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Ciências & Cognição

versão On-line ISSN 1806-5821

Ciênc. cogn. vol.15 no.1 Rio de Janeiro abr. 2010

 

Revisão

 

Aspectos neurobiológicos do transtorno do déficit de atenção e hiperatividade (TDAH): uma revisão

 

Neurobiological aspects of the attention deficit/hyperactivity disorder (ADHD): a review

 

 

Taciana de Souza CoutoI; Mario Ribeiro de Melo-JuniorII; Cláudia Roberta de Araújo GomesIII

IColégio Pontual, Recife, Pernambuco, Brasil;
IIAssociação Caruaruense de Ensino Superior (ASCES), Caruaru, Pernambuco, Brasil;
IIIDepartamento de Educação, Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE), Recife, Pernambuco, Brasil

 

 


Resumo

O transtorno do déficit de atenção e hiperatividade (TDAH) representa, junto com a dislexia, a principal causa de fracasso escolar e está presente em 7% das crianças no Brasil. Desde os anos 80, o TDAH tem sido interpretado como uma doença neuropsiquiátrica que surge na infância e persiste até a idade adulta. Atualmente, é descrito pelas autoridades médicas internacionais como um sério problema de saúde pública. Diante disto, este estudo apresenta uma seletiva revisão das mais significantes pesquisas sobre os diferentes aspectos neurobiológicos do TDAH. Todos os artigos usados neste trabalho foram obtidos da base de dados do Scielo, Sciencedirect e Medline. Em conclusão, todos os estudos relatam que diferentes grupos profissionais entendem as diferentes causas para o TDAH, contudo, a maioria desconhece os atuais processos de diagnóstico e tratamento. Assim, torna-se de grande importância a instituição de programas de treinamento em TDAH para todas as pessoas envolvidas neste distúrbio (pais, pacientes, educadores e clínicos). © Cien. Cogn. 2010; Vol. 15 (1): 241-251.

Palavras-chave: transtorno do déficit de atenção e hiperatividade; aspectos neurobiológicos; diagnóstico.


Abstract

The attention deficit/hyperactivity disorder (ADHD) together with dyslexia are main cause to schools fallen and are present at 7% of childrens in Brazil. Since the 1908s the ADHD diagnosis has been interpreted as a neuropsychiatric disease that appears in childhood and persists into adulthood. Nowadays, the ADHD is described by international medical authorities as a serious public health problem. In this review we proposing new insights about the different neurobiological aspects from this disturb. Based on this finding, this study performed a selective review of the most significant researches in order to reproduce an update on neurobiological profile from ADHD. All articles used in this study were obtained from Medline, Sciencedirect and Scielo databases. In conclusion, all studies showed that different professional groups beliefs in the various sources to ADHD, however, they unknowns the actual diagnosis procedure or adequate treatments. Thus, it is very important be performed a trainee and information programs on ADHD for all people (parents, professional groups and patients) involved in this disturb. © Cien. Cogn. 2010; Vol. 15 (1): 241-251.

Keywords: attention deficit/hyperactivity disorder; neurobiological aspects; diagnosis.


 

 

A problemática do transtorno do déficit de atenção/hiperatividade (TDAH)

A partir de informações constantes em artigos recentemente publicados na base de dados do Scielo, Sciencedirect e Medline, principalmente na última década, é possível perceber que diversos aspectos fazem com que o Transtorno do Déficit de Atenção/Hiperatividade (TDAH) seja descrito como uma "polêmica internacional". O aumento do número de casos em crianças, adolescentes e adultos, a disseminação de diagnósticos e proliferação de processos legais que pleteiam o direito à educação especial e privilégios no ambiente de trabalho têm contribuído para ampla discussão desta temática (Caliman, 2008; 2009).

O TDAH é um dos distúrbios comportamentais comumente diagnosticados em crianças. Este transtorno tem aparecido com variações na sua nomenclatura no decorrer da história, incluindo algumas denominações como Lesão Cerebral Mínima, Reação Hipercinética da Infância, Distúrbio do Déficit de Atenção ou Distúrbio de Hiperatividade com Déficit de Atenção/Hiperatividade (Poeta e Neto, 2006).

Historicamente, as primeiras referências aos transtornos hipercinéticos na literatura médica apareceram no meio do século XIX (Topczewki, 1999); e, em sua nomenclatura, vem sofrendo alterações contínuas. Na década de 40, surgiu a designação "lesão cerebral mínima", que em 1962, foi modificada para "disfunção cerebral mínima", reconhecendo-se que as alterações características da síndrome relacionam-se mais a disfunções nas vias nervosas do que propriamente a lesões nas mesmas. Os sistemas classificatórios modernos utilizados em psiquiatria, CID-10 - Código Internacional de Doenças (transtornos hipercinéticos) e (DSM) - IV Manual de Diagnóstico e Estatística das Perturbações Mentais (transtorno por déficit de atenção com hiperatividade, tipo desatento, hiperativo, impulsivo e combinado), apresentam mais semelhanças do que diferenças nas diretrizes diagnósticas para o tratamento (Bromberg, 2002; Silva, 2004).

Estes sintomas se iniciam antes dos sete anos de idade, embora a maioria seja diagnosticada após a manifestação destes por alguns anos, podendo-se observá-los em situações como na casa, na escola ou no trabalho. Muitas vezes, o distúrbio só é reconhecido quando a criança ingressa na escola, pois é o período em que as dificuldades de atenção e inquietude são percebidas com maior frequência pelos professores, quando comparada com outras crianças da mesma idade e ambiente (Poeta e Neto, 2006).

Dificuldade de aprendizagem, perturbações motoras (equilíbrio, noção de espaço e tempo, esquema corporal, etc.) e fracasso escolar são manifestações que acompanham o transtorno hiperativo. A variabilidade do comportamento ou entre ambientes é outra característica dessas crianças. O TDAH representa, junto com a dislexia, a principal causa de fracasso escolar, sendo que a dificuldade de aprendizagem está presente em 20% das crianças com este transtorno (Mattos, 2001).

O transtorno é observado a partir de três subtipos: os que apresentam predominantemente as dificuldades de atenção; outro que prevalece a impulsividade e a hiperatividade; e o que combina os dois anteriores. O tipo com predomínio de sintomas de desatenção é mais frequente no sexo feminino e parece apresentar, conjuntamente com o tipo combinado. Nos tipos que apresentam, predominantemente, as dificuldades de atenção, são apresentadas características marcantes de falta de atenção e dificuldade para se ater aos detalhes, os que ocasionam erros grosseiros nas atividades, sejam elas escolares ou não. Apresenta ainda uma falta de organização o que dificulta ainda mais o cumprimento de suas atividades. Parecem, ainda, não escutar o que se fala com ela diretamente (Rohde et al, 2004).

No tipo combinado, no qual concomitantemente apresenta sintomas de ambos os subtipos, as pessoas com déficit de atenção se distraem com facilidade diante do menor estímulo, interrompendo continuamente suas atividades. Nelas, a hiperatividade se manifesta não só como inquietação motora, mas também intelectual e verbal. A impulsividade se evidencia por respostas aceleradas, dificuldade de autocontrole e de auto-regulação de seguir instruções de forma sequenciada e pausada, e de antecipar as consequências de seus atos (Rohde et al, 2004).

 

Possíveis causas do TDAH

A etiologia do transtorno é multifatorial, ou seja, enquanto fenótipo o TDAH resulta da interação de vários fatores ambientais e genéticos que atuam na manifestação de seus diversos quadros clínicos (Roman et al., 2003).

Em relação à imaturidade emocional, segundo Riesgo e Rohde (2004), alguns eventos pré ou perinatais como, por exemplo, o baixo peso ao nascer, a exposição ao álcool ou cigarros durante a gestação, aumentam o risco para o desenvolvimento do TDAH. Eles atestam também que existem evidências de que o TDAH esteja associado a uma permanência de imaturidade, ou melhor, de ilhas de imaturidade, em um curso maturacional normal e progressivo, mas um pouco mais lento em determinados setores.

Estudos realizados por Moreno (1995) avaliaram o comportamento das crianças por meios de distintas etapas evolutivas deixando claro que as complicações pré e perinatais não afetam igualmente todas as crianças prematuras ou com baixo peso, o que significa que esses problemas não são suficientes para explicar a futura existência de um TDAH.

No que se refere aos estudos da genética do TDAH, estudos epidemiológicos mostram a recorrência familiar e, conforme Todd (2000), o risco da recorrência do TDAH entre pais e irmãos é cerca de cinco vezes maior que a prevalência na população. Estes dados foram obtidos a partir de estudos com famílias com gêmeos e adotados.

Embora estes trabalhos demonstrem a existência de uma contribuição genética substancial para a ocorrência do TDAH, não evidenciaram nenhum gene como necessário ou suficiente para o desenvolvimento do transtorno, fato que segundo o autor pode ser explicado pela complexidade clínica do transtorno.

Em outro estudo, Faraone e colaboradores (1992) concluíram que 57% das crianças com TDAH têm pais afetados com o transtorno, com um risco de 15% entre irmãos. Também confirmaram esta teoria os estudos feitos com gêmeos monozigotos, nos quais se constatou a concordância de 51%, enquanto em dizigotos a concordância é de 33% com maior incidência de TDAH em familiares de primeiro grau do indivíduo afetado.

Segenreich e Mattos (2007) afirmam que trabalhos recentes encontram evidências de que o TDAH se trata de um distúrbio neurobiológico. Dois grupos de pesquisas atuais têm resultados que atribuem a este transtorno duas possíveis causas: uma relacionada ao déficit funcional do lobo frontal, mais precisamente o córtex cerebral; e a outra ao déficit funcional de certos neurotransmissores.

Pesquisadores como Barkley (2002) acreditam ainda que o TDAH se evidencia por um déficit básico no comportamento inibitório. Uma deficiência em determinadas áreas nas quais o cérebro deveria comandar. Ainda para este pesquisador, um dos problemas preponderantes é que a criança com este transtorno tem dificuldade em manter sua atenção focalizada por um período mais longo.

Durante a década de 70, uma teoria esteve presente em relação aos fatores que ocasionava o TDAH: as questões nutricionais. Acreditava-se que os aditivos presentes nas dietas alimentares das crianças com TDAH estivessem relacionados ao agravo das crises.

Esses estudos foram realizados por Feingold (1975) que retratou que as crianças hiperativas tinham uma melhora em seu comportamento quando eram excluídos de sua dieta corantes artificiais, conservantes e salicilatos naturais como amêndoas, morangos, tomates entre outros alimentos. Estas pesquisas foram questionadas por outros cientistas que não encontraram respaldo que confirmasse que a diminuição de tais produtos na dieta produzisse algum efeito no desenvolvimento do TDAH.

Desta forma, como podemos perceber, as causas do TDAH podem ter um sintoma isolado ou um conjunto de fatores. Devido a isso, torna-se imperioso um diagnóstico detalhado por diferentes profissionais, como: psicólogos, psicopedagogos e neuropsicólogos (Badía et al., 2006). Contudo, apesar dos variados fatores que influenciam o desenvolvimento do TDAH, cada vez mais se constata que a etiologia do transtorno é neuro-genético-ambiental.

 

A neurobiologia do TDAH

Segundo Caliman (2008), atualmente não existe dúvida de que a importância da constatação diagnóstica do transtorno chamado TDAH refere-se não apenas à demonstração de que este distúrbio causa danos ao sujeito, mas que ele, o transtorno, é "causado" por um conjunto de aspectos biológicos, genéticos e cerebrais. Assim, os dados que fundamentam esta idéia vêm das pesquisas neurológicas, a partir de tecnologias de imagem cerebral e estudos de biologia molecular. Com os resultados destes estudos foi possível demonstrar que o diagnóstico do TDAH é real, porque é visível biologicamente uma condição maligna.

A teoria científica atual defende que no TDAH existe uma disfunção da neurotransmissão dopaminérgica na área frontal (pré-frontal, frontal motora, giro cíngulo); regiões subcorticais (estriado, tálamo médiodorsal) e a região límbica cerebral (núcleo acumbens, amígdala e hipocampo). Alguns trabalhos indicam uma evidente alteração destas regiões cerebrais resultando na impulsividade do paciente (Rubia et al., 2001). Além disso, pesquisas recentes apontam que também ocorre a participação de sistemas noradrenérgicos nos indivíduos com TDAH (Han e Gu, 2006).

Especificamente, as insuficiências nos circuitos do córtex pré-frontal e amígdala (figura 1), a partir da neurotransmissão das catecolaminas, resultam nos sintomas de esquecimento, distratibilidade, impulsividade e desorganização (Armsten e Li, 2005).

Nos estudos utilizando imagens de ressonância magnética (MRI), demonstrou-se a diminuição de atividade neural na região frontal, córtex cingular anterior e nos gânglios da base de pacientes com TDAH (Bush et al., 1999).

Em apoio às evidências neurológicas, estudos genéticos indicam que a maioria dos genes específicos implicados no TDAH codifica sistemas de sinais de catecolaminas e incluem o transportador de dopamina (DAT), transportador de noradrenalina (NET), receptores dopaminérgicos D4 e D5, dopamina b-hidroxilase e a proteína-25 (SNAP-25) que facilitam a liberação dos neurotransmissores implicados no TDAH (Yang et al., 2004; Faraone et al., 2005).

 

Figura 1 - Principais áreas cerebrais afeadas em pacientes com transtornos d déficit de atenção/hiperatividade (TDAH).

 

Procedimentos para avaliação diagnóstica

O distúrbio TDAH é caracterizado por comportamentos crônicos, com duração de no mínimo seis meses, que se instalam definitivamente antes dos sete anos (Capovilla, 2006).

O diagnóstico do TDAH é clínico, embora seus sinais possam ser detectados precocemente pelo pediatra que acompanha a criança; é essencial o conhecimento da história do sujeito, a partir da observação dos pais e dos professores. As características gerais da história da criança com TDAH aparecem resumidas na tabela 1.

 

Fases

Características

Lactente

Bebê difícil, insaciável, irritado e de difícil consolo, com maior prevalência de cólicas, dificuldades de alimentação e sono.

Pré- escolar

Atividade aumentada ao usual, dificuldades de ajustamento, teimosia, irritação e extremamente difícil de satisfazer.

Escola elementar

Incapacidade de colocar foco, distração, impulsivo, desempenho inconsciente, presença ou não de hiperatividade.

Adolescência

Inquieto e com desempenho inconsistente, sem conseguir colocar foco, dificuldade de memória na escola, abuso de substância, acidentes.

Tabela 1 - Evolução clínica clássica do Transtorno de déficit de atenção/hiperatividade (Segundo Rohde et al, 2004).

 

Iniciando o diagnóstico, o médico procura observar o comportamento social da criança, suas atividades na escola e no lar, as influências do meio em sua conduta. Fazem também exames para verificar se existe alguma doença no sistema nervoso central que exija tratamento (Mattos et al, 2006).

Esse diagnóstico envolve também outras avaliações complementares com outras especialidades médicas e ainda outros profissionais. É necessário, logo de início avaliações auditivas e visuais, uma vez que déficits nessas capacidades podem provocar dificuldade de atenção. Além disso, é de grande importância a avaliação neurológica, para que se excluam outras possíveis doenças.

Possa e colaboradores (2005) e Vasconcelos e colaboradores (2005) revelam alta comorbidade (ocorrência de dois ou mais transtornos em um mesmo indivíduo) entre TDAH e outros transtornos psiquiátricos; e entre os assim chamados transtornos de aprendizagem que, de acordo com o DSM IV, englobam os transtornos de leitura (dislexia), transtornos de matemática (discalculia) e transtorno de escrita (disgrafia).

Segundo Mattos e colaboradores (2005) e Gomes e colaboradores (2007) além dos sintomas do transtorno, em mais de 50% dos casos existem comorbidades, destacando-se entre elas:

a) transtorno desafiante de oposição (TOD), que se caracteriza por comportamento desafiador e opositivo (conforme o nome sugere) em relação a figuras de autoridade;
b) transtorno de conduta (TC), que se caracteriza pelo padrão de comportamento no qual se desrespeita os direitos básicos dos outros (mentiras, roubo, crueldade com animais entre outros);
c) abuso de substâncias psicoativas e álcool - em geral o abuso destas substâncias relaciona-se com o comprometimento funcional nas áreas acadêmicas, social e profissional;
d) transtorno de humor - depressão e transtorno bipolar, sendo que o primeiro caracteriza-se por tristeza, irritação, perda de interesse por atividades habitualmente prazerosas, fadiga fácil, insônia ou hiperisônia, enquanto que o transtorno bipolar caracteriza-se pela presença de humor exaltado, euforia alternando-se com momentos de depressão;
e) transtornos de ansiedade, que se caracterizam por medos ou preocupações excessivas que comprometem a vida acadêmica, social e familiar;
f) transtornos de tiques que se caracterizam pela realização de movimentos ou sons vocais repentinos, rápidos, não rítmicos, estereotipados;
g) transtornos de aprendizado, não consideradas aqui as dificuldades primárias decorrentes das próprias características do TDAH (desatenção e impulsividade) e que erroneamente são designadas como transtorno de aprendizagem.

Por se tratar de um transtorno, que na maioria das vezes envolve uma multiplicidade de sintomas o diagnóstico do TDAH, é um processo que requer a avaliação de diferentes profissionais como: médicos, psicólogos, psicopedagogos e neuropsicólogos.

Esta avaliação deve conter uma anamnese minuciosa, um exame físico abrangente, uma avaliação do neurodesenvolvimento e a realização de exames que tem por objetivo avaliar o rendimento pedagógico, através de dados recolhidos com professores e sua interação social com adultos que interagem com a pessoa que está sendo avaliada.

De acordo com os critérios do DSM-IV (American Psychiatric Association, 2002), alguns sintomas são relacionados nos quadros 1 e 2.

 

Sintomas de desatenção
Seis ou mais dos seguintes sintomas de desatenção persistiram por pelo menos seis meses em grau mal-adaptativo e incoerente com o nível de desenvolvimento:

(a) frequentemente deixa de prestar atenção a detalhes ou comete erros por descuido em atividades escolares, de trabalho ou outras;
(b) com frequência parece não escutar quando lhe dirigem a palavra;
(c) com frequência tem dificuldades para manter a atenção em tarefas ou atividades lúdicas;
(d) com frequência não segue instruções e não termina seus deveres escolares, tarefas domésticas ou deveres profissionais (não devido a comportamento de oposição ou incapacidade de compreender instruções);
(e) com frequência tem dificuldade para organizar tarefas e atividades;
(f) com frequência evita, antipatiza ou reluta em envolver-se em tarefas que exijam esforço mental constante (como tarefas escolares ou deveres de casa);
(g) com frequência perde coisas necessárias para tarefas ou atividades (por exemplo, brinquedos, tarefas escolares, lápis ou outros materiais);
(h) é facilmente distraído por estímulos alheios à tarefa;
(i) com frequência apresenta esquecimento em atividades diárias.

Quadro 1 - Orientações do DSM-IV para Transtorno de Déficit de Atenção/Hiperatividade (Rotta e Freire, 2005).

 

Sintomas de hiperatividade-impulsividade
Seis ou mais dos seguintes sintomas de hiperatividade-impulsividade persistiram por pelo menos seis meses, em grau mal-adaptativo e incoerente com o nível de desenvolvimento:

(a) frequentemente agita as mãos ou os pés ou se remexe na cadeira;
(b) frequentemente abandona sua cadeira em sala de aula ou outras situações nas quais se espera que permaneça sentado;
(c) frequentemente corre ou escala em demasia, em situações nas quais isso é inapropriado (em adolescentes e adultos, pode estar limitado a sensações subjetivas de inquietação);
(d) com frequência tem dificuldade para brincar ou se envolver silenciosamente em atividades de lazer;
(e) está frequentemente "a mil" ou muitas vezes age como se tivesse "a todo vapor";
(f) frequentemente fala em demasia;
(g) frequentemente dá respostas precipitadas antes de as perguntas terem sido completadas;
(i) frequentemente interrompe ou se mate em assuntos de outros (por exemplo, intromete-se em conversas ou brincadeiras).

Quadro 2 - Orientações do DSM-IV para Transtorno de Déficit de Atenção/Hiperatividade (Rotta e Freire, 2005).

 

Opções terapêuticas

O tratamento do TDAH abrange abordagens múltiplas, envolvendo intervenções psicossociais e também psicofarmacológicas.

Condemarín e colaboradores (2006) retratam que o emprego de psicofármacos se insere em um programa de apoio integral à criança. São reguladores neurobioquímicos que lhes são proporcionados na espera de seu amadurecimento e que, claramente, não têm efeitos curativos; mas ajudam-na a se adequar melhor às demandas do ambiente, a conseguir aumentar o rendimento escolar e a melhorar as relações interpessoais.

A tabela 2 nos mostra os efeitos dos psicoestimulantes na atenção das crianças.

 

Efeitos Diretos

Efeitos Indiretos

Efeitos favoráveis sobre a hiperatividade e a atenção.

Efeitos positivos psicossociais, relacionados com mudanças no que se refere ao entorno e à auto-estima da criança.

Efeitos negativos farmacológicos: em relação às doses.

Efeitos adversos não farmacológicos: dependem da conotação do tratamento farmacológico.

Efeitos favoráveis na impulsividade.

Diminuição de erros na tarefa e nas condutas disruptivas.
Adaptação social.

Efeitos favoráveis na atividade e na eficiência motora.

Atribuição de lócus de controle externo sobre a conduta.

Efeitos favoráveis no aspecto cognitivo.

Melhor processamento da linguagem.
Melhor processamento da informação.
Melhora na memória e na eficiência da aprendizagem.

Efeitos adversos em aspectos psicossociais.

Rotulação da criança (necessidade de medicamentos).

A criança pode se sentir diferente.

Atribuição de êxito ou fracasso ao medicamento.

Mito sobre o efeito do medicamento: modificam todas as condutas as situações.

O medicamento modifica alguma de suas condutas em algumas situações, mas não todas as condutas em todas as situações.

Tabela 2. Efeitos diretos e indiretos dos psicoestimulantes administrados em pacientes com transtorno de déficit de atenção/hiperatividade (Segundo Condemarín et al., 2006).

 A utilização de medicamentos visa estimular o sistema nervoso central (SNC), aumentando a disponibilização dos neurotransmissores, dopamina e norepinefrina em partes específicas do cérebro. Os pais vêem o uso de medicamentos com certa preocupação e tentam retardar ao máximo este momento, recorrendo a tratamentos alternativos. A este respeito Mattos (2001) nos diz que:

"... foram desenvolvidas outras modalidades terapêuticas para o TDAH, porém, não existe comprovação de que qualquer uma delas seja tão eficiente quanto a medicação, e o tratamento psicoterápico não deve ser visto como uma alternativa ao tratamento farmacológico, e sim como uma medida complementar, especial para alguns casos" (p. 146).

O acompanhamento por profissionais competentes que estejam sempre solícitos a tirarem as dúvidas dos pais seja em relação aos efeitos colaterais da medicação ou mesmo como auxiliar seus filhos na vida diária traz uma relação de confiança que facilita o tratamento. Diante de um diagnóstico positivo, surgem inúmeros questionamentos por parte dos pais, que quando bem orientados, colaboram com o tratamento de forma que este tenha um melhor êxito (Oliveira e Faria, 2006).

Segundo DuPaul e Stoner (2007), com o uso dos medicamentos alguns efeitos colaterais agudos podem ser observados, como a insônia e a redução do apetite. Afirma, ainda, que um desses efeitos colaterais tende a ocorrer em cerca de 50% das crianças tratadas com metilfenidrato, particularmente em doses mais altas e durante os estágios iniciais do tratamento.

 

Perspectivas atuais

Na última década, um crescente interesse vem surgindo em relação aos estudos de genética molecular no TDAH. O principal alvo destas pesquisas são sequências genéticas envolvidas no funcionamento dos sistemas dopaminérgicos e noradrenérgicos como possíveis fatores desencadeadores dos fenômenos patofisiológicos do transtorno.

Contudo, os estudos genéticos ainda são muito controversos, principalmente quanto o papel dos genes DRD4 e DAT1, primeiros genes diretamente relacionados ao TDAH.

Dentre as novas opções farmacológicas para o tratamento do TDAH, aprovada pelo Food and Drug Administration (FDA) nos Estados Unidos, a Atomoxetina uma droga não-estimulante e potente inibidor da recaptura da noradrenalina estará disponível no Brasil ainda este ano (2009).

Mas apesar de todas estas inovações e recentes descobertas, estudos clínicos e epidemiológicos sugerem que na população brasileira mais de 50% acredita que o TDAH causa uma crescente dependência da criança ou adolescente, impossibilitando-a de ter uma vida normal e que este distúrbio resulta, principalmente, da ausência de assistência dos pais. Dados estes totalmente negados pelos estudos modernos (Possa et al., 2005).

Segundo um interessante trabalho realizado por Gomes e colaboradores (2007), para a maioria dos entrevistados (educadores, clínicos e população em geral) o tratamento psicoterápico é suficiente e atividades como a prática de esportes poderiam substituir o uso dos medicamentos utilizados.

Baseando-se nestes dados, conclui-se que apesar de existir muitos estudos e novas informações sobre o TDAH, constata-se que boa parte da população e dos profissionais que interagem com os pacientes acometidos por este distúrbio não estão sendo corretamente informados e adequadamente esclarecidos. Com isso, defendemos que se torna urgente a capacitação adequada de profissionais, bem como um programa permanente para esclarecer os pais e educadores sobre os diferentes aspectos tanto do TDAH como dos demais distúrbios neuro-psicológicos que as crianças da atualidade podem apresentar.

 

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Notas

Mario Ribeiro de Melo-Junior
Endereço para correspondência: Rua Cassilândia, 331/404, Cidade Universitária, Recife, PE 50.740-370, Brasil.
E-mail para correspondência: mariormj@gmail.com.

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