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Pensando familias

versão impressa ISSN 1679-494X

Pensando fam. vol.25 no.2 Porto Alegre dez. 2021

 

ARTIGOS

 

Enfrentamento materno do câncer pediátrico em quatro fases da doença

 

Maternal coping with childhood cancer in four stages of the disease

 

 

Claudiane Aparecida Guimarães1, I ; Letícia Lovato Dellazzana-Zanon2, II ; Sônia Regina Fiorim Enumo3, II

I Universidade de Uberaba - UNIUBE
II
Pontifícia Universidade Católica de Campinas (PUC-Campinas)

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

O cuidador familiar fornece apoio fundamental em doenças crônicas como o câncer, sofrendo a maior sobrecarga física, emocional e social. Esta pesquisa analisou o processo de enfrentamento de quatro mães de crianças com câncer com idade entre 7-13 anos, em diferentes fases da doença – diagnóstico [M1], tratamento [M2], manutenção [M3] e terminalidade [M4]. As mães responderam individualmente o Protocolo de Entrevista sobre Enfrentamento Materno do Câncer de Crianças e Adolescentes, com 34 questões. Os maiores estressores relacionaram-se à dificuldade do prognóstico do caso, à falta de tempo e energia para dedicar-se à família e às dificuldades financeiras. As mães apresentaram mais estratégias de enfrentamento adaptativas, como: Autoconfiança, Resolução de problemas, Busca de informação e Acomodação, indicativas de percepção de desafio às necessidades de Relacionamento, de Competência e de Autonomia. Os dados evidenciam a necessidade de avaliar e atender às demandas dessa população, considerando a fase da doença.

Palavras-chave: Cuidadoras de criança, Coping, Câncer pediátrico.


ABSTRACT

The family caregiver provides fundamental support in chronic diseases such as cancer, suffering the greatest physical, emotional and social burden. This research analyzed the process of coping with four mothers of children with cancer aged 7-13 years, at different stages of the disease - diagnosis [M1], treatment [M2], maintenance [M3] and terminality [M4]. Mothers individually answered the Interview Protocol on Coping with Cancer of Children and Adolescents, with 34 questions. The biggest stressors were related to the difficulty of the prognosis of the case, the lack of time and energy to dedicate to the family and the financial difficulties. Mothers presented more adaptive coping strategies, such as: Self-confidence, Problem solving, Information search and Accommodation, indicative of perceived challenge to the needs of Relationship, Competence and Autonomy. The data show the need to assess and meet the demands of this population, considering the stage of the disease.

Keywords: Child caregivers, Coping, Pediatric cancer.


 

 

Introdução

O diagnóstico de câncer pediátrico acarreta um impacto inegável para a dinâmica familiar, sendo vivenciado como uma experiência dolorosa e desesperadora, a partir da qual a família precisa buscar alternativas para enfrentar o impacto dessa nova realidade (Paula et al., 2019). Embora a família possa estar totalmente inserida no tratamento de seu filho, ela não está preparada, principalmente do ponto de vista psicológico, para enfrentar todas as mudanças decorrentes de um tratamento tão agressivo como o câncer (Anjos et al., 2015). É preciso que a família desenvolva novas habilidades e reorganize seu cotidiano para solucionar os conflitos decorrentes da hospitalização da criança e lidar demandas físicas, psicossociais e financeiras da doença (Compas et al., 2014).

De acordo com o Instituto Nacional do Câncer (INCA, 2019), as taxas brutas de incidência de tumores pediátricos no Brasil, em 2020, foram de um milhão de crianças e adolescentes (0–19 anos) e de 8.460 novos casos, sendo a primeira causa de morte. Nessa faixa etária, os tumores mais frequentes são as leucemias. Entretanto, últimas quatro décadas, tem ocorrido um significativo progresso no tratamento do câncer nessa faixa etária quando há o diagnóstico precoce e tratamento, alcançando a cura em 80% dos casos.

Nesse contexto, o cuidador principal é fundamental para os cuidados da criança e adolescente com câncer. Geralmente, o paciente pediátrico tem como porta-voz das tomadas de decisões clínicas, terapêuticas, éticas e sociais o familiar principal, que, geralmente, é a mãe (Compas et al., 2014; Nascimento & Faro, 2015). As crianças não podem tomar as decisões relacionadas à sua saúde; estas são decididas por seu responsável que representaram os seus interesses (Bandinelli & Goldim, 2017). Os pais devem proteger seus filhos dos danos e fazer o melhor em prol dos mesmos, o que não impede da criança ser envolvida. Este é um processo de enfrentamento individual e interpessoal, em que, para o pai e para a mãe, o coping de controle primário (por exemplo, resolução de problemas, modulação emocional) e de controle secundário (por exemplo, aceitação, reavaliação cognitiva) estavam associados a sintomas depressivos, especialmente o coping de controle secundário, em que a pessoa não pode lidar diretamente com o estressor (Compas et al., 2015). As estratégias de enfrentamento dos pais influenciam os comportamentos dos filhos (Monti et al., 2017), cujas respostas podem variar de acordo com idade, sexo, experiência prévia com cirurgia e estresse do cuidador (Carnier et al., 2015).

Desde o diagnóstico de uma doença potencialmente mortal, como o câncer, todos os envolvidos defrontam com rupturas, limitações e privações (Price et al., 2016). Nesse processo, as pessoas responsáveis pelo paciente precisam ajustar antigos papéis a essa nova realidade. Na jornada da doença, o cuidador familiar principal geralmente se vê obrigado a abrir mão de sua própria vida para cuidar de seu familiar; sua rotina é alterada, a aprendizagem de competências é fundamental, assim como a remodelação do estilo de vida e, com o agravamento da doença, o paciente se torna cada dia mais dependente do cuidador (Blanc et al., 2016).

Esta situação pode gerar uma sobrecarga física e emocional (Almico & Faro, 2014; Compas et al., 2014; Farinhas et al., 2013), levando a uma trajetória de desamparo e depressão que pode se manter substancialmente até cinco anos após o diagnóstico (Sharp et al., 2020). Soma-se a esta condição a possível perda de um familiar, a qual, em qualquer situação, é considerada um dos eventos mais estressantes do ser humano, e a perda de um filho é um dos lutos mais difíceis de serem superados (Barbosa et al., 2012). A morte de um filho é acontecimento indescritível, para os pais que cultivaram planos e idealizações para sua prole, essa morte tão precoce é inaceitável e irreparável (Carvalho & Azevedo, 2009). As perdas para esses pais são múltiplas, além da morte do filho, morrem também seus sonhos, esperanças, sua ilusão de imortalidade, ficando ainda a impressão de fracasso na missão como pais (Barbosa et al., 20012; Menezes et al., 2007).

O processo de enfrentamento do adoecimento e da ameaça de morte do filho, em geral, caracteriza-se por sentimento de culpa, impotência, fracasso, estranhamento, raiva e punição (Duarte et al., 2012; Ljungman et al., 2014; Vrijmoet-Wiersma et al., 2008). Para os cuidadores, essa experiência é dolorosa, desesperadora, com a sensação de perda sempre presente (Beltrão et al., 2007; Carvalho & Azevedo, 2009; Peçanha, 2008; Sanches, 2012). A raiva e a revolta, por vezes, podem ser direcionadas à figura de Deus. Na relação com a equipe de saúde, podem surgir reações de tristeza, impotência, inconformismo e pavor diante o desconhecido. Esses sentimentos e reações denotam o quanto esse momento é de sofrimento e incertezas, e apontam a importância da relação entre equipe de profissionais e familiares (Duarte et al., 2012; Menezes et al., 2007).

Os estudos sobre os impactos da hospitalização da criança na família em nosso país, em geral, são qualitativos, descritivos, exploratórios, feitos com entrevistas, havendo poucos que utilizam instrumentos avaliativos (Bandinelli & Goldim, 2017; Silveira et al., 2019), como escalas (Santos & Figueiredo, 2013), havendo poucas pesquisas sobre o tema (Schardong et al., 2017). Os estudos, em geral, são realizados por pesquisadores da área médica (Fernandes et al., 2019), apesar das possíveis contribuições da Psicologia.

Em nível internacional, há poucas as revisões sistemáticas sobre os efeitos de longo prazo do câncer nos pais (Ljungman et al., 2014; Pai et al., 2007; Wakefield et al., 2011), sendo os estudos mais quantitativos (Ljungman et al., 2014). Faltam estudos sobre o enfrentamento dos pais nas diferentes fases do tratamento (Boman et al., 2003; Ljungman et al., 2014; Prussien et al., 2018), e sobre como pais e mães vivenciam pessoalmente o tratamento do câncer (Compas et al., 2015). Há, porém, indicações de que os sintomas de estresse pós-traumático nas mães são mais frequentes após o diagnóstico do câncer (Lawrenz et al., 2016; Sharp et al., 2020), assim como as respostas de esquiva, pensamentos intrusivos e reatividade emocional (Kazak et al., 2004). Sintomas de ansiedade, depressão e estresse pós-traumático podem variar de intensidade nas fases da doença, na forma como a família enfrenta este processo, mas tendem a perdurar por muitos anos, em maior grau para as mães (Duarte et al., 2012; Vrijmoet-Wiersma et al., 2008). Há evidências de que o ajustamento e o enfrentamento dos pais são melhores preditores do seu funcionamento emocional, em comparação com variáveis médicas e aquelas relacionadas à doença (Ljungman et al., 2014), evidenciando a importância do estudo do processo de enfrentamento dessas cuidadoras desde o diagnóstico da doença, passando pelas fases do tratamento e pós-tratamento. Nesse sentido, pesquisas qualitativas poderiam fornecer dados relevantes para a intervenção na área, de forma a prevenir também futuros problemas psicológicos para essa população (Ljungman et al., 2014; Prussien et al., 2018).

Da mesma forma, não há estudos sobre esse tema usando a abordagem mais recente de análise do coping, proposta com uma perspectiva desenvolvimentista, centrada em processos de autorregulação do comportamento, da cognição e da emoção, proposta pela Teoria Motivacional do Coping (TMC) (Skinner et al., 2003; Skinner & Zimmer-Gembeck, 2016). Esta abordagem teórica poderia contribuir para o estudo das estratégias de enfrentamento (EE) nesse contexto, fornecendo dados processuais e funcionais que subsidiem futuras propostas de intervenção psicológica nessa área. A TMC define o enfrentamento como a forma como o indivíduo regula seu comportamento, sua emoção e sua orientação motivacional sob condições de estresse psicológico.

Nessa abordagem, as EE são compreendidas como um processo transacional em que vários componentes da reação ao estresse aparecem em tempo real (Skinner & Zimmer-Gembeck, 2016). Incluem respostas voluntárias e involuntárias, abrangendo esforços pessoais no intuito de manter, restaurar e reparar as principais necessidades psicológicas - de relacionamento (sentir que pertence a um grupo), competência (perceber que dá conta de resolver as demandas) e de autonomia (agir conforme seus valores) - quando afetadas por eventos estressantes (Skinner et al., 2003).

A TMC propõe um sistema hierárquico de famílias de coping, as quais representam uma classe de preocupações organizadas em padrões de resposta ou tendências de ação, revelando as funções adaptativas das estratégias e abarcando diversos níveis de categorias de baixa ordem. Esse sistema de famílias de enfrentamento contém: (a) os comportamentos observados em cada família de enfrentamento, (b) as emoções a ela relacionadas, e (c) as tendências de rota de ação ou a orientação do indivíduo. Skinner et al. (2003), após ampla revisão de mais de cem escalas de enfrentamentoe análise de mais de quatrocentas categorias de enfrentamento, propuseram como básicas 12 famílias de coping, sendo seis adaptativas, por serem relacionadas à percepção de desafio das necessidades psicológicas básicas de: Relacionamento - autoconfiança e busca de suporte social; Competência - resolução de problemas e busca de informações; e Autonomia - ajustamento/adaptação e negociação; e seis mal adaptativas no médio e longo prazo, relacionadas à percepção de ameaça às NPPB de: Relacionamento - delegação e isolamento; Competência - desamparo e fuga; e de Autonomia - submissão e oposição. Frente a esse contexto e baseando-se na Teoria Motivacional do Coping, a presente pesquisa teve por objetivo descrever e analisar o processo de enfrentamento de 4 mães de crianças com câncer, em fases diferentes da doença: no início do diagnóstico, durante o tratamento, em manutenção e na fase de terminalidade.

 

Método

Esta pesquisa foi um estudo quanti-qualitativo. Participaram do estudo quatro mães de crianças com câncer, a partir de uma amostra de conveniência, em fases distintas da doença: (a) diagnóstico (fase inicial) – M1; (b) aguardando transplante medular (fase tratamento) – M2; (c) em manutenção (após tratamento medicamentoso) - M3; e (d) terminalidade (prognóstico de Cuidados Paliativos) – M4. As quatro crianças eram atendidas por uma casa de apoio de uma cidade do interior de Minas Gerais, que oferece suporte tanto a crianças e adolescentes com doenças onco-hematológicas e outras hemopatias quanto a suas famílias.

Cabe esclarecer que, inicialmente, a amostra seria composta por mães com crianças com câncer em Cuidados Paliativos (CP). Entretanto, havia apenas um caso de criança com prognóstico de CP na instituição no período em que a coleta de dados foi realizada. Por essa razão, a coleta de dados foi realizada com mães de crianças com câncer que se dispusessem a participar voluntariamente da pesquisa.

Recorreu-se a uma amostra de cuidadores familiares, definidos como um membro da família que fosse a pessoa mais presente nos cuidados da criança, tendo como critérios de inclusão: ser o cuidador familiar do paciente; não exercer o cuidado de forma remunerada; concordar em participar da pesquisa espontaneamente. Os critérios de exclusão foram: ser menor de idade, exceto se fosse a própria mãe da criança, e não responder a todos os instrumentos psicológicos fixados na pesquisa. Foram respeitadas as normas 466/2012 do Conselho Nacional de Saúde (CNS, 2012), as normas do Conselho Federal de Psicologia (CFP, 2000) e as diretrizes do Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos da PUC-Campinas, o qual avaliou e aprovou o estudo (Parecer nº 548.116).

As mães tinham entre 28 e 49 anos de idade (Mediana = 36,5). Três eram casadas e uma divorciada. Em termos de escolaridade, três tinham Ensino Médio completo e uma, nível Superior. Todas cuidavam do filho=em tempo integral, não exercendo suas atividades profissionais. As crianças eram do sexo masculino, com idade entre 7 e 13 anos (Mediana = 9,5 anos). Todas estavam matriculadas na escola, três no Ensino Fundamental e uma no Ensino Médio, mas três delas estavam impossibilitadas de frequentar a escola devido ao tratamento, que exige internação hospitalar. Todas as crianças tinham como diagnóstico a Leucemia Linfoblástica Aguda (LLA).

Foi utilizado o Protocolo de Entrevista sobre Enfrentamento Materno de Crianças e Adolescentes com câncer, baseado na Motivational Theory of Coping Scale-12 [MTC–12](Less, 2007).Este instrumento foi adaptado para esta pesquisa, incluindo, além das 12 perguntas sobre estratégias de enfrentamento propostas pelo estudo original, outras questões que permitem acessar o episódio de enfrentamento completo, com informações sobre a frequência e a topografia da resposta, sua funcionalidade e efetividade, na visão do entrevistado, segundo proposta de Beers (2012). O protocolo para avaliação do processo de enfrentamento contém três campos: I – Caracterização do cuidador e do paciente, II – Demanda (identificação dos estressores) e o III – Processo de enfrentamento, avaliado por meio da pergunta geral: “O que você tem feito para lidar com a situação de cuidar de seu filho com câncer nesta fase da doença?”.

 

Resultados e Discussão

Todas as quatro mães apresentaram um conjunto de respostas de coping mais adaptativo para lidar com a doença dos filhos, relacionado à percepção de desafio às três Necessidades Psicológicas Básicas (NPB): Competência, por meio de resolução de problemas e busca de informação;de Autonomia, por meio de acomodação; e de Relacionamento, por de autoconfiança. As mães apresentaram menos estratégias mal adaptativas, mas a percepção de ameaça à NPB de Autonomia, por meio de submissão e oposição se destacaram, seguidas de isolamento, indicativo de uma percepção de ameaça à NPB de Relacionamento, entendendo que não podiam confiar nos recursos sociais disponíveis, especialmente M4, com o filho em fase terminal da doença. A mãe cujo filho estava em tratamento (M2) apresentou o maior repertório de EE, tanto adaptativas, como mal adaptativas. M3 apresentou a segunda maior média de EE adaptativas e M4 a segunda maior frequência de EE mal adaptativas (Tabela 1). Todas elas avaliaram que essas estratégias de enfrentamento adaptativas ajudaram a lidar no cuidado com o filho e que não fariam diferente.

 

 

Seguindo o curso da doença, observa-se que, na fase de diagnóstico (M1), a mãe procurou lidar com a situação de uma forma mais pró-ativa, tentando se acomodar e ressignificar o que estava vivendo, buscou informações e suporte social, procurou resolver os problemas e agir com autoconfiança. Contudo, procurou também se isolar, percebendo-se sem apoio social por parte de pessoas significativas. Talvez por depender do diagnóstico médico, não apresentou quaisquer respostas relativas à família de coping de negociação. Foi, porém, a mãe com menos coping mal adaptativo desta amostra, indicando que estava interpretando os eventos estressores mais como um desafio do que uma ameaça às suas NPB (Tabela 1).

A mãe cujo filho estava em tratamento, aguardando o transplante medular (M2) tinha um bom repertório de estratégias adaptativas, percebendo a situação mais como um desafio à sua NPB de Competência, de Relacionamento e de Autonomia. Contudo, por ter que se submeter ao diagnóstico e indicação para cirurgia, e às demandas dos cuidados com o filho, também percebia a situação como uma ameaça à sua NPB de Autonomia (Tabela 1).

A mãe que tinha o filho em uma etapa mais avançada, de manutenção após o tratamento medicamentoso (M3) apresentou o segundo conjunto de estratégias mais adaptativas, procurando se acomodar à situação e agir com autoconfiança, buscar suporte e resolver os problemas. Por outro lado, ainda reagia à situação com estratégias mal adaptativas de submissão e de isolamento social (Tabela 1)

A única mãe que apresentou respostas de fuga da situação foi M4, diante da possibilidade de morte do filho, complicando o quadro pela ausência de busca de suporte social. Como fator de proteção, contudo, apresentou mais estratégias de acomodação e negociação, procurando atender sua NPB de Autonomia, e de resolução de problemas, procurando ser competente para lidar com a situação (Tabela 1).

Considerando as respostas do conjunto dessas mães, frente aos estressores da doença do filho, a família de coping com maior frequência foi a de acomodação, indicativo de uma percepção de desafio à NPB de Autonomia (Tabela 1). As mães procuraram se adaptar e se acalmar por meio de distração. Percebe-se, ainda, que essa experiência de lidar com a doença propiciou mudanças na forma de pensar e agir, caracterizada como mudanças positivas, indicando a EE de ressignificação ou reestruturação cognitiva. Houve verbalizações de aceitação da realidade, mas sem desanimar, mostrando que, independentemente do estágio da doença, não há inatividade, conforme pode ser observado nos relatos a seguir:

“Olha, eu quero que tudo dê certo, mas hoje eu olho para trás e consigo agradecer tudo que eu passei, sabe?; ”[...] eu criei uma esperança no meu coração e não desgrudo dela.”;  “Procuro focar em outras coisas, em tipo assim... eu vou, ajuda uma pessoa fazer algo bom..., eu procuro fazer o bem a outras pessoas para esquecer isso e me dá uma alegria grande no meu coração, é uma coisa que vem de dentro mesmo, sabe? Uma alegria espontânea.” (M3) [sic];

“Eu tento fazer as coisas, para ele não ter ‘inhaca’, para ele não ficar focado no problema, aí eu saio com ele, eu faço as coisas que dá para fazer com ele”; “Nós vai para a roça, nós solta pipa; eu encho a piscina dele...”; “Eu não aceito as coisas na verdade, mas eu tenho que seguir a minha vida, tenho que mostrar para ele que ele tem que reagir.” (M4). [sic]

Pesquisas ressaltam que a aceitação da doença, do cenário, pode facilitar a adaptação das situações estressoras e, consequentemente, enfrentar o processo da doença de forma que propicie bem-estar ao filho e a ela mesma (Almico & Faro, 2014; Compas et al., 2014; Faria & Cardoso, 2010). Almico e Faro (2014) destacam também a religiosidade como estratégia de adaptação e manejo diante dos eventos estressantes. Buscam, por meio da religiosidade, força e coragem, explicação e sentido para a doença do filho, como também o fortalecimento da esperança na cura da criança.

Lidar com os estressores da doença e tratamento do filho por meio de estratégias relacionadas à família de coping de autoconfiança nesta amostra significou aceitar a responsabilidade imposta, assumindo seu papel de mãe, com base no controle emocional e na fé religiosa. A NPB de Relacionamento dessas mães pôde ser assim atendida. Os relatos seguintes ilustram essa forma de enfrentamento:

“Eu tento enfrentar. Eu tenho que passar por isso mesmo” (M1) [sic];

“A maior estratégia é essa, não tem outra, tem que ter fé, saber que vai passar, que é só um resgate, sabe?” (M2) [sic];

“Eu respiro, eu rezo muito para Deus me dar muita paciência para eu conseguir, para eu conseguir segurar as coisas no controle.” (M4) [sic].

As estratégias dessa família de coping foram referenciadas por Almico e Faro (2014) ao apontarem a ‘medicalização do sofrimento’ no sentido de regular o estado emocional e psicológico ante o sofrimento atrelado ao cuidado do filho. Esse controle é com o intuito de transmitir aos filhos apoio e confiança.

Em relação à família de coping de resolução de problema, as mães apresentaram estratégias que as auxiliaram no planejamento de ações para minimizar sofrimento da criança ou solucionar algum problema pontual, procurando não sofrer por antecedência, o que promove a percepção de controle em algum nível. É uma forma de satisfazer a NPB de Competência. Com essa função, o coping religioso também foi relatado, considerando a fé em Deus para o encontro da melhor solução, ilustrado nos seguintes relatos:

“Eu vou atrás dos médicos, eu converso sabe? Vou atrás da enfermeira. Para melhorar ele assim, dá um alívio para ele.” (M1) [sic];

“Porque eu criei rotinas e eu descobri que, criando rotinas, a vida fica mais fácil, mais prático e mais leve.”;  

 “Eu busquei muita oração, muito mesmo, sabe? Viver e vivenciar a presença de Deus na minha vida.” (M3)  

[sic].

Esses dados são coerentes com outros estudos (Coletto & Câmara, 2009; Faria & Cardoso, 2010; Santos, 2013), que indicam a resolução de problemas como uma das EE mais frequentes em cuidadores familiares. Almico e Faro (2014) ressaltam que a resignação, a abnegação e a dedicação são formas empregadas pelas mães para atingirem o bem-estar físico, emocional e psicológico dos filhos. Destacam, também, que, dessa forma, buscam gerenciar dificuldades suscitadas pela presença da doença.

Também buscando a satisfação da NPB de Competência, a busca de informação por parte das mães se deu de várias formas, ficando mais evidente por meio da comunicação com profissionais envolvidos no cuidado do filho e pela internet. Elas explicaram que a buscam informações com o intuito de se preparem melhor para lidar com os possíveis efeitos do tratamento, para não serem surpreendidas; conhecer a doença e se capacitarem para o melhor cuidado, mas selecionam e até evitam saber algumas informações, preservando-se, assim, de sofrer por antecipação ou perderem a esperança na cura.

Esses dados correspondem aos encontrados por Araújo et al. (2014), Kohlsdorf e Costa (2009) e Oliveira e Angelo (2000). A pesquisa de Beltrão et al. (2007) e de Kohlsdorf e Costa (2008) assinalam a importância da comunicação clara, o esclarecimento da doença por parte dos profissionais como subsídio para o enfrentamento da situação como valor informativo. Exemplos da utilização dessa estratégia podem ser observados nos seguintes relatos:

“Pela internet e pelos médicos.”; “[...] não escuto nada do que os outros falam não, até tem um dia que falei: ‘a gente não pode escutar os outros,’ cada criança é de um jeito.” (M1) [sic];

“Eu busco, mas não busco mais como eu buscava.”; “Busco informação para eu não ser pega de surpresa, não gosto de surpresa”; “[...] porque tem umas coisas que eu prefiro não saber. Maioria das coisas independente de eu querer ou não, eu sei, eu fico sabendo.” (M4) [sic].

Três mães apresentaram estratégias relacionadas à busca de suporte com o intuito de obter apoio de pessoas significativas, por meio do diálogo para se confortar, ao apoio de profissionais (médico, psicólogo), visando a obter informações instrumentais, apoio social para ajuda na assistência financeira, nos cuidados com a criança, e emocional, o apoio advindo das instituições religiosas que proporciona conforto e fortalecimento da fé. São formas estas de satisfação da NPB de Relacionamento. O uso dessas estratégias por estas mães é exemplificado pelos seguintes relatos:

“Peço ajuda para minha família, no caso, minhas irmãs, minha mãe, meu marido e para o médico, de como a gente pode melhorar”; “Só a família, o apoio da família, dos amigos, da família então é essencial.” (M1) [sic];

“[...] as pessoas só de está apoiando já é uma grande ajuda.”; “Eu busco ajuda com minha mãe, no centro espírita, com tratamento espiritual, nos amigos, na família, na campanha, com muita gente.” (M2) [sic].

Apenas uma mãe, a M4, afirma não contar com apoio externo, assumindo totalmente a responsabilidade com o filho. Declara que, desde o início do tratamento, se sentiu sozinha e sem ajuda, até a confiança com a equipe foi construída lentamente, devido ao sofrimento a que o filho foi submetido no início do processo. Como pode ser exemplificado no relato a seguir: “[...] quando a doutora (médica responsável pelos cuidados da criança) chegou, ela sofreu muito comigo, porque eu, não vinha confiando nos médicos. Ela teve dificuldade para chegar em mim, porque o meu foi muito judiado.” (M4). [sic]

A importância da busca de suporte social no cuidado cotidiano com a criança pode amenizar a sobrecarga do cuidador, e o suporte oriundo das instituições religiosas oferece apoio emocional e psicológico, ao passo que o suporte dos familiares e amigos é considerado como minimizador do impacto do cuidado diário (Almico & Faro, 2014). Santos (2013) salienta que o suporte social é a segunda estratégia de enfrentamento mais citada por cuidadores familiares. Beltrão et al. (2007) citam que o apoio mais referenciado pelas participantes em sua pesquisa foi a crença divina, e ressaltam, inclusive, a importância do apoio da família e de outras mães que vivenciam a mesma experiência, igualmente, o apoio da equipe de profissionais.

Quanto à família de coping de negociação, indicativa de uma percepção de desafio à NPB de Autonomia, a maioria das mães entendeu como uma negociação com o filho para concordarem com procedimentos do tratamento e com outras pessoas próximas. Contudo, M1 afirmou não fazer nenhum tipo de trato, e M3 salientou o acordo com Deus, mas deixando claro que o compromisso não se tratava de uma ‘moeda de troca’, porque era a vontade de Deus que prevalecia, independentemente do desfecho do caso. Outros pesquisadores apontam a utilização dessa estratégia por parte das mães (Kohlsdorf & Costa, 2009); estudos que assinalam a religião, a fé como mediadoras dessa situação, depositando a esperança na vontade de Deus (Almico & Faro, 2014; Araújo et al., 2014).

Algumas mães demonstraram que definem prioridades e assim vivem um dia de cada vez. A seguir, exemplos dessas negociações:

“[...] é uma coisa assim que a gente sabe que é o que tem de ser, então é o que tem de passar, então eu não sinto muito estresse assim de raiva, de falta de aceitação, mas de toda forma é coisa que você tá sempre ali orando, pedindo a Deus para aliviar, sabe?”; “Só melhorar as obras para poder ter o merecimento e ajudar ele (o filho) o máximo que eu puder e ajudar fazer para que ele também melhore para poder pensar em ter o merecimento para ele.” (M2) [sic];

“Eu sempre faço acordo com ele (filho)”; “Eu não fico fazendo muitas expectativas não fazendo muita... sonhando muita coisa não.” (M4) [sic].

Em relação ao coping mal adaptativo, o isolamento foi referenciado por três mães, sendo possível serem identificadas por comportamentos de afastamento de pessoas que não contribuíam para o cuidado da criança; evitação de alguns espaços públicos com intuito de proteger o filho e, consequentemente, a minimização dos contatos sociais. As mães também declararam que preferem ficar sozinhas em momentos críticos. Nesse sentido, percebiam os estressores como uma ameaça à NPB de Relacionamento.

Esses dados corroboram estudos que apontam o isolamento social como uma mudança relevante que ocorre nas famílias de crianças com doenças crônicas (Castro & Piccinini, 2002). Oliveira e Angelo (2000) caracterizam essa vivência das mães cuidadoras como uma ‘vivência solitária’, já que a mãe é a personagem, que na maioria dos casos, está na linha de frente da situação. Os estudos de Faria e Cardoso (2010) e de Santos (2013) frisam essa estratégia como uma das menos utilizadas pelos familiares e cuidadores, o que contradiz o apresentado pela maioria desta amostra. Como pode ser percebido nos seguintes relatos das mães desta pesquisa:

“Quando está bem crítico assim. À noite, sabe? Seu eu pudesse queria ficar sozinha assim...”; “Quando ele está passando mal, eu tenho vontade de ficar sozinha...” (M1) [sic];

“[...] antes eu fugia, eu fugia das pessoas, eu fugia de tudo.”; “Mas hoje estou me aproximando mais, antes eu preferi afastar.” (M3) [sic];

“Eu prefiro ficar sozinha. Porque é um momento que é muito difícil para mim e eu não gosto de conversar”; ”Eu sempre afastei. Sempre fui tratada diferente. Depois que ele ficou doente, aí a gente nem sai mais...” (M4) [sic].

A família de coping de submissão foi citada por três mães (M2, M3, M4), relatando como os pensamentos que invadem a mente (pensamentos intrusivos). M3 ressaltou que isso propicia a busca de soluções e M2 que se comovia quando via outras mães passando pelo que ela já passou, demonstrando empatia por essas famílias. Almico e Faro (2014) salientam que as mães, ante a impotência de contornar a situação, demonstram conformismo, mas sem aceitar, sendo mais comum a submissão. Por outro lado, todas as mães da presente amostra ressaltaram que evitam os pensamentos que possam prejudicar neste momento da doença e se sustentam pela fé em Deus. Os seguintes relatos expressam estratégias dessa família de enfrentamento:

“De vez em quando, eu choro sozinha ou eu converso, não é reclamo, eu converso às vezes com minha mãe...”; “A gente lembra sempre, mas não é um martírio assim, de ficar pensando só nas coisas negativas...” (M2) [sic];

“[...] penso no que pode acontecer, o que pode acontecer a qualquer momento, então eu fico pensando muito!!!”; “Eu tento não pensar não ficar pensando nisso, ele só ‘tá aqui com uma infecçãozinha...”; “Eu tento não pensar o tempo todo né? Mas é inevitável não pensar, eu tento o máximo, eu tento...” (M4)[sic].

Oliveira e Angelo (2000) ressaltam que, após inúmeras internações, mãe e criança se tornam mais fragilizados, propiciando, assim, pensamentos de perda, mas, ao mesmo tempo, a busca constante de manter as emoções para poupar o filho e amenizar o seu sofrimento e evitando pensamentos negativos. Araújo et al. (2014) destacam a dualidade de pensamentos sobre a cura e o medo da morte, depositando toda esperança em Deus.

O enfrentamento da situação por meio da oposição foi apresentado somente por M2. Sua percepção de ameaça à NPB de Autonomia pode ser observada pelo relato a seguir: “.... os mesmos, ele, eu, minha mãe, o pai, as pessoas que estão mais envolvidas.” “Para mim é um resgate, coisa que vem de obras erradas do passado, que veio agora pra gente poder aprender...” (M2) [sic].

 

Considerações Finais

A análise dos relatos das quatro mães que participaram desta pesquisa, com base na Teoria Motivacional do Coping, permitiu confirmar e descrever como lidar com uma doença como câncer pode desafiar e também ameaçar suas necessidades psicológicas básicas de competência, de relacionamento e autonomia. O impacto da doença atinge a criança, a família e todos envolvidos de forma diferente, mas não menos sofrida. Além do choque no diagnóstico, soma-se o impacto de cuidar, as adaptações necessárias ao longo do processo, gerando perturbações psicológicas, emocionais e físicas.

Reconhece-se o cuidado como fundamental durante todo ciclo vital, mas, no enfrentamento dessa situação, além de primordial, é também uma função que é amplificada pelo sentimento de amor materno, produzindo um resultado único e singular para cada família. Esse cuidado, neste momento jamais esperado e desejado, em que a doença se faz presente, representa o que de mais sublime as mães poderiam fazer para os filhos, mas implica, também, uma reviravolta na vida desses personagens.

As mudanças impostas pedem adaptações na rotina da vida da família, com alterações de papéis e transformações na vida financeira e social. E como qualquer mudança, gera, por vezes, conflitos, raiva, cansaço, sobrecarga, mas também novos aprendizados. Aprendizados que vão desde o conhecer e lidar com a doença, como um novo olhar para a vida e para as pessoas, reformulação de valores, crenças e atitudes.

Cada fase da doença é um novo contexto, que exige novos ajustes e remanejos, novos conhecimentos são adquiridos; mas, para a maioria das mães, a fase pontuada como mais difícil era a que estavam vivendo, exceto para a mãe cujo filho se encontrava em manutenção do tratamento. Esta relatou que a fase mais difícil para ela foi o período de tratamento e internações durante a quimioterapia, devido aos efeitos colaterais do tratamento.

Independentemente da fase da doença, o impacto, a sobrecarga e as dificuldades são muitas, e cada núcleo familiar, dentro de seu contexto e de suas experiências, utiliza estratégias de enfrentamento para lidar com a situação. Constatou-se que o enfrentamento comum a todas as mães, independentemente da fase da doença, inclui estratégias adaptativas no médio e longo prazo, como a acomodação, autoconfiança, resolução de problemas, busca de informação, além de busca de suporte e negociação. Há, porém, o uso de estratégias mal adaptativas, como a submissão e o isolamento e a oposição.

Essas mães apresentam estratégias de enfrentamento de autoconfiança ao lidarem com a responsabilidade assumida no papel de mãe, a qual é permeada pelo amor ao filho. Nesse sentido, todas consideram ser a melhor pessoa para cuidar do paciente e demonstram dificuldade em delegar essa função a outra pessoa. Como consequência, foram obrigadas a abrir mão de outras atividades, inclusive da profissão, para se dedicar exclusivamente aos cuidados da criança. Os resultados são a sobrecarga, o cansaço e a falta de tempo para lidar com outros aspectos de suas vidas, os quais foram maximizados.

Essas estratégias também foram adotadas para solucionar os problemas que foram surgindo na jornada da doença. Visando a conhecer melhor a doença, o tratamento e as condutas práticas para o cuidado, buscam informações que auxiliam e potencializam o alívio do sofrimento da criança. Essa busca é mais direta com os profissionais envolvidos, mas fazem pesquisas também pela Internet. As informações são selecionadas a partir do reconhecimento de que nem todos os procedimentos são válidos para todos os pacientes; com isso, buscam dados e experiências que podem colaborar no processo de seus filhos, eliminando outros que prejudicam, inclusive para manter a esperança. Com isso, entende-se que a busca de informações visa a propiciar também proteção e conforto.

Estratégias de enfrentamento para se ajustar a essa realidade também são utilizadas pelas mães para conseguir aceitar a situação, assumindo suas responsabilidades. Nota-se uma aceitação limitada, que frente ao que não se pode mudar, é preciso se submeter, mas não de forma passiva. Todas as mães se mostraram ativas no processo de tomada de decisão, participando dos procedimentos junto à equipe de saúde, acompanhando o que era administrado na criança, na busca por novas formas e condutas que pudessem auxiliar o filho.

Algumas mães pontuaram a importância de se isolarem e ficarem sozinhas nos momentos críticos, que ocorriam quando a criança passava mal ou quando recebiam algum mau prognóstico quanto à evolução da doença. Nesses momentos, elas precisam se isolar para se acalmar e ter mais tranquilidade, para refletir e buscar novas soluções para os problemas que surgem. Uma mãe ressaltou que este isolamento foi frequente em toda jornada da doença do filho e que, nesse momento, era importante para protegê-lo de comentários que poderiam prejudicar o andamento da situação. Assim, o isolamento nesse contexto tinha uma função de proteção para si mesmas ou para os filhos.

Essa postura perante a essas circunstâncias foi sustentada pela fé na esperança da cura e na vontade de Deus. A fé em Deus propiciou, nesta amostra, conforto, esperança, força para lidar com as dificuldades e aceitação, além de auxiliar na busca de um sentido para tudo que estavam vivenciando. Por meio da crença religiosa, buscavam focar nas possibilidades favoráveis e evitar os pensamentos negativos, principalmente os que a levavam a pensar na morte da criança.

Com os dados aqui encontrados, fica evidente a importância que se deve dar às demandas dessa população que vivencia umas das experiências mais difíceis, a de cuidar de um filho com uma doença que tem um histórico e um estigma tão avassalador como o câncer. São mães cuidadoras, que necessitam de uma escuta acolhedora, mas que também carecem de oportunidade para expressar seus sentimentos, receios, preocupações e significados deste processo. Mães que precisam de espaço de acolhimento, que possibilite o enfrentamento dessa situação mediante uma forma menos sofrida.

Espera-se que esses dados contribuam para uma melhor compreensão dessas mães, tão importantes na jornada da doença. Alguns pesquisadores já apontaram a necessidade de pesquisas que investiguem, de modo sistematizado e longitudinalmente, a vivência desses cuidadores das crianças, para maior compreensão das dificuldades e exigências enfrentadas por essa população. Dessa forma, essas informações vêm ao encontro dessa pendência apontada por outros autores e, por isso, acredita-se que os dados encontrados possam auxiliar na elaboração de estratégias apropriadas para as mães cuidadoras de crianças com câncer.

 

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Endereço para correspondência
Letícia Lovato Dellazzana-Zanon
E-mail: leticiadellazzana@gmail.com

Enviado em: 02/10/2020
1ª revisão em: 23/02/2021
Aceito em: 23/04/2021

 

 

1 Universidade de Uberaba - UNIUBE.
2 Pontifícia Universidade Católica de Campinas (PUC-Campinas).
3 Pontifícia Universidade Católica de Campinas (PUC-Campinas).

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