou que o processo de lidar com o diagnóstico já inicia na comunicação e sofre transformações bastante precoces no sentido da elaboração dos pais, que pode durar um longo tempo. As crenças se mostraram bons indicativos de como os pais estão compreendendo o que passam naquele momento e que caminhos estão visualizando. Novos dados derivados de informações de profissionais ou de outras fontes, de vivências ou observações sobre o filho, etc., vão se agregando às antigas crenças e produzindo transformações nestas.

Os dados do estudo não podem, no entanto, ser generalizados. O intuito foi compreender a importância das crenças parentais no processo diagnóstico de forma contextualizada. Sugere-se, portanto, realização de pesquisas com triangulação de dados, envolvendo crenças de profissionais que trabalham com essas crianças, sobre autismo e sobre os pais, como por exemplo, como profissionais lidam e compreendem as reações destes. Estas informações são relevantes para considerações sobre planos de tratamento para essas crianças e para compreender a vivências destas famílias de forma mais integral. Pesquisas sobre as crenças de profissionais acerca do autismo são poucas e recentes e só vem sendo realizadas em outros contextos socioculturais, tais como Irlanda (Ridge & Guerin, 2011) e Inglaterra (O’Reilly, Cook & Karim, 2012).

Compreender a vivência destes pais necessita ir além da aparência e às vezes além da palavra, valorizando aspectos qualitativos dos fenômenos presentes na vida dos pacientes e sua família. Compreender, por exemplo, o significado da vida no processo do cuidado inclui não somente atribuições técnicas, mas também capacidade de perceber e compreender o ser humano e como ele constrói as suas histórias através, por exemplo, de suas crenças. As intervenções com pais de crianças com autismo, portanto, precisam incluir as crenças parentais, tanto as que se referem a fragilidades quanto a potenciais dos pacientes e de seus familiares. Melhorar a comunicação dos profissionais com os pais pressupõe poder escutar sua vivência a partir destes processos, como são as suas crenças, e não exclusivamente a partir dos sintomas de autismo.

 

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Endereço para correspondência
Márcia Rejane Semensato
E-mail: msemensato@gmail.com

Enviado em: 10/09/2014
1ª revisão em: 14/11/2014
Aceito em: 05/12/2014

 

 

1 Artigo derivado da tese de doutorado da primeira autora, orientada pela segunda. Apoio: CAPES.
2 Os nomes dos participantes foram alterados, bem como informações que poderiam identificar a família.
3 O presente estudo foi submetido ao Comitê de Ética em Pesquisa com parecer de aprovação sob o número 31528.
4 A aplicação dos instrumentos em todas as entrevistas foi feita por um profissional psicólogo.
5 Conforme combinado com o casal, eles foram posteriormente encaminhados para atendimento psicoterápico em uma clínica de psicologia da universidade.
6 E1, E2, E3, E4 referem se respectivamente à primeira, segunda, terceira e quarta entrevista.