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Ciências & Cognição

versión On-line ISSN 1806-5821

Ciênc. cogn. vol.16 no.1 Rio de Janeiro dic. 2011

 

Artigo Científico

 

A influência de características dos uniformes de times de futebol no tempo de reação manual em tarefas de orientação da atenção visual

 

The influence of soccer teams uniforms characteristics in the manual reaction time in orienting of attention tasks

 

 

Alberto Filgueiras

Pontifícia Universidade Católica, Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, Brasil

 Endereço para correspondência

 


Resumo

A Psicologia e as Neurociências possuem diversas formas de mensurar e avaliar as funções cognitivas, em especial a Atenção. A Orientação da Atenção Visual é um dos fenômenos cognitivos que influencia na preparação para o ato motor e, conseguintemente, na performance. A fim de verificar de que modo os uniformes de times de futebol do Rio de Janeiro impactam na execução motora, conduzimos um experimento de Tempo de Reação Manual (TRM) avaliando-o sob três aspectos: uniformes que aparecem junto ao Estímulo-Alvo, uniformes que aparecem do lado oposto ao Estímulo-Alvo, e preferência dos participantes por um dos times; em duas condições experimentais: Condição Válida, na qual a Pista é apresentada previamente apontando para o lado em que o Estímulo-Alvo aparecerá, e a Condição Inválida, na qual a Pista aponta para o lado oposto. O experimento contou com 31 participantes. Os resultados apontaram diferença significativa entre Condição Válida e Inválida considerando todos os participantes e tratamentos. Quando analisados os times que apareceram junto do Estímulo-Alvo, o padrão foi mantido. Todavia, quando foi levado em consideração o uniforme que aparece do lado oposto ao Estímulo-Alvo, não houve diferença significativa entre o TRM das Condições quando o uniforme do Clube de Regatas do Flamengo apareceu. O fenômeno ocorreu para os participantes que se auto-declararam torcedores do Flamengo, Fluminense e Vasco da Gama. Os resultados apontam para a influência do uniforme do Flamengo na tomada de decisão dos participantes. Os resultados são discutidos à luz das teorias da Orientação da Atenção na Psicologia e nas Neurociências. © Cien. Cogn. 2011; Vol. 16 (1): 019-034.

Palavras-chave: atenção; cognição; neuropsicologia.


Abstract

The Psychology and the Neurosciences have several ways to measure and assess the cognitive functions, specially the Attention. The Orienting of Visual Attention is a cognitive phenomenon that influences the preparation for the motor act, and, therefore, the performance. In order to check how the uniforms of soccer teams in Rio de Janeiro impact on motor execution, we conducted an experiment of Manual Reaction Time (MRT) evaluating it under three aspects: uniforms that appear next to the Target-Stimulus, uniforms appearing opposite Target-Stimulus, and preference of participants for one team; in two experimental conditions: Valid Condition in which a Cue is presented pointing to the side on which the Target-Stimulus appears previously, and Invalid Condition, in which the Cue points to the opposite side. The experiment had 31 participants. The results showed a significant difference between Valid and Invalid Condition considering all participants and treatments. When analyzing the teams that came next to the Stimulus-Target, the pattern was maintained. However, when the uniform that appears opposite the Target-Stimulus was taken into account, there was no significant difference between the MRT Conditions when the uniform of the Clube de Regatas do Flamengo appeared. The phenomenon occurred for participants who self-declared fan of Flamengo, Fluminense and Vasco da Gama. The results indicate the influence of Flamengo's uniform in the decision making of participants. The results are discussed in the light of the Orienting of Attention theories on Psychology and on Neurosciences. © Cien. Cogn. 2011; Vol. 16 (1): 019-034.

Keywords: attention; cognition; neuropsychology.


 

 

Introdução

As Ciências do Esporte há muito conhecem a importância da Atenção no desempenho de atletas amadores e profissionais (Weinberg & Gould, 2001). A Psicologia, por sua vez, trata de questões acerca dos diversos componentes da atividade psíquica, dentre elas, a Atenção. Contudo, ainda há pouco conhecimento consolidado, isto é, escassez de teorias que consigam explicar de modo completo a atividade atencional humana (Baddeley, 2003; Filgueiras, 2010; Maringelli & Umiltà, 1998; Norman & Shalice, 1986; Posner, 1980, 1994; Pylyshyn et al., 1994; Rizzolatti, Riggio, Dascola & Schmidt, 1987; Treisman, 1992a, 1992b; Wolfe et al., 1990; Zhang, Yan & Yangang, 2009).

A história das teorias que pretendem explicar a Atenção nos seres humanos passa, inicialmente, pela audição, ao invés da visão como seria esperado, como paradigma de input sensorial a ser estudado. Sternberg (2008) ilustra o problema do cocktail party proposto inicialmente por Donald Broadbent, em 1953, no qual o sujeito depende de determinadas características fisiológicas intrínsecas e externas do estímulo: volume do som, amplitude e frequência das ondas sonoras, quantidade de pessoas que estão falando ao mesmo tempo, o esforço do ouvinte em entender o que está sendo dito, distância entre o ouvinte e o locutor, e se o estímulo sonoro esta chegando ao ouvido direito ou esquerdo (Sternberg, 2008). Mais tarde, Petocz, Keller e Stevens (2008), bem como Suied, Suzuni e McAdams. (2008), demonstram que o viés afetivo também influencia na percepção do som, e na orientação e sustentação da Atenção em estímulos sonoros representativos de perigo ou "warning signs".

A visão, todavia, é o principal paradigma de input sensorial estudado em modelos experimentais nas neurociências e psicologia contemporâneas (Rossini & Galera, 2006). Posner (1980) utilizou dois paradigmas experimentais para estudar a Orientação da Atenção visual para demonstrar empiricamente duas hipóteses: (1) a Orientação da Atenção possui processos automáticos e processos controlados, (2) Orientação da Atenção e Sustentação da Atenção são constructos diferentes. Os paradigmas para Atenção propostos por Posner (1980) foram: Tempo de Reação Manual (TRM), e tarefa de Busca Visual. A constatação que se originou deste estudo abriu espaço para a construção sólida de teorias que buscam compreender o processo atentivo humano (Rossini & Galera, 2006). Contudo, ainda hoje, há muitas questões que ensejam dúvidas sobre a Orientação da Atenção em si (Posner, 1980; Treisman, 1992b) e sobre seus impactos em outros processos cognitivos ou voluntários como a execução motora (Rizzolatti et al., 1987).

A atenção como processo cognitivo

A partir de uma breve análise da expressão: Processos Cognitivos, nós podemos atribuí-la validade teórica. O termo: Processo, deriva do verbo proceder - do latim procedere - que significa caminho ou trajetória; enquanto o termo: Cognitivo, advém de cognição - do latim cognocere - ou conhecer (Cunha, 1986). Logo, podemos pensar em processos cognitivos como trajetórias ou caminhos cujo objetivo é extrair informação do ambiente, conhecer o meio.

O primeiro grande Processo Cognitivo de extração de informação do mundo é a Percepção. Forgus (1981) afirmou que perceber é a ação de extrair informação, tanto do meio externo quanto interno ao sujeito. Assim sendo, toda informação que é captada e processada por nosso sistema sensorial pode ser percebida, mas isto ocorre somente com uma parcela. O sistema psíquico humano possui limitações práticas que impedem o processamento total do que é sentido (Sternberg, 2008). Para tanto, o processo da Atenção age como um holofote (Posner, 1994), um processo múltiplo e paralelo (Pylyshyn et al., 1994; Treisman, 1992b), ou um sistema supervisor (Norman & Shalice, 1986) focalizando o que é mais importante e direcionando os esforços do sistema cognitivo para somente uma parcela de toda informação adquirida. Para tudo que é extraído do meio, o homem atribui certa relevância. Há, portanto, um sistema executivo, ou Executivo Central, que faz a gerência dos esforços cognitivos no sentido do mais para o menos importante (Baddeley, 2003).

A Atenção, conseguintemente, é um sistema complexo e, como tal, possui algumas subdivisões que permitem sua execução global. Inicialmente, o sistema atencional pode ser compreendido como um Executivo Central (Baddeley, 2003) que apresenta como principais características a subdivisão de dois momentos diferentes de um processo executivo: orientação e sustentação. A abordagem do Executivo Central se aproxima muito dos modelos teóricos contemporâneos da Atenção (Garon, Brysion & Smith, 2008). A Orientação da Atenção é a simples atividade psíquica de eleger uma informação percebida como mais relevante (Posner, 1980). Significa dizer que, do ponto de vista da Atenção Executiva, diante da demanda de realizar uma tarefa, inicialmente orientamos nossa Atenção no sentido dos estímulos mais relevantes, porém para melhorar a performance na tarefa, temos de eleger certas características dos diversos estímulos e sustentarmos a Atenção para otimização do desempenho nesta tarefa. Sustentação, no entanto, envolve a manutenção da Atenção na informação por um período significativo de tempo, suficiente para realizar alguma operação mental, isto é, executar uma tarefa (Baddeley, 2003). De certa maneira, para obtermos desempenhos satisfatórios em tarefas que envolvam a Atenção, devem estar presentes não só a capacidade de orientar corretamente o foco atencional e mudar de foco sempre que necessário, mas mantê-la ao longo da janela temporal no qual a tarefa está compreendida, por isto, este gerenciamento de esforços cognitivos é conhecido como Flexibilidade Atencional (Colacicco, Welzl, Lipp & Würbel, 2002; Birrel & Brown, 2000).

Rossini e Galera (2006) apontam para concentração de estudos em dois processos atencionais visuais: ascendentes e descendentes. Processos ascendentes são orientados pelas características físicas do objeto e parâmetro fisiológicos na detecção de estímulos, logo, estariam relacionados à automatização da Atenção, ou seja, há pouco ou não há controle consciente. Processos descendentes são delimitados pelas diretrizes internas do sujeito e processamento executivo do sistema cognitivo, destarte, podem ser controlados voluntariamente e passíveis de modificação a partir de comandos conscientes. Em atividades complexas que envolvam a Atenção Executiva, ambos os aspectos são relevantes (Filgueiras, 2010; Maringelli & Umiltà, 1998; Rizzolatti et al., 1987; Zhang et al., 2009).

A literatura ainda não possui um uníssono no que tange à perspectiva teórica que dê conta de explicar os diversos fenômenos da Atenção, contudo o que se tem de concreto é: (1) há um Sistema da Atenção envolvido no gerenciamento da execução de diversos tipos de tarefa (Baddeley, 2003; Garon et al., 2008; Norman & Shalice, 1986); (2) há influência das regras impostas na tarefa e da estratégia adotada pelo sujeito na sua realização em face da Orientação e Sustentação da Atenção ao longo da execução da tarefa (Filgueiras, 2010; Maringelli & Umiltà, 1998; Pylyshyn et al., 1994); (3) do mesmo modo que há influência das características físicas e de localização espacial do objeto na forma como a Atenção é manejada (Chen, 1998; Posner, 1980; Treisman, 1992a).

A neuropsicologia vem estudando a atenção a partir de modelos cognitivos a serem testados por paradigmas experimentais em tarefas motoras (Filgueiras, 2010; Posner, 1980; Maringelli & Umiltà, 1998; Rizzolatti et al., 1987), modelos animais (Colacicco et al., 2002; Colby & Goldberg, 1999), e imageamento cerebral (Greene, Mooshagian, Kaplan, Zaidel & Iacoboni, 2009; Horiguchi, Nakadomari, Misaki & Wandell, 2009).

Os paradigmas motores se baseiam nos estudos de Posner (1980) no qual o participante deve responder a uma tarefa no qual é coletada o Tempo de Reação Manual (TRM). A partir destes dados é possível imaginar quais as trajetórias que o impulso nervoso percorre desde a ativação do córtex visual primário no loco occipital (Horiguchi et al., 2009) até o córtex sensório-motor e o sistema nervoso periférico que lança o estímulo muscular à ação motora (Kolb & Wishaw, 2002). Estes paradigmas vêm se mostrando muito consistentes e excelentes bases para construção de teorias sobre a atenção (Maringellie & Umiltà, 1998; Rizzolatti et al., 1987).

Destarte, a resposta motora depende da Orientação da Atenção quando exigimos respostas rápidas do sujeito. O Sistema Atencional, nos paradigmas de TRM, é responsável por gerar uma preparação do sistema motor para responder do lado correspondente àquele que a Pista aponta, isto é, gera-se um potencial lateralizado motor para responder de modo mais rápido para o lado Pista (Rizzolatti et al., 1987). Caso a Pista indique o lado oposto da resposta, para que o sujeito possa responder corretamente é necessário que se reestruture, desativando o potencial lateralizado para um dos lados, e focalizando seu esforço cognitivo em praticar o ato motor no lado contrário. Isto gera uma latência de tempo significativa entre as respostas, o sujeito é mais lento quando a Pista aparece apontando para o lado oposto do Alvo (Rizzolatti et al., 1987).

Os paradigmas animais podem obter dados de relevância ímpar, uma vez que permitem tanto a investigação com lesões e estimulações cerebrais para aspectos de Sustentação e Orientação da Atenção com base em paradigmas de Flexibilidade Atencional (Birrel & Brown, 2000), estudos da fisiologia em diferentes comportamentos cuja quantificação fornecem índices para avaliação da Atenção (Colacicco et al., 2002), quanto análise de dados de Eletroencefalografia (EEG) em tarefas motoras de primatas em paradigmas de TRM (Colby & Goldberg, 1999).

O imageamento cerebral depende de maquinários sofisticados e pouca ou nenhuma atividade motora do sujeito (e.g., Ressonância Magnética Funcional), portanto, constitui técnica de difícil avaliação dos sistemas neurais em situações nas quais o sujeito deve realizar tarefas motoras mais complexas (Kolb & Wishaw, 2002). Ainda assim, são informações importantes que correlacionam ativação de regiões cerebrais com funções cognitivas. Graças a este tipo de estudo que descobrimos o papel do córtex visual primário na Atenção humana (Horiguchi et al., 2009).

Com o mesmo procedimento, foi possível analisar o funcionamento das redes neurais responsáveis pela Atenção Social, que considerou a percepção facial em especial, como diretriz interna do sujeito. Ficou claro o envolvimento de regiões Pré-motoras Frontais, Córtex Parietal Posterior e áreas Temporo-occipitais (Greene et al., 2009; Martín-Loeches, Sel, Casado, Jiménez & Castellanos, 2009).

As pesquisas em Neuropsicologia sobre a Atenção são ricas de informações e, por conta de paradigmas experimentais do comportamento bastante robustos e sistematizados, a ciência consegue extrair dados valiosos na compreensão dos referenciais fisiológicos, cerebrais e processuais das funções executivas e cognitivas envolvidas no Sistema Atencional.

Os uniformes dos times de futebol como variáveis do sistema atencional

Os estudos que demonstram a influência das características físicas dos objetos na orientação da atenção (Pylyshyn et al., 1994; Treisman, 1992a) buscam avaliar tão somente o impacto de determinadas características do objeto em detrimento a outros. A literatura também demonstra que em tarefas nas quais há restrições de regras nos procedimentos experimentais é possível ver a influência das variáveis do objeto no desempenho (Chen, 1998; Davranche, Hall & McMoris, 2009; Filgueiras, 2010; Wolfe et al., 1990; Zhang et al., 2009).

Os uniformes dos times de futebol constituem, no decorrer de um evento esportivo, a principal característica de diferenciação entre os jogadores e, portanto, necessitam de constante vigilância do Sistema Atencional de cada jogador para discriminação das equipes.

Zhang et al. (2009) mostraram que há diferenças significativas no TRM de atletas quando percebem objetos em movimento de uma cor única em face a objetos que possuem cores múltiplas ou que mudam de cor no decorrer do movimento. Há, consequentemente, uma tendência de responder mais rápido a objetos em movimento que apresentam diversas cores que objetos de cor única (Zhang et al., 2009).

Com a finalidade de compreendermos de que maneira as características físicas dos uniformes dos quatro clubes de futebol que representam o Estado do Rio de Janeiro na Primeira Divisão do Campeonato Brasileiro de 2010 (i.e., Botafogo de Futebol e Regatas, Clube de Regatas do Flamengo, Clube de Regatas Vasco da Gama, e Fluminense Football Club) influenciam na decisão motora em tarefa de Orientação da Atenção Visual, propomos um estudo com base nos paradigmas experimentais de Posner (1980) usando os uniformes destas equipes como distratores. Portanto, desejamos verificar se a diretriz dada ao sujeito de ignorar eventuais características físicas dos estímulos que sejam irrelevantes à tarefa será capaz de manter o efeito de Orientação da Atenção entre Pistas Válidas e Inválidas (Posner, 1980). Caso apareça supressão deste efeito na presença de algum dos uniformes, podemos conjeturar duas hipóteses: o impacto dos parâmetros fisiológicos da percepção e parâmetros físicos do objeto (Chen, 1998; Davranche et al., 2009; Filgueiras, 2010; Treisman, 1992a; Wolfe et al., 1990; Zhang et al., 2009), ou, a preferência do sujeito por aquele time, em outras palavras, viés sócio-afetivo da Atenção (Greene et al., 2009; Martín-Loeches et al., 2009; Petocz et al., 2008; Suied et al., 2008).

Metodologia

Utilizamos o paradigma de Posner (1980) para criar um teste simples de Orientação da Atenção Visual. Contudo, incluímos estímulos distratores, uniformes dos quatro clubes de futebol que representam o Estado do Rio de Janeiro na Primeira Divisão do Campeonato Brasileiro de 2010, na tarefa de modo que, além da Pista e do Estímulo-Alvo, informações sobre características de complexidade de forma, cor, e afetividade dos participantes seriam coletadas.

O paradigma nos permite a comparação entre o TRM das condições de Pistas Válidas (i.e., quando a resposta está no lado em que a Pista apontou) e o TRM das condições de Pistas Inválidas (i.e., quando a resposta está no lado contrário ao apontado pela Pista). Contudo, em virtude das diferentes características dos uniformes, consideramos esta comparação em função de três condições experimentais: (1) qual o uniforme que está do lado válido à Pista, (2) qual o uniforme que está no lado inválido da Pista, e (3) qual o time que o participante torce.

Participantes

Participaram do experimento 31 pessoas não-daltônicas com idade média de 32,41 anos de idade (DP = 7,56), sendo 13 mulheres (41,9%) e 18 homens (58,1%) alunos de graduação e pós-graduação do curso de Psicologia das Universidades: Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ) e Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).

Todos os participantes foram convidados a participar do experimento, havendo adesão voluntária, estavam cientes do objetivo do experimento e concordaram em participar assinando Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da PUC-RJ sob o protocolo de número 026/2010.

 

Variável

Amostra

Idade

N (f)

X

EPM

Homens

18 (58,1%)

32,59

1,49

Mulheres

13 (41,9%)

32,16

1,14

Total

31

32,41

1,36

Tabela 1 - Dados demográficos da amostra.

Dos 31 participantes, 11 declararam-se torcedores do Flamengo (35,5%), 7 declararam-se torcedores do Botafogo (22,6%), 7 declararam-se torcedores do Vasco da Gama (22,6%) e 6 declararam-se torcedores do Fluminense (19,3%).

 

Time de Preferência

Amostra

Homens (f)

Mulheres (f)

Total (f)

Flamengo

8 (72,7%)

3 (27,3%)

11 (35,5%)

Botafogo

4 (57,1%)

3 (42,9%)

7 (22,6%)

Vasco

2 (28,6%)

5 (71,4%)

7 (22,6%)

Fluminense

4 (66,7%)

2 (33,3%)

6 (19,3%)

Total

18 (100%)

13 (100%)

31 (100%)

Tabela 2 - Distribuição da amostra em função do time de preferência.

Aparatos e estímulos

Programamos o paradigma de Posner (1980) com o software para Experimentos em Psicologia (Stahl, 2006) Inquisit versão 3.0.2 (Millisecond Software) para um protocolo total de 96 tratamentos. Usamos um computador do tipo notebook PC Philco PHN 14122, com tela plana de 15 polegadas. O computador foi afixado em uma mesa a 52 centímetros do aparato de fronte-mento previamente alinhado ao centro da tela.

Todo o teste foi programado sobre fundo totalmente preto (referência hexadecimal #000000) com luminância da tela de 30 cd/.² para esta condição. O estímulo representativo do ponto de fixação foi uma cruz cinza de 0,6 cm de altura e largura, posicionada no centro da tela. A Pista era uma seta em branco de 1,5 cm de altura e 3 cm de largura que aparecia também ao centro da tela. Os jogadores uniformizados foram editados com o software Photoshop CS2 (Adobe) a partir de um modelo único retirado do software Pro Evolution Soccer 7.0 (Capcom). Todos os jogadores tinham 6,6 cm de altura e 2 cm de largura, posicionados horizontalmente a 11 cm do centro da tela para esquerda ou para a direita, centralizados verticalmente. O Estímulo-Alvo foi um círculo totalmente azul de raio 2 cm colocado sobre os jogadores uniformizados (i.e., horizontalmente a 11 cm do centro da tela para um lado ou para o outro), centralizado verticalmente. A escolha da cor para o Estímulo-Alvo se deu pela capacidade de contraste da cor do azul com as cores predominantes nos uniformes dos times do Estado do Rio de Janeiro a partir do eixo ortogonal de contraste de cor consagrado na literatura científica (Gomes et al., 2006, Neto, Ribeiro & Valeri, 2004), deste modo, teríamos evidências de que o participante poderia reconhecer o Estímulo-Alvo repousado sobre os uniformes. Um X vermelho com 3 cm de altura e 2 cm de largura no centro da tela indica que o participante errou.

Figura 1

Figura 1 - Os estímulos dos jogadores uniformizados foram editados nas cores originais de seus clubes a partir da vestimenta titular dos jogadores de linha, isto é, não consideramos o uniforme dos goleiros. O uniforme do (1) Botafogo foi editado em preto e branco para as faixas verticais, do (2) Flamengo preto e vermelho em faixas horizontais, do (3) Fluminense verde, branco e grená em faixas verticais, do (4) Vasco em negro sob a faixa em diagonal branca. Detalhes dos uniformes como estrelas, patrocinadores e escudos não foram utilizados.

Procedimentos

Com base no paradigma experimental de Posner (1980) preparamos o nosso experimento. O participante era orientado a sentar-se de forma a apoiar seu queixo e testa no aparato de fronte-mento na extremidade da mesa de testagem. Uma vez posicionado, deveria colocar os dedos indicadores sobre as teclas A e L de um teclado padrão ABNT 2 conforme sua lateralidade (i.e., dedo indicador esquerdo sobre a tecla A e indicador direito sobre a tecla L). As respostas foram correspondentes com a lateralidade motora do participante, em outras palavras, quando o Estímulo-Alvo aparecesse do lado esquerdo do centro da tela, a tecla A deveria ser pressionada, enquanto a tecla L seria ativada quando o Estímulo-Alvo aparecesse do lado direito.

O protocolo foi configurado da seguinte forma: o ponto de fixação aparece no centro da tela por 1000 milissegundos (ms); logo após, a Pista substitui o ponto de fixação apontando para a esquerda ou para a direita ficando exposta por mais 1000 ms; o ponto de fixação é exibido novamente por mais 300 ms; e finalmente dá lugar ao Estímulo-Alvo (círculo azul) que aparece 80% das vezes no lado apontado pela Pista (Condição Válida) e 20% das vezes do lado contrário ao apontado pela Pista (Condição Inválida), acompanhado por estímulos distratores tanto no lado da Condição Válida quanto na Condição Inválida. Os uniformes, portanto, sempre aparecem em pares, sendo um do lado do Estímulo-Alvo e outro do lado contrário (e.g., Condição Válida com Estímulo-Alvo do lado esquerdo sobre o uniforme do Botafogo e o uniforme do Flamengo do lado direito; ou Condição Inválida com Estímulo-Alvo do lado direito sobre o uniforme do Fluminense e o uniforme do Vasco do lado esquerdo). O participante é orientado a pressionar a tecla correspondente ao lado em que o Estímulo-Alvo aparece tentando ignorar os potenciais distratores. Caso cometa um erro, um X vermelho aparece no centro da tela e é solicitado a responder com a outra tecla o mais rápido que puder. O tempo entre tratamentos ou testes é de 500 ms.

Figura 2

Figura 2 - A figura ilustra dois exemplos de tratamentos ou testes: Condição Válida e Condição Inválida. O paradigma experimental adaptado de Posner (1980) seguiu o seguinte procedimento: (1) o ponto de fixação fica exposto por 1000 ms; (2) a Pista aponta para um dos lados fixa no centro da tela por 1000 ms; (3) a Pista some o ponto de fixação fica exposto por 300 ms; (4) finalmente o Estímulo-Alvo, i.e., o círculo azul, aparece acompanhado por dois uniformes, um que fica sob o (a) Estímulo-Alvo e o outro do (b) lado oposto. Quando a Pista aponta para o lado em que o Estímulo-Alvo vai aparecer, consideramos a Condição Válida, o que acontece em 80% dos casos; quando a Pista aponta para o lado contrário ao do Estímulo-Alvo, consideramos a Condição Inválida, o que ocorre em 20% do experimento. No caso de erro cometido pelo participante, um X em vermelho aparece imediatamente no centro da tela, indicando que a tecla do lado contrário deverá ser pressionada.

Este paradigma experimental nos permitiu combinar pares de uniformes em função das condições experimentais. A combinação de todas as possibilidades entre os distratores foi duplicada para o aparecimento em ambos os lados, dando-nos um total de 96 tratamentos ou testes (cada uniforme aparece 6 vezes junto do Estímulo-Alvo na Condição Inválida e 18 vezes junto do Estímulo-Alvo na Condição Válida). A média dos Tempos de Reação Manual (TRM) foi coletada para cada participante em função das Condições Válidas e Inválidas.

 

Resultados

O TRM foi coletado em milissegundos (ms). O experimento se mostrou consistente mantendo o padrão de resposta esperado: X=433,31 ms; EPM=19,20 para Condição Válida e X=527,13 ms; EPM=40,59 para a Condição Inválida; a diferença das médias se mostrou estatisticamente significativa [t(30)=4,198; p<0,001].

Figura 3

Figura 3 - A diferença entre os tempos de reação na Condição Válida e na Condição Inválida foi significativa. O TRM dos participantes na Condição Válida foi mais rápido que na Condição Inválida. * p < 0,001.

Uniformes do mesmo lado que o Estímulo-Alvo

O TRM ainda foi analisado em função dos uniformes distratores. Considerando apenas os uniformes que apareciam sempre junto ao Estímulo-Alvo obtivemos a manutenção do padrão verificado estatisticamente por uma ANOVA (2x4) de duas vias [F(3,247)=8,484; p=0,005]. Analisamos, ainda, o impacto de cada diferente uniforme que aparece conjuntamente ao Estímulo-Alvo. Para o uniforme do Botafogo: Média do TRM na Condição Válida foi X=446,63 ms; EPM=18,09; e na Condição Inválida foi X=539,81 ms; EPM=42,68, diferença das médias demonstrada pelo teste t de student: t(30)=2,010; p=0,05. Para o uniforme do Flamengo: Média do TRM na Condição Válida foi X=419,02 ms; EPM=19,91; e na Condição Inválida foi X=508,81 ms; EPM=37,66, diferença das médias demonstrada pelo teste t de student: t(30)=2,108; p=0,04. Para o uniforme do Fluminense: Média do TRM na Condição Válida foi X=421,43 ms; EPM=17,75; e na Condição Inválida foi X=509,56 ms; EPM=36,89, diferença das médias demonstrada pelo teste t de student: t(30)=2,153; p=0,03. Para o uniforme do Vasco: Média do TRM na Condição Válida foi X=446,18 ms; EPM=21,04; e na Condição Inválida foi X=550,33 ms; EPM=45,13, diferença das médias demonstrada pelo teste t de student: t(30)=2,092; p=0,04.

Figura 4

Figura 4 - O TRM médio foi comparado entre os uniformes que apareciam juntamente do Estímulo-Alvo, não considerando quais os uniformes que apareciam do lado contrário. Como no padrão geral encontrado no tratamento entre as Condições Válidas e Inválidas, independente do uniforme que aparecia junto ao Estímulo-Alvo, o TRM para a Condição Válida permaneceu significativamente mais rápido do que para a Condição Inválida. * p = 0,05; ‡ p = 0,04; ** p = 0,03.

Uniformes do lado oposto ao Estímulo-Alvo

Consideramos ainda o TRM médio para cada participante considerando apenas o uniforme que aparece do lado oposto ao Estímulo-Alvo. Em outras palavras, analisamos as Condições Válidas e Inválidas quando, do lado contrário ao Estímulo-Alvo, o uniforme de um time específico aparecia. Desta forma, quando ocorria a Condição Válida, 80% dos casos a pista não apontava para o uniforme distrator que se posicionava do lado oposto ao Estímulo-Alvo; contudo em 20% das vezes, na Condição Inválida, a pista apontava para o uniforme que estava do lado contrário.

A partir de uma ANOVA (2x4) de duas vias, analisamos novamente o TRM para cada Condição, considerando como variável independente o uniforme que aparecia do lado oposto. Foi mostrada diferença estatisticamente significativa entre as médias [F(3,247)=26,745; p<0,001]. Em específico para cada equipe, usamos o teste t de student para verificar o efeito do uniforme distrator no lado contrário. Para o uniforme do Botafogo: Média do TRM na Condição Válida foi X=362,03 ms; EPM=6,63; e na Condição Inválida foi X=534,74 ms; EPM=20,03, diferença das médias demonstrada estatisticamente: t(30)=8,186; p<0,01. Para o uniforme do Flamengo: Média do TRM na Condição Válida foi X=561,42 ms; EPM=28,54; e na Condição Inválida foi X=603,53 ms; EPM=37,31, estatisticamente não houve diferença das médias, de modo inesperado: t(30)=0,896; p=0,37. Para o uniforme do Fluminense: Média do TRM na Condição Válida foi X=421,80 ms; EPM=14,75; e na Condição Inválida foi X=502,11 ms; EPM=18,93, diferença das médias demonstrada estatisticamente: t(30)=3,346; p<0,01. Para o uniforme do Vasco: Média do TRM na Condição Válida foi X=418,65 ms; EPM=14,08; e na Condição Inválida foi X=523,52 ms; EPM=16,26, diferença das médias demonstrada estatisticamente: t(30)=4,875; p<0,01.

Figura 5

Figura 5 - O TRM médio foi comparado entre os uniformes que apareciam do lado oposto ao Estímulo-Alvo, não considerando quais os uniformes que apareciam conjuntamente. Como no padrão geral encontrado no tratamento entre as Condições Válidas e Inválidas, verificamos que quando o uniforme distrator foi do Botafogo, Fluminense e Vasco, o TRM para a Condição Válida permaneceu significativamente mais rápido do que para a Condição Inválida. Contudo, quando o uniforme do Flamengo apareceu do lado oposto ao Estímulo-Alvo, não houve diferença significativa gerada pela diferença de TRM entre Condição Válida e Inválida. * p < 0,01.

Preferência por time como viés sócio-afetivo do resultado

Para verificar o viés sócio-afetivo, propomos verificar se a diferença entre Condição Válida e Condição Inválida se mantinha nas duas posições de distratores, isto é, junto ao Estímulo-Alvo, ou do lado oposto do Estímulo-Alvo, dentro de quatro grupos, respeitando a preferência explícita do participante por um dos quatro clubes.

Para os torcedores ou declarantes de preferência pelo Botafogo (N=7) houve diferença estatística quando os uniformes apareceram do mesmo lado do Estímulo-Alvo [F(1,55)=229,477; p<0,001]. O padrão dos resultados de todos os participantes se manteve, pois houve diferença significativa entre as Condições Válidas e Inválidas [F(1,55)=7,728; p<0,01], e com relação aos clubes, esta diferença não ocorreu [F(3,55)=0,830; p=0,485]. Quanto ao distrator que apareceu do lado oposto do Estímulo-Alvo, houve manutenção do efeito de Orientação da Atenção em função da Pista [F(1,55)=906,846; p<0,001], se mantendo entre as Condições [F(1,55)=11,803; p<0,002] e não aparecendo diferença entre os diferentes times distratores [F(3,55)=0,049; p=0,985], portanto não apareceu o viés afetivo para torcedores do Botafogo, tão pouco a supressão da Orientação da Atenção em função da Pista para o uniforme do Flamengo, como ocorreu na totalidade dos participantes.

No caso dos torcedores do Flamengo (N=11), houve diferença estatisticamente significativa para estímulos distratores do mesmo lado que o Estímulo-Alvo [F(1,87)=611,007; p<0,001], sendo esta diferença em função da Condição [F(1,87)=8,337; p<0,01] e não em função do clube que acompanhou o Estímulo-Alvo [F(3,87)=0,385; p=0,764]. Considerando o estímulo distrator na posição do lado oposto ao Estímulo-Alvo, os dados mostraram diferença significativa entre o TRM [F(1,87)=942,240; p<0,001], apontando que tais diferenças se devem em função tanto da Condição [F(1,87)=20,918; p<0,001], quanto em função do clube que aparece [F(3,87)=6,960; p<0,001]. O teste post-hoc LSD de diferença entre as médias mostrou que o Flamengo foi o uniforme que aumentou de modo significativo o TRM deste grupo de participantes: Flamengo vs Botafogo LSD=147,50; p<0,001; Flamengo vs Fluminense LSD=95,40; p=0,005; Flamengo vs Vasco LSD=83,84; p<0,02.

Para os torcedores ou declarantes de preferência pelo Fluminense (N=6) houve diferença estatística quando os uniformes apareceram do mesmo lado do Estímulo-Alvo [F(1,47)=260,795; p<0,001]. Este padrão de resultados em relação à totalidade dos participantes se manteve, pois houve diferença significativa entre as Condições Válidas e Inválidas [F(1,47)=10,339; p<0,003], mas com relação aos clubes, esta diferença não ocorreu [F(3,47)=1,789; p=0,162]. Quanto ao distrator que apareceu do lado oposto do Estímulo-Alvo, houve manutenção do efeito de Orientação da Atenção em função da pista [F(1,47)=749,018; p<0,001], se mantendo entre as Condições [F(1,47)=7,894; p<0,01], contudo a diferença entre os times distratores apareceu de modo estatisticamente significativo entre os torcedores do Fluminense [F(3,47)=8,166; p<0,001]. Usamos o teste post-hoc LSD para diferença das médias, evidenciando que as respostas para o uniforme do Flamengo quando colocado do lado oposto do Estímulo-Alvo foram mais lentas que para os demais uniformes: Flamengo vs Botafogo LSD=175,15; p=0,001; Flamengo vs Fluminense LSD=203,07; p<0,001; Flamengo vs Vasco LSD=198,34; p<0,001.

No caso dos torcedores do Vasco da Gama (N=7), o fenômeno se manteve de modo estatisticamente significativo para estímulos distratores do mesmo lado que o Estímulo-Alvo [F(1,55)=728,308; p<0,001], sendo esta diferença em função da Condição [F(1,55)=18,863; p<0,001] e não em função do clube que acompanhou o Estímulo-Alvo [F(3,55)=0,314; p=0,815]. Considerando o estímulo distrator na posição do lado oposto ao Estímulo-Alvo, os dados mostraram diferença significativa entre o TRM [F(1,55)=667,111; p<0,001], apontando que tais diferenças se devem em função tanto da Condição [F(1,55)=6,759; p<0,02], quanto em função do clube que aparece [F(3,55)=5,082; p<0,005]. O teste post-hoc LSD mostrou que, assim como ocorreu anteriormente, o uniforme do Flamengo gerou aumento de modo significativo no TRM dos participantes: Flamengo vs Botafogo LSD=177,43; p=0,003; Flamengo vs Fluminense LSD=184,83; p=0,002; Flamengo vs Vasco LSD=171,11; p=0,004.

 

Discussão

Os resultados demonstraram que houve diferença entre o TRM médio dos participantes na Condição Válida e Inválida, apontando para melhor desempenho quando a Condição foi Válida em detrimento à Condição Inválida, pois a Pista exposta antes dos estímulos ajuda na orientação prévia da atenção (Posner, 1980; Chen, 1998; Filgueiras, 2010; Rizzolatti et al., 1987). Rizzolatti et al. (1987) explica que este fenômeno ocorre, porque a resposta motora depende da predisposição do Sistema Atencional em responder lateralmente. Uma vez que a Pista aponta para um dos lados, a Orientação da Atenção prepara a ação motora na direção correspondente, gera-se, então, potencial lateralizado motor, em outras palavras, o sujeito cria uma predisponência ao ato motor no lado em que a Pista aponta. Caso o Estímulo-Alvo não apareça na Condição Válida, no lado para qual a Pista apontou, não há aproveitamento do potencial lateralizado motor e o Sistema Atencional tem que reorganizar o processamento da informação de modo que a resposta motora seja realizada com o lado contrário ao esperado (Rizzolatti et al., 1987).

O resultado manteve a coerência quando consideramos como variável independente o uniforme que surge sob o Estímulo-Alvo, mostrando diferença entre as Condições e não ressaltando qualquer outra alteração significativa no padrão de respostas. Destes dados, podemos imaginar que, independente da característica do estímulo distrator que acompanhava o Estímulo-Alvo, ainda assim a Orientação da Atenção se mantinha de acordo com as diretrizes internas dos participantes (Baddeley, 2003; Filgueiras, 2010; Maringelli & Umiltà, 1998; Pylyshyn et al., 1994).

Todavia, quando optamos por analisar o TRM em face da qualidade do estímulo distrator que aparece do lado oposto ao Estímulo-Alvo, pudemos observar que apareceu uma supressão do efeito demonstrado por Posner (1980) não aparecendo diferença estatisticamente significativa entre Condição Válida e Condição Inválida para os tratamentos com o uniforme do Clube de Regatas do Flamengo. O TRM piorou para a Condição Válida, o que a aproximou da Condição Inválida, suprimindo o efeito da Orientação da Atenção para o Estímulo-Alvo em função da Pista quando o uniforme do Flamengo aparecia do lado oposto. Em outras palavras, os dados apontam que este estímulo distrator foi tão forte que os participantes perdiam parte de seu potencial lateralizado motor gerado pela Pista e, conseguintemente, tempo para reorientar sua Atenção, o que causou uma lentificação psicomotora da resposta para a Condição Válida. Estes resultados poderiam ser explicados de duas maneiras: o impacto dos parâmetros fisiológicos da percepção e parâmetros físicos do objeto (Chen, 1998; Davranche et al., 2009; Filgueiras, 2010; Wolfe et al., 1990; Zhang et al., 2009), ou, a preferência do sujeito por aquele time, em outras palavras, viés sócio-afetivo da Atenção (Greene et al., 2009; Martín-Loeches et al., 2009; Petocz et al., 2008; Suied et al., 2008). Como acreditamos que certos parâmetros fisiológicos perceptuais e certas características físicas como complexidade do objeto e das cores são os responsáveis pelo resultado, testamos a hipótese da preferência dos participantes por um time específico.

Ao analisarmos os resultados em função do time de preferência, buscamos confirmar a hipótese do viés sócio-afetivo da Orientação da Atenção (Greene et al., 2009; Petocz et al., 2008; Suied et al., 2008) como responsável pelos resultados que mostraram o uniforme do Clube de Regatas do Flamengo como um bom distrator para o lado oposto. Verificamos, no entanto, que não importa o time para qual o participante torce, o uniforme do Flamengo continuou sendo responsável pela lentificação do TRM entre os torcedores do Flamengo, do Fluminense e do Vasco, não aparecendo este fator somente no caso dos torcedores do Botafogo. A ausência desta diferença pode ser explicada pelo tamanho da amostra nestes grupos de participantes, porque nenhuma das divisões foi capaz de concentrar mais de trinta sujeitos, o que pode ter comprometido os resultados. Ainda assim, com base nos dados coletados e nos tratamentos estatísticos emprestados, acreditamos que a explicação mais robusta se funda na hipótese do impacto dos parâmetros fisiológicos da percepção e parâmetros físicos do objeto (Chen, 1998; Davranche et al., 2009; Filgueiras, 2010; Wolfe et al., 1990; Zhang et al., 2009). Caso a supressão o efeito aparecesse somente em torcedores dos times adversários: Botafogo, Fluminense e Vasco, ou somente nos torcedores do Flamengo, poderíamos apontar para a hipótese do viés afetivo, contudo, não foi o que apareceu nos dados.

Outra hipótese plausível para possível ausência do viés afetivo é que este vai se relacionar a estímulos cuja conotação esperada é a significação de perigo (Petocz et al., 2008; Suied et al., 2008). Os estudos apontam que o sujeito tende a orientar a Atenção para sons que apontem iminência de perigo. Em nosso estudo, o viés afetivo se aproxima mais do afeto positivo, isto é, mera preferência por um clube em detrimento aos demais, talvez esta preferência não seja suficiente para causar uma alteração nos parâmetros internos ou fisiológicos dos participantes. Para o elemento social, não há compartilhamento da experiência socialmente ou características que suscitem a percepção facial nos estímulos, fatores de extrema importância na Atenção Social (Greene et al., 2009; Martín-Loeches et al., 2009). Cremos que o fator de influência social no experimento estaria na identificação do participante com o clube ou o estereótipo de rivalidade, o que não acarretou em alteração significativa nos dados.

Todas as análises estatísticas dos dados mostraram a manutenção do efeito mostrado por Posner (1980) e replicado na literatura (Chen, 1998; Davranche et al., 2009; Filgueiras, 2010; Wolfe et al., 1990; Zhang et al., 2009). A supressão do potencial lateralizado gerado pela Pista sobre a Orientação da Atenção no caso do uniforme do Flamengo que aparece do lado oposto ao Estímulo-Alvo parece estar muito mais relacionada a processos ascendentes que dependem de parâmetros fisiológicos internos ao sujeito e características físicas dos estímulos do que a outra hipótese levantada do viés sócio-afetivo.

 

Conclusão

A Atenção é um constructo da Psicologia Cognitiva que apresenta diversas abordagens. Enquanto processo mental possui dimensões que a subdividem quanto à qualidade e determinam diretrizes internas e externas ao sujeito que a direcionam para um estímulo preponderante (i.e., Orientação da Atenção) ou concentram os esforços cognitivos ao longo de um tempo maior no estímulo (i.e., Atenção Sustentada). Estes processos, quando usados para resolver uma tarefa, passam a ser considerados parte de um Sistema Executivo Central (Baddeley, 2003) ou de Flexibilidade Atencional (Birrel & Brown, 2000).

A Orientação da Atenção Visual é um processo cognitivo estritamente relacionado à Percepção (Sternberg, 2008). Nas Ciências do Esporte, bem como na Psicologia Esportiva, este processo é de grande importância por conta do seu impacto no desempenho dos atletas (Filgueiras, 2010). O que acreditamos é que certas características dos uniformes usados pelos times de futebol em campo podem exercer influência na tomada de decisão e na execução da atividade motora em função de diretrizes fisiológicas internas ao sujeito (Davranche et al., 2009; Rossini & Galera, 2006; Wolfe et al., 1990) e características físicas de complexidade da cor e da forma (Chen, 1998; Filgueiras, 2010; Treisman, 1992a; Zhang et al., 2009). Todavia, levantamos a hipótese do viés sócio-afetivo com base em estudos com sinais de perigo (Petocz et al., 2008; Suied et al., 2008) e Atenção Social na interação e reconhecimento de certos fatores das faces como Pista para estímulos (Greene et al., 2009; Martín-Loeches et al., 2009).

Após a análise dos resultados, a hipótese do viés sócio-afetivo foi rejeitada, pois não há referencial empírico que a sustente. Isto significa que, do ponto de vista dos uniformes dos clubes, a hipótese não rejeitada foi a das diretrizes fisiológicas internas ao sujeito e características físicas de complexidade da cor e da forma. Estudos futuros podem determinar quais são tais características e criar protocolos de treinamento mental para atletas com a finalidade de evitar que este efeito possa ser causa de alterações do desempenho durante a atividade esportiva.

 

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