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SMAD. Revista eletrônica saúde mental álcool e drogas

On-line version ISSN 1806-6976

SMAD, Rev. Eletrônica Saúde Mental Álcool Drog. (Ed. port.) vol.12 no.4 Ribeirão Preto Dec. 2016

http://dx.doi.org/10.11606/issn.1806-6976.v12i4p249-259 

DOI: 10.11606/issn.1806-6976.v12i4p249-259
ARTIGO DE REVISÃO

 

Consulta de Enfermagem em Saúde Mental: revisão Integrativa

 

Consulta de Enfermeria en Salud Mental: Revisión Integradora

 

 

Eduarda Berckenbrock BolsoniI; Isabella Paola Meisterlin HeusyI; Zenandia Feliciano da SilvaI; Jeferson RodriguesII; Girlane Mayara PeresIII; Ramona de MoraisIV

IEnfermeira, Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, SC, Brasil
IIPhD, Professor Adjunto, Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, SC, Brasil
IIIDoutoranda, Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, Santa Catarina, Brasil
IVMSc, Enfermeira, Secretaria Municipal de Saúde de Florianópolis, Florianópolis, SC, Brasil

 

 


RESUMO

Trata-se de uma revisão integrativa da literatura que objetivou revisar as produções científicas sobre consulta de enfermagem em saúde mental nos serviços de saúde no período de 2001 a 2013 nas bases de dados Scientific Eletronic Library Online (SciELO) e Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde (LILACS). Identificou-se que 60% dos artigos pesquisados indicaram que os enfermeiros possuem limitações para realizar o diagnóstico de enfermagem em saúde mental. Concluiu-se que a consulta de enfermagem e sua relação no campo da saúde mental ainda é incipiente. Sugere-se que a consulta de enfermagem seja sistematizada e abranja temas como a relação interpessoal, histórico de enfermagem, exame físico e mental, diagnóstico e planejamento em enfermagem.

Descritores: Cuidados de Enfermagem; Saúde Mental; Serviços de Saúde.


RESUMEN

Se trata de una revisión integradora de la literatura destinada a revisar la producción científica en la consulta de enfermería en salud mental en los servicios de salud en el período 2001-2013 en las bases de datos Scientific Electronic Library Online ( SciELO ) y América Latina y el Ciencias de la Salud del Caribe ( LILACS ). Se identificó que el 60% de los encuestados indicó que los artículos enfermeras tienen limitaciones para hacer el diagnóstico de enfermería de salud mental. Se concluyó que la consulta de enfermería y su relación en el campo de la salud mental es todavía en su infancia. Se sugiere que la consulta de enfermería es sistemática y cubre temas tales como las relaciones interpersonales, la historia de enfermería, el examen físico y mental, el diagnóstico y la planificación en la enfermería.

Descriptores: Atención de Enfermería; Salud Mental; Servicios de Salud.


 

 

Introdução

A Organização Mundial de Saúde (OMS) define a saúde mental como um estado de bem-estar no qual o indivíduo percebe suas atitudes, podendo enfrentar as dificuldades da vida e trabalhar de forma produtiva sendo capaz de contribuir com a sua comunidade(1). Nessa perspectiva, pode-se afirmar que a saúde mental está inserida na saúde geral das pessoas e interfere diretamente em sua qualidade de vida.

A saúde mental como campo de conhecimento e subjetividade inclui um espectro que implica o sofrimento humano e os transtornos mentais. De acordo com o Ministério da Saúde, 3% da população brasileira possuem transtornos mentais severos e persistentes; mais de 6% da população apresenta transtornos psiquiátricos graves decorrentes do uso de álcool e outras drogas e 12% da população precisa de alguma assistência em saúde mental contínua ou eventual(2).

A partir de todo arranjo que envolve o campo da saúde mental, além do campo teórico e olhar para a subjetividade humana, necessários aos dados estatísticos, a saúde mental é também um direito. Depois de 12 anos de luta social, em 2001, foi sancionada a Lei 10.216 que ampara a Reforma Psiquiátrica brasileira e proporciona mudanças no modelo de atenção em saúde mental. No lugar do isolamento e exclusão das pessoas com transtorno mental há o indicativo de inclusão e possível convívio com a família e a comunidade. Pressupõe-se a garantia da população ao acesso aos serviços de saúde mental de base territorial e o respeito à liberdade e à autonomia(2).

Embora se reconheça que várias experiências contribuem para a formulação de políticas públicas, a desinstitucionalização tem sido a base fundamental para guiar um projeto ético, técnico na ampliação do acesso aos cuidados em saúde mental e na melhoria da qualidade de vida das pessoas com transtornos mentais longamente internadas. A partir da Reforma Psiquiátrica e, atualmente, com a Portaria 3088 de 2011 o cuidado feito exclusivamente em hospitais psiquiátricos passa a ser realizado na rede de atenção. Essa última possui diversos pontos, sendo a principal porta de entrada a Atenção Básica. Inicia-se assim, a construção da transição de um modelo de assistência centrado no hospital psiquiátrico para um modelo de atenção comunitário baseado na territorialização da atenção e do cuidado a pessoa com transtorno mental, objetivando sua reinserção na família e comunidade(3).

Sendo a consulta de enfermagem uma das formas desse acompanhamento do cuidado, este estudo visa colaborar com a ampliação do conhecimento acerca da realização da consulta de enfermagem em saúde mental, e como atividade parte do Projeto Terapêutico Singular, entre outras.

A consulta de enfermagem em saúde é uma potente ferramenta para o enfermeiro cuidar da pessoa e ter mais subsídios históricos e relacionais com a pessoa em sofrimento. A consulta de enfermagem em saúde mental é uma das formas de assistência do cuidado que traz reconhecimento ao profissional, compartilhamento de saberes e dá autonomia possível à pessoa e aos familiares(4).

No entanto, por um lado, durante o processo de ensino aprendizagem, no curso de graduação em enfermagem da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), os autores do artigo ao realizarem seus estágios constaram a ausência da consulta de enfermagem em saúde mental nos serviços. Na busca por uma melhor compreensão deste fato alguns enfermeiros relataram dificuldades nas condições de trabalho, demanda elevada para desenvolver seu processo de trabalho e por limitações de formação, desinteresse e distanciamento com referenciais teórico-metodológicos que integrassem consulta de enfermagem e saúde mental.

Por outro lado, sabe-se que a atuação do enfermeiro no campo de saúde mental cresceu consideravelmente no Brasil, pois além de desenvolver atividades em espaços tradicionais de atenção como o hospital psiquiátrico, ainda pode atuar como profissional em Centros de Saúde, Ambulatórios e novos dispositivos de atenção psicossocial e isto indica que a consulta de saúde mental é uma prerrogativa a ser executada no processo de trabalho do enfermeiro nos diversos cenários de cuidado(5). Justificamos a realização de estudos sobre a consulta de enfermagem em saúde mental nos serviços de saúde porque toda demanda em saúde é também de saúde mental, destarte, o enfermeiro deve ser sensibilizado e preparado para desenvolver a consulta de enfermagem em saúde mental em quaisquer situações do processo de saúde, doença e cuidado.

A consulta de enfermagem à pessoa com uma demanda de saúde, ou transtorno mental, ou sofrimento psíquico abrange os fatores determinantes e condicionantes para a qualidade de vida, como a alimentação, moradia, saneamento básico, meio ambiente, trabalho, renda, educação, transporte, lazer e o acesso aos bens e serviços essenciais. Com a proposta de aprofundar a compreensão da consulta de enfermagem em saúde mental nos serviços de saúde, tem-se como questão norteadora: de que modo é abordada a consulta de enfermagem em saúde mental nas produções científicas no Brasil?

O objetivo do presente artigo é revisar as produções científicas que descrevem a consulta de enfermagem em saúde mental no Brasil.

 

Método

Trata-se de uma revisão integrativa da literatura relativa à consulta de enfermagem em saúde mental, a partir do acesso às produções científicas sobre o tema. A revisão integrativa é um método de pesquisa de literatura pelo qual se busca deduzir generalizações sobre a delimitação de tema e a partir dos principais resultados dos estudos. A revisão integrativa apoia à pesquisa para discutir hipóteses, sugestões para novas questões teóricas e identificação de uma pesquisa necessária(6).

A escolha e combinação das palavras-chaves tiveram a contribuição de uma bibliotecária que acompanhou o estudo: cuidado, assistência, consulta, enfermagem, saúde mental e psiquiatria. Os estudos científicos foram buscados nas bases Scientific Eletronic Library Online (SciELO) e Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde (LILACS). As combinações com as palavras-chaves foram: LILACS: ("Consulta de enfermagem") AND ("saude mental") = 14; ("assistencia de enfermagem" OR "consulta") AND ("enfermagem") AND ("saude mental") = 190; ("cuidados de enfermagem" or "assistencia de enfermagem" OR "consulta") AND ("enfermagem") AND ("saude mental") = 213; ("cuidados" or "assistencia" OR "consulta") AND ("enfermagem") AND ("saude mental") = 637; SciELO ("cuidados" or "assistencia" OR "consulta") AND ("enfermagem") AND ("saude mental") = 40. Estas combinações foram construídas e testadas no decorrer dos meses de setembro a outubro de 2013.

Os critérios de inclusão foram: artigos completos científicos indexados em periódicos nacionais publicados em português e espanhol, no período de 2001 a 2013, que contemplassem a consulta de enfermagem em saúde mental em serviços de saúde. Esse recorte temporal se justifica pelas publicações serem mais profícuas a partir do ano da sanção da lei 10.216(7). Pesquisas que contribuíssem com a tomada de decisão para o aprofundamento do objeto de estudo. O referencial adotado permitiu agregar estudos de diferentes naturezas teórico-metodológicas como revisão de literatura, estudos de reflexão e relatos de experiência. Os critérios de exclusão associaram estudos que não contemplassem o escopo deste estudo.

O método que guiou a revisão integrativa seguiu as etapas descritas na Figura 1(6):

A coleta de dados foi realizada com auxílio de uma tabela preliminarmente elaborada, alusiva aos seguintes tópicos: título do artigo, nome dos autores, titulação dos autores, ano de publicação, periódico, objetivo da pesquisa, metodologia, principais resultados, discussões relevantes, principais achados nas conclusões e recomendações. A coleta de dados se deu de setembro a outubro de 2013. Utilizou-se a análise temática(8) para examinar os dados provenientes das produções científicas. Os artigos que compuseram este estudo estão identificados pela abreviatura (A) de 1 a 10.

 

Resultados

No primeiro levantamento encontrou-se 677 artigos, destes, 637 eram do LILACS e 40 do SciELO. Na busca de títulos alguns estudos foram excluídos e com a aplicação dos critérios de inclusão/exclusão e leitura dos resumos, foram selecionados 25 artigos, 19 do LILACS e 6 do SciELO. Depois de criteriosa leitura obteve-se 10 artigos (Figura 2 de acordo com o escopo deste estudo.

Quanto aos títulos, seis artigos citam saúde mental, dois deles consultas de enfermagem e apenas um consulta de enfermagem em saúde mental. Foram 38 autores que escreveram tais artigos, dos quais 33 são enfermeiros, quatro são acadêmicos de enfermagem e um acadêmico de ciências da computação, equivalente a quase quatro autores por artigo. As produções, conforme os anos de publicação, foram mais assíduas em 2005 a 2012. Dentre os periódicos, não houve predominância, cada artigo foi publicado em periódicos diferentes. Dos 10 artigos, seis foram publicados em revistas de enfermagem. Todos os estudos apresentaram objetivos gerais, os quais refletem clareza e coerência em sua descrição, seguindo as introduções e problemas dos estudos. Segundo os objetivos, sete citam ações de enfermagem, dois deles consultas de enfermagem, um histórico de enfermagem e um sistematização da assistência de enfermagem.

Dos métodos descritos, dois estudos utilizaram metodologia quali-quantitativa, dois relatos de experiência, uma abordagem qualitativa, uma revisão bibliográfica, um caso clínico, um estudo exploratório descritivo, uma análise de discurso, e uma revisão integrativa.

Dos sete artigos que realizaram a pesquisa em cenários de estudo, obteve-se dois em hospitais psiquiátricos, dois na atenção básica, dois em ambulatórios e um no serviço de saúde mental. Mostra-se dessa maneira que a consulta de enfermagem em saúde mental na atenção básica ocorre na mesma proporção que nos demais níveis de complexidade. Pode-se constatar também que ainda é incipiente o número de produções científicas sobre a consulta de enfermagem em saúde mental na atenção básica.

Quanto às teorias utilizadas nos artigos como referencial teórico metodológico, um estudo indica teorias das relações interpessoais, um a teoria das necessidades humanas básicas e terminologias de referência CIPE (Classificação Internacional para a Prática de Enfermagem), NIC (Classificação de Intervenções de Enfermagem) e NOC (Classificação de Resultados de Enfermagem) e um artigo apresentou como suporte teórico o materialismo histórico e dialético. Os demais não esclarecem ou não utilizam teorias para sustentar as análises dos dados.

 

Discussão

A prática da consulta de enfermagem em saúde mental nos serviços de saúde

Segundo A2, A3 e A6 é recomendada a Sistematização da Assistência de Enfermagem (SAE) para prestação de cuidado de enfermagem, sendo importante para o processo de tomada de decisões de acordo com a necessidade do paciente(10-11,14).

No Brasil, a enfermagem vem utilizando vocábulos mais conhecidos como: diagnósticos NANDA (North American Nursing Diagnosis Association), a Classificação das Intervenções de Enfermagem (NIC), a Classificação dos Resultados de Enfermagem (NOC), Classificação Internacional para a Prática de Enfermagem (CIPE) e Classificação Internacional das Práticas de Enfermagem em Saúde Coletiva (CIPESC), sendo que esta última é uma adaptação no Brasil da CIPE. Estes vocábulos, além de possibilitar o registro, conforme o processo de enfermagem, proporcionam o mesmo significado para os profissionais de diferentes regiões. Tendo sua importância para o desenvolvimento da Enfermagem, pois servem como ferramentas para constatar o conhecimento global. Ademais se o vocabulário utilizado na prática se fizer de forma estruturada, padronizada e classificada, teremos o melhor entendimento por parte dos profissionais e também o monitoramento da qualidade do cuidado de enfermagem prestado aos pacientes, potencializando a produção de estudos científicos(19).

A sistematização da assistência da enfermagem psiquiátrica vem sendo uma ferramenta útil e importante na tentativa de construir uma prática mais eficaz na enfermagem psiquiátrica brasileira no que se refere à reabilitação psicossocial. A consulta de enfermagem por meio do atendimento prioritário das necessidades humanas básicas, busca a atenção para o autocuidado, para isto faz-se necessário associar efetivamente a teoria com a prática para que aconteça compreensão e implementação no processo de enfermagem na área de saúde mental(20).

Na sistematização da assistência de enfermagem, tem-se uma organização do trabalho profissional quanto ao método, ao pessoal e aos instrumentos, que possibilitam a operacionalização do processo de enfermagem. Esta se fundamenta na assistência à pessoa em sofrimento e norteia o enfermeiro para a aplicação do processo de enfermagem, trazendo segurança ao paciente, qualidade na assistência prestada e maior autonomia aos profissionais de enfermagem(21).

A resolução COFEN 358/2009 descreve que o processo de enfermagem deve ser realizado em todos os ambientes públicos e privados, organizado em cinco etapas inter-relacionadas, interdependentes e recorrentes, são elas: histórico de enfermagem, diagnóstico de enfermagem, planejamento de enfermagem, implementação e avaliação de enfermagem(22). Conforme A9, o cuidado de enfermagem quando executado segundo a sistematização contribui para a recuperação do paciente promovendo o bem-estar psíquico, físico e social(17).

O Histórico de Enfermagem é um procedimento padrão e deve ser realizado na consulta de enfermagem, uma vez que se realiza o levantamento de dados do paciente. Ele é o primeiro passo do método científico, pois a partir dele, é possível realizar o diagnóstico de enfermagem, o plano terapêutico, sua implementação e avaliação, na evolução e prognóstico de enfermagem(23).

De acordo com A1, dentre as ações terapêuticas que melhoram o atendimento em saúde mental estão: a observação, a escuta e a percepção da comunicação não verbal(9).Esta última qualifica a relação humana, possibilita uma compreensão e percepção maior dos sentimentos apresentados pela pessoa emissora e não apenas do significado das palavras expressas, pois na comunicação não verbal a pessoa também expõe suas emoções(24).

Merhy (2002) propôs tecnologias da saúde, que são formas de cuidado, as quais valem para todos os lugares onde se pensa em humanização. Tais tecnologias dividem-se em leve, leve e dura e dura. A tecnologia leve é a parte da relação entre a pessoa que recebe o cuidado e o profissional. A tecnologia leve e dura dá-se pelos saberes e conhecimentos técnicos, considerando-se a dura está centrada nas máquinas e procedimentos técnicos. Uma tecnologia de cuidado complementa a outra, entretanto, a tecnologia leve deveria conduzir todo o trabalho do enfermeiro, considerando-se que o vínculo e relação depende do diálogo entre profissional e a pessoa que busca o cuidado(25). Desta forma, A2 e A4 abordam, que na consulta de enfermagem, deve se observar as respostas fisiológicas, cognitivas, emocionais e comportamentais, realizar a investigação de histórica clínica, hábitos pessoais e fatores de risco. Ainda, a solicitação e avaliação de exames complementares, informações sobre patologia e uso de medicamento, incentivo a adesão do tratamento, orientações gerais, registro de informações no prontuário(10,12). Todavia, em A6, destaca-se como essencial, levar em consideração a bagagem sociocultural da pessoa com transtorno mental(14).

Portanto, além, da relação interpessoal que deve ser estabelecida na consulta de enfermagem deve-se realizar exame físico e mental (A6), através desses, é possível estabelecer diagnósticos de enfermagem. Desse modo, a consulta de enfermagem baseia-se em um tripé, qual seja: vínculo, avaliação mental e física. Depois de esses procedimentos deve-se realizar o diagnóstico em enfermagem, planejamento terapêutico e, se necessário discussão com a equipe(14).

Em relação à avaliação do estado mental, o enfermeiro deve avaliar durante a consulta de enfermagem tópicos como: aparência do paciente (odor, situação da saúde, presença de deformidades, expressão facial, sinais de ansiedade, extremos de manifestações emocionais (tristeza ou alegria exagerada). Além do sono, que pode estar em excesso ou insone, a psicomotricidade que inclui marcha, hiper ou hipoatividade, tremores por somatizações ou efeitos de medicamentos, atitude e movimentos (in)voluntários; características do pensamento, da fala entre outros(26).

A3, A6 e A7 trazem teorias que são utilizadas na prática de enfermagem como a das Necessidades Humanas Básica de Wanda de Aguiar Horta e a do Autocuidado de Dorothea Elizabeth Orem. Na teoria de Horta, as necessidades humanas básicas são comuns a todos os seres humanos, entretanto, o que varia entre os indivíduos são as maneiras de satisfazer ou atender as suas necessidades. Na teoria de Orem a enfermagem deve agir de acordo com as necessidades individuais dos pacientes, de maneira a manter a vida e promover saúde, prevenir doenças e suas consequências (11,14-15). Sendo a assistência a partir das necessidades e preferências dos pacientes dependentes das percepções do enfermeiro.

O processo de enfermagem fundamentado nas Necessidades Humanas Básicas, proposto por Wanda Horta, compreende um conjunto de etapas sistematizadas e inter-relacionadas para a assistência ao ser humano de forma integral(27).

A implementação da consulta de enfermagem em saúde mental passa por um processo de amadurecimento, no qual é necessário que tais ações sejam aplicadas como a relação interpessoal, comunicação não verbal, exame mental, sistematização de enfermagem, processo e teorias de enfermagem. Tais conhecimentos devem ser aprimorados e direcionados para o melhor desempenho na prática da saúde mental de acordo com a sua peculiaridade.

Os limites e desafios da realização da consulta de enfermagem em saúde mental

De acordo com A2, A3, A4, A5, A9 e A10, a formação profissional apresenta limitações quanto à capacidade para identificação de sinais e sintomas de transtornos mentais, reconhecimento de ações que são de saúde mental, incorporação da filosofia e saber instrumental da reforma psiquiátrica, ainda considerando a assistência centrada no médico, no tratamento medicamentoso e principalmente no contexto hospitalar(10-13,17-18). Portanto, seis de dez trabalhos indicam dificuldades técnicas e paradigmáticas da atuação do enfermeiro na saúde mental. A5 e A10 pontuam como uma das barreiras para a realização da consulta de enfermagem em saúde mental a falta de educação permanente e capacitação na área de conhecimento específico(13,18). Segundo A4, os enfermeiros relataram ter maior dificuldade para efetuar a assistência e promoção à saúde a pessoas diagnosticadas com depressão, pela inexistência de qualificação na área específica(12). Salienta-se que os processos de capacitação devem ser estruturados a partir da problematização do processo de trabalho, objetivando a transformação das práticas profissionais e a organização do trabalho, tendo em vista as necessidades de saúde da população(20).

No campo da saúde mental, o desafio da educação permanente é consolidar a reforma psiquiátrica. Esta deve articular conhecimentos profissionais específicos com a rede de saberes e fazeres envolvidos no sistema de saúde. A formação do enfermeiro exige programas interdisciplinares de ensino que possibilitem análises mais integradas dos problemas de saúde(20).

Além disso, nos artigos A5 e A6, são citados a não implementação da sistematização de enfermagem e de modelo de assistência como dificuldade para o atendimento e realização da consulta de enfermagem em saúde mental(13,14). Para a realização da Consulta de Enfermagem é necessário que o serviço de enfermagem da instituição tenha um padrão de estrutura claramente definida, estabelecido no modelo de assistência, que permita captar a face individual e coletiva dos indivíduos e familiares que atende(28).

No entanto, esta estrutura padrão por meio de instrumentos para guiar a consulta de enfermagem em saúde mental não foi encontrada nesta busca de literatura. A5 destaca a importância de a enfermagem construir um saber instrumental na área de saúde mental que ultrapasse um plano de discurso e manifeste-se na prática.

O trabalho A2 afirma que os enfermeiros em atividades na atenção básica, não estão preparados para dar devida atenção à pessoa com transtorno mental, apesar de apresentar médio conhecimento teórico no estudo revisto(10). Faz-se necessário sensibilizar o profissional da assistência (serviço) e o docente (ensino) sobre a implementação de ações específicas no cuidado de enfermagem à pessoa com transtorno mental em todos os níveis de complexidade.

Segundo A1 é essencial que novos estudos sejam realizados com o intuito de contribuir para uma efetiva aplicação de consulta de enfermagem, tanto na saúde mental quanto em outras áreas de atuação do enfermeiro(9). Em A10, destaca-se a necessidade de ampliar as investigações voltadas para o tema apresentado, contribuindo para o fortalecimento das práticas psicossociais nas instituições extra hospitalares(18).

Tendo em vista, a reforma psiquiátrica, que proporcionou mudanças voltadas para a inserção do usuário na comunidade e no ambiente familiar, é preciso ultrapassar limites e desafios existentes na prática profissional, na formação acadêmica e a busca de subsídios teóricos para fortalecer a ciência da enfermagem em saúde mental. Isto fortalecerá a disciplina da enfermagem como profissão e contribuirá para cuidados seguros e um sistema de saúde resolutivo.

 

Considerações finais

A revisão integrativa de literatura mostrou que ainda é incipiente o número de produções que tratam de consulta de enfermagem em saúde mental, sendo abordadas ações gerais desenvolvidas pela enfermagem nesta área, mostrando a necessidade de estudos sobre o tema e inserção prática nos serviços de saúde do Brasil.

Vale ressaltar que as mudanças no sistema de saúde brasileiro, as quais vêm ocorrendo em consonância com a lei 10.216/2001, devem ser impulsionadas e acompanhadas a pari passu pela enfermagem, pois é esperado que o modelo de atenção psicossocial seja operacionalizado pelos enfermeiros.

A consulta de enfermagem nos serviços de saúde que trabalham com transtornos mentais deve ser sistematizada. Portanto, através da revisão de literatura sugere-se um modelo de consulta de enfermagem que pode ser adaptado conforme a necessidade de cada serviço. Na consulta de enfermagem a relação interpessoal, empatia, respeito, garantia da autonomia e devem ser transversais durante os demais procedimentos. Deve ser solicitado o histórico de enfermagem, ou seja, a anamnese (nome, idade, sexo, escolaridade, tipo sanguíneo, queixa principal, aspectos da história de vida, antecedentes patológicos, hábitos de vida, etc.)

No exame físico pode avaliar a hidratação, mucosas, anexos (unha e cabelos), avaliação cardíaca, pressão arterial, avaliação pulmonar, temperatura, sinais vitais, entre outros. Durante o histórico de enfermagem e exame físico é possível fazer o exame mental em que avalia-se as funções mentais: consciência, atenção, sensopercepção, orientação, memória, humor, pensamento e linguagem. A partir da coleta desses dados realiza-se o diagnóstico em enfermagem e as respectivas intervenções.

Os limites e desafios para implementação da consulta de enfermagem encontrados na revisão podem ser superados através de educação permanente, formação acadêmica com abordagem na prática em saúde mental, pois nos artigos houve relatos sobre formação profissional com limitações, falta de capacitação e educação permanente. O avanço para a realização da consulta de enfermagem em saúde mental nos serviços de saúde se deve ao interesse docente e profissional, a escolha de referenciais teórico-metodológicos apropriados a utilização do Processo de Enfermagem e indicadores de avaliação que permitam a mudança de sintomas e qualidade de vida dos usuários e familiares no campo da saúde mental.

Neste contexto, o estudo oferece aos profissionais de diversas áreas de atuação da saúde, principalmente aos enfermeiros, contribuições sobre a consulta de enfermagem em saúde mental quanto a sua prática profissional e os desafios a serem vencidos, para que o cuidado seja prestado com qualidade e autonomia.

 

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Recebido: 14.09.2014
Aprovado: 09.11.2015

Correspondência:
Jeferson Rodrigues
Universidade Federal de Santa Catarina
Rua Eng. Agronômico Andrei Cristian Ferreira, s/n
CEP: 88040-900, Florianópolis, SC, Brasil
E-mail: jeferson.rodrigues@ufsc.br

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