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Ciências & Cognição

On-line version ISSN 1806-5821

Ciênc. cogn. vol.16 no.2 Rio de Janeiro Aug. 2011

 

Artigo Científico

 

O uso de priming conceitual supraliminar na ativação do estereótipo de político: um estudo empírico

 

The use of supraliminal conceptual priming on the activation of politician stereotype: an empirical study

 

 

Raoni Paiva Pereira e Marcos Emanoel Pereira

Universidade Federal da Bahia (UFBA), Salvador, Bahia, Brasil

 

 


Resumo

Este estudo utilizou priming conceitual supraliminar para ativação dos estereótipos da categoria "político", buscando através da exposição breve de palavras ligadas a esta categoria, reduzir o tempo de resposta em uma tarefa de decisão lexical, sendo este o objetivo do estudo, verificar o efeito facilitador de um priming congruente. Utilizando uma amostra selecionada por conveniência de 67 estudantes universitários, uma análise das médias do tempos de respostas relacionadas ao tipo de priming apresentado foi realizada. Os resultados obtidos corroboram apenas parcialmente as hipóteses testadas, palavras relacionadas ao estereótipo reduziram o tempo de resposta quando apresentadas, mas não se obteve o efeito de priming desejado. Foram levantadas hipóteses que podem ter levado à incongruência dos resultados com o esperado pela literatura. © Cien. Cogn. 2011; Vol. 16 (2): 002-012.

Palavras-chave: priming; priming supraliminar; estereótipos; automatismos mentais; psicologia cognitiva.


Abstract

This study used conceptual supraliminal priming to the activation of stereotypes of the category "political", searching through the brief exposure of words linked to this category to reduce the response time in a lexical decision task, being the goal of the experiment to verify the facilitating effect of a congruent priming. Using a convenience sample of 67 college students, an analysis of the mean of the response times related to the type of priming presented was performed. The results only partially confirm the hypotheses tested, the stereotype-related words reduced the response time when presented, but not had the desired effect of priming. Hypotheses have been raised about what may have caused the inconsistency of the results with the results expected from the literature.© Cien. Cogn. 2011; Vol. 16 (2): 002-012.

Keywords: priming; supraliminal priming; stereotypes; mental automatisms; cognitive psychology.


 

 

Introdução

Para que possamos lidar com um ambiente social complexo e exigente, nossas mentes são equipadas com duas habilidades cognitivas complementares. Por um lado, precisamos estar sensíveis aos aspectos invariáveis dos mundos que nos cercam. Para isso, precisamos de representações internas estáveis (também conhecidas como modelos mentais) dos meios em que operamos. Dessa forma podemos "saber o que esperar - e exatamente onde, quando, e de quem esperar", tornando o mundo em um lugar com significado, ordenado e previsível. Por outro lado, nossas mentes precisam de flexibilidade para lidar com os estímulos inesperados e imprevisíveis do dia-a-dia. A conjunção entre modelos mentais estáveis e a necessidade de adaptação ao inesperado leva ao que Macrae e Bodenhausen (2000) chamam de processamento flexível.

O processamento flexível é obtido através da operação de dois módulos mentais complementares. O sistema neocortical (i.e. sistema de aprendizado lento), armazena as crenças gerais sobre o mundo, geradas pelas constantes repetições de estímulos (memória semântica). Em decorrência da necessidade de percepção estável do mundo, é altamente resistente às modificações e mudanças. Em contraste, o sistema hipocampal (i.e. sistema de aprendizado rápido) é o responsável por formar as representações temporárias de estímulos incomuns e surpreendentes (memória episódica). Geralmente esses estímulos não exercem impacto no conhecimento geral de uma pessoa, a menos que ocorram de modo repetitivo (passando, neste caso, a integrar o sistema neocortical) (Macrae & Bodenhausen, 2000).

É por meio da interação entre esses dois sistemas de processamento independentes que somos capazes de, ao mesmo tempo, termos uma visão de um mundo estável e previsível - possibilitando assim decisões de médio e longo prazo - e podermos nos adaptar a situações inesperadas, diante das quais a própria sobrevivência poderia estar em risco. Nas palavras de Macrae e Bodenhausen (2000, p. 95):

"Dadas as limitações cognitivas básicas e um mundo de estímulos desafiadores, os percebedores precisam de uma maneira de simplificar e estruturar o processo de percepção das pessoas. Isto é alcançado através da ativação e implementação do pensamento categórico."

Isto significa que, ao invés de considerarmos os indivíduos em termos de sua constelação única de atributos, nós os agrupamos em termos das categorias sociais a que pertencem, sobre as quais existem amplas informações no sistema de memória de longo prazo. O pensamento categórico possibilita, então, o acesso à memória de longo prazo em busca do que é esperado dentro da categoria, bem como a possibilidade da flexibilidade diante do inesperado (afinal, algo só pode ser inesperado em contraste com o que é esperado).

Porém, ao armazenar informações que permitam a formação de categorias estáveis, a mente precisa ignorar detalhes individuais e incongruentes. Ao formar uma categoria como "idoso", uma série de atributos que detalham o que esperar e o que não esperar dessa categoria são armazenados na memória de longo prazo, e ativados cada vez que algum indivíduo que se encontre nesta categoria se apresente. E estes atributos nem sempre se baseiam em experiência prévia, mas também em aspectos sócio-culturais, que muitas vezes não correspondem à realidade. É este conjunto de informações e atributos, altamente influenciados pelo meio social e cultural, que é geralmente chamado de estereótipo.

 

O uso do priming como técnica de mensuração implícita

A idéia de que as atitudes, crenças e comportamento são freqüentemente afetados por fatores que fogem à consciência e não podem ser totalmente compreendidos pela auto-reflexão e outros métodos intuitivos, tem sido um tema importante de estudo na psicologia social. Nas últimas décadas, a psicologia social experimental descobriu que atitudes e crenças podem ser ativadas na memória de uma pessoa sem que haja intenção ou sequer percepção de que elas foram ativadas. Uma vez ativadas, essas cognições e julgamentos são difíceis de inibir ou suprimir, e geram efeitos comportamentais significativos, afetando, por exemplo, julgamentos, decisões e atitudes. A essas reações sutis foram dados muitos nomes na literatura: implícito, automático, inconsciente ou não-consciente (Dasgupta, 2009).

Os estereótipos são, portanto, parte deste conjunto de crenças e atitudes que são ativados automaticamente e que geram expectativas a respeito de um determinado grupo ou pessoa que pertença a este grupo. Estas expectativas criadas pelos estereótipos enviesam constantemente as relações e julgamentos sociais. Por isso, os estereótipos são alvo de grande interesse dos estudiosos em Psicologia Social, que buscam compreender seus mecanismos de formação, ativação, manutenção e seus efeitos.

Por se tratar de um processo implícito e automático, diversos métodos foram desenvolvidos para estudar os estereótipos, dentre as quais um conjunto de técnicas denominada priming. Existem vários tipos diferentes de priming, dependendo do tipo de conceito que é pré-ativado e a forma de sua ativação. Neste estudo é utilizado um priming do tipo conceitual e supraliminar.

O priming conceitual envolve dois ou mais contextos distintos, onde no primeiro contexto são ativadas representações mentais que exercem influência (não-intencional e não-consciente) nos contextos subseqüentes, que não apresentam relação com o contexto inicial. Por exemplo, em um contexto inicial pode ser apresentado ao sujeito imagens ou palavras relacionadas à "preguiça", e em uma tarefa de julgamento de atitude posterior, estas imagens ou palavras (o prime) tenderão a afetar o julgamento, fazendo com que o indivíduo tenda a ver as atitudes como relacionadas com o prime inicial. Bargh e Chartrand (2000) subdividem as técnicas de priming conceitual em dois grupos: priming subliminar e priming supraliminar.

No priming supraliminar, o indivíduo é exposto ao priming como parte de uma tarefa consciente, podendo enxergar plenamente os estímulos, mas não percebendo o padrão entre eles, que é onde o priming é realmente gerado. Uma forma comum de apresentação deste tipo de priming é apresentar aos indivíduos um teste inicial com palavras que supostamente mede as capacidades lingüísticas, onde as palavras apresentadas guardam entre si significado relacionado a um conceito que o experimentador deseja utilizar como prime. Metodologicamente, o mais importante neste tipo de priming é que os indivíduos não percebam a ligação entre o contexto de exposição ao priming e os contextos subseqüentes, ou seja, não percebam que suas respostas estão sendo afetadas pela tarefa realizada anteriormente.

 

Um estudo utilizando priming conceitual supraliminar para ativação do estereótipo de político

O estudo realizado se baseou em uma tarefa de decisão lexical, que consiste em "apresentar-se uma série de letras, a fim de que o participante decida, o mais breve e acuradamente possível, se esta corresponde ou não a uma palavra" (Busnello, Stein & Salles, 2008, p. 42). A metodologia utilizada é bastante semelhante às pesquisas efetuada por Neely (1977), Blair e Banaji (1996), Estes e Jones (2009) e Busnello et al. (2008). Assim como na grande maioria dos estudos citados, este estudo utiliza-se do modelo proposto por Posner e Snyder (como citado em Gilbert, Fiske & Lindzey 1998, p. 461) a respeito dos processos mentais automáticos e conscientes. Segundo este modelo, os processos automáticos de codificação de um estímulo são ativados diretamente pela presença do estímulo, sem intenção consciente, e de maneira muito rápida (em torno de 200 a 300 milissegundos). Processos conscientes levam mais tempo para se desenvolverem (no mínimo 500 milissegundos) e requerem mais recursos de atenção. Dessa forma, segundo este modelo, quando há pouco tempo ou os recursos de atenção encontram-se sobrecarregados, os processos automáticos tendem a prevalecer.

Este estudo se baseou em grande parte na pesquisa de Neely (1977), onde ele solicitava aos participantes que respondessem de maneira mais rápida possível se o estímulo apresentado era uma palavra ou não. Neely encontrou em seus resultados, em concordância ao modelo de Posner-Snyder, que quando o tempo entre o prime e o estímulo eram curtos (250ms, por exemplo), as respostas onde existia associação entre a categoria que serviu de prime e o estímulo eram facilitadas, pois a forte associação de memória entre a palavra e a categoria ao qual ela se enquadra funciona de maneira automática.

A principal diferença entre este estudo e o apresentado por Neely (1977) consiste nas categorias a serem apresentadas. No presente estudo, buscou-se verificar se existem associações de memória entre a palavra "Político" e os estereótipos dessa categoria. Dessa forma, as palavras utilizadas como prime foram categorias de político (como vereador, senador, etc), categorias não ligadas à política (porteiro, encanador, etc) e não-palavras (conjunto de letras, com a mesma quantidade de letras que o prime da categoria político, como ohpacsn, mtginrcf, etc). Como alvo, ou seja, palavras que permaneciam na tela para que os participantes executassem a tarefa de decisão lexical, foram utilizadas palavras associadas ao estereótipo de político, palavras não associadas ao estereótipo e pseudo-palavras (conjunto de letras com similaridade silábica às palavras usadas como estereótipos).

Outra diferença entre este estudo e o realizado por Neely (1977) é a de que neste estudo, o alvo foi constituído não de uma, mas duas palavras apresentadas simultaneamente. Desta forma, a possibilidade de análise posterior ganha em amplitude, pois as possibilidades do alvo aumentam com a possibilidade de relação entre as palavras (palavra relacionada x palavra não relacionada x não-palavra).

 

Método

Material e sujeitos

O estudo foi realizado com amostras de estudantes universitários, predominantemente oriunda dos cursos de Psicologia da Universidade Federal da Bahia (UFBA) e do curso de Direito da União Metropolitana de Educação e Cultura (UNIME), selecionados por meio de voluntariado (amostra por conveniência), tendo seus direitos (incluindo, mas não restringindo ao de anonimato e autonomia) respeitados e concordando com sua participação através da assinatura de um termo.

Neste estudo foram coletados dados de 67 participantes. Um único participante conseguiu visualizar algumas palavras utilizadas como priming e teve sua participação excluída da base de dados. Portanto, a análise foi realizada com uma base de 66 sujeitos, sendo 42 do sexo feminino (63,6%) e 24 do sexo masculino (36,4%). Destes participantes, 36 eram estudantes de psicologia (54,5%), 26 estudantes de direito (39,4%) e 4 estudavam outros cursos universitários (6,1%).

A coleta de dados foi realizada de maneira computadorizada, utilizando-se instrumentos previamente construídos com o auxílio do software Toolbook, da empresa Sumtotal e do website de pesquisas http://www.unipark.info/. Para a efetivação da coleta e melhor controle de variáveis como distância do monitor e ausência de distratores, a coleta foi realizada em laboratórios de informática nas duas instituições de ensino.

Procedimentos

Para a definição dos estereótipos de político a serem utilizados neste estudo foi realizada uma análise baseada em uma tarefa de livre associação realizada por 25 pessoas, posteriormente submetida a juízes que julgaram a relação das palavras associadas com o conceito de político.

Para a realização do experimento, estudantes foram convidados a participarem de um teste de atenção, uma vez que não se podia explicitar a verdadeira natureza do experimento antes de sua realização, por se tratar de um tipo de medida implícita. Ao aceitar participar, os sujeitos eram levados até o laboratório, onde eram brevemente instruídos a sentarem-se diante de um computador e lerem as instruções na tela, perguntando em caso de dúvida. Antes da realização do experimento, havia uma sessão de treino obrigatória.

Após o final do experimento, os participantes eram levados a outra sala, onde a verdadeira natureza do experimento era explicada, além de requisitada sua opinião sobre o experimento e como foi sua participação.

Objetivo e hipóteses

O objetivo deste estudo foi o de verificar a influência de um priming supraliminar na ativação de um estereótipo relacionado ao prime. Esta influência foi medida por meio da mensuração dos tempos de resposta.

A primeira hipótese a ser verificada é a de que duas palavras relacionadas (estereótipos) teriam tempos médios de resposta menores, visto que pela associação, seriam identificadas mais rapidamente, independente do tipo de prime e do delay.

Esperava-se também, como segunda hipótese, que se existirem associações mentais fortes entre a categoria "político" e seus estereótipos, as respostas congruentes com essa associação seriam facilitadas, apresentando menor tempo de resposta e maior índice de acertos, quando o tempo de apresentação entre o prime e o estímulo for curto.

Já quando o tempo de apresentação entre prime e estímulo fossem longos espera-se, em concordância com o estudo supracitado de Neely (1977), que os sujeitos desenvolvam estratégias para contornar o efeito de priming, aumentando o tempo de resposta mesmo quando há congruência entre as palavras apresentadas.

 

Resultados

Com a finalidade de normalizar os dados, inicialmente excluiu-se os tempos de resposta menores do que 100ms, pois considerou-se que respostas tão rápidas se dariam ao acaso, não a um esforço intencional dos participantes. Também foram excluídas respostas acima de 2,5 desvio-padrão acima da média, pois um tempo tão longo provavelmente se dá devido a distratores e desatenção dos participantes. Por fim, também foram excluídos os tempos de resposta das respostas incorretas. Esses critérios de ajuste são muito semelhantes aos usados por Neely (1977), Busnello et al. (2008) e outros estudos que utilizam o mesmo paradigma. Após os ajustes serem feitos, as médias foram dos participantes foram agrupadas e analisadas.

Inicialmente, foi testada a hipótese de que a apresentação de duas palavras relacionadas a um mesmo estereótipo seria visualizada de maneira mais rápida e, conseqüentemente, teria tempos de resposta menores. As seqüências de letras que não formam palavras levariam mais tempo para serem identificadas, tendo tempos de resposta maiores, e as palavras que não tem relação entre si seriam a categoria intermediária. O resultado obtido condiz com essa hipótese:

Gráfico 1

Gráfico 1 - Principais categorias de palavras com intervalo de confiança de 95%, utilizadas para analise dos tempos de resposta.

No gráfico 1, observamos que a média dos tempos de resposta do grupo EE (duas palavras estereotípicas) foi menor, com média 1323,24 e desvio-padrão 346,54, sendo seguido pelo grupo NN (duas palavras não relacionadas) com média 1378,48 e desvio-padrão 305,51 e pelo grupo SS (dois conjuntos de letras que não formam palavras), que obteve média 1544,43 e desvio-padrão 508,96. Para verificar a significância desses valores, foi executado um teste ANOVA de medidas repetidas, onde foi obtido Pillai (2,64) = ,316, p < .001. Assim, podemos afirmar que existe diferença significativa entre os grupos, confirmando a hipótese supracitada.

Ao incluir todas as combinações possíveis de palavras, pode-se notar um padrão, melhor visualizado na figura abaixo:

Gráfico 2

Gráfico 2 - Todas as categorias de palavras com intervalo de confiança de 95%, utilizadas para a analise de combinações.

Através do gráfico, pode-se perceber que, de modo geral, todas as combinações que envolveram uma não-palavra (string de letras, representada pela letra S) tiveram tempos de resposta maiores, enquanto as combinações onde ao menos um estereótipo aparece (representado pela letra E), tempos de resposta mais baixos. Como intermediário, novamente as palavras não relacionadas ao estereótipo (letra N). Ou seja, o padrão que se nota com as 3 categorias de palavras iguais (EE, NN e SS) se estende à combinação entre esses grupos de palavras.

Em uma análise estendida, foram comparadas as médias dos tempos de resposta separadas pelo tipo de priming apresentado antes da exibição das palavras. Independentemente do tipo de priming (estereótipo, palavra não-relacionada ou string), o padrão manteve-se e a diferença encontrada entre os grupos foi significativa. Um olhar sobre as médias dos tempos de resposta separadas pelo tipo de priming apresentado mostra que não há grande variação entre estas e as médias totais, independente do tipo de priming, com valores muito semelhantes. Existe uma pequena redução do tempo de resposta de palavras estereotípicas, quando o priming é congruente (ou seja, um priming de estereótipo), mas o mesmo não ocorre quando um priming de palavra não relacionada é seguida por palavras não relacionadas, e quando um priming de não-palavra é seguido por não-palavras. Isto era esperado, uma vez que o efeito facilitador do prime só existe quando há congruência entre ele e a palavra alvo, conforme o modelo de Posner-Snyder (Bargh & Chartrand, 2000). Embora se tenha notado o efeito esperado, ainda não foi feita uma análise da hipótese de que um priming estereotípico facilitaria as respostas congruentes (palavras estereotípicas), reduzindo seu tempo de resposta. Acerca desta hipótese, os seguintes resultados foram obtidos:

Gráfico 3

Gráfico 3 - Categorias de palavras estereotípicas com tipos de priming variados e intervalo de confiança de 95%, utilizadas para analise dos tempos de resposta.

No gráfico 3 representa a diferença entre as médias dos tempos de resposta da condição EE (duas palavras estereótipo) em relação à condição do priming, sendo a condição 1 um priming estereotípico (média 1270,96 e desvio-padrão 336,41), a condição 2 um priming de palavra não relacionada (média 1323,50 e desvio-padrão 433,58) e a condição 3 um priming de string de letras (média 1348,65 e desvio-padrão 483,81). Pode-se notar que os valores das médias corresponde ao esperado pela hipótese, pois a média foi menor quando o priming foi congruente, caso da condição 1. No entanto, quando foi analisada a significância desta variância (ANOVA de medidas repetidas), obteve-se Pillai (2,64) = ,039, p = ,277. Ou seja, a variância entre os grupos não é significativa.

O mesmo ocorreu com o segundo grupo principal de palavras, o das palavras não-relacionadas com o estereótipo, onde não se obteve diferença significativa entre os grupos divididos pelo tipo de priming apresentado: Pillai (2,61) = ,017, p = ,585.

Com relação ao terceiro grupo principal de palavras, o teste ANOVA encontrou significância [Pillai (2,60) = ,144, p < ,05]. Porém, a diferença existente entre os grupos nada significa perante as hipóteses deste estudo, uma vez que não se espera efeito algum do priming quando dois conjuntos de letras que não formam palavras são apresentados.

Considerando o reduzido tamanho da amostra, sobretudo quando dividida em diversas categorias como foi feito, foi percebido o fato de que a distribuição dos resultados não se aproximou da curva normal e, por isso, pode ter distorcido os resultados na análise estatística. Para tentar anular esse efeito da distribuição, os resultados foram convertidos em logaritmos de base 10, e a análise foi feita novamente, mas novamente sem significância entre os resultados.

Com relação à segunda hipótese, onde seria analisada a variável diferença de tempo entre priming e alvos (delay), foram realizadas algumas análises caso a caso onde não foram encontrados quaisquer efeitos significativos entre o delay e o tempo de resposta. Desta forma, rejeita-se a hipótese e se aceita a hipótese nula a respeito da influência do delay no tempo de resposta.

 

Discussão

Com relação à primeira hipótese, os resultados encontrados foram os esperados, com os tempos de resposta sendo significativamente menores diante de alvos estereotípicos. No entanto, o objetivo principal deste experimento era testar a influência do priming supraliminar na ativação do estereótipo, conseqüentemente, reduzindo o tempo de resposta diante de um priming congruente.

No entanto a diferença encontrada não foi significativa, ou seja, de modo geral, o tipo de priming apresentado não gerou efeito significativo contrariando a hipótese de que um priming de estereótipo seguido de palavras estereotípicas reduziria o tempo de resposta em comparação com outras categorias.

Um dos motivos pelo qual o efeito de priming pode não ter surgido origina-se na seleção de que palavras utilizar como priming de estereótipo. A maneira utilizada, livre evocação seguida de juízes, pode ter gerado palavras que não necessariamente representam o estereótipo de político, uma vez que palavras como "decoro" e "favorecimento", por exemplo, podem estar relacionadas com a categoria, mas não necessariamente representam um estereótipo.

Outro fator a ser considerado é o uso de duas palavras como alvo da decisão lexical, ao invés de apenas uma, como utiliza a maior parte dos estudos. No desenho do experimento, pensamos que isto daria uma maior amplitude para a análise, uma vez que se misturariam condições diferentes. No entanto, talvez esta alternativa tenha suplantado o efeito do priming.

É importante retomar a idéia de que não existem processos "puros", ou seja, totalmente automáticos ou totalmente controlados. Conforme Dasgupta (2009, p. 269):

"Por exemplo, no caso de tarefas de tempo de reação que usam a velocidade com que as pessoas associam grupos sociais com atributos particulares para inferir a força de sua atitude, parte destas respostas aceleradas é governada pela ativação de associações automáticas mas outra parte é determinada pela habilidade individual de seletivamente acessar informação que facilita respostas precisas e descartar informação que leva a respostas inacuradas."

Ou seja, processos controlados podem interferir nos resultados em testes como este, que utilizam tempo de reação como variável. No entanto, é improvável que este seja um fator que tenha gerado por si só a ausência de resultados, uma vez que este experimento se assemelhou bastante a outros experimentos que obtiveram resultados satisfatórios, e que dificilmente uma parcela significativa da amostra possa ter elaborado estratégias conscientes de maneira semelhante.

Por fim, não pode ser desconsiderada a possibilidade de ter havido desatenção ou falta de empenho dos participantes, pois embora o experimento não tenha sido tão demorado (cerca de 20 minutos, em média), a tarefa exigia concentração constante e uma quantidade grande de tentativas, podendo gerar alguma fadiga. O fato de que até oito participantes poderiam estar juntos na mesma sala fazendo o experimento, sem isolamento, pode ter servido como efeito distrator, colaborando com a falta de concentração na tarefa.

 

Considerações finais

Ao buscar a ativação automática do estereótipo de político por meio de um priming supraliminar, este experimento obteve um resultado parcialmente incongruente com o que era esperado pela análise da literatura e de outros experimentos semelhantes.

Os fatores aqui apresentados como possíveis causadores desta incongruência com a literatura podem colaborar com experimentos futuros que utilizem do paradigma do priming para investigação de processos mentais, como os estereótipos.

Em busca realizada em julho de 2010 nos principais bancos de dados de artigos brasileiros (scielo, lilacs, google acadêmico e portal de periódicos da capes) com as palavras "priming", "prime" e "pré-ativação" foram encontrados apenas cinco artigos [Borine (2007), Busnello et al. (2008), Victoria, Soares e Maratori (2005), Lima, Machado, Ávila, Lima e Vala (2006), Oliveira et al. (2010)] em língua portuguesa que se trataram de relatos de pesquisa utilizando no sentido definido neste estudo (existem outros estudos que utilizam as mesmas palavras para se referirem a outros processos, como vacinação e preparo de sementes). Também foram encontradas duas dissertações de mestrado (Busnello, 2007; Holderbaum, 2009).

Dos sete relatos de pesquisa, três utilizaram priming subliminar, quatro utilizaram priming supraliminar e um utilizou ambas as formas de apresentação de priming. Também em relação às sete pesquisas, cinco delas encontraram algum tipo de problema com relação aos resultados e as expectativas oriundas da literatura, e apenas duas encontraram resultados totalmente consistentes com a teoria.

Ou seja, há de ser realizada uma futura análise acerca dos motivos que podem estar influenciando pesquisas nacionais que utilizam priming na análise de processos mentais, pois um grande número delas não encontra resultados totalmente condizentes com a literatura.

Embora não haja mais dúvida sobre a presença de efeitos de priming devido a uma literatura consistente oriunda de diversos experimentos que utilizam este paradigma, é importante notar que não apenas no Brasil, mas na literatura internacional também existem diversos casos de experimentos que não foram totalmente bem-sucedidos em suas hipóteses (Mussweiler & Damisch, 2008). Ainda assim, estes estudos colaboram com o crescimento do campo de estudos a respeito dos estereótipos e automatismos mentais.

 

Agradecimento

À CAPES pela colaboração para esta pesquisa por meio de bolsa de demanda social (DS).

 

Referências bibliográficas

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Notas

R.P. Pereira
E-mail para correspondência: raonielfo@gmail.com.