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Estudos e Pesquisas em Psicologia

On-line version ISSN 1808-4281

Estud. pesqui. psicol. vol.5 no.1 Rio de Janeiro June 2005

 

RESENHA

 

Espaços de esperança para um mundo melhor

 

Space of hope for the best world

 

 

Gisela Verri de Santana*

Universidade do Estado do Rio de Janeiro

Endereço para correpondência

 

HARVEY, D. Espaços de Esperança. Spaces of Hope. Tradução de Adail Ubirajara Sobral e Maria Stela Gonçalves. São Paulo: Edições Loyola, 2004.

A versão brasileira do livro “Espaços de Esperança”, do antropólogo e professor David HARVEY, traduzida a partir do inglês, foi publicada originalmente em 2000. O autor também escreveu conhecidos livros como “Condição Pós-Moderna”, com seis edições publicadas em português (6ª ed., 1996), e “A Justiça Social e a Cidade” (1980). De forma geral, seus estudos perpassam conteúdos e abordagens da antropologia social e da geografia humana relacionadas aO Capitalismo e seus impactos sobre a sociedade.

Em “Espaços de Esperança”, que é de fácil e instigante leitura, ele nos propõe uma reformulação interior como uma das alternativas para transformar e melhorar o mundo em que vivemos.

A partir dos seus 12 capítulos; agrupados nos macrotemas que abordam “Desenvolvimentos geográficos desiguais”, “Dos corpos e das pessoas políticas no espaço global”, “O momento utópico” e, “Conversações sobre a pluralidade de alternativas”; Harvey, fortemente baseado nos ideais de Karl Marx, aborda entre outros assuntos, a questão do “ser da espécie”, quando se refere aos indivíduos e à nossa responsabilidade perante a natureza e a própria natureza humana.

Ele inicia o livro relatando sua trajetória de mais de 20 anos de estudos, em forma de cursos para universitários, dedicados ao “Capital” de Karl Marx. E, apresenta visões desta obra ao longo de diversas gerações.

Além de suas impressões sobre a ascensão e “declínio” desta obra ao longo dos tempos, Harvey nos oferece um precioso mapa de obras e autores que devem ser lidos para uma melhor compreensão do clássico de Marx.

De forma leve, Harvey parece conversar com o leitor, explicando-lhe seu raciocínio, ao longo do texto. Numa mistura de prosa e cientificidade, elucida fatos de como as mudanças ocorridas nos últimas décadas têm transformado o modo de se enxergar a realidade, conduzindo-a a uma espécie de “conto de fadas”. Entre as mudanças discursivas contemporâneas, nos fala da emergência do conceito da globalização e da re-significação do corpo enquanto “O” referente de todos referentes, enquanto locus irredutível da determinação de todos os valores, significados e significações.

A globalização é abordada por Harvey como um projeto geopolítico empreendido pelos Estados Unidos com o apoio de alguns aliados como a Grã-Bretanha, sobretudo no período tatcherista. E que, desde 1945, os EUA vêm pensando localmente e agindo globalmente, sobretudo por meio das suas políticas externa, militar e comercial.

Ao longo do livro, Harvey vai construindo sua tese para defender a idéia de que a globalização, fabricada e edificada em prol dos interesses norte-americanos, ao mesmo tempo em que produz desenvolvimentos geográficos desiguais e disparidades sócio-econômicas e políticas, também constrói sua própria fragilização, através dos seus aspectos negativos e desmobilizadores.

Baseado nas contradições e paradoxos da própria globalização, Harvey afirma que estes oferecem oportunidades para que uma política progressista alternativa possa emergir, criando um conjunto sem precedentes de condições para uma mudança radical.

Ainda embasado no pensamento marxista, Harvey se transforma em um D’Artagnan da luta anticapitalista. Parafraseando o mosqueteiro, ele afirma que: “‘um por todos e todos por um’, na luta anticapitalista, continua a ser um slogan vital”. (HARVEY, 2004, p. 116) Com o olhar voltado para as lutas de classes, ele também levanta a questão de que a globalização “nos obrigou a considerar as regras e os costumes por meio dos quais podemos nos relacionar uns com os outros numa economia global em que todos, de uma ou de outra maneira, se relacionam com todos, assim como dependem de todos”. (HARVEY, 2004, p. 118) E que “a disseminação dos modos ocidentais de pensar a auto-satisfação e a auto-realização desencadeou um conjunto de intensas forças de crescente frustração econômica, social e cultural” (HARVEY, 2004, p. 127). Sobretudo, pela evidente caracterização do neoliberalismo como violador dos direitos humanos.

Baseado na idéia de que o “homem”, ou o “corpo” é a medida de todas as coisas, ele irá fazer uma série de analogias deste com o ambiente e com a mercadoria. E irá reforçar a idéia de que neste ser uno, como membro de um conjunto, pode estar “A” solução para as questões de conflitos existente no mundo. É neste momento, do livro Espaço de Esperança, que Harvey retoma a questão do tempo e do espaço, já tratada por ele em seu outro livro a Condição Pós-Moderna. Aqui, ele afirma que as necessidades do corpo são fixadas e sabidas em um dado espaço e num dado tempo e que estes serão determinantes. Ele afirma: “há [...] a necessidade de persuadir as pessoas a ver para além das fronteiras do míope mundo da vida cotidiana que todos habitamos necessariamente” (HARVEY, 2004, p. 310) e que os interesses, as práticas políticas e arquitetônicas, inseridas em um dado tempo e em um dado espaço, têm condições de “moldar os outros a se adaptar a suas concepções e desejos pessoais e particulares” (HARVEY, 2004, p. 308) e que, portanto, todos os fatores aí envolvidos se expressam e são determinantes nesta concepção de “pessoa”.

É nesta direção que Harvey convoca a todos para sermos “arquitetos rebeldes”. Para reservar e produzir um espaço não apenas para a reflexão crítica, mas, sobretudo, para o florescimento desta autotransformação. Onde a negociação, “que está sempre na base de todas as práticas políticas e arquitetônicas” e que “envolve as pessoas que buscam transformar umas às outras e ao mundo, assim como a si próprias” (HARVEY, 2004, p. 309) possa ser utilizada como ferramenta neste processo de renovação.

 

 

Endereço para correspondência
E-mail: givs@uol.com.br

Recebido em: 16/08/2005
Aceita para publicação em: 09/09/2005

 

 

NOTAS

* Doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Psicologia Social da UERJ, Mestre em Desenvolvimento Urbano e Regional pela UFPE.

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