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SMAD. Revista eletrônica saúde mental álcool e drogas

versión On-line ISSN 1806-6976

SMAD, Rev. Eletrônica Saúde Mental Álcool Drog. (Ed. port.) vol.12 no.1 Ribeirão Preto mar. 2016

http://dx.doi.org/10.11606/issn.1806-6976.v12i1p22-29 

ARTIGO ORIGINAL
DOI: 10.11606/issn.1806-6976.v12i1p22-29

 

Barreiras e facilidades encontradas por mulheres usuárias de substâncias psicoativas na busca por tratamento especializado

 

Barreras y facilidades encontradas por mujeres usuarias de substancias psicoactivas en la busca por tratamiento especializado

 

 

Caroline de Souza AlbuquerqueI; Maria do Perpétuo Socorro Sousa NóbregaII

IEnfermeira, Secretaria Municipal de Saúde de Santa Filomena, Santa Filomena, Pernambuco, PE, Brasil
IIPhD, Professor Doutor, Escola de Enfermagem, Universidade de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil

 

 


RESUMO

Identificar barreiras e facilidades encontradas por mulheres na busca de tratamento em dependência química. Pesquisa quantitativa realizada em três Centros de Atenção Psicossocial do estado de São Paulo. A pesquisa foi realizada a partir de informações obtidas por amostras com 44 mulheres, sendo: solteiras (52,3%), brancas (43,2%), sem trabalho (95,4%). De acordo com a amostragem, os índices obtidos foram: o uso de substância psicoativa identificado na faixa etária entre 5 e 20 anos (77,2%), o uso de substância psicoativa na rua com amigos (34,9%), buscaram tratamento pela primeira vez devido ao álcool (45,5%) e (65,9%) ficaram motivadas ao chegar ao tratamento. Como barreiras externas predominaram os seguintes itens: (81,8%), não sabiam que existia serviço especializado, (79,5%) não sabia que existia tratamento específico para mulheres, (79,5%) que a família não via importância/tinha vergonha da mulher usuária, e (79,5%) nunca havia sido encaminhadas para um serviço especializado. Entretanto, o índice mais relevante como facilidade na busca por tratamento é o apoio da família e/ou amigos, apontado por 70,5% das mulheres.  A pesquisa reflete fragilidades na detecção precoce do consumo de substâncias psicoativas em mulheres e na divulgação e encaminhamento para os serviços de tratamento especializados.

Descritores: Mulheres; Drogas Ilícitas; Terapêutica.


RESUMEN

Identificar barreras y facilidades encontradas por mujeres en la busca de tratamiento en dependencia química. Investigación cuantitativa realizada en tres Centros de Atención Psicossocial del estado de São Paulo. La Investigación fue realizada desde informaciones logradas por muestras con 44 mujeres, siendo: solteras (52,3%), blancas (43,2%), sin trabajo (95,4%). De acuerdo con el muestreo, los índices logrados fueron: el uso de substancia psicoactiva identificada en la banda etaria entre 5 y 20 años (77,2%), el uso de substancia psicoactiva en la calle con amigos (34,9%), buscaron tratamiento por la primera vez debido al alcohol (45,5%) y (65,9%) quedaron motivadas al llegar al tratamiento. Como barreras externas predominaron los siguientes ítems: (81,8%), no sabían que existía servicio especializado, (79,5%) no sabía que existía tratamiento específico para mujeres, (79,5%) que la familia no consideraba importante o tenia vergüenza de la mujer usuaria, y (79,5%) nunca había sido encaminadas para un servicio especializado. Mientras, el índice más relevante como facilidad en la busca por tratamiento es el apoyo de la familia y/o amigos, apuntado por 70,5% de las mujeres. La investigación refleja fragilidades en la detección precoz del consumo de substancias psicoactivas en mujeres y en la divulgación y encaminamiento para los servicios de tratamiento especializados.

Descriptores: Mujer; Drogas Ilícitas; Terapéutica.


 

 

Introdução

Durante o intervalo de quatro anos a dependência de álcool em mulheres com idade entre 12 e 65 anos, cresceu de 5,7 % para 6,9 %, o uso durante a vida, de maconha, subiu de 3,4% para 5,1%; de cocaína aumentou de 0,9% para 1,2%, os estimulantes subiram de 2,2% para 4,5%, e os benzodiazepínicos passaram de 4,3% para 6,9%(1-2). Apesar do aumento da prevalência no consumo de drogas lícitas e ilícitas, a porcentagem de mulheres que recebeu algum tipo de tratamento especializado caiu de 2,5%, em 2001 para 1,6%, em 2005. Estudo recente com 370 mil usuários de crack nas capitais e regiões metropolitanas do Brasil, mostrou que somente 21,3% são mulheres(3).

O Plano Nacional de Políticas para as Mulheres entre 2013-2015(4) incorpora o compromisso de inserção de mulheres usuárias de substâncias psicoativas (SP) na rede de serviços de saúde, a cargo de medidas tomadas pelo Ministério da Saúde. Apesar do avanço com a definição da Política Nacional de Drogas - PND de 2010(5), o país não avançou na devida atenção às necessidades de mulheres usuárias de drogas em suas especificidades, não estabelecendo diretrizes quanto à captação e retenção dessa clientela nos espaços de tratamento.

Segundo o consenso mundial sobre tratamento de mulheres usuárias de drogas, desenvolvido pelo Escritório das Nações Unidas contra as Drogas e Crime - OFNUDC, as mulheres têm, em geral, problemas mais graves quando iniciam o tratamento e encontram mais obstáculos que os homens para acessá-lo, e o receio em procurar ajuda chega a 2% comparado aos homens que é de 8%(6).

Muitas barreiras estão envolvidas, como estigma, preconceito da sociedade, das próprias mulheres, dos profissionais de saúde, da falta de treinamento destes, resistência em abordar o tema, falta de planejamento e implantação de serviços específicos e atrativos que considerem as necessidades fisiológicas, psicológicas e sociais(6).

As barreiras encontradas pelas mulheres para o tratamento podem ser internas, tais como: a negação da severidade do problema com a bebida, a consideração que o tratamento é ineficaz, o medo de estigmatização por parte dos familiares e profissionais, a preocupação sobre a perda da guarda dos filhos por estarem em tratamento, culpa, vergonha, medo de transtornar a família e sofrer represálias dos companheiros, também usuários de drogas.

As barreiras externas estão relacionadas aos assuntos interpessoais, como: a oposição de familiares e amigos, a desaprovação social, o custo social do rompimento com familiares, o desencorajamento de parceiros/maridos/família, o treinamento inadequado de grande parte dos profissionais de saúde na detecção de problemas com álcool e drogas, a falha no encaminhamento para um serviço especializado, a falta de serviços de tratamento apenas para mulheres que necessitam de cuidados com filhos e falta de recursos econômicos(7-8).

Posto isso, tem-se por objetivo identificar as barreiras e facilidades encontradas por mulheres usuárias de Substâncias Psicoativas (SP), na busca de tratamento especializado para dependência química num Centro de Atenção Psicossocial. Postula-se que, ao identificar barreiras e facilidades no acesso ao tratamento, medidas de enfrentamento possam ser (re) pensadas. É oportuno sinalizar que a literatura sobre o objeto de estudo investigado ainda é incipiente no país.

 

Método

Estudo quantitativo, do qual participaram 44 mulheres usuárias de SP, inseridas em tratamento no Centro de Atenção Psicossocial em Álcool e Drogas – CAPSad, configurado como um serviço aberto de base territorial, das cidades de São Bernardo do Campo, São Caetano do Sul e Mauá, estado de São Paulo, Brasil.

O acesso às participantes dessa pesquisa aconteceu durante as atividades realizadas no serviço de tratamento ("grupo de mulheres", "grupo de artesanato" e "grupo de psicoterapia"). A coleta de dados ocorreu por meio de um questionário autoaplicável com 19 questões fechadas, de múltipla escolha, adaptado do relatório da OFNUDC(6), no período compreendido entre abril e agosto de 2013. Todas as opções do questionário foram apresentadas aos participantes da pesquisa e mais de uma alternativa poderia ser marcada.

Utilizou-se o programa EPI-Info versão 3.5.2 para armazenamento e análise dos dados, e estatística descritiva para as variáveis contínuas por meio da média e mediana. A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética conforme número de protocolo 281.057/2013. Todas as participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE).

 

Resultados

Do total de 44 mulheres, a idade variou de 15 a 65 anos, com média de 22,5 anos, solteiras (52,3%), católicas (40,9%) e evangélica/protestante (34,1%), cor branca (43,2%), negras e pardas (54,6%), com filhos (68,3%), uma média de 2,29 filhos, ensino fundamental incompleto (54,5%), residentes com companheiros e/ou filhos (45,5%), pais (34,5%) e residem em Residências Terapêuticas (RT) (9,1%). Frequentam (CAPS ad) de São Bernardo do Campo (47,7%), Mauá (34,1%) e São Caetano do Sul (18,2%). A maioria não trabalha fora de casa ou tem trabalho remunerado (54,5%), nunca trabalhou (4,5%) e não possuem renda (40,9%).

Para 77,2% das mulheres o uso de SP aconteceu entre os 05 e 20 anos, e para 22,8% o uso aconteceu na vida adulta (21 a 37 anos). O álcool representa a SP lícita que motivou a busca pelo serviço para 66% das mulheres, seguido de cocaína (34,11%), crack (27,2%), e maconha (18,1%). Para 34,9% o primeiro contato com o álcool foi na rua, com amigos, 25,5% na "balada" /bar/festa familiar. Tentavam tratamento pela primeira vez, na ocasião do estudo 35,5% das mulheres e 64,5% tentaram mais de uma vez.

As mulheres encontraram motivação para tratamento nos filhos (38,7%), nos pais (27,2%), nos companheiros (20,4%), nos amigos (27,3%). No entanto, boa parte das mulheres chegaram sozinhas ao tratamento (29,5%). Os sentimentos em relação à busca por tratamento são: desejam melhorar as condições clínicas em que estão (66%), estão ansiosas com o processo (65,7%), não relatam preocupação (72,2%), estão pouco otimistas (66,0%).

Sobre o tratamento, 61,3% das mulheres consideram que o mesmo tem ajudado, estão satisfeitas com o tratamento (50,0%) e 6,8% não estão satisfeitas. Houve mudanças após o tratamento para 63,7% das mulheres: em relação à família 11,4%, a autoestima 9%, a saúde/qualidade de vida/comportamento 13,8% e para 29,5% pouca coisa mudou. Para 11,4% absolutamente nada mudou, 4,6% das mulheres sentem-se bem tratadas pelos profissionais e 2,3% sentem-se "cobaias".

Em relação à opinião sobre o tratamento, as mulheres relataram que gostariam de ter mais consultas com o psicólogo 50%, mais consultas com médico 45,5%, com o enfermeiro 18,2% e com o assistente social 40,9%. Gostariam de ter creche para os filhos 11,4%, ter transporte 2,3% e mais abordagem motivacional para a família 2,3%.

Os problemas ocasionados pelo uso/abuso criaram necessidades específicas que nem sempre são reconhecidas e satisfeitas pelos serviços especializados, podendo criar barreiras internas e externas para o acesso ao tratamento. Apesar das barreiras encontradas, as mulheres reconhecem algumas facilidades para acessar o tratamento (Tabela 1).

 

Discussão

Considera-se que, para uma compreensão da complexidade das experiências de mulheres usuárias de SP em busca de tratamento especializado, é necessário interpelar vários aspectos do viver social. Revelou-se nesse estudo, uma amostra de mulheres adultas, solteiras, com baixa escolaridade, com precariedade de capital econômico, cultural e social (9).

O início precoce do uso de substâncias psicoativas pelas mulheres deste estudo, é uma realidade evidenciada na literatura, sob influências diversas, como amigos, pressão de grupos sociais, violência doméstica, conflitos pessoais, fuga de problemas, prazer e busca de alternativa de vida, como também o aprendizado social, a interação familiar, traços da personalidade e fatores genéticos(10).

O álcool representa a substância mais utilizada e principal motivo de procura pelo CAPSad, corroborando o Relatório Brasileiro sobre drogas de 2006, que aponta que o uso  de álcool, durante a vida, passou de 60,6% para 68,3% e a dependência evoluiu de 5,7% para 6,9%, num intervalo de quatro anos(11). Na maioria das culturas as mulheres apresentam menor tendência a ingerir álcool ou a beber em grande quantidade que os homens. No entanto, esse padrão de consumo tem mudado consideravelmente entre as mulheres, dado evidenciado pelo II Levantamento Nacional sobre os Padrões de Consumo de Álcool e outras Drogas, em que o padrão de beber em binge (cinco ou mais doses por ocasião), evoluiu de 36% para 49%, representando aumento de 36% na população feminina(12).

Do ponto de vista biológico, as mulheres são metabolicamente menos tolerantes ao álcool que os homens, devido a menor quantidade de água corporal e menor quantidade de enzimas metabolizadoras. Assim, são mais vulneráveis ao desenvolvimento de complicações clínicas, como doenças hepáticas e neuropatias, e elevado risco de mortalidade. Apesar do aumento no consumo de substâncias e a aproximação com padrão de consumo masculino, as mulheres ainda bebem menos, mas adoecem mais cedo e de forma mais grave, fenômeno conhecido como o efeito telescópico(13).

O uso de cocaína/crack também justificou a procura por tratamento, evidenciando uma clientela que vem exigindo muita atenção, e que comparada aos homens, vem fazendo consumo de mais pedras de crack/dia, numa proporção de 21:13(3). A maioria das mulheres investigadas não procurou o tratamento pela primeira vez, ou seja, elas são recorrentes, situação que revela ambivalência quanto à cessação do consumo, recaídas e/ou abandono e baixa resolutividade ao longo do processo.

De modo geral, usuários problemáticos de SP encontram dificuldades em reconhecer que precisa de ajuda, por não considerar o consumo grave o suficiente para merecer tratamento, acreditam que sozinhos superam seu comportamento aditivo, e justificam suas atitudes criticando a pouca disposição dos profissionais de saúde para dar conta de suas necessidades, fenômeno comum entre as mulheres mais jovens(14).

As mulheres revelaram a influência de companheiros no compartilhar e oferecer SP, além falta de incentivo e/ou acompanhamento desses parceiros no tratamento, dado também encontrado em outros estudos(15-17). Ao destacarem que não sofrem pressão familiar para acessar tratamento, desconsideram a possibilidade de negligência por parte dos familiares, no estímulo, apoio e suporte, como também protagonista no processo de tratamento.

Atendendo aos objetivos do estudo, detectou-se que as barreiras internas estão presentes para algumas mulheres. O medo de não ser bem recebida e medo dos profissionais de saúde, coloca em evidência uma preocupação que pode vir subjacente à vergonha e o receio de sofrer críticas. O estigma posto sobre as mulheres usuárias de substâncias psicoativas existe, e apesar do enfrentamento e das mudanças no papel social da mulher, atitudes pouco acolhedoras e contextos morais nos espaços de tratamento são comuns. Considera-se fundamental que os profissionais de saúde, ao abordarem essa clientela devam abster-se de atitudes preconceituosas.

O medo de perder a guarda dos filhos para a família ou para adoção ainda representa um aspecto negativo na busca de tratamento por mulheres. Ponto que reflete a negligência na falta de políticas públicas específicas que trate de seus direitos. Divergindo do censo comum, as mulheres valorizam a maternidade e se preocupam com os riscos que a droga possa trazer aos seus filhos. A experiência tem mostrado que, a motivação para tratar-se está na retomada do cuidado com os mesmos e, quando são violentamente afastadas dos filhos tendem a aumentar o padrão de consumo(16).

Quanto às barreiras externas, a falta de dinheiro para o transporte e a difícil localização do serviço, condiz com o perfil socioeconômico evidenciado nessa amostra. De fato, as mulheres estão no tratamento, demonstrando que de alguma forma lidam com esses obstáculos, mas, as dificuldades geográficas e financeiras podem comprometer o acesso a serviços de saúde e o direito enquanto cidadã de acessá-los com rapidez.

O não (re) conhecimento sobre o problema com álcool e drogas por parte do indivíduo é uma condição inerente à própria dependência química. Apesar de não reconhecerem os problemas, as mulheres sabem do que precisam e os serviços devem ser estruturados de modo a atraí-las. Necessitam de encorajamento para buscar ajuda apropriada às suas necessidades. Nesse sentido, a falta de conhecimento sobre serviços especializados e programas específicos para mulheres deve-se a pouca divulgação desses recursos.

A estigmatização, o empobrecimento da rede de suporte social, as atitudes negativas dos profissionais de saúde, a rede de serviço ineficaz, a falta de transporte direto para os serviços, cuidado com os filhos, horários inflexíveis, são barreiras importantes já reconhecidas. Dentre as medidas para reduzi-las, destacam-se a disponibilidade integral dos serviços especializados, o acolhimento dos profissionais, a capacitação técnica das equipes, programas para lidar com problemas sociais complexos, contextos de violência das mais variadas, e comorbidades físicas e psicológicas(18-19).

Os cenários de tratamento desta investigação não são específicos para mulheres, para encontrá-los foi necessário investimento das autoras, detectando pouca presença dessa clientela, aspecto que por si, reflete o déficit na procura, apesar do aumento na prevalência. Nesse sentido, é inquietante a constatação de que as mulheres estão transitando pelos serviços de saúde invisíveis aos olhos dos profissionais, mantendo o uso de substâncias às escondidas, ocultas no espaço privado dos lares, e negligenciadas, juntamente com seus filhos, nas vias públicas, nas famosas cracolândias.

A baixa prevalência de mulheres em serviços especializados está ligada a percepção que tem de seus problemas de saúde, quando buscam ajuda, tendem inicialmente a procurar os serviços clínicos e psiquiátricos não específicos para tratar a dependência de drogas(6). A oportunidade para investigar uso de substância psicoativa existe nesses contextos, requer compromisso, sensibilidade e qualificação dos profissionais para intervir e encaminhá-las. Essas condutas contribuirão para tirar as mulheres do anonimato e da exclusão nos sistemas de saúde e social vigentes, como também desconstruir estigma e preconceito.

Apesar da melhora no acesso aos serviços de saúde ter aumentado significativamente no Brasil, nos últimos dez anos(20), as mulheres não encontram tantas facilidades para acessá-los, e desacreditam na eficácia do tratamento. Assim, as críticas exigem o que realmente faz diferença para acessar o serviço especializado: as condições econômicas, proximidade, apoio da família, valorização e respeito enquanto sujeito de direitos. Nesse sentido, espera-se que as informações apresentadas nesse estudo ofereçam uma janela para uma realidade complexa e impactante sobre a vida de mulheres usuárias de álcool e outras drogas.

As barreiras para os usuários de SP chegarem a um tratamento são diversas, e nos países em desenvolvimento a não universalização dos atendimentos pelo sistema público de saúde é a principal delas(6). Nesse sentido as diretrizes da Política Nacional de Drogas - PND(5) apontam na direção da prevenção, tratamento, recuperação e reinserção social, que são as características específicas dos diferentes grupos. Dentre estes as mulheres e gestantes precisam ser reconhecidas, pois carecem de uma atenção diferenciada e um tratamento especial nos serviços.

A temática "barreiras e facilidades para acessar tratamento por mulheres dependentes químicas" merece ser mais explorada em nosso país. Por fim, sugere-se o avanço de pesquisas com número maior de mulheres, para ampliar a análise desse fenômeno, uma vez que a amostra pequena é um fator limitante.

 

Conclusão

Este estudo objetivou identificar as barreiras internas, externas e facilidades para mulheres acessarem tratamento para dependência de substâncias psicoativas. Os resultados oferecem informações importantes sobre as circunstâncias do processo de reconhecimento da necessidade de ajuda profissional. Reflete ainda, fragilidades na divulgação de serviços de saúde mental e específicos em álcool e drogas, detecção precoce de problemas, encaminhamento pelos serviços não especializados, corroborando os achados da literatura.

Ao apontar as barreiras de acesso ao tratamento por mulheres é necessário também pensar nas estratégias para mantê-las inseridas. Conhecer as necessidades e especificidades das mulheres conduz ao planejamento de ações individualizadas que potencializem sua permanência.

Dentre as ações, as mulheres necessitam de abordagens para trabalhar autoestima, questões relativas à violência, comum nessa população, papel feminino, maternidade, cuidado com os filhos, estigmas, sentimento de culpa e vergonha, perdas psicossociais, comorbidades que, oferecidas em um único cenário de tratamento ou com articulação entre os serviços pode produzir melhores resultados.

Considerando o aumento na prevalência de mulheres usuárias de substâncias psicoativas na realidade brasileira, as políticas preventivas e assistenciais de atenção a essa população precisam avançar muito. Deve ter como premissa a pluralidade e investimento capaz de sustentar a heterogeneidade que as mulheres revelam. Nessa perspectiva, acredita-se na capacidade que os profissionais enfermeiros têm para ofertar assistência qualificada a essa população, mas precisam conhecer e interessar-se por suas demandas.

 

Referências

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Recebido: 10.09.2014
Aceito: 22.10.2015

 

 

Correspondência:
Maria do Perpétuo Socorro Sousa Nóbrega
Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo
Departamento de Enfermagem Materno-Infantil e Psiquiátrica
Av. Dr. Enéas de Carvalho Aguiar, 419
CEP: 05.403-000, São Paulo, SP
E-mail: perpetua.nobrega@usp.br

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