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SMAD. Revista eletrônica saúde mental álcool e drogas

versão On-line ISSN 1806-6976

SMAD, Rev. Eletrônica Saúde Mental Álcool Drog. (Ed. port.) vol.14 no.2 Ribeirão Preto abr./jun. 2018

http://dx.doi.org/10.11606/issn.1806-6976.smad.2018.000336 

ARTIGO DE REVISÃO
DOI: 10.11606/issn.1806-6976.smad.2018.000336

 

Estresse percebido em graduandos de enfermagem

 

Estrés percibido en estudiantes de enfermería

 

 

Ana Luiza YosetakeI; Isabela Masucci de Lima CamargoI; Luciana Barizon LuchesiI; Edilaine C. Silva Gherardi-DonatoI; Carla Araujo Bastos TeixeiraI

IUniversidade de São Paulo, Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, Centro Colaborador da OPAS/OMS para o Desenvolvimento da Pesquisa em Enfermagem, Ribeirão Preto, SP, Brasil

 

 


RESUMO

O presente estudo teve como objetivo avaliar os níveis de estresse percebido em alunos de graduação de uma universidade do Estado de São Paulo. Foram utilizados instrumentos para a avaliação sociodemográfica e de identificação de estressores no espaço acadêmico e a Perceived Stress Scale, para a mensuração do estresse percebido. Após análise dos dados, foram encontrados como principais resultados a sobrecarga descrita pelas participantes, bem como estressores relacionados ao curso e dificuldades no manejo do estresse. Dessa forma, conclui-se que a rotina do estudante, somada à falta de tempo livre e de redes de apoio, pode ter influência na saúde mental e na percepção do estresse dos sujeitos.

Descritores: Estresse; Estudantes; Enfermagem Psiquiátrica; Enfermagem; Saúde Mental.a


RESUMEN

Este estudio tuvo como objetivo evaluar los niveles de estrés percibido estudiantes de licenciatura de una universidad en el estado de São Paulo. Se utilizaron herramientas para sociodemográficos y factores de estrés de identificación en el espacio académico y de la Escala de Estrés Percibido para medición de estrés percibido. Después de analizar los datos, se encontró que los resultados principales la sobrecarga descritos por los participantes, así como factores de estrés relacionados con el curso, se describieron las dificultades con el manejo del estrés. Por lo tanto, se concluyó que el estudiante rutina añade a la falta de redes de tiempo y apoyo gratuitos influye en la salud mental y en el estrés percibido de los sujetos.

Descriptores: Estudiantes; Estrés; Enfermería Psiquiátrica; Enfermería; Salud Mental.


 

 

Introdução

O estresse é um termo amplamente utilizado no mundo contemporâneo. Sua utilização varia de acordo com a corrente conceitual adotada. O primeiro pesquisador a utilizar o termo estresse tratou esse termo sob perspectiva biológica, considerando o estresse como resposta fisiológica do indivíduo, a qual pode ser cronificada, dependendo da natureza e duração do estímulo estressor. Incialmente, o conceito de estresse não considerava as emoções como fatores relacionais e relevantes(1).

Atualmente, sabe-se que o estresse configura-se como "qualquer situação de tensão aguda ou crônica que produz uma mudança no comportamento físico e no estado emocional do indivíduo". Tal fenômeno demanda um processo adaptativo na esfera física e psicológica, valendo ressaltar que a natureza do agente estressor torna-se maior ou menor variando de acordo com a percepção do indivíduo(2).

Desse modo, o estresse desenvolve papel fundamental no desequilíbrio do processo saúde/doença e está relacionado a causas multifatoriais. Dentre os diversos fatores, pode-se citar a natureza da situação estressora, o nível de desenvolvimento psicológico do sujeito, a qualidade da rede de suporte psicossocial, a percepção do indivíduo sobre o estressor e os mecanismos de enfrentamento desenvolvidos ao longo da vida(3-4).

A enfermagem traz consigo uma peculiaridade já que o aprendizado dessa profissão, que lida com o cuidado, permeia os limites do ser humano, como a doença e a morte. Nesse contexto, o estudante de enfermagem vivencia as fragilidades do ser entre as esferas racional e emocional. O aluno passa a conviver habitualmente com sentimentos de dúvida, medo, decepção, ansiedade, raiva, tristeza e angústia(5).

Trabalhar com as fragilidades humanas promove o desenvolvimento de emoções, como a sensação de incapacidade nos acadêmicos, perante as incumbências que lhes são cobradas em sua formação e, dessa forma, na evolução de sua preparação para o cumprimento das atividades constantes desse trabalho, com aptidão nos diversos domínios necessários, os acadêmicos encontram-se face a cenários de sofrimento que podem fomentar o desenvolvimento do estresse nos indivíduos(6).

Na profissão enfermagem, a grande maioria dos profissionais é do sexo feminino. A prevalência de transtornos depressivos pode ter valores maiores em mulheres, em indivíduos no início da vida adulta e em circunstâncias estressoras. Uma vez que a área da saúde é potencialmente estressante e os graduandos de enfermagem, na maioria do sexo feminino, estão no início da vida adulta, torna-se de grande importância a preocupação com a ocorrência de tais transtornos nessa população(7).

O acadêmico de enfermagem inicia a vivência das ambivalências e exigências da profissão durante o curso, e sua saúde mental, assim como a dos enfermeiros, fica vulnerável a emoções paradoxais; assim sendo, tem-se tornado sujeito de pesquisas, graças ao valor da plenitude de seus aspectos biopsicobiológicos e ao estresse que o profissional de enfermagem sofre(7).

Nesse sentido, o presente estudo teve como objetivo analisar o nível de estresse percebido em estudantes de enfermagem, relacionados ao âmbito acadêmico. Sob essa perspectiva, objetiva-se, ainda, identificar as características sociodemográficas e condições de saúde relatadas pelos participantes, assim como estratégias de enfretamento utilizadas pelos mesmos.

 

Método

Trata-se de estudo descritivo exploratório, com utilização de abordagem quantiqualitativa, buscando-se complementariedade para melhor entender o fenômeno estudado. Dentre as vantagens de um delineamento integrado está a possibilidade de evitar limitações referentes à abordagem única, além de, possivelmente, promover interpretações alternativas dos dados e considerar a forma que o contexto afeta os resultados(8).

O presente estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética e Pesquisa da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo, sob protocolo CAAE 26673314.9.0000.5393, fevereiro de 2014, e todos os procedimentos éticos foram seguidos conforme Resolução nº466/12(9).

A população foi constituída por 570 alunos de graduação em Enfermagem de dois cursos, oferecidos pela mesma instituição pública. A amostra foi composta intencionalmente por 23 estudantes que se matricularam em um programa de redução de estresse, composto por atividades de introdução ao balé clássico, e que aceitaram participar do estudo. Os instrumentos de coleta de dados foram entregues aos estudantes no primeiro dia de atividade, entre março de 2014 e maio de 2015, acordando-se a devolução em uma semana.

A coleta foi constituída pelo preenchimento, de forma autoaplicável, de questionário sociodemográfico, constituído pelas seguintes variáveis: sexo, idade, estado civil, religião, número de pessoas que residem com o estudante, profissão, consultas médicas recentes, uso de medicamentos, tabagismo, consumo de álcool e média ponderada no curso. Os dados qualitativos para identificação de estressores, no espaço acadêmico, foram coletados a partir das seguintes questões: "Como você descreveria seu desempenho acadêmico no momento?", "Você poderia descrever situações relacionadas ao curso de Enfermagem que sejam estressoras?", "Como você costuma lidar com essas situações?" e "Você encontra dificuldades no manejo do estresse? Se sim, quais?". Na sequência, o estudante respondeu à escala Perceived Stress Scale (PSS).

A Perceived Stress Scale mensura o nível no qual os sujeitos percebem as situações como estressoras. Essa escala foi proposta por Cohen & Williamson, em 1988. Conforme os autores, a escala preenche lacunas de outros instrumentos que mensuram o estresse, visto que as escalas até então construídas se limitam a quantificar sintomas físicos e psicológicos ou se direcionam à presença/ausência de agentes estressores específicos(10-11).

A PSS é composta por itens que têm como componentes três pontos fundamentais: a imprevisibilidade, a falta de controle e a sobrecarga de atividades na visão do respondente(12-13). Esses três pontos correspondem aos pilares da "experiência de estresse", conforme a perspectiva transacional do estresse, proposta por Lazarus e Folkman(14). O elevado grau de estresse percebido, resultado obtido através da aplicação da PSS, está diretamente relacionado a desequilíbrios fisiológicos, como alterações de níveis de cortisol, triglicerídeos, interleucina-6, dentre outras alterações fisiológicas compatíveis com o processo de estresse fisiológico(15).

A PSS é uma escala que se adequa a diferentes faixas etárias decorrente de sua inespecificidade de contexto. Essa ausência de questões específicas de contexto é um fator relevante na escala e que pode estar associada ao motivo pelo qual a mesma tenha sido validada em diversas línguas(12,16-17). Aqui no Brasil, a versão completa (PSS 14) foi traduzida e validada com qualidades psicométricas dentro dos padrões, em população idosa, mas seu uso pode ser realizado em diferentes faixas etárias, incluindo adolescentes e jovens adultos(12).

A PSS 14 é composta por 14 questões com opções de resposta que variam de zero a quatro sendo: zero=nunca; um=quase nunca; dois=às vezes; três=quase sempre; quatro=sempre. As perguntas com sentido positivo (4, 5, 6, 7, 9, 10, 13) têm a pontuação somada de forma invertida. As demais questões devem ser somadas diretamente. O escore total da PSS é a soma dos escores individuais de cada pergunta, podendo variar de zero a cinquenta e seis(12), cuja interpretação é feita considerando-se: quanto maior o escore, maior o estresse percebido.

Para análise dos dados, foi utilizado o software Statistical Package for the Social Sciences (SPSS®), versão 20.0, e análise categorial para as questões abertas. Com os dados qualitativos obtidos, seguiram-se operacionalmente as fases propostas para análise temática, organizando-as em torno dos três polos cronológicos: pré-análise, exploração do material com decodificações e categorização e, por fim, o tratamento dos resultados com inferências e análise propriamente dita(18).

 

Resultados

Dos 23 participantes da pesquisa, todos da sexo feminino, faixa etária entre 18 e 30 anos completos, sendo a média de idade de 20,6 anos. Quanto ao estado civil, 21 (91%) das participantes são solteiras. Apenas uma participante realiza atividade remunerada concomitantemente ao curso. Com relação à moradia, 10 (43,5%) das participantes residiam com familiares, enquanto 11 (47,8%) residiam em repúblicas estudantis e 2 (8,7%) residiam sozinhas, a média de pessoas com quem dividiam suas residências foi de 3,9.

 

Tabela 1

 

Na análise das variáveis relacionadas à saúde das participantes, foi encontrado que 82,6% da amostra realizaram consulta médica no último ano, com maior incidência para realização de exames de rotina (35,7%). Quando questionadas sobre o uso de medicamentos, 11 (47,8%) das participantes relataram fazer uso de algum medicamento, sendo os medicamentos anticoncepcionais os mais utilizados (20,8%). Com relação ao uso de substâncias lícitas, nenhuma das participantes referiu uso de tabaco, porém, 15 (65,2%) relataram uso de álcool; conforme dados da Tabela 2.

 

 

Na aplicação da Escala de Estresse Percebido, foram encontrados escores que variaram de 14 a 45. A média de escore foi de 29,3. Foram encontradas, ainda, médias mínima e máxima de 1,3 e 3,6, respectivamente, dentre as quatorze questões, conforme dados da Tabela 3.

Quanto ao desempenho acadêmico, dos 23 sujeitos, identificaram-se 23 unidades de análise, classificadas nas categorias "respostas positivas sobre o desempenho no curso" (13 unidades de análise – 56,5%), "desempenho bom, mas com relatos de dificuldades" (6 unidades de análise - 26,1%) e "respostas negativas relacionadas à saúde mental no desempenho" (3 unidades de análise – 13,0%), e um estudante não soube avaliar, pois ainda não havia realizado provas.

Na categoria "respostas positivas sobre o desempenho no curso", em geral os sujeitos classificaram-na como "bom". Estou satisfeita, com notas boas (Sujeito 11). Bom, estudo diariamente, participo de todos os trabalhos e tarefas e me empenho para absorver o conteúdo necessário das disciplinas (Sujeito 22). A categoria "desempenho bom, mas com relatos de dificuldades" apresentou respostas que denotam superação de dificuldades para manutenção do desempenho. No momento, me sinto mais cansada para estudar e me dedicar aos estudos. Porém, tenho ido bem nas disciplinas, com notas acima da média (Sujeito 25). No momento meu desempenho acadêmico está melhor, porém mais cansativo (Sujeito 18). Já na categoria "respostas negativas relacionadas à saúde mental no desempenho", houve relatos de cansaço físico e emocional, como limitações para o desempenho acadêmico. [...] estou bem cansada! E olha que é só o começo do ano (Sujeito 19). No momento, não muito bem. O novo ambiente da faculdade é meio perturbador, tudo tem que conhecer, procurar e as matérias, juntamente aos trabalhos de grupo, são cansativos (Sujeito 34).

Referente a situações relacionadas ao curso de Enfermagem estressoras, dos 23 sujeitos, identificaram-se 41 unidades de análise classificadas nas categorias "metodologia do curso" (22 unidades de análise – 53,7%), "pouco tempo para estudos" (6 unidades de análise -14,6%), "desgaste emocional" (5 unidades de análise – 12,2%), "relação de estresse entre alunos e docentes" (4 unidades de análise – 9,8%) e "pouco tempo livre para lazer" (4 unidades de análise – 9,8%).

Dentro da categoria "metodologia do curso", 7 unidades de análise corresponderam à "carga horária densa", sendo as demais unidades de análise (15) relativas aos estágios, aulas extensas, avaliações (incluindo as práticas), técnicas e trabalhos. Houve relação entre carga horária densa e pouco tempo livre para estudos e lazer. Os intensos trabalhos e provas seguidas, a não compreensão dos docentes de que a grade horária é muito puxada e a exigência frente às condições de estudo (pouco tempo e desgaste físico) (Sujeito 25). [...] correria para imersões e aulas após essas imersões (Sujeito 21). Na categoria "desgaste emocional", os estudantes relataram como o curso os afeta emocionalmente. [...] isso me leva a uma sobrecarga, me levando ao estresse (Sujeito 11). Na categoria "relação de estresse entre alunos e docentes", houve relatos sobre a exigência dos docentes frente à carga horária extensa. [...] exigência exagerada de alguns professores, "forma de lidar" com os alunos (Sujeito 36).

Sobre as estratégias de enfrentamento para situações estressantes, foram localizadas 34 unidades de análise, classificadas nas categorias "realização de atividades prazerosas" (8 unidades de análise – 23,5%), das quais são mencionadas dança, música, descanso, sono, filmes e psicoterapia. Tento ficar calma e relaxar e descansar quando posso (Sujeito 21). Procuro relaxar dançando, ouvindo música e indo ao psicólogo (Sujeito 41). Na categoria "dificuldades no enfrentamento do estresse" (8 unidades de análise – 23,5%), os estudantes trouxeram aspectos como desmotivação, autocobrança e cobrança externa, desespero, choro e estresse. Não consigo lidar muito bem. Ou eu deixo o estresse tomar conta de mim ou largo todas as minhas obrigações [...] (Sujeito 19). Me sinto pouco motivada a praticar atividades extracurriculares (esportes), apesar de gostar muito devido à cobrança pessoal à graduação (Sujeito 13). Identificou-se, também, a categoria "tentativas de autocontrole" (7 unidades de análise – 20,6%). Eu costumo tentar fazer com que essas situações não me abale emocionalmente (Sujeito 3). [...] durante a prova tento me manter calma respirando fundo para não me dar "branco" (Sujeito 22).

Foram ainda identificadas as categorias "organização das atividades diárias" (4 unidades de análise – 11,8%), "estudo" (3 unidades de análise - 8,8%), "conversar com amigos e familiares" (2 unidades de análise – 5,9%) e "medicação" (1 unidade análise – 2,9%). Um sujeito, que correspondeu a 1 unidade de análise – 2,9% - não soube precisar seu enfrentamento.

Quanto às possíveis dificuldades no manejo do estresse, dos 23 sujeitos, 11 (47,8%) afirmaram encontrar dificuldades, 5 sujeitos (21,7%) negaram dificuldades, 6 sujeitos (26,1%) relataram que "às vezes" ou "raramente" encontram dificuldades e 1 sujeito (4,3%) não respondeu à questão. Entre as estudantes que relataram dificuldades, destacam-se nervosismo, ansiedade, inquietação, intolerância com pessoas próximas, capacidade de abstração reduzida e perda do controle emocional. Geralmente eu não costumo conversar sobre o que estou passando na graduação e isso vai se acumulando até o ponto de não aguentar mais e ter crises muito fortes de nervosismo, choro, além de cefaleia (Sujeito 3). Às vezes é difícil me distrair (Sujeito 17). [...] dependendo do estresse sinto dificuldades para entrar em equilíbrio e acabo ficando muito ansiosa e inquieta. Tento não descontar em pessoas próximas a mim, mas algumas vezes acabo descontando sem querer (Sujeito 22).

 

Discussão

O sentimento de cobrança por parte dos alunos, bem como situações estressantes relacionadas à metodologia do curso, como, por exemplo, os estágios, são corroborados em estudo realizado com alunos de enfermagem em que são descritas pelos estudantes as incertezas referentes às expectativas dos professores em relação ao desempenho acadêmico dos alunos, citando-se mais frequentemente os estressores relacionados aos professores, ao currículo e às atividades práticas com pacientes ou em laboratório(19). Outro estudo com estudantes de enfermagem corrobora nos quesitos estrutura oferecida para realização das atividades, método de ensino, dificuldades pessoais, número de disciplinas para cursar, realização de provas e trabalhos em aula que, dentre outros fatores, configuram situações de desgaste para os graduandos de enfermagem(20).

Também foram encontrados maiores níveis de estresse percebidos em grupos de idade inferior, quando comparado com pessoas pouco mais velhas, bem como diferenças nas estratégias de enfrentamento utilizadas pelo grupo de idade superior, sendo que esse grupo utilizou estratégias de reestruturações cognitivas e centradas no problema. Já o grupo de idade inferior utilizou com frequência estratégias de pensamento esperançoso e autocrítico. Nesse mesmo estudo encontrou-se, ainda, que altos níveis de estresse percebido e a utilização de enfrentamento passivo estão relacionados ao estado de ânimo negativo(21).

Resultados semelhantes foram encontrados em um estudo realizado com mestrandos da área da saúde, em que foi descrito alto índice de sujeitos sob estresse, bem como alto índice de estresse percebido. Foi descrita, também, grande quantia de sintomas físicos relacionados ao estresse, sendo as mulheres mais vulneráveis(22).

No presente estudo houve relatos de nervosismo, ansiedade, intolerância com pessoas próximas e dificuldade de abstração, apontados como dificuldades no manejo do estresse. Outro estudo, realizado com estudantes, apresenta relatos de que os estudantes se sentem frequentemente nervosos ou cansados, porém, no mesmo estudo, os participantes consideraram-se, em sua maioria, razoavelmente bons ao lidar com seus problemas, apesar de grande parte dos sujeitos ter referido apresentar sintomas somáticos diariamente(23). Também vale ressaltar que nervosismo e ansiedade são percepções do estudante que podem interferir no desempenho das atividades físicas e mentais para a execução do trabalho.

No presente estudo não foi possível analisar o impacto dos diferentes anos, em virtude da amostra não ser homogênea. Entretanto, em estudo com estudantes de medicina houve maior incidência de depressão e ansiedade em alunos do primeiro ano, quando comparados aos alunos do quarto ano do mesmo curso, dado que os autores do artigo relacionam ao fato de os alunos dos últimos anos já estarem mais bem adaptados às circunstâncias estressoras(24).

Dentre as dificuldades descritas, deve-se atentar à percepção do aluno a respeito de sua intolerância com pessoas próximas, uma vez que pode prejudicar suas redes de apoio que oferecem suporte para o enfrentamento das adversidades do mundo acadêmico e futuramente, do mundo do trabalho, ainda mais por se tratar da formação de um profissional da área da saúde, cuja responsabilidade é o cuidado.

 

Considerações finais

O contexto encontrado neste estudo, ou seja, um curso de graduação com extensa carga horária e limitação de atividades de lazer, além do estresse percebido, é preocupante, pois os estudantes tendem a internalizar essas características do curso como algo que obrigatoriamente deve ser superado, deixando de lado a ideia de que o profissional de saúde precisa cuidar de si para cuidar do outro. Nesse sentido, esse modus operandi, culturalmente transmitido, pode ser reproduzido na vida pessoal e profissional, causando problemas de saúde ao profissional e perda de redes de apoio.

Tais fatores podem ser percebidos em alunos de graduação, conforme os achados deste estudo, uma vez que muitos já relatam se sentirem sobrecarregados e sem tempo hábil para realizar atividades de lazer ou cuidar de seu bem-estar mental de outras maneiras. Essas características do curso e também da profissão de enfermagem, em alguns momentos, são reforçados ao longo do curso, uma vez que, para alcançar um bom rendimento, é necessário que o aluno deixe de lado atividades recreativas.

O estresse causado pela lembrança constante das tarefas a serem realizadas, sensação de nervosismo e de incompetência, para lidar com o estresse percebido, foram os fatores de maior pontuação na PSS, corroborando os relatos de cansaço, muitas vezes atribuídos à metodologia do curso de graduação. Como estratégias de enfrentamento alguns estudantes buscam atividades de lazer, mas, também, sinalizam dificuldades de enfrentamento, tendo como reflexo nervosismo, irritabilidade e intolerância com pessoas próximas.

O estudo sobre as características de saúde e estresse, percebido entre os acadêmicos que se submetem a um programa de redução de estresse, contribui para o planejamento e a organização de propostas de intervenção para atender essa clientela, considerando-se que a efetividade das intervenções está diretamente relacionada à identificação dos sujeitos com a problemática a ser trabalhada.

Porém, ainda que haja o planejamento e a organização de intervenções direcionadas aos graduandos de enfermagem, continuarão existindo limitações na implementação dessas, uma vez que características pedagógicas e curriculares relacionadas ao curso dificultam a participação dos alunos em atividades extracurriculares, como pôde se ver com as respostas dos sujeitos desta pesquisa.

O estudo possui como limitações a amostragem por conveniência. Contudo, os autores assumem essa limitação e reconhecem-na como condição propícia para revelar evidências científicas que favorecem o pensar sobre os mecanismos de suporte disponíveis na formação do enfermeiro e, em segunda estância, podem contribuir para a prevenção dos efeitos negativos do estresse no profissional de enfermagem.

 

Referências

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Recebido: 03.11.2016
Aceito: 31.07.2018

Autor de correspondência:
Luciana Barizon Luchesi
E-mail: luchesi@eerp.usp.br
 https://orcid.org/0000-0002-7282-109X

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