SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
vol.14 número3Indicadores de estresse e sobrecarga em cuidadores formais e informais de pacientes oncológicosImplementação e avaliação de um Programa de Desenvolvimento da Empatia em estudantes de Psicologia índice de autoresíndice de assuntospesquisa de artigos
Home Pagelista alfabética de periódicos  

Estudos e Pesquisas em Psicologia

versão On-line ISSN 1808-4281

Estud. pesqui. psicol. vol.14 no.3 Rio de Janeiro dez. 2014

 

PSICOLOGIA DO DESENVOLVIMENTO

 

Trabalho infantil doméstico no interior dos lares: as faces da invisibilidade

 

Domestic child labour in inside homes: the face of invisibility

 

Trabajo infantil doméstico en el interior de los hogares: la cara de la invisibilidad

 

 

Gabriela Fernandes Rocha Patriota*; Maria de Fatima Pereira Alberto**

Universidade Federal da Paraíba – UFPB, João Pessoa, Paraíba, Brasil

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

Este artigo objetiva caracterizar as atividades e as condições de trabalho doméstico, realizadas por crianças e adolescentes na própria casa, além de refletir acerca do caráter de invisibilidade desse tipo de trabalho infantil. O método utilizado foi qualitativo com aplicação de um questionário e da entrevista semiestruturada, tratados com a análise de conteúdo. A pesquisa foi realizada em duas escolas da rede municipal de ensino da cidade de João Pessoa e participaram crianças e adolescentes com idades entre 8 e 18 anos. No questionário mosquito participaram 435, desses 61 trabalhadores. Na entrevista participaram 16. Os dados revelam um conjunto de atividades desempenhadas por trabalhadores precoces que começam cedo a cuidar da casa, das pessoas e da alimentação. Contribuem na família, que pode contar com seu trabalho doméstico para o funcionamento do lar ou na ausência dos responsáveis para trabalhar fora. As modalidades de trabalho doméstico "socialização" e "ajuda" dão um caráter de invisibilidade, não sendo vistos como trabalho, mas como dimensão de gênero ou de participação na vida social. Apesar de invisível, foram identificadas queixas de cansaço, fadiga, sobrecarga e comprometimento das atividades escolares.

Palavras-chave: trabalho infantil, trabalho doméstico, criança, adolescente, famílias de baixa renda.


ABSTRACT

This article aims to characterize the activities and conditions of domestic work carried out by children and adolescents at their own house, besides to reflect on the character of invisibility of this type of child labour. The qualitative method was used by applying the questionnaire and the semi-structured interview, both analyzed by content analysis. The research was conducted in two municipal schools in João Pessoa city with the participation of children and adolescents aged from 8 to 18 years old. 435 participated in the mosquito questionnaire, among which 61 were workers. Sixteen participated in the interview. The data reveal a set of activities performed by precocious workers who begin early to take care of people, clean the house and cook. They contribute to the family - who can count on their housework for running the household or allowing responsible to work outside the home. The "socialization" and "help" housework arrangements give a character of invisibility and they are not seen as work but as a matter of gender or participation in social life. Although it's invisible, complaints of tiredness, fatigue, overload and damage to school activities.

Keywords: child labour, domestic work, child, adolescent, low-income families.


RESUMEN

Este trabajo tiene como objetivo caracterizar las actividades y las condiciones del trabajo doméstico realizado por niños y adolescentes en el propio hogar, además de reflexionar sobre el carácter de la invisibilidad de este tipo de trabajo infantil. Fue utilizado el método cualitativo. Se aplicó el cuestionario mosquitos (instrumento corto, de forma análoga al folleto identifica quien realiza los servicios domésticos) y la entrevista semiestructurada tratada con el análisis de contenido. La encuesta se realizó en dos escuelas municipales de la ciudad de João Pessoa y participaron los niños y adolescentes de 8 a 18 años. En el cuestionario mosquito participaron 435, entre estos, 61 eran trabajadores. En la encuesta participaron 16. Los datos revelan un conjunto de actividades realizadas por los trabajadores precoces que comienzan temprano a cuidar de la casa, la gente y la comida. Contribuyen con la familia, que puede contar con su trabajo doméstico para que el hogar funcione o en la ausencia de los responsables por trabajar fuera de la casa. Las modalidades de las tareas del hogar "socialización " y " ayuda " le dan un carácter de invisibilidad y no es visto como un trabajo sino como una dimensión de género o la participación en la vida social. Aunque invisible se identificó quejas de cansancio, fatiga, sobrecarga y perjuicio en las actividades escolares.

Palabras clave: trabajo infantil, trabajo doméstico, niño, adolescente, familias de bajos ingresos.


 

 

1 Introdução

O presente artigo tem como objetivos caracterizar as atividades de trabalho doméstico, realizadas por crianças e adolescentes no próprio domicílio, bem como as condições de trabalho enfrentadas por esses trabalhadores. Diante disso, busca-se refletir acerca do seu caráter de invisibilidade, uma vez que esse tipo de atividade nem sempre é considerado trabalho, mas um elemento socializador e formador.

Moreira e Stengel (2003) argumentam que a discussão de trabalho doméstico demanda uma reflexão acerca do serviço doméstico que remete ao caráter socializador no desempenho de papéis de gênero e na invisibilidade que permeia o não reconhecimento. Portanto, a discussão do Trabalho Infantil Doméstico (TID) requer a incorporação da concepção de serviço. As referidas autoras ao abordar o trabalho doméstico feito por crianças e adolescentes utilizam o termo "serviço doméstico" para abranger todos os serviços de cuidar de casas, da alimentação, das pessoas ou animais realizados no âmbito doméstico, o que na maioria das vezes, não é considerado como "trabalho" porque não é remunerado e nem reconhecido socialmente.

Alberto, Nunes, Cavalcante e Santos (2006) ao analisarem o trabalho doméstico realizado por crianças e adolescentes incorporaram a concepção de serviços de Moreira e Stengel (2003), porém, denominaram trabalho infantil doméstico, pois identificaram que mesmo com caráter socializador, há uma relação mercantilista. O serviço feito por crianças e adolescentes contemplava a obtenção de um pagamento, que pode ser em gênero ou em espécie, incluindo aqueles feitos no domicílio, para a própria família. Ou são feitos por crianças e adolescentes em suas casas, substituindo suas mães ou outros adultos na realização das atividades domésticas, e, na maioria das vezes, liberando-os para o trabalho fora de casa, assumindo os lugares dos mesmos. São atividades variadas que contemplam o cuidado com pessoas (crianças e idosos) (Dellazzana & Freitas, 2010) e animais, a alimentação e os serviços de limpeza da casa e do vestuário (Arruda, 2008; Aued & Vendramini, 2009; Organização Internacional do Trabalho [OIT], 2011; Silva, 2002), e que na maioria das vezes contemplam uma dimensão de gênero (Abramo, 2004; Whitaker, 2002).

A definição de TID conforme Alberto, Nunes, Cavalcante e Santos (2006) refere-se, além dos afazeres, ao tipo de relação da criança e do adolescente com os habitantes da casa, ao processo de trabalho e à presença ou ausência de remuneração. O que possibilita caracterizar o TID em três modalidades: O tipo socialização, que é considerado todo trabalho realizado na própria casa e que tem o caráter de socialização e participação na vida familiar. O tipo ajuda que diz respeito ao trabalho realizado na casa da família ou de terceiros, no qual a criança ou adolescente assume responsabilidades pelo cuidado da casa ou de pessoas, liberando os adultos para realizarem outras atividades, contribuindo de forma indireta para a renda familiar, para a produção e reprodução. E o tipo remunerado que é aquele trabalho no qual a criança ou adolescente recebe um pagamento em dinheiro ou gêneros e há nitidamente estabelecida uma relação de trabalho empregador e empregado. O foco do presente artigo são os tipos socialização e ajuda, devido o seu caráter de invisibilidade e realização no próprio domicílio (Alberto et al., 2006).

Apesar dos elementos diferenciadores nas três modalidades, a reflexão acerca da participação de crianças e adolescentes nos serviços domésticos contempla ainda elementos pertinentes ao caráter socializador ou segregacionista da atividade, as implicações para o desenvolvimento biopsicossocial, mais especificamente os agravos à saúde e à violação de direitos. Sobre isso, a OIT (2011) afirma que

“As meninas, meninos e adolescentes podem também realizar serviços domésticos em sua própria residência e estes podem ser classificados como perigosos quando são realizados por longas horas do dia (e interferem em sua educação); quando manipulam equipamentos perigosos, materiais tóxicos ou cargas pesadas, além de realizá-los em lugares perigosos” (pp. 3).

Na análise do TID carece levar em consideração a articulação dos vários elementos, tais como jornada de trabalho, carga de trabalho, relações sociais, tempo para as brincadeiras e para as tarefas escolares e grau de responsabilidade da tarefa, pois a conceituação aparentemente simplista de que visa à socialização pode esconder a violação de um direito.

Direitos esses assegurados em lei específica, como o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), que zela pela condição peculiar do desenvolvimento. Pode-se observar nos artigos 3° (garante todos os direitos fundamentais a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social), 4° (define responsáveis pela efetivação dos direitos) e 5° (define na forma da lei a punição para quem atentar contra o direito fundamental) (Estatuto da Criança e do Adolescente [ECA], 1990).

O reconhecimento dos direitos de crianças e adolescentes encontra respaldo na Legislação Internacional da qual são signatários vários Estados. O compromisso dos Estados em respeitar e fazer cumprir os direitos encontra-se positivado nas convenções da Organização Internacional do Trabalho (OIT): a Convenção 138 e a Convenção 182. A primeira estabelece que "a idade mínima de admissão em qualquer tipo de trabalho nunca deverá ser inferior à idade de conclusão da escolaridade compulsória ou, em todo caso, a 15 anos" (Convenção nº 138 sobre a idade mínima de admissão ao emprego, 1973). E para trabalhos perigosos a idade mínima é de 18 anos. A Convenção 182 tipifica as piores formas de trabalho infantil e recomenda a adoção de medidas imediatas e eficazes visando à sua eliminação. O trabalho infantil doméstico, objeto desse artigo é uma das piores formas.

As referidas convenções foram ratificadas pelo Brasil sucessivamente em 1990 e 2002. A Convenção 182 (1999) resultou ainda na aprovação de um Decreto de número 6.481, de 2008, que regulamenta os artigos 3° e 4º da referida convenção, que definem as piores formas e que resultou na lista de 80 tipos de atividades. Estas versam sobre atividades escravas ou de práticas análogas, como servidão por dívidas ou recrutamento para conflitos armados; além de atividades ilícitas como tráfico e exploração sexual; ou aquelas que podem prejudicar a saúde, a segurança e a moral das crianças, como é o caso do trabalho infantil doméstico.

Apesar da legislação nacional e internacional e das ações para erradicar o trabalho infantil, a exemplo da III Conferência Global sobre o Trabalho Infantil, na qual diversos países discutem sobre a temática, o trabalho infantil, inclusive o doméstico, continua ocorrendo no mundo todo. Cerca de 168 milhões de crianças em todo o mundo são crianças trabalhadoras; este número representa cerca de 11% da totalidade da população infantil (OIT, 2013). Esse tipo de trabalho tem sido respaldado pela sociedade de várias maneiras: pelas necessidades das famílias submetidas à pobreza, pela concepção cultural ou religiosa, pela divisão do trabalho manual e trabalho intelectual e pelo suposto caráter disciplinador, educador e de formação humana, atribuído ao trabalho, como revelam os dados no Brasil.

A Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) de 2011, por exemplo, aponta que ainda existem mais de 90.000 crianças e adolescentes de 5 a 17 anos trabalhando nos lares e domicílios no Brasil. O Nordeste é a segunda região de maior número, com mais de 23.000 crianças e adolescentes trabalhadores (PNAD, 2011).

Segundo Becker (2014), é preocupante que enquanto os números do trabalho infantil em geral estejam caindo, no setor doméstico eles crescem. Houve um aumento de 1 milhão de crianças que entraram no trabalho doméstico dos diversos tipos (remunerado ou não) nos últimos quatro anos. E este é um setor difícil de atingir, pois as crianças e adolescentes não estão trabalhando em fábricas, mas em casas privadas, estão muito isoladas (J. Becker, 28 de Abril, 2014). A questão de gênero do trabalho doméstico é historicamente construída, pois os papéis sociais são definidos historicamente e atribui às mulheres os serviços domésticos e o cuidado com os filhos. Alberto e Santos (2011) afirmam que o trabalho infantil se configura como uma dimensão cultural de gênero, pois há uma "divisão" de atividades nas quais predominam os meninos (frentista, feirante, engraxate, entre outras) e atividades nas quais predominam meninas (trabalho doméstico e exploração sexual) (Alberto e Santos, 2011).

Nessa mesma linha de análise a Organização Internacional do Trabalho publicou um relatório global chamado "Medir o progresso na luta contra o trabalho infantil" (OIT, 2013), no qual foram vistos os principais resultados, progressos e desafios para erradicação do trabalho infantil. Segundo o relatório, desde o ano 2000, a OIT tem estudado e medido o progresso mundial registrado na luta pela redução do trabalho infantil. E, desde 2006, tem realizado esta análise à luz do objetivo definido pela OIT para erradicar as piores formas de trabalho infantil até 2016. Observam-se avanços na redução do trabalho infantil, luta na qual se busca adesão dos governos e da sociedade como um todo (inclusive os empregadores), porém, muito ainda há para ser feito e os números ainda são altos (OIT, 2013).

A alta incidência reside nas várias causas conhecidas (OIT, 2011) acerca do trabalho infantil, dentre elas destacam-se três: a pobreza, a cultura ou imaginário social de que o trabalho é positivo em qualquer idade e a concepção de que o trabalho é disciplinador. Isto explica, em parte, a ideia de que para essas crianças e adolescentes é melhor trabalhar do que ficar "sem fazer nada", como se as únicas possibilidades para estes fossem trabalho ou criminalidade. Esse imaginário do trabalho precoce como formador foi construído socialmente, baseando-se na concepção de que as classes pobres são perigosas e devem ser formadas via trabalho, ou seja, por meio da ocupação, da atividade (Alberto e Santos, 2011). Segundo Alberto e Santos (2011), o trabalho precoce é explorado pelo capitalismo e usado pela sociedade como elemento disciplinador das crianças e adolescentes dos seus segmentos pobres, como meio de evitar seu ingresso na marginalidade. Porém, o trabalho é instrumento de um jogo que tem um duplo papel: ao mesmo tempo em que é usado como modelador, pode causar sofrimento.

Lima e Almeida (2010) chamam atenção para a dificuldade enfrentada por órgãos internacionais e nacionais para definir as fronteiras entre o que é considerado trabalho e o que é considerado uma prática aceitável. Segundo as autoras, para se compreender tais dificuldades, é importante enxergar as outras dimensões que cercam o trabalho infantil para além da econômica. Trabalhar desde cedo, pelo menos para algumas famílias, pode ser percebido como uma regra moral, um princípio de socialização, baseado em um sistema de relações que se situa entre a cooperação e a troca. As relações nas famílias e na sociedade condicionam a existência e o uso do trabalho infantil doméstico reproduzindo uma prática cultural que acaba por naturalizar-se (Alberto e Santos, 2011; Arruda, 2008; Lima e Almeida, 2010; OIT, 2011) ao ponto de se tornar invisível.

 

2 Método

2.1. Participantes

Os participantes foram crianças e adolescentes na faixa etária de 8 a 18 anos. Todos foram consultados acerca da participação, e as autorizações verbais foram gravadas, os pais ou responsáveis autorizaram mediante assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE). O critério de inclusão foi a faixa etária de escolaridade obrigatória (6 a 15 anos) somada à questão da proibição de trabalho doméstico (até 18 anos por estar classificado nas piores formas de trabalho infantil), diante disso, a amostra poderia estar localizada na faixa de 6 a 18 anos.

A pesquisa foi realizada em duas escolas da rede municipal de ensino da cidade de João Pessoa, escolhidas a partir de pesquisa anterior denominada "Trabalho Infantil Doméstico: perfil bio-sócio-econômico e configuração da atividade no município de João Pessoa-PB" (Alberto et al., 2009).

2.2. Instrumentos

Foram utilizados dois instrumentos: a) um questionário "mosquito" que diz respeito aos panfletos que repassam rapidamente informações sobre um determinado assunto e (b) uma entrevista semiestruturada. O primeiro que diz respeito a um questionário breve que visou "sondar" quais as crianças e adolescentes estavam realizando atividades de trabalho no momento da pesquisa. Esse procedimento foi adotado porque estudos anteriores (Alberto et al., 2006; Dantas, 2004; Munich, 2003) constataram que as crianças e adolescentes trabalhadores domésticos têm vergonha de falar para os colegas que realizam esse tipo de atividade, devido ao receio de que sejam vítimas de discriminação social. Foi aplicado coletivamente com as turmas do 1° ao 9° ano (abrange a faixa etária da amostra), nas duas escolas, de acordo com a disponibilidade destas. As perguntas do questionário foram: qual a escola, série e turno em que estuda, nome, idade, sexo raça/etnia, se trabalha, se ajuda em alguma atividade (em caso de resposta afirmativa, em que trabalha ou ajuda).

O segundo instrumento foi uma entrevista semiestruturada, que foi aplicada apenas com os dezesseis participantes (que através do questionário mosquito se identificaram como trabalhadores domésticos, considerando-se o trabalho realizado nas próprias casas). As questões analisadas foram: (a) atividades domésticas que realizam, (b) motivos pelos quais trabalham em casa, (c) quais as atividades realizadas pelos seus responsáveis, (d) idade em que começou a trabalhar e (e) qual o pagamento que recebem.

2.3. Procedimentos de coleta de dados

O projeto de pesquisa foi submetido e aprovado pelo Comitê de Ética da Secretaria de Saúde do Estado da Paraíba. Posteriormente, foram realizadas visitas nas duas escolas para que a pesquisadora explicasse a pesquisa aos diretores e coordenadores das duas instituições. Após aprovada pelos gestores das escolas, foi iniciada a coleta de dados.

2.4. Procedimentos de análise dos dados

Na análise dos dados, adotou-se o seguinte procedimento: os questionários "mosquito" foram lidos atentamente para identificar quais crianças e adolescentes relatavam realizar trabalho doméstico e que posteriormente seriam chamados para a entrevista. A análise das entrevistas foi feita por meio de análise de conteúdo temática (Bardin, 2010) da qual emergiram as categorias: "atividades domésticas que realizam"; "motivos pelos quais trabalham em casa"; "a idade em que começaram a trabalhar"; "ocupações dos responsáveis"; "consequências do trabalho".

 

3 Resultados e discussão

3.1. Questionários

Em relação ao questionário mosquito, foram aplicados 435 questionários nas duas escolas que fizeram parte da pesquisa. Destes, 61 participantes responderam que realizavam algum tipo de atividade de trabalho, sendo que havia quem fizesse mais de uma atividade, chegando a 67 o número de trabalhadores. As atividades de trabalho citadas pelos participantes nos questionários mosquito ficaram distribuídas da seguinte forma, conforme Tabela 1:

Desse total de 67 trabalhadores, 37 (60%) deram indicações de serem trabalhadores domésticos. Tratava-se de respostas nas quais o participante revelava que fazia serviços domésticos, mas às vezes apresentava incongruência com outra resposta, por exemplo, o horário das atividades e da escola eram os mesmos. Portanto, foi feito um contato com os participantes para esclarecimentos acerca destas atividades. Após esses contatos, 22 sujeitos foram confirmados como trabalhadores precoces domésticos. Destes, apenas 16 tiveram permissão dos responsáveis para participar da entrevista semiestruturada.

Apesar de a pesquisa abordar o trabalho infantil doméstico, o questionário mosquito possibilitou identificar o quão o trabalho infantil é invisível e se faz presente na realidade de crianças e adolescentes, a tal ponto que a presente pesquisa cujo lócus foi a escola, encontrou 14 tipos de atividades de trabalho diferentes, o TID e outras 13 atividades. Esse dado coaduna-se com os dados do IBGE que revelam que o número de crianças e adolescentes que estudam e trabalham é de três milhões, o que corresponde a 6,9% das crianças brasileiras (Fórum Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil [FNPETI], 2013).

Percebe-se também a presença invisível de crianças e adolescentes nos serviços domésticos ou atividades de caráter comercial, feitas no âmbito doméstico, tais como entregar marmitas e vender comida na rua. De modo que o trabalho doméstico atravessa o cotidiano das crianças e adolescentes deste estudo à semelhança do que ocorre no restante do país, como revela a PNAD 2011. Dos 42,7 milhões de crianças e adolescentes de 5 a 17 anos de idade vivendo no Brasil em 2011, 3,7 milhões realizavam algum tipo de trabalho, e dessas, 258 mil (7%) estavam ocupadas nos serviços domésticos, trabalho este proibido para essa faixa etária.

3.2. Dados sociodemográficos

Dos 16 participantes das entrevistas, 14 são do sexo feminino e dois são do sexo masculino. As idades variaram de 8 a 18 anos. No que diz respeito à raça/etnia, 6 se identificaram como morenos, 8 se identificaram como pardos, 1 se identificou como branco e um se identificou como amarelo. Os dados aqui identificados corroboram outros autores (Abramo, 2004; Alberto et al., 2006; Moreira & Stengel, 2003; Whitaker, 2002), que identificaram o trabalho precoce doméstico como uma questão de gênero, pois a grande maioria da amostra é composta de meninas.

A prevalência da raça/etnia afrodescendente fica visível, pois, embora a amostra seja pequena, predominou uma autodefinição de participantes morenos e pardos. Silva (2009) em uma pesquisa sobre trabalho infantil doméstico em São Luís - MA, identificou que pelo menos 84% das crianças e adolescentes envolvidas no trabalho doméstico eram afrodescendentes. O trabalho infantil doméstico no Brasil é, em sua maioria, composto de negros, que representava 67% das crianças e adolescentes ocupados nessa atividade (FNPETI, 2013).

3.3. Caracterização das atividades de trabalho doméstico

Quanto às atividades domésticas que realizam, os dados deram conta de três categorias: (a) cuidar da casa, (b) cuidar de pessoas e (c) cuidar da alimentação. A categoria cuidar da casa abrange atividades como: varrer, passar pano no chão, lavar louça, arrumar o quarto, lavar banheiro, lavar roupas, limpar o fogão, estender roupas. A categoria cuidar de crianças abrange atividades como: cuidar dos irmãos, cuidar de parentes menores (como primos), ajudar a cuidar de crianças no trabalho da mãe; e apenas um participante se referiu a "dar banho na avó". A categoria cuidar da alimentação abrange fazer comida e, em um dos casos, fechar quentinhas e entregar. Os dados encontrados por Alberto et al. (2006) corroboram os dados encontrados aqui. Segundo os autores, dentre as tarefas que as crianças e adolescentes desempenham, destacam-se as atividades relativas a cuidar da casa, como: varrer, lavar louça, colocar lixo fora, lavar banheiro, passar pano no chão, brincar com criança, lavar roupa, limpar geladeira, entre outros. Silva (2002) também identificou entre as trabalhadoras plantadoras de cana-de-açúcar que suas filhas são trabalhadoras domésticas e que essas meninas além de substituir suas mães para elas trabalharem fora de casa realizam os serviços de cuidar de crianças menores, fazer comida e cuidar da casa.

Nesse sentido, Aued e Vendramini (2009) em pesquisa sobre trabalho infantil na indústria e na agricultura, encontraram crianças realizando os serviços de cuidar da roupa, da comida e da casa. Algumas crianças e adolescentes cuidavam da casa e da alimentação sozinhas enquanto a mãe trabalhava fora.  Quando sofriam algum tipo de acidente (queimadura, fratura) e tinham que ir para o hospital, as mães ficavam angustiadas sem saber o que fazer sem a "ajuda" dos filhos nos afazeres domésticos (Aued & Vendramini, 2009). Arruda (2008) também verificou em pesquisa sobre TID que as meninas trabalhadoras domésticas realizam os serviços de cuidar da casa e, principalmente, cuidar de crianças menores.

Os achados dessa pesquisa em consonância com a literatura possibilitam a reflexão de que as características do TID revelam a predominância de crianças e adolescentes em todos os serviços domésticos. Esses trabalhadores partilham de todo o processo de trabalho doméstico (casa, alimentação, roupa e cuidado com pessoas), porém, isso invisibiliza o trabalho infantil ao se fazer crer que esse sujeito em processo de desenvolvimento está em formação ao realizar essas atividades domésticas, logo sua atividade nos lares seria apenas socialização.

3.4. Condições de trabalho enfrentadas pelas crianças e adolescentes

Ao se analisar os motivos pelos quais trabalham em casa, as respostas possibilitaram a emergência de duas categorias temáticas: socialização e ajuda. A categoria socialização diz respeito às respostas nas quais os entrevistados afirmam que fazem as atividades domésticas porque querem ajudar a mãe ou responsável: "Porque eu gosto, eu quero ajudar minha mãe" (Participante 11); "Porque eu gosto de ajudar minha mãe" (Participante 7). A categoria ajuda diz respeito às falas nas quais os entrevistados percebem a necessidade de trabalhar em casa para liberar a mãe para trabalhar fora e sustentar a família: "Porque minha mãe trabalha e não tem como ela trabalhar e arrumar a casa quando chegar" (Participante 9). Apesar de desempenhar as atividades de serviço doméstico, as crianças e os adolescentes entrevistados não percebiam esses serviços como trabalho, porque o fazem para ajudar a mãe ou responsável. O que demonstra a necessidade de refletir sobre o TID considerando-se os vários aspectos, pois o exercício no âmbito do lar, no contexto da família, o torna invisível.

Nessa questão, observou-se que as condições concretas de vida determinam e colocam essas crianças e adolescentes na realidade do trabalho. O trabalho precoce doméstico é socialmente aceito como formador e os responsáveis acham natural esse trabalho e inserem a criança nas atividades domésticas. Percebe-se que a questão econômica das condições sociais de vida se junta à questão cultural. Alberto e Santos (2011) corroboram esse pensamento quando afirmam que a forma de relacionamento com os outrosé um elemento importante para se compreender a questão do trabalho infantil. Segundo Arruda (2008), a ideia de acostumar meninas de classes menos favorecidas às atividades de trabalho doméstico é comum e muito forte no Brasil, e parte da concepção de que o trabalho nos lares faz parte de sua formação, gerando aprendizado e até uma profissão, caso nenhuma outra dê certo.

A inserção precoce no trabalho, sobretudo em atividades como o trabalho informal urbano e o trabalho doméstico, tem como motivos, além da necessidade financeira, uma rede de relações que a oportuniza (OIT, 2006) ou uma cultura das redes sociais que a favorecem (OIT, 2006). O termo "redes sociais"refere-se à reinserção da criança e/ou adolescente no trabalho proporcionada por familiares, vizinhos ou outros parentes, em locais onde existe uma demanda por mão de obra mais barata, necessidade econômica das famílias e escassez de equipamentos institucionais no espaço em que essas crianças e adolescentes se situam. A visão dos adultos acerca da criança e do adolescente permeia esse meio relacional e é pautada na disponibilização deles para as atividades a eles designadas pelos adultos para contribuírem na manutenção familiar, ou mesmo na percepção deles como sujeitos que devem ser educados para o trabalho e ocupados pelo trabalho.

Ao ser abordado sobre a idade em que começaram a trabalhar, as idades variaram de quatro a quatorze anos. Moreira e Stengel (2003) observaram que as meninas iniciam no serviço doméstico bastante cedo, o que significa que a infância, para as classes pobres, acaba mais cedo, em especial para as meninas. Os dados corroboram outras pesquisas que mostram que a análise do trabalho infantil não pode ser feita considerando-se apenas os fatores econômicos, mas que é preciso levar-se em conta fatores de ordem cultural, intergeracional, de sexo e raça (Sarti, 1996).

Tanto a perda da infância como o trabalho infantil ferem os direitos fundamentais de crianças e adolescentes, artigos 3º, 4º e 5º do ECA (1990) e põem em risco o desenvolvimento físico, moral, psicológico e social. A invisibilidade do TID que esse artigo traz à tona revela que o Brasil também viola a Legislação Internacional da qual é signatário. Nesse caso, tanto a Convenção 138 (1973) (Artigo 1º que trata do compromisso de abolição do trabalho infantil), como a Convenção 182 (1999) (Artigo 1º, 3º, 4º e 6º compromisso de abolição e eliminação das piores formas).

Dellazzana e Freitas (2010) observaram que meninas a partir dos doze anos já começam a cuidar dos irmãos mais novos, assumindo todas as responsabilidades sobre eles. As autoras citam em sua pesquisa que as adolescentes que cuidam dos irmãos menores assumem atividades como: servir o café da manhã, o almoço, o café da tarde, a janta, dar mamadeira, vestir e pentear, levar e buscar na escola e na atividade extraclasse, dar banho, colocar os irmãos para que eles assistam televisão, fazer dormir, trocar as fraldas e cuidar dos irmãos enquanto eles estão brincando.

O cuidar dos irmãos ou da casa relaciona-se com as ocupações dos pais ou responsáveis. De modo que quando questionados acerca das "ocupações dos responsáveis", os dados deram conta de três categorias temáticas: trabalha em casa, trabalha em casa com remuneração, trabalha fora. A categoria trabalha em casa diz respeito aos responsáveis que realizam o trabalho doméstico da própria casa e os entrevistados auxiliam nesse trabalho: "Minha mãe tá em casa fazendo o almoço." (Participante 10).

A categoria trabalha em casa com remuneração diz respeito aos responsáveis que ficam em casa, mas realizam atividades remuneradas para outras pessoas e os entrevistados ficam "responsáveis" pelos afazeres domésticos: "Ela fica em casa debulhando feijão... ela dá pro homem e o homem dá o dinheiro a ela" (Participante 5); "Ela está em casa fazendo as quentinhas" (Participante 6).

Nestes casos, as crianças e os adolescentes não recebem nenhum tipo de pagamento, porém, contribuem indiretamente na renda familiar, uma vez que, cuidando da casa, liberam os adultos para realizar outras atividades remuneradas. As crianças e adolescentes não se dão conta disso, pois se trata de uma questão cultural. É um comportamento naturalizado, no qual essas famílias "reproduzem" o que está posto socialmente, e provavelmente, também foi assim na infância das mães, que reproduzem questões internalizadas do meio sociocultural.

A categoria trabalha fora diz respeito aos responsáveis que se ausentam de casa para trabalhar, enquanto os filhos cuidam da casa: "Ela [mãe] trabalha de manhã e de tarde, só que quatro horas ela já está em casa" (Participante 3); "Mainha tá trabalhando" (Participante 16). Alguns autores (Alberto et. al., 2006; Moreira & Stengel, 2003) chamam a atenção para o fato de que a discussão de trabalho doméstico leva à necessidade da reflexão acerca do serviço doméstico, o qual remete ao caráter socializador no desempenho de papéis de gênero e do não reconhecimento.  Essa realidade torna o TID invisível, pois não é visto como trabalho, mas como "afazeres" da vida cotidiana dessas crianças.

Esses trabalhadores precoces não contribuem com a renda familiar diretamente, mas indiretamente, com seu trabalho. Esse dado revela não apenas a contribuição do trabalho precoce no conjunto familiar, no complemento das finanças da família, mas, também, no processo capitalista, uma vez que não se conta na renda geral da família, aparecendo no processo de reprodução da mesma.

Nessa linha de reflexão, Aued e Vendramini (2009) observaram que na maioria dos casos de trabalho doméstico os responsáveis precisavam se ausentar de casa para trabalhar, deixando o cuidado da casa por conta das crianças e adolescentes. Em uma das entrevistas realizadas pelos autores, a mãe comenta: "Agora estou perdida, ele é quem cuida da roupa, da louça, da comida e da casa. É meu braço direito". Essa mãe refere-se ao filho de dez anos que foi hospitalizado por conta de uma fratura no braço (Aued & Vendramini, 2009).

3.5. Invisibilidade do trabalho infantil doméstico

As modalidades de trabalho doméstico, aqui chamadas de "socialização" e "ajuda", dão um caráter de invisibilidade ao trabalho dessas crianças e adolescentes. Por não receberem pagamento em dinheiro, ou não ter uma relação de trabalho estabelecida, por estarem mergulhadas na dimensão de gênero e de participação de aprendizagem da vida social, muitas vezes essas atividades não são vistas como trabalho. Nos dados do presente estudo, pôde-se observar que sete participantes se enquadraram na modalidade "socialização" (é considerado todo o trabalho realizado na própria casa e que tem o caráter de participação e contribuição na vida familiar), oito participantes se enquadraram na modalidade "ajuda" (diz respeito ao trabalho realizado na casa da família ou de terceiros; a criança ou adolescente assume responsabilidades pelo cuidado da casa ou de pessoas, liberando os adultos para realizarem outras atividades, contribuindo de forma indireta para a renda familiar) e apenas um participante se enquadrou na modalidade "remunerado" (aquele trabalho no qual a criança recebe um pagamento em dinheiro ou gêneros). Para algumas crianças e adolescentes, e também para os responsáveis, o trabalho doméstico (mesmo dos tipos socialização e ajuda) é visto como uma "obrigação" para contribuir no funcionamento da família. Moreira e Stengel (2003) fazem essa distinção da remuneração, destacando que o trabalho doméstico pode ser remunerado em dinheiro ou outros objetos; já no serviço doméstico na própria casa, não há nenhuma espécie de remuneração. Esse fator soma-se ao caráter de socialização que o torna invisível.

Há uma diferença sutil entre a modalidade "socialização" e a modalidade "ajuda".  Na primeira, as atividades delegadas às crianças e adolescentes são de caráter educativo, formador, e se somam às atividades dos adultos, se articulam e se misturam com a participação na família; "[...] eu gosto de ajudar minha mãe" (Participante 7), por outro lado, na modalidade ajuda, os responsáveis precisam se ausentar dos afazeres domésticos para realizar outras atividades, delegando assim afazeres às crianças e adolescentes; "[...] minha mãe trabalha e não tem como ela trabalhar e arrumar a casa quando chegar" (Participante 9).

Lima e Almeida (2010) identificaram que para as meninas, a ajuda doméstica é tratada mais no registro da "obrigação", isto é, são atividades cotidianas regulares que podem ser bastante intensas, vivenciadas a partir de um enquadramento moral mais explícito. As atividades domésticas não são consideradas trabalho, mas sim uma obrigação das meninas no processo de educação transmitido nas famílias. Nessa linha de discussão, segundo Silva (2009), o trabalho infantil doméstico pode ser caracterizado pela invisibilidade causada pela "fronteira" da esfera privada da família. Segundo a autora, existem sérias dificuldades de ação das políticas públicas em relação ao trabalho infantil doméstico, seja por essa "invisibilidade", seja pela não percepção desse tema como um problema social.

3.6. Consequências do trabalho infantil doméstico

Foram encontradas algumas referências às implicações ou consequências do trabalho infantil tais como cansaço, fadiga, sobrecarga e comprometimento das atividades escolares, que podem ser vistos em algumas falas dos entrevistados, quando indagados acerca da relação trabalho e escola. "É meio difícil... porque além de ajudar minha mãe tenho que vim pra escola, da escola ir pra casa e ainda fazer as tarefas de casa" (Participante 1). De modo que no final do dia as participantes se sentem cansadas, como revelam estas falas: "Me sinto cansada, enfadada" (Participante 3); "Me sinto cansada, dá vontade de dormir" (Participante 10).

Aos participantes foi perguntado se pudessem escolher entre trabalho e escola, o que escolheriam, e a maioria das respostas foi do tipo: Preferia só estudar... pra mim seguir na vida, pra mim não acabar como minha mãe" (Participante 12). Mas também houve quem respondesse: "Eu escolhia os dois. Porque quero ajudar minha mãe porque ela faz muita coisa pra mim... e estudar porque eu quero ser alguém na vida" (Participante 14). Dados que revelam um paradoxo entre a internalização da socialização e a detecção do prejuízo.

Pode-se perceber que a maioria dos entrevistados faz as tarefas da escola à noite, após um dia cansativo de escola e trabalho. A rotina dessas crianças e adolescentes é bem apertada, pois os entrevistados afirmam que têm pouco tempo para fazer as tarefas da escola que são enviadas para casa: "Quando dá tempo pra fazer em casa eu faço, antes de dormir, umas 11:30; ou senão eu faço logo cedo antes de ir pra escola" (Participante 2). E não há muito tempo para o lazer, segundo a maioria deles: "Quando eu tô em casa eu só brinco quando termino de fazer as tarefas e termino o trabalho" (Participante 10). Esses dados, apesar de paradoxais revelam os agravos à saúde que o TID socialização e o TID ajuda representam (Alberto & Santos, 2011), o que leva a OIT (2011) a qualificar como perigoso quando são realizados por longas horas do dia e interferem na escolarização.

 

4 Considerações finais

Os dados identificados revelam um conjunto de atividades desempenhadas por crianças e adolescentes que começam cedo, nas suas casas ou de terceiros, a cuidar da casa, das pessoas e da alimentação, além de contribuir na família, que pode contar com seu trabalho doméstico para o funcionamento do lar e ausência dos responsáveis para trabalhar fora. O TID socialização e o TID ajuda descortinam a invisibilidade das atividades que se revelam como mobilizadoras da saúde, pois exigem tempo, e podem afetar outras áreas da vida, como estudo e lazer.

Este artigo, ao tornar visível o TID no interior dos lares, pode contribuir com a escola e as políticas públicas para refletir sobre formas de combate ao trabalho infantil, tendo a própria escola como parceira, inclusive no diagnóstico do problema. Ao mesmo tempo possibilita avançar no alcance de conceitos que sejam representativos da complexidade e da variabilidade do trabalho infantil, em especial o doméstico, que necessita articular os processos de trabalho, a cultura e socialização de gênero e as modalidades da educação de crianças e adolescentes no âmbito dos lares e do impacto dos mesmos no desenvolvimento humano.

O presente estudo foi importante para a temática em questão, mas uma das limitações diz respeito ao tamanho da amostra. Seria fundamental investigar em outras escolas, incluindo escolas públicas estaduais, não apenas municipais. Outro fator importante é da discussão dos resultados encontrados com as escolas, para que a pesquisa tenha efeito na sociedade, trazendo reflexões acerca da temática com os sujeitos que estão envolvidos.

 

Referências

Abramo, L. (2004). Perspectiva de gênero e raça nas políticas públicas. In Ministério do Trabalho e Emprego, Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, Mercado de Trabalho: Conjuntura e Análise [pp. 17-21]. Brasília, DF: Ipea/ MTE.         [ Links ]

Alberto, M. F. P., & Santos, D. P. (2011). Trabalho infantil e desenvolvimento: Reflexões à luz de Vigotski. Revista Psicologia em Estudo, 16(20), 209-218. Recuperado em 10 de Maio de 2014, de http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1413-73722011000200004&lng=pt&nrm=iso        [ Links ]

Alberto, M. F. P., Nunes, T. S., Cavalcante, C. P., & Santos, D. P. (2006). O trabalho infantil doméstico em João Pessoa - PB: Um diagnóstico rápido à luz das piores formas de trabalho infantil. Brasília, DF: OIT.         [ Links ]

Alberto, M. F. P., Santos, D. P., Leite, F. M., Lima, J. W., Paixão, G. P. & Silva, S. A. (2009). Trabalho infantil doméstico: perfil bio-sócio-econômico e configuração da atividade no município de João Pessoa, PB. Cadernos de Psicologia Social do Trabalho,12(1). Recuperado em 10 de Maio de 2014, de http://www.revistas.usp.br/cpst/article/view/25775        [ Links ]

Arruda, K. M. (2008). O trabalho infantil doméstico: Rompendo com o conto da Cinderela. Revista de Informação Legislativa. (178), 285-291. Recuperado em 15 de Maio de 2014, de http://www.trt3.jus.br/escola/download/revista/rev_75/Katia_Arruda.pdf        [ Links ]

Aued, B. W., & Vendramini, C. R. (2009). A persistência do trabalho infantil na indústria e na agricultura (Santa Catarina no contexto Brasileiro). Florianópolis, SC: Insular.         [ Links ]

Bardin, L. (2010). Análise de Conteúdo. Lisboa – Portugal: Editora 70.

Becker, J. (2014, 28 de Abril). Comunicação pessoal retirada do Site do Tribunal de Justiça do Estado da Bahia, arquivada em http://www5.tjba.jus.br/infanciaejuventude/index.php?option=com_content&view=article&id=846        [ Links ]

Convenção nº 138, aprovada em 27 de Junho de 1973, promulgada no Brasil pelo decreto 4.134 de 15 de Fevereiro de 2002. Dispõe sobre a idade mínima de admissão a emprego. Recuperado em 15 de Abril de 2014, de http://portal.mte.gov.br/data/files/FF8080812BAFFE3B012BCA906FCD1165/cv_138.pdf        [ Links ]

Convenção nº 182, aprovada em 17 de Junho de 1999, promulgada no Brasil pelo decreto 3.597 de 12 de Setembro de 2000. Dispõe sobre a proibição das piores formas de trabalho infantil e a ação imediata para sua eliminação. Recuperado em 15 de Abril de 2014, de http://www.tjpb.jus.br/wp-content/uploads/2012/05/Convencao-n.-182-e-Decreto-6481.pdf        [ Links ]

Dantas, A. P. A. (2004). Trabalho Infanto-juvenil doméstico como violação dos direitos humanos. Monografia de Graduação em Psicologia. Universidade Federal da Paraíba, João Pessoa. PB, Brasil.         [ Links ]

Dellazzana, L. L., & Freitas, L. B. L. (2010). Um dia na vida de irmãos que cuidam de irmãos. Psicologia: Teoria e Pesquisa, 26(4), 595-603. Recuperado em 15 de Maio de 2014, de http://www.scielo.br/pdf/ptp/v26n4/03.pdf        [ Links ]

Fórum Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil (2013). O trabalho infantil doméstico no Brasil: Avaliação a partir dos microdados da PNAD/IBGE (2008-2011). Brasília, DF: Autor.         [ Links ]

Lei nº 8.069, de 13 de Julho de 1990 (1990). Dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente e dá outras providências. Brasília, DF: Secretaria dos Direitos Humanos/ Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (CONANDA). Recuperado em 10 de Fevereiro de 2014, de http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8069.htm        [ Links ]

Lima, A. C., & Almeida, A. M. F. (2010). Permanências e mutações na definição intergeracional do trabalho infantil. Revista Educação & Sociedade, 31(111), 347-369.  Recuperado em 15 de Maio de 2014, de http://www.scielo.br/pdf/es/v31n111/v31n111a04.pdf        [ Links ]

Moreira, M. I., & Stengel, M. (2003). Narrativas infanto-juvenis sobre o trabalho doméstico. Belo Horizonte, MG: PUC Minas.         [ Links ]

Munich, S. (2003). As condições e o sentido do trabalho doméstico realizado por adolescentes que residem no local de emprego. Dissertação de Mestrado, Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, RN, Brasil. Recuperado em 30 de Abril de 2014, de http://ftp.ufrn.br/pub/biblioteca/ext/bdtd/MunichVS.pdf        [ Links ]

Organização Internacional do Trabalho (2006). O trabalho infantil doméstico em quatro Estados do país: Maranhão, Paraíba, Rio Grande do Sul e São Paulo. (Relatório de pesquisa não publicado). João Pessoa: OIT.         [ Links ]

Organização Internacional do Trabalho (2011). Notas OIT – O Trabalho Doméstico Remunerado na América Latina e Caribe. Programa Internacional para a Eliminação do Trabalho Infantil (IPEC). Recuperado em 08 de Abril de 2014, de http://www.oitbrasil.org.br/content/notas-da-s%C3%A9rie-da-oit-%E2%80%9Ctrabalho-dom%C3%A9stico-remunerado-na-america-latina-e-caribe%E2%80%9D-trazem-info

Organização Internacional do Trabalho (2013). Medir o progresso na luta contra o trabalho infantil: Estimativas e tendências mundiais 2000-2012. Genebra: Departamento de Governança e Tripartismo. Bureau international do Trabalho, Programa Internacional para a Eliminação do Trabalho Infantil (IPEC).         [ Links ]

Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (2011). Título. Recuperado em 10 de Abril de 2014, de http://www.ibge.gov.br/home/presidencia/noticias/imprensa/ppts/00000010135709212012572220530659.pdf        [ Links ]

Rocha, G. F. (2011). O trabalho precoce doméstico e o processo escolar. Dissertação de Mestrado, Universidade Federal da Paraíba, João Pessoa, PB, Brasil. Recuperado em 05 de Abril de 2014, de http://bdtd.biblioteca.ufpb.br/tde_busca/arquivo.php?codArquivo=1464        [ Links ]

Sarti, C. A. (1996). A família como espelho: Um estudo sobre a moral dos pobres. Campinas, SP: Autores Associados.         [ Links ]

Silva, M. R. (2002). Recortando e colando as imagens da vida cotidiana do trabalho e da cultura lúdica das meninas-mulheres e das mulheres-meninas da zona da mata canavieira pernambucana. Cadernos Cedes, 22(56), 23-52. Recuperado em 28 de Abril de 2014, de http://www.scielo.br/pdf/ccedes/v22n56/10863.pdf        [ Links ]

Silva, C. C. S. (2009). Trabalho Infantil Doméstico: Perfil e vivências de meninas trabalhadoras em São Luís. Dissertação de Mestrado, Universidade Federal do Maranhão, São Luís, MA, Brasil. Recuperado em 08 de Maio de 2014, de http://www.tedebc.ufma.br//tde_busca/arquivo.php?codArquivo=342        [ Links ]

Whitaker, D. C. A. (2002). Nas franjas do rural-urbano: Meninas entre a tradição e a modernidade. Cadernos Cedes, 22(56), 7-22. Recuperado em 18 de Maio de 2014, de http://www.scielo.br/pdf/ccedes/v22n56/10862.pdf        [ Links ]

 

 

Endereço para correspondência
Gabriela Fernandes Rocha Patriota
Universidade Federal da Paraíba
Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes
Programa de Pós-graduação em Psicologia Social
Cidade Universitária, s/n - Castelo Branco, CEP 58051-900, João Pessoa – PB, Brasil
Endereço eletrônico: gabifernandesrocha@gmail.com
Maria de Fatima Pereira Alberto
Universidade Federal da Paraíba
Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes
Programa de Pós-graduação em Psicologia Social
Cidade Universitária, s/n - Castelo Branco, CEP 58051-900, João Pessoa – PB, Brasil
Endereço eletrônico: jfalberto@uol.com.br

Recebido em: 14/06/2014
Reformulado em: 01/09/2014
Aceito para publicação em: 26/09/2014

 

 

Notas

* Mestre em Psicologia Social pela Universidade Federal da Paraíba, João Pessoa-PB, Brasil.
** Doutora em Sociologia pela Universidade Federal de Pernambuco, Professora Associada do Departamento de Psicologia e do Programa de Pós-Graduação em Psicologia Social da Universidade Federal da Paraíba (UFPB). Coordenadora do Núcleo de Pesquisas e Estudos sobre o Desenvolvimento da Infância e Adolescência (NUPEDIA), integrante do GT Juventude e Resiliência da ANPEPP, bolsista produtividade do CNPq.