SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
vol.12 issue3The Psychiatric Nursing/Mental Health Education: advances, limitations and challenges author indexsubject indexarticles search
Home Pagealphabetic serial listing  

SMAD. Revista eletrônica saúde mental álcool e drogas

On-line version ISSN 1806-6976

SMAD, Rev. Eletrônica Saúde Mental Álcool Drog. (Ed. port.) vol.12 no.3 Ribeirão Preto Sept. 2016

http://dx.doi.org/10.11606/issn.1806-6976.v12i3p137-138 

EDITORIAL
DOI:10.11606/issn.1806-6976.v12i3p137-138

 

Saúde mental e trabalho

 

 

Ana Maria Pimenta Carvalho

 

 

Co-editora, SMAD - Revista Eletrônica Saúde Mental Álcool e Drogas. Professor Associado, Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo, Centro Colaborador da OPAS/OMS para o Desenvolvimento da Pesquisa em Enfermagem, Ribeirão Preto, SP, Brasil, e-mail: amalmeid@eerp.usp.br

 

 

Relatos mostram que Freud, quando indagado por um ouvinte sobre o que seria ser normal ou ter saúde mental, respondeu que uma pessoa saudável mentalmente é aquela que é capaz de amar e trabalhar. O amor era visto pelo autor como produto final de um longo processo de desenvolvimento(1). Uma resposta curta, que comporta duas esferas delicadas e complexas de nossas humanas vidas: o afeto e o trabalho. Dessa maneira, o autor mostra que corpo e psiquismo são integrados e inseparáveis na leitura freudiana, pois a subjetividade que vive (sofre e se regozija) tem um corpo e é nele que dor e prazer se enraízam(2). Ambas ações são os eixos do nosso viver com suas infinitas formas de expressão em contextos também diversos desde aqueles mais continentes e fomentadores da expressividade humana até aqueles restritivos. De forma similar, grupo de expertos da Organização Mundial da Saúde (OMS) refere-se à saúde mental como o estado de bem-estar no qual o indivíduo realiza suas capacidades, pode fazer face ao estresse normal da vida, trabalhar de forma produtiva e frutífera e contribuir para a comunidade na qual se insere(3).

A definição freudiana enfatiza as relações afetivas, mas sem esquecer que existe o sujeito e o seu corpo, apesar de uma parcela considerável da comunidade analítica perceber sujeito e corpo como uma "dualidade insuperável" e aceite ficar com a "parte nobre" da subjetividade, ou seja, o psiquismo, deixando para a psiquiatria o cuidar do corpo. Contudo, na teoria, tal separação não se sustenta, pois o que exista é um "corpo sujeito" com suas manifestações de afetividade para mais ou para menos. Essa separação, da mesma maneira que a desvalorização do afeto, retira grande parte das manifestações de mal-estar atual dos seres humanos fora da escuta da psicanálise. Corpo e afeto tem um lugar imprescindível na interpretação da subjetividade humana e é também base para compreender a psicanálise como uma escuta do psiquismo e uma modalidade de ação(3). Perfeitamente em sintonia com a visão de Freud a respeito das perturbações do espírito, para quem elas seriam impossibilidades de ação(4), provocadas por "ofensas e feridas" da autoestima do indivíduo e cujos desdobramentos poderiam ser mudados através da psicanálise(5).

 Enquanto a definição freudiana dá ênfase às relações afetivas este excerto da OMS atribui ao trabalho um papel de relevância, como seu principal eixo, visto que este confere a nós um sentido de que somos úteis, necessários e conectados ao mundo. Em um mundo em que as relações homem e trabalho encontram-se convulsionadas, entende-se o porquê de crescentes queixas de sofrimento e adoecimento mental(6-7).

 Ao buscar veicular conhecimento sobre saúde mental a SMAD esforça-se por comportar relatos de estudos que abordam o continuum saúde e adoecimento mental. Nesse sentido, inicia este novo fascículo trazendo artigo sobre o ensino de enfermagem psiquiátrica e saúde mental e suas limitações face à complexidade do fenômeno saúde-doença mental.

 Na sequência, estudo chama atenção para a saúde mental do estudante de enfermagem, compreendendo que este futuro profissional precisa estar bem para cuidar daqueles que estão sob seus cuidados.

 Oficinas terapêuticas como veículos da expressão da subjetividade de indivíduos com transtornos mentais são o foco do artigo seguinte. Por meio de atividades artísticas e artesanais busca-se resgatar e valorizar os aspectos saudáveis das vidas de seus participantes.

 Dois outros artigos tratam do problema do uso abusivo de drogas, seja de sua compreensão, a partir de reflexões ancoradas no referencial psicanalítico, seja ao descrever o trabalho de comunidades terapêuticas para promover o fortalecimento das relações familiares e inserção no trabalho. Quanto a este último, os autores encontraram como um dos resultados de sua pesquisa certa fragilidade nas ações relacionadas à inserção dos usuários no trabalho. O segundo artigo, centrado nos aspectos psicossociais do trabalho em saúde mental, chama atenção para o cuidado com a saúde do trabalhador da área.

Esse é um desafio que diz respeito não apenas aos profissionais de saúde, mas a setores da sociedade que tratam da economia e atividades laborais. Em momentos onde as configurações do trabalho podem interferir de forma negativa nas relações sociais e no próprio exercício das atividades laborais, a saúde mental das pessoas pode ser afetada e o resultado do embate tanto pode ser o fortalecimento como a vulnerabilidade, a depender da qualidade do apoio que essas pessoas receberem.

Mais uma vez convidamos o leitor a percorrer este fascículo da SMAD certos de que sua leitura trará acréscimos ao pesquisador e ao profissional de assistência, assim como fomentará reflexões que poderão gerar outros estudos.

Creative Commons License