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SMAD. Revista eletrônica saúde mental álcool e drogas

versão On-line ISSN 1806-6976

SMAD, Rev. Eletrônica Saúde Mental Álcool Drog. (Ed. port.) vol.8 no.3 Ribeirão Preto dez. 2012

 

ARTIGO ORIGINAL

 

Perfil da utilização de drogas lícitas e ilícitas por universitários de uma instituição privada

 

Perfil de la utilización de drogas lícitas e ilícitas por universitarios de una institución privada

 

 

Rizângela Lyne Mendes de FreitasI; Danelle da Silva NascimentoII; Rivelilson Mendes de FreitasIII; Gláucio Barros SaldanhaIV; Roberta Mayara de Moura RochaV; Pauline Sousa dos SantosV

IDoutoranda, Universidade Federal da Bahia, Salvador, BA, Brasil. Professor Auxiliar, Faculdade Ateneu, Fortaleza, CE, Brasil
IIEnfermeira, Professor Substituto, Fundação Universidade Estadual do Piauí, Teresina, PI, Brasil
IIIPhD, Professor Adjunto, Universidade Federal do Piauí, Teresina, PI, Brasil
IVDoutorando, Universidade Federal da Bahia, Salvador, BA, Brasil. Professor, Faculdade Católica Rainha do Sertão, Quixadá, CE, Brasil
VAluna do curso de graduação em Farmácia, Universidade Federal do Piauí, Teresina, PI, Brasil

Correspondência

 

 


RESUMO

O trabalho investigou a prevalência do uso de drogas lícitas e/ou ilícitas entre os universitários dos Cursos de Ciências da Saúde de uma instituição de ensino superior do município de Quixadá, Ceará. O estudo foi realizado por meio de um questionário aplicado entre 345 universitários dos Cursos de Ciências da Saúde em questão. O perfil dos universitários estudados é de mulheres na faixa etária de 16 a 20 anos, solteiras, brancas, que não exerciam atividade remunerada, com renda familiar de 2 a 4 salários-mínimos. A grande maioria não fazia uso de nenhuma droga lícita ou ilícita. Entretanto, entre 39 e 16% fazia uso do álcool e da cocaína, respectivamente, devido, em especial, à sensação de alegria, e, principalmente, pela influência dos amigos em eventos sociais. A maioria dos universitários pratica automedicação. O estudo realizado sugere que o problema de uso de drogas e álcool nessa população é preocupante e novos levantamentos precisam ser realizados.

Descritores: Epidemiologia; Bebidas alcoólicas;  Drogas ilícitas; Estudantes; Universidades.


RESUMEN

El trabajo investigó la superioridad del uso de drogas lícitas y/o ilícitas entre los universitarios de los Cursos de Ciencias de la Salud (CCS) de una institución de enseñanza superiora del municipio de Quixadá, Ceará. El estudio fue realizado por medio de un cuestionario aplicado entre 345 universitarios del CCS en cuestión. El perfil de los universitarios estudiados es de mujeres con banda etaria de 16 a 20 años, solteras, blancas, que no ejercen actividad remunerada con renta familiar de 2 a 4 salarios mínimos. La grande mayoría no hace uso de ninguna droga lícita o ilícita. Mientras, 39 y 16% hace uso del alcohol y de la cocaína, respectivamente, debido en especial a la sensación de alegría, y principalmente por la influencia de los amigos en eventos sociales. La mayoría de los universitarios practica automedicación. El estudio realizado sugiere que el problema de uso de drogas y alcohol en esa población es preocupante y nuevos levantamientos necesitan ser realizados.

Descriptores: Epidemiología; Bebidas alcohólicas;  Drogas ilícitas; Estudiantes; Universidades.


 

 

Introdução

Estima-se que 200 milhões de pessoas no mundo façam uso de alguma substância ilícita, dentre as quais cerca de 25 milhões poderiam ser consideradas como "usuários problemáticos de drogas". Segundo dados do relatório mundial sobre drogas, as drogas ilícitas mais usadas no mundo são a maconha, os estimulantes tipos anfetamina, os opioides e a cocaína. No mundo, o consumo das diversas drogas ilegais não é uniforme: na Europa e na Ásia predomina o uso de opioide; nas Américas, a maior parte da demanda por tratamento decorrente do uso de cocaína; enquanto que na África a procura por tratamento é mais relacionada ao consumo de maconha(1).

No Brasil, 22,8% da população geral relatou uso na vida de qualquer droga psicoativa (exceto álcool e tabaco) em levantamento domiciliar, realizado em 2005(2). Dentre essas substâncias, as de maior prevalência de uso na vida foram: maconha, solventes, benzodiazepínicos, anorexígenos, estimulantes e cocaína. O uso na vida de tabaco, observado nesse levantamento, foi de 44%, com maior prevalência na população masculina(3).

Em todo o mundo, estima-se que, aproximadamente, 1,3 bilhões de pessoas sejam fumantes de cigarros ou consumam outros produtos de tabaco(4). O uso de tabaco é uma das principais causas de doença e morte prematuras no mundo(5), contribuindo para parcela considerável da carga global de doenças e vem aumentando rapidamente em países em desenvolvimento e entre as mulheres(6). Cerca de metade dos fumantes morre devido a alguma condição associada ao tabagismo. Embora o benefício de se parar de fumar seja maior quanto mais precoce for a interrupção do tabagismo, deixar de fumar é sempre benéfico, a qualquer momento, em razão da melhoria do prognóstico e da qualidade de vida(7).

Ao se compararem diferentes faixas etárias, pode-se observar que a idade entre 18 e 24 anos apresenta maiores prevalências para o uso na vida de maconha e solventes, enquanto que a população entre 25 e 34 anos apresenta as maiores prevalências para uso na vida de cocaína e estimulantes/anorexígenos. As mulheres apresentaram maiores prevalências do uso indevido de medicamentos; entre eles estimulantes/anorexígenos, benzodiazepínicos, xaropes à base de codeína, opiáceos e barbitúricos(3).

O abuso de substâncias psicoativas é um problema de saúde pública de grande relevância para as universidades. Nos Estados Unidos, esse comportamento representa a principal causa de morte e ferimentos entre estudantes com idade entre 18 e 25 anos(8). O álcool é a principal substância psicoativa de escolha entre os universitários norte-americanos, logo, a maior parte dos problemas está relacionada ao consumo de bebidas alcoólicas. Entretanto, os universitários também sofrem consequências sérias resultantes do uso de substâncias ilícitas ou do seu uso em combinação com álcool, de tal forma que o consumo de outras substâncias, incluindo tabaco, maconha e cocaína, também é significativo entre os universitários(9).

Segundo estudos epidemiológicos norte-americanos, cerca de 30% dos universitários referem o consumo de tabaco nos últimos 30 dias, cerca de 20% ou menos relatam uso de maconha e menos de 2% referem uso de cocaína(9). Também existem evidências de que esses universitários têm probabilidade maior de relatar uso indevido de substâncias sintéticas, em comparação com jovens não universitários de mesma faixa etária(10).

É nessa faixa etária que os jovens da população geral apresentam as maiores frequências para o uso de substâncias psicoativas e para a incidência de comportamentos de risco(2), o que desperta a necessidade de estudos que sejam destinados à compreensão específica da realidade dos universitários (na universidade há concentração de grande parte desses jovens), o que facilitará o desenvolvimento e implantação de eficientes políticas públicas a respeito(11).

Diante do exposto, faz-se urgente e necessário um estudo sobre a utilização desses em nossa realidade, bem como é de extrema importância a realização de uma abordagem farmacoepidemiológica e sobre as consequências do uso indevido de drogas lícitas e ilícitas entre os estudantes universitários. Considerando a alta prevalência do uso de drogas entre estudantes universitários e a carência de estudos, especificamente na Região Nordeste, o estudo foi conduzido com o seguinte objetivo: determinar o perfil da utilização de drogas lícitas e ilícitas por universitários de uma instituição privada do município de Quixadá, Ceará.

 

Material e Métodos

Os dados foram coletados por meio da realização de estudo do tipo quantitativo analítico, prospectivo, transversal, observacional com o preenchimento de um questionário padronizado e validado, construído especificamente para este estudo, que foi aplicado aos estudantes dos Cursos de Ciências da Saúde (CCS) de uma instituição de ensino superior particular, localizada no Sertão Central, a 165km de Fortaleza, no município de Quixadá. A instituição tem 2.103 alunos matriculados e distribuídos em 14 cursos de graduação. Desses, 1.269 estão regularmente matriculados nos cursos de ciências da saúde, o restante cursa na área de ciências exatas e ciências humanas. O estudo foi realizado durante o período de agosto a outubro de 2010. A população do estudo foi composta por, aproximadamente, 1.269 alunos da instituição, regularmente matriculados do 1º ao 9º período acadêmico, e a amostra constituída por 345 estudantes, sendo 239 estudantes do sexo feminino, dos seguintes cursos de graduação: 80 acadêmicos de farmácia (representando 47% dos alunos regularmente matriculados no curso), 80 acadêmicos de fisioterapia (40% do curso), 80 acadêmicos de enfermagem (24% do curso), 80 acadêmicos de odontologia (27% do curso) e 25 acadêmicos de biomedicina (100% do curso), de forma não probabilística e aleatória.

No estudo, foram incluídos os estudantes universitários de ambos os sexos dos cursos de ciências da saúde (farmácia, fisioterapia, enfermagem, odontologia e biomedicina) da Faculdade Católica Rainha do Sertão (FCRS).

Todos os universitários convidados a participar foram esclarecidos quanto ao objetivo da entrevista e quando aceitaram participar de forma voluntária. Os estudantes foram solicitados a assinarem o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) de participação no estudo. Não houve identificação nominal, nem risco moral para os estudantes, por se tratar apenas de dados estatísticos.

O projeto foi aprovado sob Protocolo nº200100075 pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade Católica Rainha do Sertão (FCRS), em 18/6/2010, de acordo com a Resolução 196/96, do Conselho Nacional de Saúde, Ministério da Saúde, que trata de pesquisa envolvendo seres humanos.

Para a obtenção das informações sobre o consumo de drogas e outros dados, foi utilizado um questionário anônimo autoaplicado, composto por questões objetivas e subjetivas, relacionadas aos dados socioeconômicos (faixa etária, sexo, cor da pele autorreferida, situação conjugal, renda familiar e tipo de moradia); ao consumo de substâncias lícitas e ilícitas; o uso de fármacos durante a prática da automedicação, bem como o uso específico de álcool (etilismo) e tabaco (tabagismo). Os questionários foram aplicados de maneira coletiva e mantidos sem identificação. Somente participaram da pesquisa os alunos que estavam presentes na sala de aula no dia da aplicação do questionário, sendo excluídos da pesquisa apenas aqueles estudantes que se recusaram a participar da pesquisa ou não entregaram o Termo de Livre Consentimento e Esclarecido (TCLE) assinado por ele.

As variáveis independentes foram o curso de graduação, idade, sexo, cor da pele autorreferida, estado civil, número de filhos, vínculo empregatício, tipo de moradia, renda familiar, religião, uso de drogas lícitas e ilícitas e informações relacionadas à frequência do uso de drogas, prática da automedicação e uso de medicação com potencial de abuso. As variáveis dependentes foram: o motivo que desencadeou esse hábito, a presença de fumantes na família e a quantidade de cigarros fumados por dia. Para o tratamento dos dados foi produzido um banco de dados no programa Microsoft Excel. Para análise e interpretação dos resultados foram usados os estudos existentes na literatura encontrados nas bases de dados LILACS, SciELO e Adolec, consultadas no período de novembro de 2010. A estatística descritiva com emprego da frequência absoluta e percentual foi utilizada para análise das informações(16,23).

 

Resultados

Entre os universitários entrevistados foi vista uma frequência de distribuição dos mesmos nos seguintes cursos de ciências da saúde: farmácia (23%), fisioterapia (23%), enfermagem (23%), odontologia (23%) e biomedicina (8%).

Dos 345 universitários acompanhados no estudo, a maioria é do sexo feminino (69,3%), 57% estavam na faixa etária entre 16 e 20 anos de idade, 48% autorreferiu a cor da pele parda e 44% como branca. Quanto à situação conjugal, 90% deles eram solteiros, 82% dos universitários não têm filhos e 70% reside em casa própria com seus pais. A maioria dos estudantes não possuía vínculo empregatício ou relação trabalhista (84%) e 63% apresentavam renda familiar de dois a quatro salários-mínimos. Quanto à religião, 90% eram católicos, 7% evangélicos e 3% protestantes (Tabelas 1 e 2).

Quanto às possíveis drogas utilizadas entre os universitários, foi detectado consumo de 39 e 6% para as drogas lícitas como o álcool e o tabaco, respectivamente, entre os universitários dos cursos de ciências da saúde da instituição de ensino superior em estudo. Também foi visto que 38% faziam uso dessas substâncias devido à curiosidade, 21% durante eventos sociais e 18% principalmente devido à vontade própria.

Além disso, foi verificado o uso, em 16% deles, da cocaína e de substâncias tranquilizantes. E 35% dos universitários autorreferiram não ter usado nenhum tipo de droga lícita ou ilícita. Os estudantes destacaram a influência dos amigos (13%) e a sensação de diversão (21%) causada pelas drogas, como fatores motivadores para o uso dessas substâncias, sendo que a grande maioria relatou não usar o álcool de modo frequente (71%) e não haver se excedido no seu uso (67%).

Somando-se os resultados, foi visto que 69% não esqueciam os compromissos devido ao uso de álcool, bem como 85% afirmaram não fazer uso de álcool pela manhã e 46% relataram fazer uso sem um motivo específico e 39% consideraram as festas universitárias como situações propícias ao uso do álcool.

Com relação aos estudos sobre o uso do tabaco, os estudantes afirmaram que 95% deles não fumavam e 78% disseram que não eram influenciados pelos pais. Dos 16 universitários que faziam uso do tabaco, citaram como fator motivador para o uso dessa droga influência dos amigos (64%) (Tabela 3), sendo que todos os estudantes fumantes relataram fazer uso de menos de 10 cigarros por dia (100%).

Com base nos achados, os estudantes relataram que não faziam uso de medicamentos em geral por prescrição médica (76%). Com relação à prática da automedicação, os resultados, aqui, demonstram que 71% dos universitários faziam uso de medicamentos sem prescrição médica e 65% deles relataram fazer uso de analségicos e anti-inflamatórios sem prescrição médica (Tabela 4).

 

Discussão

Os estudantes universitários têm sido objeto de diversos estudos por constituírem um grupo de maior vulnerabilidade para diversos comportamentos de risco, em que o consumo do álcool e outras drogas estão associados(12). É sabido que o ambiente universitário se torna favorável para o uso de bebidas alcoólicas e de outras drogas, uma vez que há diversos eventos sociais que favorecem e torna atrativo o uso do álcool e de outras drogas ilícitas(13).

Em outro estudo(14) foi verificado que a prevalência de uso de "drogas ilícitas" entre os universitários era de 38,1% na vida e de 18,9% nos últimos 30 dias. Neste estudo foi verificado um resultado que não corrobora os dados apresentados, uma vez que foi analisado o uso pelo menos de uma vez na vida de "drogas ilícitas" entre universitários. Nesse estudo citado anteriormente foi identificado, também, que álcool e o tabaco eram as substâncias mais consumidas, enquanto que no presente estudo foi detectado maior consumo, entre os universitários, de álcool e cocaína. Em outro estudo também foi visto maior consumo de álcool e tabaco entre os estudantes(15). Dessa forma, os dados, aqui, não corroboram estudos já disponíveis, demonstrando que pode estar havendo mudanças nos estilos e nos hábitos de vida de forma prejudicial entre os universitários.

O interessante nesse tipo de abordagem é a possibilidade de se comparar os dados encontrados em uma população específica, como no presente estudo, de estudantes universitários, aos levantamentos realizados em âmbito nacional pelo Cebrid e Senad. Um levantamento realizado, em Alfenas, MG, os estudantes de graduação relataram que já consumiam álcool antes de ingressarem na universidade(16). Esse dado concorda perfeitamente com os dados obtidos pela Senad em 2007. Quando se avaliaram padrões de consumo de álcool entre brasileiros, os jovens relataram início de uso de bebidas alcoólicas entre 14,8 e 17,3 anos de idade, período relativamente anterior ao ingresso no curso superior, que se caracteriza, geralmente, a partir dos 18 anos(16-17).

Neste estudo foi detectada alta prevalência de estudantes na faixa etária de 16 a 20 anos que relataram fazer uso, pelo menos, de uma substância lícita ou ilícita durante eventos sociais ou para aliviar o estresse, após o final do dia das atividades acadêmicas, corroborando outros estudos(2-3). Segundo um estudo desenvolvido entre estudantes da área da saúde de uma universidade em Curitiba, PR, o consumo de álcool ou drogas, entre os participantes que já fizeram uso, era induzido principalmente pelos seus "colegas, amigos ou conhecidos". Esse estudo mostrou que 65,8% dos estudantes nos quatro cursos estudados fizeram uso de pelo menos uma vez na vida dessas substâncias. Quanto ao principal motivo que induziu ao uso pela primeira vez, 13,6% dos alunos do curso de educação física informaram que começaram a usar em busca de "diversão ou prazer". Entretanto, 6,4% dos universitários relataram que fizeram uso dessas substâncias pela primeira vez para "melhorar o desempenho" (escolar, sexual e/ou social). Outros motivos que induzem o uso dessas substâncias pela primeira vez são a curiosidade (18,7%), a busca pela diversão e/ou prazer fácil (14,1%)(18).

Um estudo realizado com acadêmicos de enfermagem em Passo Fundo, RS, revelou que bares, danceterias, boates (31,5%) e a casa de amigos/conhecidos (18,2%) são os lugares mais propícios para o consumo de drogas e, em especial, álcool, sendo que os amigos e familiares foram citados como os principais responsáveis pela introdução do acadêmico no uso de bebidas alcoólicas, numa frequência de 49 e 20%, respectivamente(19).

Quanto ao uso do cigarro entre os universitários investigados nesse artigo, 95% se autorreferiram como não fumantes, revelando, ainda, não haver qualquer influência pelo hábito do fumo por parte dos seus familiares, uma vez que 78% dos pais dos universitários não fumavam.

Estudo realizado sobre o uso de drogas entre estudantes universitários da cidade de Alfenas, MG, em uma amostra de 1.500 estudantes de duas universidades (uma universidade federal e a outra, particular). Foi observado que 55% dos estudantes usavam algum tipo de droga, porém, entre a amostra coletada, os estudantes revelaram que já consumiam álcool e tabaco antes de ingressarem na universidade. O trabalho sugere que o ambiente universitário não representa necessariamente o ponto de partida para o consumo de drogas(14). Esses resultados concordam com os achados do presente trabalho, uma vez que foi detectado baixo número de fumantes entre os universitários e aqueles que se declararam fumantes, relataram ter iniciado o uso de tabaco antes do ingresso na faculdade.

Com base nos resultados encontrados neste estudo, a maioria dos estudantes é da religião católica, e um pequeno número deles é evangélico ou protestante. Pode-se supor que a religião está agindo de forma protetora ao uso de drogas na população de alunos estudados, resultado também visto em outros trabalhos. Em pesquisa com estudantes de sete países da América Latina, encontraram-se que altos níveis de religiosidade e estavam inversamente relacionados a experiências mais precoces com tabaco e maconha, mas não para o álcool. Porém, entre os alunos que tiveram oportunidade de experimentar tabaco e maconha, os níveis de religiosidade não influenciaram o adolescente a usar ou não essas substâncias(20).

O perfil dos entrevistados evidenciou que o maior número de participantes era do sexo feminino (61,4%)(21), dado semelhante ao encontrado no presente estudo, no qual 69,3% dos estudantes pertencem ao gênero feminino.

Com os resultados obtidos por este estudo, foi possível extrair informações sobre diferença entre gêneros na prevalência do uso de drogas, entre estudantes universitários. Dessa forma, foi observado que a maior diferença entre os gêneros foi relatada no consumo de drogas nos últimos 30 dias, com aumento significativo no consumo de tabaco entre homens (de 19,6 para 23,5%), maconha (de 15,8 para 20,5%), anfetaminas (de 1,1 para 3,2%) e inalantes (de 4,0 para 7,9%) (20). Este estudo mostrou consumo significativo de álcool entre homens e mulheres (39%), cocaína (16%), tabaco (6%) e tranquilizantes (4,0%).

No que se refere às medicações utilizadas pelos universitários, analgésicos, anti-inflamatórios e antitérmicos destacaram-se como os mais usados. Dados que concordam com estudo realizado em uma universidade pública de Recife, PE, com estudantes da área de saúde(22), no qual o grupo terapêutico analgésico/antitérmico foi citado pela maioria dos entrevistados (24%).

Em estudo realizado em Petesburgo, África do Sul, foi verificado que pode existir correlação entre o aumento do uso de tabaco e de drogas quando os alunos estão mais cansados, estressados, deprimidos ou em festas e o uso de álcool foi maior quando os alunos estavam em festas, ou durante os fins de semana e horários livres(23). Essa observação não condiz com os resultados obtidos no presente trabalho, mostrando que os usuários dessas substâncias não estão mais fora de casa e, consequentemente, mais expostos ao uso já que a grande maioria reside com os seus familiares e que alto número nunca fez uso de álcool, tabaco e de outras drogas lícitas ou ilícitas.

Os dados, aqui, quando comparados aos de outros países, mostram semelhanças com relação ao perfil socioeconômico e demonstram que o comportamento relacionado ao consumo de drogas lícitas e ilícitas representa a principal causa de morte e ferimentos entre estudantes com idade entre 18 e 25 anos, dados semelhantes ao encontrado neste estudo(8).

Entre os alunos estudados, o uso de álcool e "drogas ilícitas" esteve relacionado à renda familiar mais elevada. Da mesma maneira, foi observado que os alunos da rede particular de ensino de São Paulo relataram ter consumido maior quantidade de cigarro, álcool, inalante e maconha no período recente do que os alunos da rede estadual de ensino da mesma idade(2). Também observou-se que a classe "socioeconômica alta" foi associada a um risco duas vezes maior do uso de álcool do que a classe baixa entre alunos de escolas públicas de primeiro e segundo graus(24). Os resultados do presente estudo concordam com esses dados da literatura, já que os estudantes acompanhados no estudo pertencem à classe socioeconômica A ou B, conforme definido pelo número de salários-mínimos correspondentes à renda familiar mensal.

 

Conclusões

A confirmação da influência do ambiente universitário para o consumo abusivo de substâncias psicoativas confere maior importância à tomada de medidas preventivas institucionais. A prevenção do uso abusivo de drogas é essencial para evitar danos à saúde e à qualidade de vida dos universitários, bem como para reduzir posterior dependência física e química. Os resultados obtidos ressaltam a importância da triagem do uso de substâncias nas instituições de ensino em questão, para inserção de programas de prevenção direcionados à epidemiologia local, também corroborada em estudos regionais e nacionais.

Os resultados do presente estudo apresentam algumas limitações, uma vez que procederam de uma instituição privada que difere das demais pelo número de alunos e perfil socioeconômico desses, embora contemplem uma amostragem representativa de todos os cursos de graduação de ciências da saúde disponibilizados na FCRS.

 

Referências

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Correspondence
Rivelilson Mendes de Freitas
Universidade Federal do Piauí
Rua Cícero Eduardo, S/N
Bairro: Junco
CEP: 64600-000, Picos, PI, Brasil
E-mail: rivelilson@pq.cnpq.br

Received: Nov. 21th 2010
Accepted: Apr. 1th 2013