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SMAD. Revista eletrônica saúde mental álcool e drogas

versão On-line ISSN 1806-6976

SMAD, Rev. Eletrônica Saúde Mental Álcool Drog. (Ed. port.) vol.9 no.1 Ribeirão Preto abr. 2013

 

ARTIGO ORIGINAL

 

Análise da evolução dos transtornos mentais e comportamentais ao longo das revisões da Classificação Internacional de Doenças

 

Análisis de la evolución de los trastornos mentales y comportamentales a lo largo de las revisiones de la Clasificación Internacional de Enfermedades

 

 

Rubia Paixão BenedictoI; Mey Fan Porfírio WaiII; Renata Marques de OliveiraII; Cecília GodoyIII; Moacyr Lobo da Costa JrIV

IMSc, Enfermeira, Hospital Santa Tereza de Ribeirão Preto, Secretaria do Estado de São Paulo, Ribeirão Preto, SP, Brasil
IIDoutoranda, Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto,  Universidade de São Paulo, Centro Colaborador da OMS para o Desenvolvimento da Pesquisa em Enfermagem, Ribeirão Preto, SP, Brasil
IIIMSc
IVPhD, Professor Associado, Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo, Centro Colaborador da OMS para o Desenvolvimento da Pesquisa em Enfermagem, Ribeirão Preto, SP, Brasil

Correspondência

 

 


RESUMO

Este estudo teve por objetivo descrever a criação e a evolução de três categorias diagnósticas do capítulo V da Classificação Internacional de Doenças, denominadas na Classificação Internacional de Doenças-10: 1) transtornos de humor, 2) esquizofrenia e 3) transtornos mentais e comportamentais, devido ao uso de substâncias psicoativas, desde a sexta revisão à décima (atual). Foram descritas as mudanças dessas categorias entre as Classificações Internacionais de Doenças, as mudanças de códigos e quantificado o número de agrupamentos, categorias e subcategorias. Observaram-se mudanças significativas, incorporações de novas definições e redefinições. Concluiu-se que as alterações ocorridas acompanharam a trajetória das doenças e transtornos psiquiátricos que foram carregados de expressões que remetem ao preconceito e à exclusão, destacando-se, além da expansão do número de categorias, o melhoramento no conteúdo do capítulo V.

Descritores: Classificação Internacional de Doenças; Transtornos do humor; Esquizofrenia; Transtornos Relacionados ao Uso de Substâncias.


RESUMEN

Este estudio tuvo por objetivo describir la creación y la evolución de tres categorías diagnósticas del capítulo V de la Clasificación Internacional de Enfermedades-CID, denominadas en CID-10: 1) Trastornos de humor, 2) Esquizofrenia y 3) Trastornos mentales y comportamentales debido al uso de substancias psicoactivas, desde la sexta revisión a la décima (actual). Fueron descritos los cambios de esas categorías entre CID, los cambios de códigos y cuantificado el número de agrupamientos, categorías y subcategorías. Se observaron cambios significativos, incorporaciones de nuevas definiciones y redefiniciones. Se concluyó que las alteraciones ocurridas acompañaron la trayectoria de las enfermedades y trastornos psiquiátricos que fueron cargados de expresiones que remeten preconcepto y exclusión, destacándose además de la expansión del número de categorías, el mejoramiento en el contenido del capítulo V.

Descriptores: Clasificación Internacional de Enfermedades; Trastornos del humor; Esquizofrenia; Trastornos Relacionados con Sustancias.


 

 

Introdução

A Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde (CID), atualmente, é o sistema diagnóstico mais utilizado na codificação de agravos à saúde, inclusive na área da psiquiatria, e tem por objetivo a busca da padronização internacional dos diagnósticos(1).

O conhecimento sobre a CID é de fundamental importância para os profissionais, considerando que, para as informações referentes à saúde serem adequadamente compreendidas e comparadas, é necessário que haja uma organização no seu modo de apresentação. Isso ocorre na CID através de um sistema de classificação que vem evoluindo ao longo dos anos, tendo seu início conceitual no século XIX(2-3).

É necessário conhecer a evolução histórica da CID, desde o seu surgimento até como se apresenta atualmente, de modo a permitir melhor compreensão dos diagnósticos realizados em pacientes acompanhados, ao longo dos últimos anos, bem como maior confiabilidade nas pesquisas de séries históricas sobre o assunto.

O processo para a criação da CID, tal como hoje se apresenta, é antigo e complexo. Ao se realizar um epítome histórico constatou-se que, por muitos anos, a grande preocupação dos estudiosos estatísticos era em relação às doenças como causas de morte e não às doenças como causadoras de incapacidades e sofrimento para os seus portadores. 

No século XVII, John Graunt realizou o primeiro estudo estatístico sobre doença, no qual, com o intuito de estimar a proporção de óbitos em crianças, criou uma classificação de doenças baseadas nas causas. É importante considerar que, nessa época, não havia registro da correlação entre óbito e idade, o que certamente dificultou a realização do estudo.

Nos anos seguintes a esse primeiro estudo, pesquisadores importantes como William Cullen (1710-1790) e Willian Farr (1807-1883) se dedicaram à criação de uma classificação de doenças para as causas de morte, sendo implementada em alguns países. O grande desafio da época era a impossibilidade de comparação internacional da ocorrência de óbito por determinada causa, uma vez que não havia uma padronização das classificações entre os diferentes países.

Várias discussões sobre a padronização da classificação de causas de morte foram realizadas. Em 1853, ocorreu, em Bruxelas, o 1º Congresso Internacional de Estatística, em 1855, ocorreu em Paris o 2º Congresso Internacional de Estatística, em 1891, foi criado um comitê presidido por Jacques Bertillon para a elaboração de uma classificação de morte que pudesse ser adotada mundialmente. Nos anos seguintes foram realizadas conferências internacionais para a revisão da Classificação criada por Bertillon(2).

A partir da sexta revisão, criada em 1948 e posta em uso em 1950, a responsabilidade pelos trabalhos de revisão, publicação e divulgação da Classificação Internacional de Doenças passou a ser da Organização Mundial da Saúde (OMS). A conferência da sexta revisão constituiu o princípio de uma nova era no campo internacional das estatísticas vitais e sanitárias, principalmente em relação aos transtornos mentais, pois, uma vez uniformizadas as terminologias referentes a esses transtornos, as estatísticas passaram a ser realizadas com maior propriedade(3-4).

Da evolução da sexta à décima revisão da CID, chama atenção a expansão do número de categorias para classificar tanto morbidade como mortalidade. A CID é composta por capítulos, cada capítulo é subdividido em agrupamentos, cada agrupamento é subdividido em categorias e, por fim, as categorias são subdivididas em subcategorias.

Considerando as expectativas atuais em relação à elaboração da 11ª Revisão da CID, é importante que discussões sejam realizadas sobre as mudanças ocorridas ao longo das revisões anteriores. Desse modo, o presente estudo teve por objetivo descrever a criação e a evolução de quatro categorias diagnósticas do capítulo V da Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde, assim denominadas em sua revisão mais atual (CID-10): 1) transtornos de humor (afetivos); 2) esquizofrenia, transtornos esquizotípicos e delirantes; 3) transtornos mentais e comportamentais, devido ao uso de álcool e 4) transtornos mentais e comportamentais, devido ao uso de outras substâncias psicoativas.

 

Material e Método

De interesse para a área de psiquiatria, a evolução da sexta à décima revisão da CID não é simples e trivial, mas complexa pelo grande número de mudanças ocorridas. Para tanto, foram descritas as principais mudanças na evolução das CIDs sobre as seguintes categorias diagnósticas: transtornos afetivos, esquizofrenia e transtornos mentais e comportamentais, devido ao uso e abuso de substâncias.

A escolha dessas categorias deu-se após levantamento no Sistema de Informações de Saúde do Sistema Único de Saúde – Datasus, no qual são disponibilizadas gratuitamente, de modo fácil e amistoso, por meio do site www.datasus.gov.br, todas as informações que podem ser acessadas junto ao Ministério da Saúde. A tabela a seguir mostra o impacto desses transtornos no âmbito da saúde mental brasileira para o ano 2009.

 

Tabela 1

 

Como observado, os transtornos mentais e comportamentais foram responsáveis por 274.808 internações no Brasil no ano 2009, o que equivale a 2,4% de todas as internações do SUS, no país, em 2009. Ao serem distribuídas por morbidades, a esquizofrenia, os transtornos de humor e os transtornos mentais e comportamentais, devido ao uso de substâncias psicoativas (inclui-se o álcool), foram responsáveis por 90% das internações psiquiátricas.

Nesse contexto, optou-se por descrever apenas as categorias referentes à esquizofrenia, transtornos afetivos e transtornos mentais e comportamentais pelo uso de substâncias psicoativas, por serem os diagnósticos mais frequentes nos serviços de internação psiquiátrica.

Delimitadas as categorias diagnósticas, buscou-se apresentar em forma de tabelas as descrições da sexta à décima revisão da CID, pontuando cada sucessão das revisões.

 

Resultados

CID – 6ª Revisão (1948)5 para CID – 7ª Revisão (1955)(6)

Enquanto as primeiras revisões da classificação diziam respeito somente às causas de morte, a partir da Sexta Revisão, em 1948, suas finalidades se expandiram, passando a incluir doenças não fatais. Foi denominada pela primeira vez "Classificação Internacional de Doenças" com participação inédita da Organização Pan-Americana de Saúde e da Organização Mundial da Saúde.

No que tange à saúde mental, a CID na Sexta Revisão nomeia o capítulo V – "Perturbações mentais, psiconeuroses e modificações da personalidade". Esse capítulo apresentava 3 agrupamentos, 26 categorias, 60 subcategorias com códigos indo de 300 a 326. Já na CID-7, o capítulo V passou a ser denominado "Doenças mentais, psiconeuroses e perturbações da personalidade" e não houve aumento do número de agrupamentos, categorias ou subcategorias.

Algumas definições que caíram em desuso: esquizotimia; psicose mista esquizofrênica; psicose maníaco-depressiva; histeria; neurose de compensação e mentismo.

A tabela a seguir mostra as principais mudanças ocorridas nas categorias diagnósticas esquizofrenia, transtornos, devido ao uso de substâncias, e transtornos de humor na passagem da 6ª para 7ª Revisão da CID.

A Tabela 2 mostra que a esquizofrenia está dentro do agrupamento das Psicoses da CID-6 à CID-7. Quanto à categoria, manteve o mesmo código (300), nome (pertubações esquizofrênicas) e número de subcategorias da CID-6 para CID-7.

Da CID-6 até a CID-9, o agrupamento referente aos atuais transtornos de humor afetivos foi denominado Psicoses, tendo mantido os códigos 300-309 na Sexta e Sétima Revisão. Nesse agrupamento, só havia duas categorias: 301 "Reação maníaco-depressiva" (com 3 subcategorias) e 302 "Melancolia de involução" (sem subcategorias).

Observou-se que os Transtornos relacionados ao abuso de álcool e outras substâncias psicoativas esteve dentro do agrupamento das perturbações do caráter, do comportamento e da inteligência na CID-6 e na CID-7. Nessas duas versões da CID, as categorias e subcategorias se mantiveram as mesmas, respectivamente 322 "Alcoolismo" e 323 "Outras Toxicomanias", tendo a primeira três subcategorias. No que se refere às categorias na CID-6 e CID-7 mantiveram-se os mesmos códigos e nomes.

CID -7ª Revisão (1955) para CID – 8ª Revisão (1965)(7)

O capítulo V recebe nova titulação "Transtornos Mentais", tendo sido alterado da revisão anterior. Houve um breve esclarecimento de que a secção era destinada a pacientes com transtornos mentais, não sendo o capítulo indicativo para classificação de mortalidade como causa primária.

Havia, na Oitava Revisão do capítulo V: três agrupamentos, 26 categorias e 131 subcategorias. Ao comparar a Sétima com a Oitava Revisão, verificou-se que o número de agrupamentos e categorias não sofreu alterações, enquanto as subcategorias obtiveram aumento de 60 para 131.

Surgiu pela primeira vez, nos volumes da CID, o termo hipomania.

 

Tabela 3

 

Na CID-8, no agrupamento Esquizofrenia, o código da categoria passou a ser 295 e seu nome Esquizofrenia. Foram acrescentadas três subcategorias – esquizofrenia residual (295.6), tipo esquizoafetiva (295.7) e a subcategoria outras e não especificadas foi subdividida em duas: outras (295.8) e tipo não especificada (295.9).

Na CID 8, a categoria "Psicoses afetivas" era apresentada com seis subcategorias, sendo que as categorias das revisões anteriores foram retiradas e foram acrescentadas quatro novas subcategorias. Vale ressaltar que a categoria "Melancolia de involução", encontrada na 6ª e na 7ª Revisão, deixou de existir como categoria na CID 8, passando a ser uma das subcategorias.

Na CID-8 a categoria referente aos transtornos mentais, devido ao uso de substâncias, recebeu o nome de Neuroses, transtornos da personalidade e outros transtornos mentais não psicóticos. Seu código foi alterado de 322 para 303, mas manteve o nome e foram acrescentadas as subcategorias: excesso alcoólico episódico (303.0); excessos alcoólicos habituais (303.1) e dependência do álcool (303.2). O código 323 foi alterado para 304, tendo mudado o nome "Outras toxicomanias" para "Dependência de drogas", a qual foi acrescida de dez subcategorias.

CID - 8ª Revisão (1965) para a CID - 9ª Revisão (1975)8

A partir da 9ª Revisão, essa seção de classificação diferiu das demais por incluir um glossário com definição do significado dos títulos, com o intuito de diminuir os vieses de comunicação, servindo como referência comum aos profissionais da área de psiquiatria. Isso possibilitou melhor adequação na classificação dos diagnósticos, permitindo, assim, análises estatísticas mais fidedignas.

Da 8ª à 9ª, o número de agrupamentos se manteve (3) com a alteração de um título, na qual Deficiência mental passou a ser denominada Oligofrenia. A nona possuía 30 categorias e 180 subcategorias.

 

Tabela 4

 

Na CID-9 a única modificação na categoria Esquizofrenia foi referente ao nome que passou a ser denominada Psicoses Esquizofrênicas.

Em relação aos transtornos de humor, os códigos 290-299 foram mantidos na 8ª e 9ª Revisão. A partir da 8ª Revisão, deixou-se de ter duas categorias e passou-se a ter uma categoria – 296 "Psicoses Afetivas".

Na CID 9 a categoria "Psicoses afetivas" passou a ter 9 subcategorias, tendo sido 5 subcategorias acrescentadas e 2 subcategorias excluídas em relação às revisões anteriores. Também, o termo "Neuroses" foi substituído por "Transtornos neuróticos" no nome do agrupamento.

Na CID-9 mantiveram-se os mesmos códigos 303 e 304 da CID anterior, porém, com alteração no nome do código 303 de "Alcoolismo" para "Síndrome de dependência do álcool", com ausência de subcategoria, e no código 304 houve a exclusão das subcategorias anteriores, acrescentando-se as seguintes subcategorias: Ópio, alcaloide do ópio e seus derivados (304.0); Analgésicos sintéticos de efeitos parecidos aos da morfina (304.1); Barbitúricos (304.2); outros hipnóticos e sedativos ou "tranquilizantes"(304.3); Cocaína (304.4); Cannabis sativa (maconha) (304.5); outros psicoestimulantes (304.6); Alucinógenos (304.7); outras (304.8) e droga não especificada (304.9).

Ainda, nessa mesma revisão da CID, houve o acréscimo da categoria cujo código é 305 e o nome "Abuso de drogas sem dependência", o qual passou a possuir dez subcategorias.

CID - 9ª Revisão (1975) para CID - 10ª Revisão da CID (1995)9

A décima revisão passou a ser denominada Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde, diferentemente do que vinha ocorrendo desde a Sexta Revisão. Essa mudança do título enfatizou a amplitude da finalidade estatística que passou a ter ênfase, também, na morbidade. Embora o nome tenha mudado, a abreviação continuou a mesma com as siglas CID.

Houve uma grande mudança na CID-10 com a transformação dos códigos que passaram a ser alfanuméricos para possibilitar maior expansão. Acredita-se que, com os códigos alfanuméricos, permitiu-se melhor equilíbrio entre os conteúdos dos capítulos, bem como abriu espaço para mudanças e adições futuras sem a necessidade de reestruturar todo o sistema.

Ao capítulo V, que vinha nomeado "Transtornos Mentais", foi acrescentado o termo Comportamentais, ficando assim denominado "Transtornos Mentais e Comportamentais". Também se verificou que na CID-9 havia 3 agrupamentos, 30 categorias e 180 subcategorias. Já na CID-10, com substancial expansão, passou-se de 3 a 11 agrupamentos; de 30 a 78 categorias, e de 180 a 274 subcategorias, com códigos indo de F00-F99.

Para melhor visualização, serão apresentadas em forma de quadro comparativo as mudanças ocorridas quanto às categorias relacionadas à esquizofrenia, transtornos afetivos e transtornos mentais, devido ao uso substâncias.

 

Tabela 5

 

Na CID-10, o agrupamento das Psicoses, recebe o nome de "Esquizofrenia, transtornos esquizotípicos e delirantes". Quanto à categoria ficou-se com F-20 Esquizofrenia apenas, o que na CID anterior era 295 Psicoses esquizofrênicas.

Na CID-10, o agrupamento que cobre a esquizofrenia, estados esquizotípicos e transtornos delirantes (F20–F29) foi expandido pela introdução de novas categorias tais como transtorno esquizotípico e transtornos delirantes persistentes. A classificação de psicoses breves foi também consideravelmente expandida.

Na categoria esquizofrenia (F20) foram acrescentados ainda duas novas subcategorias, a esquizofrenia indiferenciada (F20.3) e a depressão pós-esquizofrênica (F20.4). Além disso, foram excluídas as subcategorias episódios esquizofrênicos agudos, esquizofrenia latente e tipo esquizoafetivo, as duas primeiras presentes desde a 6ª Revisão e a última a partir da 8ª.

Os Transtornos de humor (afetivos), assim denominado na CID 10, passaram por mudanças bruscas ao longo das revisões da CID, de forma que o modo como é apresentado hoje difere muito do apresentado nas revisões anteriores.

No que se refere à 10ª Revisão, as mudanças ocorridas foram muito evidentes. O agrupamento passou a ser denominado de modo diferente das revisões anteriores. Da 6ª à 9ª Revisão, o agrupamento era denominado "Psicoses", na 10ª Revisão passou a ser denominado "Transtornos de humor (afetivos)", codificados entre F30 e F39.

Percebe-se que a classificação dos transtornos afetivos na CID 10 passou a ser apresentada de modo a seguir o princípio de reunir os transtornos em temas comuns. Na CID 10 foram apresentadas 10 subcategorias, todas diferentes do que até então vinha sendo apresentado pelas revisões anteriores. O transtorno afetivo bipolar passou a constar na CID pela primeira vez. Termos como "depressão neurótica" e "depressão endógena" não são mais usados, mas seus equivalentes podem ser encontrados nos diferentes tipos e gravidades de depressão agora especificados. Também foi incluído o diagnóstico "distimia" (F34.1).

Em relação aos transtornos por uso de substâncias, na CID-10 houve alterações no agrupamento, categorias e subcategorias. O agrupamento recebeu o nome de Transtornos mentais e comportamentais, devido ao uso de substâncias psicoativas, e códigos F-10 a F-19. Esses códigos foram subdivididos em 10 categorias de acordo com os diversos tipos de substâncias psicoativas, tais como: álcool, opiáceos, canabinoides, sedativos e hipnóticos, cocaína, cafeína, alucinógenos, fumo, solventes voláteis e outras substâncias psicoativas. Essas categorias foram todas acrescentadas de 10 subcategorias, respectivamente definidas: 0 Intoxicação aguda; 1 Uso nocivo para a saúde; 2 Síndrome de dependência; 3 Síndrome [estado] de abstinência; 4 Síndrome de abstinência com delirium; 5 Transtorno psicótico; 6 Síndrome amnésica; 7 Transtorno psicótico residual ou de instalação tardia; 8 outros transtornos mentais ou comportamentais e 9 transtorno mental ou comportamental não especificado.

 

Considerações Finais

Da sexta à décima revisão da CID houve mudanças significativas, incorporações de novas definições e redefinições, principalmente no que se refere à área de saúde mental. Seja qual for o estudo relacionado a essa área, é imprescindível o conhecimento da CID para codificação, seleção de causas e ciência dos diferentes conceitos utilizados ao longo dos anos.

No que concerne ao capítulo V da CID, verificou-se que as alterações ocorridas acompanharam a trajetória das doenças e transtornos psiquiátricos que foram carregados de expressões que remetem ao preconceito e à exclusão, também acompanhando a própria evolução na classificação psiquiátrica internacional.

As várias mudanças ocorridas dificultam a obtenção dos dados estatísticos brasileiros sobre indicadores de saúde mental em uma série histórica. Percebeu-se a falta de indicadores de saúde mental pelo Datasus como, por exemplo, coeficiente de morbidade por depressão e uso e abuso de álcool e outras drogas.

Concluiu-se ainda, no que tange ao capítulo V, que só são viáveis estudos retrospectivos a partir da CID-9, pois só a partir dessa Revisão houve maior estabilização do sistema de códigos e menor descontinuidade das revisões. Por fim, não é somente a expansão do número de categorias que deve ser citada, mas, também, que o conteúdo do capítulo V se tornou mais lógico, ou seja, menos passível de mudanças e com categorias e subcategorias mais correlacionadas.

 

Referências

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3. Laurenti R. As manifestações de sofrimento mental mais frequentes na comunidade. SMAD, Rev. Eletrônica Saúde Mental Álcool Drog. (Ed. port.) [Internet]. 2007;[acesso 13 jan 2013]. 3(2). Disponível em: http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1806-69762007000200007&lng=pt&nrm=iso&tlng=pt        [ Links ]

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Correspondence
Mey Fan Porfírio Wai
Av. Bandeirantes, 3900
Bairro: Monte Alegre
CEP: 14<sup>040-902, Ribeirão Preto, SP, Brasil
E-mail: meyfan@hotmail.com

Received: Sept. 12th 2011
Accepted: Mar. 20th 2013