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SMAD. Revista eletrônica saúde mental álcool e drogas

versión On-line ISSN 1806-6976

SMAD, Rev. Eletrônica Saúde Mental Álcool Drog. (Ed. port.) vol.9 no.1 Ribeirão Preto abr. 2013

 

ARTIGO ORIGINAL

 

Fatores de risco para o uso na vida e no ano de álcool entre adolescentes do ensino médio

 

Factores de riesgo para el uso en la vida y en el año de alcohol entre adolescentes de la enseñanza media

 

 

Elisângela Maria Machado PrattaI; Manoel Antônio dos SantosII

IPhD, Professor, Universidade Camilo Castelo Branco, Descalvado, SP, Brasil. Professor, Centro Universitário Central Paulista, UNICEP, São Carlos, SP, Brasil. Professor, Instituto de Filosofia São Tomás de Aquino, São Carlos, SP, Brasil
IIPhD, Professor Doutor, Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo, Ribeirão Preto, SP, Brasil

Correspondência

 

 


RESUMO

Buscou-se, neste estudo, verificar os fatores de risco associados ao uso na vida e no ano de álcool por adolescentes do ensino médio. Participaram deste estudo 568 adolescentes entre 14 e 20 anos. Os dados foram coletados por meio de questionário anônimo, de autopreenchimento. As análises envolveram: a) descrição da distribuição das variáveis na amostra estudada, b) teste qui-quadrado e c) regressão logística. Em relação ao uso de álcool, os fatores de risco observados foram sexo, escolaridade, nível socioeconômico, frequentar bares, sair com amigos e não praticar esportes. Esses fatores identificados podem auxiliar diretamente na elaboração de ações preventivas em relação ao uso de drogas entre adolescentes.

Descritores: Adolescente; Transtornos Relacionados ao Uso de Substâncias; Fatores de Risco.


RESUMEN

Este estudio buscó verificar los factores de riesgo asociados al uso en la vida y en el año de alcohol por adolescentes de la enseñanza media. Participaron de ese 568 adolescentes entre 14 y 20 años. Los datos fueron colectados a través de cuestionario anónimo de auto-relleno. Los análisis envolvieron: a) descripción de la distribución de las variables en la muestra estudiada; b) prueba Jue-cuadrado; c) regresión logística. Con relación al uso de alcohol, los factores de riesgo observados fueron sexo, escolaridad, nivel socio-económico, frecuentar bares, salir con amigos y no practicar deportes. Estos factores identificados pueden auxiliar directamente en la elaboración de acciones preventivas con relación al uso de drogas entre adolescentes.

Descriptores: Adolescente; Trastornos Relacionados con Sustancias; Factores de Riesgo.


 

 

Introdução

Apesar de existir grande preocupação com o consumo das drogas ilícitas, estudos apontam que o álcool e o tabaco são as substâncias mais consumidas entre os adolescentes(1-3) e que apresentam início precoce, uma vez que, pelo fato de serem legalizadas, o acesso às mesmas é mais facilitado, além de serem socialmente aceitas em todos os níveis sociais(4). Embora o álcool seja a droga responsável pela maioria das internações por dependência, sua ênfase é menor, por exemplo, na mídia (em termos de campanhas preventivas), do que a ênfase dada por essa à cocaína(2). No caso do álcool, por exemplo, é possível observar justamente o contrário na mídia, uma vez que muitas campanhas publicitárias mostram incentivo ao consumo dessas substâncias, fato que pode exercer influência sobre o comportamento do adolescente(5).

Os adolescentes são considerados como um grupo de risco em relação ao uso de substâncias psicoativas, uma vez que estão passando por um período de grandes e intensas transformações que geram uma série de sentimentos contraditórios(6-7). Em função das próprias características dessa etapa, fala-se muito sobre a questão da vulnerabilidade dos adolescentes. Esses são mais vulneráveis, principalmente à pressão do grupo de amigos, nesse período, e, em função da própria necessidade do inusitado e de viver novas sensações, podem se envolver em atividades destrutivas, como é o caso do consumo de drogas(8).

Sendo assim, é importante destacar que, nessa etapa do desenvolvimento, o indivíduo deixa de viver apenas no contexto familiar e passa a viver em função também de amigos, buscando a inserção no grupo social, como forma de identificação pessoal, fato esse que o coloca diante de situações diversificadas e, dentre essas, o contato com o álcool(9).

O álcool é uma substância presente no contexto social tanto nas situações de comemoração quanto de sofrimento, uma vez que contribui para a liberação das emoções, além de propiciar reações iniciais de bem-estar instantâneo como forma de resolução de incertezas e conflitos. Dessa forma, a preferência pelo consumo de álcool pelos adolescentes ocorre pelos efeitos iniciais provocados pela mesma, bem como pela fácil inserção no grupo de pares que ela propicia(9).

O uso do álcool, contudo, traz consequências físicas, mentais e sociais, em curto, médio e longo prazo. O contato precoce com essa substância, antes dos 16 anos, deixa o indivíduo mais vulnerável, pois aumenta significativamente o risco de consumir álcool em excesso na idade adulta(10). Além disso, o contato com o álcool pode trazer aos adolescentes prejuízos relacionados à violência, incluindo a sexual, contaminação por Doenças Sexualmente Transmissíveis (DST), gravidez indesejada, distúrbios comportamentais e de conduta, absenteísmo escolar, déficit de aprendizagem, problemas familiares, perda de emprego, prejuízo financeiro e morte por acidentes de trânsito e homicídios, os quais representam a maior causa de mortes entre jovens(9-10).

Entretanto, apesar de os adolescentes serem encarados como um grupo de risco no que diz respeito ao uso de substâncias psicoativas, a literatura, de forma geral, aponta que os fatores que podem levá-los a utilizar drogas são variados. Os principais deles estão relacionados às características individuais e sociais, incluindo, nessa última, a sociedade como um todo, a família e o grupo de pares. Considerando-se esse aspecto, pode-se dizer que existe um conjunto de fatores que, ao atuarem no contexto no qual está inserido um determinado adolescente, leva-o à utilização de drogas(6).

Em função desse fato, muitos pesquisadores, na atualidade, estão preocupados em conhecer e compreender os fatores que podem contribuir para o consumo de drogas (os chamados fatores de risco) e os que podem auxiliar na prevenção do uso de substâncias psicoativas (denominados fatores de proteção). Nesse sentido, estudos realizados na atualidade identificaram aspectos comuns que contribuem ou que afastam o jovem do uso abusivo de substâncias psicoativas.

No que diz especificamente ao uso de álcool, a literatura aponta que os fatores de risco mais associados ao uso dessa substância referem-se à ausência do convívio parental, ao fato de estudar em escola pública, à reprovação escolar(11), além de variáveis como idade, sexo masculino, nível econômico, não morar com os pais, possuir história de álcool na família, ingresso no trabalho, não ter religião, uso de tabaco e drogas ilícitas e depressão(9).

Sendo assim, a partir desse panorama, neste estudo buscou-se evidenciar os principais fatores de risco associados ao uso na vida e uso no ano de álcool por adolescentes do ensino médio, uma vez que essas são as substâncias mais consumidas por eles.

 

Material e Métodos

Este estudo teve como população os adolescentes inseridos no ensino médio da cidade de São Carlos, SP. Para sua realização, foi selecionada uma amostra desses adolescentes por meio do sorteio de escolas e turmas presentes nessas, com a finalidade de compor uma amostra representativa. Sendo assim, participaram deste estudo 568 adolescentes de ambos os sexos, com idade entre 14 e 20 anos, de diferentes níveis socioeconômicos, que estavam cursando o ensino médio nas escolas e nas turmas previamente sorteadas.

Foi utilizado para a coleta de dados um questionário anônimo e de autopreenchimento, composto por 62 questões fechadas, abordando dados gerais referentes ao participante (dados demográficos como sexo, idade, grau de escolaridade etc.) e à organização familiar do mesmo (nível de escolaridade, situação econômica etc.), além de questões que avaliavam o nível de conhecimento e as opiniões dos adolescentes sobre o uso de drogas e o padrão de consumo de substâncias psicoativas por parte deles. Esse questionário foi elaborado tendo por base uma revisão da literatura da área, baseada em instrumentos que já foram padronizados para a realidade brasileira. Para a obtenção de dados a respeito do uso de drogas, foi utilizado o modelo de instrumento proposto pela Organização Mundial de Saúde (OMS), o qual foi adaptado para o contexto brasileiro por Carlini-Cotrim e Barbosa(12). Tal instrumento foi testado em um estudo-piloto com a finalidade de corrigir as imperfeições e verificar o procedimento de coleta.

A coleta foi efetivada em sala de aula, em dias previamente marcados com a escola, os professores e os alunos. Para participarem do estudo em questão, os adolescentes foram autorizados pelos pais ou responsáveis que assinaram um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE). Destaca-se que, mesmo em posse da autorização dos pais, a participação do adolescente na pesquisa foi voluntária. Além disso, os adolescentes foram esclarecidos sobre a pesquisa, sobre sua contribuição para o estudo, sendo enfatizado que os dados eram sigilosos. Ressalta-se que esta pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto, da Universidade de São Paulo.

A análise dos dados obtidos foi efetuada com o auxílio do programa estatístico SPSS (Statistical Package for the Social Sciences). Primeiramente foram realizadas as análises descritivas, as quais envolveram: a) descrição da distribuição das variáveis na amostra estudada, b) teste do qui-quadrado. Posteriormente, foi feita a regressão logística múltipla com a finalidade de verificar as estimativas das razões de chances, que medem o risco de um determinado grupo de indivíduos, exposto a um fator, usar ou não uma determinada substância psicoativa, comparativamente a outro grupo não exposto.

 

Resultados

Com base nos dados coletados em relação ao uso de álcool, os fatores de risco observados neste estudo foram sexo, escolaridade, nível socioeconômico, frequentar bares, sair com amigos e não praticar esportes. A Tabela 1 apresenta as variáveis estatisticamente significativas, considerando como variável dependente o uso na vida de álcool.

Analisando-se os dados apresentados acima pode-se dizer que:

a) o grupo constituído pelos adolescentes do sexo feminino apresentou 1,64 vezes mais chances (IC95% 1,06; 2,54) do que o grupo masculino de fazer uso de álcool na vida; b) os adolescentes do grupo de nível social baixo apresentaram 5,37 vezes (IC 95% 1,14; 6,26) mais chances do que os da classe alta e média superior e 2,19 vezes mais chances (IC 95% 1,34; 3,59) do que os adolescentes da classe média de utilizar álcool na vida; c) o grupo de adolescentes que costuma sair com os amigos do sexo oposto no tempo livre apresentou 2,30 vezes mais chance (IC95% 1,41; 3,76) de fazer uso na vida de álcool do que os que não costumam sair; d) o grupo de adolescentes que já pensou em abandonar os estudos apresentou uma chance 0,43 vezes (IC 95% 0,22; 0,86) maior de fazer uso na vida de álcool, comparativamente ao grupo que nunca pensou em abandonar os estudos; e) o grupo que afirmou assistir à TV no tempo livre apresentou 1,88 vezes mais chances (IC 95% 1,15; 3,07) de fazer uso de álcool na vida do que o grupo que não assiste; f) o grupo de adolescentes que costuma frequentar bares nos momentos de lazer apresentou 2,33 vezes mais chances (IC 95% 1.06; 5,12) do que aqueles que não frequentam, no que diz respeito a fazer uso de álcool na vida, enquanto o grupo de adolescentes que namora apresentou 2,12 vezes mais chances (IC 95% 1,26; 3,55) do que os que não namoram, nesse mesmo aspecto (uso na vida de álcool).

A Tabela 2 apresenta as variáveis estatisticamente significativas, considerando como variável dependente o uso no ano de álcool.

A partir dos dados descritos na tabela acima é possível afirmar que:

a) o grupo do sexo feminino apresentou 2,13 vezes mais chance (IC 95% 1,42; 3,20) do que o grupo masculino de fazer uso de álcool no ano;

b) o grupo do 1o ano do ensino médio apresentou 2,95 (IC 95% 1,32; 6,58) mais chance do que o do 3o ano de fazer uso de álcool no ano;

c) o grupo de nível social baixo apresentou 2,50 vezes mais chance (IC 95% 1,59; 3,92) do que o grupo de classe média de fazer uso de álcool no ano.

d) o grupo de adolescente que costuma sair com os amigos no tempo livre apresentou 2,30 vezes mais chance (IC95% 1,41; 3,76) de fazer uso no ano de álcool do que aqueles que não costumam sair;

e) o grupo de adolescentes que afirmou não praticar esportes nos momentos de lazer apresentou 1,79 vezes mais chances (IC95% 1,20; 2,67) de fazer uso no ano de álcool do que o grupo dos adolescentes que afirmou realizar alguma atividade esportiva;

f) o grupo que não vai ao cinema apresentou 1,94 vezes mais chances (IC 95% 1,15; 3,26) de uso do que o grupo que vai, bem como o grupo que namora apresentou 1,86 (IC95% 1,25; 3,08) mais chances de fazer uso no ano da substância psicoativa em questão do que o grupo que não namora.

 

Discussão

Em linhas gerais, pode-se dizer que o uso de álcool pelos adolescentes, em cada um dos padrões de consumo focalizados (uso na vida e no ano), parece estar associado a variáveis específicas. É interessante notar que indicadores escolares específicos aparecem nos dois padrões de consumo de álcool, particularmente a variável "já pensou em abandonar os estudos" (que se associou ao uso na vida) e o grau de escolaridade (que se associou ao uso no ano de álcool). Isso indica, de certa forma, a importância de se considerar aspectos relacionados ao contexto escolar como fatores que podem influenciar no uso de substâncias pelos adolescentes. Entretanto, é importante ressaltar que a variável "já pensou em abandonar os estudos" pode estar relacionada a uma série de outros aspectos, uma vez que os adolescentes podem pensar em abandonar os estudos porque não estão indo bem na escola, porque precisam trabalhar, porque não gostam de estudar ou, até mesmo, porque estão utilizando substâncias psicoativas, particularmente o álcool.

É interessante notar, ainda, que a variável "desempenho escolar" não foi associada ao uso de álcool em nenhum dos padrões de consumo. Entretanto, outros estudos já encontraram associação entre esses aspectos. Nesse sentido, especificamente no que diz respeito ao uso pesado de álcool, por exemplo, diversos estudos têm encontrado forte associação entre o uso de substâncias psicotrópicas e o baixo rendimento escolar, entre elas o uso pesado de álcool(13).

Dessa forma, futuras pesquisas precisariam avaliar outros aspectos referentes ao contexto escolar, possibilitando análise mais apurada do papel dos indicadores escolares como fatores que podem evitar ou influenciar o envolvimento dos adolescentes com substâncias psicoativas.

Em relação ao uso de álcool e à variável "sexo", também são necessárias algumas considerações. Tanto no que diz respeito ao uso na vida quanto em relação ao uso no ano, verificou-se que o sexo feminino apresentou mais chances de fazer uso dessa substância comparativamente ao sexo masculino, ou seja, apresentou risco maior de consumi-la. Entretanto, estudos que trabalharam com o uso de álcool por adolescentes, considerando-se a distribuição por sexo, não constataram associação entre essas variáveis(7), enquanto outros, apesar de mostrarem as controvérsias no que diz respeito ao gênero, ressaltam risco maior para o sexo masculino(9-10,14). Em um desses estudos, os autores verificaram que 37,8% dos entrevistados afirmaram ter utilizado pelo menos uma vez durante a última semana, bebidas alcoólicas, sendo que esses adolescentes eram, no geral, do sexo masculino (RR=1,2 IC95%1,0-1,4; p<0,005)(14).

Em relação, ainda, ao uso de álcool e o sexo, identificaram-se diferenças entre o sexo no que diz respeito à ocorrência de embriaguez alguma vez na vida, cujas porcentagens foram maiores para o sexo masculino. Além disso, segundo os autores, "o sexo masculino apresentou um risco cerca de três vezes maior para a ocorrência de duas ou mais situações de embriaguez no último mês (RP=3,10 IC95% 2,08-4,62)"(7).

Sendo assim, é importante ressaltar que os dados obtidos no presente estudo podem indicar algumas mudanças de gênero no que diz respeito tanto ao uso de substâncias psicoativas quanto ao tipo de droga consumida, questão essa que necessita ser explorada em pesquisas futuras, uma vez que o consumo de álcool entre adolescentes do sexo feminino tem aumentado.

Ainda em relação ao uso na vida de álcool, os dados obtidos referentes às atividades exercidas pelos adolescentes no momento de lazer merecem atenção. Esses dados revelam que o grupo de adolescentes que costuma sair com amigos do sexo oposto apresentou 2,16 (IC 95% 1,23; 3,79) vezes mais chances de fazer uso na vida de álcool do que o grupo de adolescentes que não costuma sair. Esse padrão também foi verificado no que diz respeito ao uso no ano de álcool pelos adolescentes.

Esse dado traz a questão da influência do grupo de amigos no uso de substâncias psicoativas. Assim, se o adolescente costuma sair com amigos que utilizam, por exemplo, álcool, ele pode começar a utilizar essa substância por pressão do próprio grupo e para se sentir integrado ao mesmo e não ser encarado, por exemplo, como "careta" entre os amigos. Entretanto, a influência do grupo de amigos não pode ser vista de uma maneira simplista, uma vez que a afiliação a pares que aprovam ou toleram o uso de substâncias psicoativas corresponde ao final de um percurso no qual diversos fatores se combinam, aumentando a probabilidade de uso abusivo. Contudo, é necessário pontuar o outro lado, uma vez que os amigos podem exercer influência positiva, quando esses apresentam objetivos e expectativas de realização de vida, bem como movimentos que levam ao protagonismo juvenil e à solidariedade(15).

Outro dado interessante observado diz respeito à atividade "assistir à TV". Verificando-se os resultados, nota-se que o grupo que afirmou assistir à TV no tempo livre apresentou 1,88 vezes mais chances (IC 95% 1,15; 3,07) de fazer uso de álcool na vida do que o grupo que não assiste. Esse dado vai ao encontro da literatura da área a respeito da influência da mídia no comportamento do adolescente. No caso da televisão, é possível levantar uma série de propagandas de bebidas alcoólicas, particularmente de cerveja, que são diariamente exibidas pela mesma. Esses comerciais costumam ser chamativos e trazem, geralmente, situações interessantes envolvendo jovens e lazer. O adolescente, que está em busca de uma identificação, pode ser diretamente influenciado por esse tipo de estímulo. Sendo assim, a mídia direcionada a propagandas de bebidas foi associada ao consumo de álcool entre adolescentes, uma vez que contribui para a formação de hábitos e estímulo ao consumo(11).

Por si só, entretanto, a propaganda não tem efeito devastador em termos de persuasão. Além disso, as informações veiculadas podem gerar reflexão crítica, moderando o risco potencial de exposição(15), e esse veículo pode ser utilizado na prevenção primordial e para convidar os adolescentes para atividades diversificadas e de interesse dos mesmos, em ambientes externos(16).

Os dados mostram, ainda, que o grupo de adolescentes que costuma frequentar bares nos momentos de lazer apresentou 2,33 vezes mais chances (IC 95% 1.06; 5,12) do que aqueles que não frequentam, no que diz respeito a fazer uso de álcool na vida, enquanto o grupo de adolescentes que namora apresentou 2,12 vezes mais chances (IC 95% 1,26; 3,55) do que os que não namoram, nesse mesmo aspecto (uso na vida de álcool)

No caso específico de "frequentar bares", pode-se dizer que o fato de o adolescente estar em um ambiente público, no qual essa substância está disponível, pode levá-lo à utilização da mesma, uma vez que apesar de existir proibição da venda de bebidas alcoólicas para menores, isso, na maioria das vezes, não é cumprido. Além disso, mesmo que exista o controle, se o adolescente está com um grupo e nesse existem indivíduos mais velhos, esses podem solicitar a bebida e compartilhar com o adolescente. Sendo assim, o fácil acesso e a disponibilidade da substância podem levar o indivíduo a utilizá-la.

Por fim, o fato de o adolescente "namorar" pode exercer influência no uso de substâncias. Isso porque, se o adolescente está namorando uma pessoa que costuma utilizar essa substância (no caso, o álcool), ele pode começar a utilizá-la para acompanhar o namorado(a) ou para não se sentir "careta", uma vez que a avaliação do outro tem peso muito grande para o adolescente.

Nesse sentido, por exemplo, o consumo de álcool entre os adolescentes espanhóis consiste no uso de cerveja e combinados, de preferência em lugares públicos, com amigos [e/ou namorado(a)] e nos finais de semana(17). Esse é um dado interessante, uma vez que o final de semana corresponde ao período que o adolescente tem maior disponibilidade para realizar atividades de lazer.

Por outro lado, em relação ao uso no ano de álcool os resultados das análises demonstraram que as variáveis estatisticamente significativas, no que diz respeito às atividades praticadas pelos adolescentes nos momentos de lazer, foram sair com amigos do sexo oposto, não praticar esportes, não ir ao cinema e namorar.

O grupo de adolescentes que afirmou não praticar esportes nos momentos de lazer apresentou 1,79 vezes mais chances (IC95% 1,20; 2,67) de fazer uso no ano de álcool do que o grupo dos adolescentes que afirmou realizar alguma atividade esportiva. Esse é um dado relevante, uma vez que retrata a importância da atividade esportiva no cotidiano do adolescente. Isso porque, se o indivíduo costuma realizar algum tipo de atividade esportiva, isso pode levá-lo a apresentar maior preocupação com a saúde, fato que pode contribuir para a não utilização de substâncias psicoativas, nesse caso particular, o uso de álcool. Esse dado chama a atenção para a avaliação das possibilidades de prática de esportes oferecidas ao indivíduo na cidade em que ele reside. O incentivo ao esporte deve ser uma preocupação constante, uma vez que a prática de atividades esportivas pode funcionar como fator de proteção em relação ao uso de substâncias psicoativas.

Esse dado, entretanto, necessita ser mais explorado em pesquisas futuras, avaliando, por exemplo, indivíduos que praticam e não praticam esportes, bem como o tipo de atividade esportiva realizada e o uso e não uso de substâncias psicoativas.

 

Considerações Finais

Tendo por base os dados apresentados e discutidos acima, pode-se dizer, então, que o uso de álcool pelos adolescentes, assim como o de qualquer outro tipo de substância, é uma questão que necessita de maior atenção no contexto social atual, uma vez que o consumo abusivo dessas substâncias pode acarretar uma série de problemas para o indivíduo, tanto no momento atual de sua vida como mais tarde, na idade adulta.

Assim, os dados obtidos nesta pesquisa podem ser utilizados como base para a elaboração de trabalhos preventivos com adolescentes no que diz respeito ao uso de drogas, especialmente o álcool. Ressalta-se que as ações preventivas tornam-se possíveis quando há efetivamente profissionais capacitados que assistam individualmente e/ou em grupos essa faixa etária, no sentido de intervir nos fatores de risco relacionados, tanto aos aspectos familiares quanto aos psicológicos e sociais(9).

Essa temática, no entanto, é complexa e exige a realização de novas pesquisas, com a finalidade de ampliar os conhecimentos sobre essa questão, uma vez que abordar as questões do uso/abuso de substâncias psicoativas não é tarefa simples e, certamente, uma única disciplina jamais responderá pelo fenômeno, se não for abordado a partir da perspectiva da interdisciplinaridade(18).

 

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Correspondence
Elisângela Maria Machado Pratta
Rua XV de Novembro, 1859
Bairro: Chácara São João
CEP: 13569-220, São Carlos, SP, Brasil
E-mail: emmppsic@terra.com.br

Received: Aug. 25th 2011
Accepted: Apr. 23rd 2013