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Estudos e Pesquisas em Psicologia

versão On-line ISSN 1808-4281

Estud. pesqui. psicol. vol.15 no.3 Rio de Janeiro nov. 2015

 

PSICOLOGIA DO DESENVOLVIMENTO

 

Vivências e Expectativas de Mães com Recém-nascidos Pré-termo Internados em Unidade de Terapia Intensiva Neonatal

 

Experience and Expectations of Mothers of Preterm Newborns Hospitalized in Neonatal Intensive Care Unit

 

Vivencias y Expectativas de Madres con Recién Nacidos Pretérminos Internados en Unidad de Terapia Intensiva Neonatal

 

Elâine Cristina Vargas Dadalto*; Edinete Maria Rosa**

Universidade Federal do Espírito Santo - UFES, Vitória, Espírito Santo, Brasil

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

O objetivo deste trabalho foi o de conhecer vivências e expectativas de mães com recém-nascidos pré-termo internados em unidades de terapia intensiva neonatal (UTINs) avaliando processos proximais iniciais mãe-filho. O planejamento foi pelaTeoria Bioecológica do Desenvolvimento Humano, com a participação de 62 mães. A maioria delas nunca tinha pensado na possibilidade da hospitalização do filho. A UTIN foi descrita como ambiente de cuidado e atenção, mas a vivência foi avaliada como evento impactante, independente da escolaridade, classe econômica, tipo de UTIN e idade gestacional (p>0,05), relatando tristeza e preocupação (45,2%), rotina cansativa, mas necessária (24,2%) e, mesmo diante da felicidade pela recuperação, o período inicial foi difícil e doloroso (30,6%). Para a maioria não terá consequência negativa na relação mãe-bebê (66,2%) e os processos proximais iniciais combinaram contato físico, conversa e amamentação.As mães estavam enfrentando a hospitalização do bebê sob perspectiva positiva, a partir dos próprios recursos biopsicológicos, apoio familiar e profissional.

Palavras-chave: Relações mãe-filho, recém-nascido, nascimento prematuro, terapia intensiva neonatal.


ABSTRACT

The purpose was understand mothers' experiences and expectations towards preterm newborns hospitalized at neonatal intensive care units (NICUs), evaluating the initial proximal processes between mother-child. Planning was based on Bioecological Theory of Human Development, with participation of 62 mothers. Most mothers had never thought about the possibility of child's hospitalization. NICU was described as an environment of care and attention, but the experience was evaluated as a shocking event, regardless of educational background, social class, type of NICU and gestational age (p>0.05); they reported sadness and concern (45.2%), tiring but necessary routine (24.2%); and, even in face of happiness about recovery, the initial period was hard and painful (30.6%). For the majority there will be no negative consequences in mother-infant relationship (66.2%) and initial proximal processes combined physical contact, conversation and breastfeeding. Mothers were facing infant hospitalization under positive perspective, from their own bio-psychological resources, family and professional support.

Keywords: Mother-child relations, infant, newborn, premature birth, neonatal intensive care.


RESUMEN

El objetivo fue conocer vivencias y expectativas de madres con recién nacidos pretérminos internados en unidades de terapia intensiva neonatal (UTINs) para evaluar procesos proximales iniciales madre-hijo. Planificación hecha con la Teoría Bioecológica del Desarrollo Humano, con participación de 62 madres. La mayoría nunca pensó hospitalizar al hijo. La UTIN fue descrita como ambiente de cuidado y atención, pero la vivencia fue evaluada como evento impactante, sin importar el nivel de escolarización, clase económica, tipo de UTIN y edad gestacional (p>0,05); relata tristeza y preocupación (45,20%); rutina agotadora, pero necesaria (24,2%) y, a pesar de la felicidad por la recuperación, el período inicial fue difícil y doloroso (30,6%). Para la mayoría no habrá consecuencia negativa en la relación madre-bebé (66,2%) e procesos proximales iniciales combinaron contacto físico, conversación y lactancia. Las madres enfrentaron la hospitalización del bebé positivamente, a partir de los propios recursos biopsicológicos, apoyo familiar y profesional.

Palabras-clave: Relaciones madre-hijo, recién nacido, nacimiento prematuro, terapia intensiva neonatal.


 

 

1 Introdução

Os altos índices de sobrevivência de recém-nascidos pré-termo (RNPTs) com baixo peso ao nascimento e o aumento da prematuridade no Brasil justificam o planejamento de ações voltadas para essa população que apresenta maior risco ao desenvolvimento (Silveira et al., 2008), dificuldades no desempenho cognitivo, linguístico, motor e problemas de comportamento (Silveira & Enumo, 2012). A existência desse maior risco foi demonstrada até para RNPTs com maior idade gestacional (Espírito Santo, Portuguez, & Nunes, 2009).

Sintomas depressivos (Miles, Holditch-Davis, Schwartz, & Scher, 2007) e de ansiedade durante a hospitalização foram mais altos em mães de RNPTs quando comparadas com mães de recém-nascidos a termo (Padovani, Carvalho, Duarte, Martinez, & Linhares, 2009), o que foi considerado estressante e emocionalmente desafiador, capaz de gerar impacto no comportamento materno (Correia, Carvalho, & Linhares, 2008; Wakely, Rae, & Cooper, 2010).

O nascimento de um bebê pré-termo de peso extremamente baixo, a ansiedade materna na unidade de terapia intensiva neonatal (UTIN) e a experiência traumática da mãe em relação a esses eventos podem exercer influência nos comportamentos interativos mãe-bebê nos primeiros anos da infância em comparação com bebês nascidos a termo. A identificação precoce de mães ansiosas e bebês com risco de desenvolver atrasos cognitivos tem como objetivo iniciar uma intervenção preventiva de suporte para o relacionamento mãe-bebê (Feldman & Eidelman, 2006; Zelkowitz, Papageorgiou, Bardin, & Wang, 2009).

A separação física devido à internação hospitalar é uma das dificuldades fundamentais no estabelecimento de interações eficazes entre a mãe e o RNPT, podendo desencadear nas mães reações emocionais de culpabilidade e medo, ao se verem impedidas de interagir com o filho (Camarneiro, Alves, Ferreira, & Gomes, 2009). Por outro lado, a partir da convivência com profissionais da UTIN, as mães podem superar seus medos e tornar-se familiarizadas no contexto hospitalar, aprendendo a cuidar do filho por meio de atividades desenvolvidas pela equipe, especialmente a partir do empenho dos profissionais para criar oportunidades de empoderamento das mães (Andrade, 2011; Melnyk, Crean, Feinstein & Fairbanks, 2008; Silva & Silva, 2009). Nesse ponto, o estabelecimento do aleitamento materno pode contribuir para melhorar o estado emocional da mãe e aumentar os comportamentos interativos, contribuindo indiretamente para o desenvolvimento do RNPT (Feldman & Eidelman, 2003).

Entre as estratégias utilizadas pelas mães para enfrentamento do stress inicial foram discutidos nas pesquisas: emprego mais frequente de estratégias emocionais do que estratégias para resolução do problema (Libera, Darmochwal-Kolarz, & Oleszczuk, 2007); influência de a mãe cantar para seu bebê (Cevasco, 2008); apoio familiar (Taubman-Bem-Ari, Findler, & Kuint, 2010); aumento da confiança materna no método mãe-canguru (Jonhson, 2007); e maior envolvimento do pai (Lee, Miles, & Holditch-Davis, 2006). Programas de suporte para estimular estratégias de enfrentamento das mães foram relacionados com menor grau de ansiedade e depressão, índices mais altos de interação mãe-bebê e redução do tempo de internação (Melnyk et al., 2008; Miles et al., 2007). O livre acesso ao RNPT também contribui para promover a qualidade das interações (Camarneiro et al., 2009).

Para contemplar a análise dos fatores relacionados ao nascimento pré-termo e à vivência das mães em UTIN, o planejamento do presente estudo foi baseado na Teoria Bioecológica do Desenvolvimento Humano (TBDH) proposta por Bronfenbrenner (2001), cuja base constitui-se de quatro componentes principais e as relações entre eles, compondo o modelo processo–pessoa–contexto–tempo. O construto processo define-se como a interação entre a pessoa e seu ambiente, considerado na TBDH como o mecanismo primário produtor do desenvolvimento, especificamente os processos proximais (Bronfenbrenner & Morris, 2006), capazes de estimular o potencial genético para o desenvolvimento psicológico eficiente e para interações com o ambiente externo (Bronfenbrenner & Ceci, 1994).

O poder de influência dos processos proximais varia em função das características da pessoa, do seu contexto ambiental imediato e mais remoto e dos períodos de tempo nos quais esses processos atuam. As características da pessoa podem influenciar o desenvolvimento pela sua capacidade de afetar os processos proximais e também como resultado do desenvolvimento, representado pelas características pessoais que emergem no curso da vida (Bronfenbrenner & Morris, 2006). O contexto ambiental mais imediato, em que as relações pessoais ocorrem face-a-face, é denominado microssistema, e o conjunto de microssistemas e as relações entre eles são designados mesossistema (Bronfenbrenner, 1994). Sob a perspectiva da TBDH, o presente trabalho teve por objetivo conhecer as vivências e expectativas de mães com recém-nascidos pré-termo internados em unidades de terapia intensiva neonatal, avaliando o estabelecimento dos processos proximais iniciais entre mãe e filho.

 

2 Método

2.1. Participantes

Este trabalho apresenta a análise dos dados coletados a partir de entrevistas com mães de RNPTs internados em uma UTIN particular (UTIN A) e uma UTIN pertencente ao sistema público de saúde (UTIN B), localizadas em um município brasileiro integrante de uma região metropolitana de médio porte. As visitas aos hospitais foram planejadas com regularidade média de duas vezes por semana, tendo sido realizadas 46 visitas à UTIN A e 44 à UTIN B. Os registros preliminares de 115 recém-nascidos na UTIN A e 100 na UTIN B foram analisados quanto à idade gestacional (IG) e ao peso do recém-nascido (RN), para direcionar a triagem conforme os critérios de seleção, ou seja, RNPT com IG inferior a 37 semanas (World Health Organization, 2014), que não apresentassem distúrbios neurológicos e já estivessem no setor de médio risco. Não foram incluídas mães com comprometimento cognitivo, usuárias de drogas e com diagnóstico de depressão pós-parto. O número de participantes selecionadas para a primeira entrevista foi de 64, entretanto foram excluídos dois casos em que as mães não concluíram a entrevista inicial e desistiram do estudo, permanecendo 62 participantes.

2.2. Instrumentos

Os instrumentos utilizados para a coleta dos dados foram elaborados pelas autoras especificamente para o presente estudo. Um formulário denominado "Coleta de Dados Neonatais" organizava as informações obtidas do prontuário do RNPT na UTIN por sexo, data de nascimento, idade gestacional, peso ao nascimento, tempo de internação, tipo de UTIN e tempo de sonda orogástrica (SOG). A entrevista com as mães foi elaborada com o emprego de um roteiro semiestruturado, contendo questões fechadas sobre dados demográficos, econômicos e sociais e 18 questões abertas sobre a internação do RNPT, incluindo aspectos ambientais da UTIN, relações iniciais mãe-bebê e expectativas futuras.

A distribuição das participantes por classificação econômica foi realizada de acordo com o protocolo Critério de Classificação Econômica Brasil da Associação Brasileira de Empresas de Pesquisa (2010), que enfatiza a segmentação conforme o poder aquisitivo das famílias e escolaridade do chefe da família, em ordem decrescente do maior para o menor poder de compra. Quanto à escolaridade da mãe, a classificação foi realizada conforme o ensino fundamental, médio ou superior do sistema educacional brasileiro, considerando se o nível estava completo ou incompleto.

De acordo com a IG, os recém-nascidos foram classificados em: RNPT extremo (<30 semanas), RN muito prematuro (30 a 33 semanas e seis dias) e RNPT tardio (34 a 36 semanas e seis dias). A classificação de acordo com o peso ao nascimento foi a seguinte: RN de extremo baixo peso (<1.000 gramas), RN de muito baixo peso (1.000 a 1.499 gramas) e RN de baixo peso (1.500 a 2.499 gramas), conforme apresentada por Ibidi e Cardoso (2011).

2.3. Procedimento

As mães que concordaram com sua participação no estudo foram entrevistadas individualmente na sala do médio risco, nas duas UTINs. As questões, respondidas livremente, tiveram seu registro por meio de gravador de áudio. As entrevistas foram, então, transcritas e numeradas sequencialmente.

As questões abertas foram avaliadas tendo como base a análise de conteúdo (Bardin, 1977), cujo objetivo foi a manipulação das mensagens visando obter indicadores que pudessem permitir a inferência de conhecimentos. O planejamento do estudo e a análise das categorias extraídas dos relatos foram baseados na TBDH, tendo como foco principal a avaliação dos processos proximais iniciais entre a mãe e o RNPT internado, considerando a influência do contexto, uma vez que a mãe estava dividida entre os microssistemas "casa" e "UTIN".

As respostas de cada item do roteiro da entrevista foram tabuladas utilizando o editor de dados SPSS versão 18.0 para Windows (SPSS Inc., Chicago, IL, USA). As questões que nortearam a entrevista foram agrupadas em cinco categorias de análise, a saber: Percepção materna sobre o ambiente da UTIN; vivência da internação do filho; tempo de permanência da mãe na UTIN; estabelecimento inicial do vínculo com o filho; e expectativas sobre as consequências para a relação mãe-bebê.

Os dados foram analisados por meio de estatística descritiva e análises bivariadas para verificar a relação entre as variáveis. As comparações foram realizadas entre as UTINs A e B para verificar possíveis diferenças estatisticamente significativas, considerando o contexto do atendimento no âmbito particular e público, bem como a triagem de participantes com diversidade quanto à classificação econômica e escolaridade. Quando não houver diferença entre as unidades os dados poderão ser apresentados conjuntamente, constituindo maior número de casos para a análise estatística. Para as tabelas cruzadas utilizou-se o teste Qui-quadrado e quando apresentaram células com resultados esperados menores do que cinco para a hipótese nula foi aplicado o teste Exato de Fisher, quando a variável de exposição admitia duas categorias, ou a Razão da Máxima Verossimilhança para mais de duas categorias. Para as variáveis métricas, após a aplicação do teste de normalidade Shapiro-Wilk, a comparação foi realizada por meio do teste t para médias quando a distribuição foi adequada ao modelo de Gauss, ou por meio do teste de Mann-Whitney (não-paramétrico) quando a distribuição não foi gaussiana (Field, 2009).

O projeto de pesquisa foi submetido e aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Centro de Ciências da Saúde sob o nº 249/10, em conformidade com a Resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde. As entrevistas, realizadas individualmente, foram precedidas pela leitura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), informações sobre os objetivos do estudo e a participação voluntária.

 

3 Resultados

A idade das 62 mães variou de 17 a 42 anos, com média de 28,3 anos (desvio padrão 6,9). A escolaridade correspondente ao ensino fundamental, incompleto (EFI) ou completo (EFC), e ao ensino médio incompleto (EMI) foi observada em 41,9% das participantes, enquanto em 58,1% a escolaridade correspondia ao ensino médio completo (EMC), ensino superior, incompleto (ESI) ou completo (ESC). Nesta entrevista, 62,9% das participantes informaram que tinham trabalho remunerado, 87,1% declararam união civil estável, 64,5% residiam nos municípios da região metropolitana e 66,2% tinham casa própria. Das participantes, 48,4% tinham plano de saúde particular e 51,6% eram usuárias do Sistema Único de Saúde do governo brasileiro, incluindo cinco participantes da UTIN particular. Os dados relacionados ao recém-nascido e ao nascimento pré-termo estão dispostos na Tabela 1. Em 9,6% dos casos não houve uso de sonda orogástrica (SOG), tendo sido possível o aleitamento materno alternando com sucção no copo na ausência da mãe, uso de sonda nasogástrica e um caso de gastrostomia.

 

 

As variáveis categóricas quanto à escolaridade das mães, classificação econômica, primiparidade e classificação de prematuridade por idade gestacional foram testadas estatisticamente para verificar se haveria independência ou não entre as UTINs A e B (Tabela 2). As variáveis métricas relativas ao tempo de permanência na UTIN (em dias) e tempo de uso de sonda orogástrica (em dias), após aplicação do teste de normalidade Shapiro-Wilk, foram comparadas para verificar se haveria diferença entre as UTINs aplicando-se o teste não-paramétrico de Mann-Whitney, não havendo diferença estatisticamente significante (p=0,614 e p=0,977, respectivamente).

 

 

3.1. Caracterização do contexto da UTIN na visão das mães

Entre as participantes, 72,6% (n=45) não tinham recebido informação durante o pré-natal de que o RN iria ficar internado em UTIN, enquanto 27,4% (n=17) foram informadas sobre essa possibilidade. Entre as 45 mães que não tiveram informação, 88,9% nunca haviam pensado nessa possibilidade e 11,1% tinham medo de que o RN tivesse alguma intercorrência, seja porque tiveram algum problema na gravidez ou já tinham ficado em UTIN com outro filho. Entre as 17 que haviam sido informadas durante a gravidez, 52,9% não se prepararam para aquele período de vivência na UTIN porque havia somente uma possibilidade ou estavam confiantes de que poderiam levar a gestação até o final, enquanto 47,1% se prepararam por meio de diálogo com o médico, apoio de parentes, apoio religioso, ou se prepararam psicologicamente para ter forças para ir todos os dias à UTIN e ajudar seus filhos.

A categoria de análise dos dados organizada para a avaliação do contexto foi quanto à percepção materna sobre o ambiente da UTIN. A descrição das participantes sobre esse contexto, explicitando qual era a sua concepção sobre aquele ambiente, após análise de conteúdo (Bardin, 1977), apresentou-se em quatro subitens organizados na Tabela 3. Pode-se observar que, embora as duas UTINs estivessem situadas em contextos socioeconômicos diferentes, a percepção das mães sobre esse ambiente não apresentou diferença significativa entre as unidades A e B. Sendo assim, os demais dados sobre o contexto estão apesentados a seguir de forma descritiva.

 

 

Na avaliação das mães sobre o que mais gostavam no ambiente da UTIN, a qualidade do atendimento identificada pela atenção e dedicação dos funcionários foi relatada por 54,8%, o fato de ficar perto do filho por 16,1%, o silêncio por 6,5%, outras percepções positivas por 14,5%, enquanto para 6,5% nada fazia sentido, por se tratar de um ambiente hospitalar e 1,6% não responderam. Quanto à percepção do que elas menos gostavam, para 32,3% não existia nada grave porque tudo o que estava presente naquele ambiente era necessário, para 19,4% eram os aparelhos que denotavam que a saúde do RN poderia estar se agravando, 12,9% a tristeza por vivenciar outros RNs em situação mais grave, 12,9% o momento de voltar para casa sem o filho, 9,7% o espaço físico pequeno, 4,8% a rigidez nas regras e horários, 3,2% a demora das técnicas em atenderem o RN, 1,6% o cheiro de hospital e 3,2% não responderam.

O apoio recebido pela equipe hospitalar de acordo com o relato das mães foi analisado sob três aspectos principais, conforme seu foco de percepção: apoio total à mãe (45,2%); atenção à mãe e ao RN, incluindo orientações, informações sobre a saúde do bebê e apoio psicológico (41,9%) e cuidado total ao RN, ressaltando atendimento e dedicação da equipe (9,7%), sendo que 3,2% não responderam. O apoio recebido de familiares durante a internação do RN na UTIN foi avaliado em relação à visita e também ao apoio para cuidar dos outros filhos: 48,4% tinham o apoio de três ou mais pessoas, 45,2% até duas pessoas e 6,5% relataram que não tinham apoio. As visitas do pai ao filho internado foram relatadas com frequência diária ou pelo menos cinco vezes por semana em 64,5% dos casos, até quatro vezes por semana em 24,2%, somente aos domingos em 4,8% e em 6,5% o pai não havia visitado o RN.

3.2. Processos proximais iniciais estabelecidos pelas mães com o RNPT na UTIN

O período de vivência da internação do filho na UTIN foi descrito por 45,2% das participantes como de "tristeza e preocupação". Esse sentimento era gerado principalmente devido às intercorrências vividas pelos outros RNs e presenciadas por elas, gerando a preocupação pelo que também poderia ocorrer com seu filho, ao sofrimento devido à separação do RN, à vontade de levá-lo para casa e à preocupação também com o filho mais velho que estava aos cuidados de outra pessoa. Outras mães (24,2%) consideraram "cansativo, mas necessário à sobrevivência do filho", enquanto 30,6% declararam que, embora no início tenha sido muito difícil e doloroso, agora relatavam "mais tranquilidade e felicidade com a recuperação do filho" e "crescimento pessoal", referindo-se à aprendizagem que obtiveram com a equipe da UTIN. Não foram encontradas diferenças estatisticamente significantes entre a forma como as mães estavam vivenciando a internação de seus filhos e a escolaridade materna (p=0,448), classificação econômica (p=0,154), tipo de UTIN (p=0,312), pelo teste de Qui-quadrado e a classificação de prematuridade por idade gestacional (p=0,632), testada pela Razão da Máxima Verossimilhança.

A categoria de análise relacionada ao tempo de permanência da mãe na UTIN foi avaliada em número de horas por dia. A maioria das mães (75,9%) ficava mais de seis horas por dia em contato com o filho (algumas delas permaneceram hospitalizadas no mesmo período em que o RN esteve internado na UTIN e para outras mães um alojamento foi providenciado dentro do próprio hospital - UTIN B); enquanto 24,2% ficaram diariamente por seis horas ou menos ou não tiveram contato diário com o filho. Não foram encontradas diferenças estatisticamente significantes entre o tempo de permanência da mãe com o RN na UTIN e escolaridade, classificação econômica, primiparidade, classificação de prematuridade, tipo de UTIN, vivência da internação e avaliação dicotômica se o tempo de permanência na UTIN era suficiente para estabelecer o vínculo com o bebê, como pode ser visualizado na Tabela 4.

 

 

Quanto à justificativa da suficiência do tempo de permanência da mãe na UTIN, entre as 47 que ficaram diariamente por mais de seis horas junto com o RN, 25 (53,2%) consideraram o tempo suficiente porque permaneciam o tempo todo permitido pela equipe (n=11) ou que o vínculo já existia desde a gestação (n=14), mas 22 (46,8%) consideraram que o tempo não era suficiente para estabelecer o vínculo com o filho porque seria necessário amamentá-lo também à noite. Já entre as 15 mães que ficaram com o RN na UTIN durante seis horas/dia ou menos, seis (40%) consideraram que o tempo era suficiente porque o vínculo já existia desde a gestação e nove (60%) que o tempo não era suficiente, sendo que não permaneciam um tempo maior alegando problemas da própria saúde, dificuldade de deslocamento até o hospital ou a necessidade de cuidar de outro(s) filho(s).

Para o estabelecimento inicial do vínculo com o filho, puderam ser extraídos dos relatos das mães três tipos de interação: o primeiro tipo foi descrito nas várias formas de "contato" físico com o RN como, por exemplo, pegar no colo, posição mãe-canguru, fazer um carinho ou participar dos cuidados como troca de fralda; o segundo tipo de interação foi definido como uma espécie de "conversa", incluindo os atos de falar e cantar com o objetivo de fazer o RN ouvir a voz da mãe; e o terceiro foi a valorização da "amamentação" como forma de interação com o filho. A distribuição percentual ocorreu na forma de combinações desses tipos de interação, nas quais o relato de "conversa" ocorreu em 14,5%, "contato e conversa" em 50% dos relatos, "contato e amamentação" em 12,9% e "contato, conversa e amamentação" em 22,6%.

O sentimento da mãe quando estava junto ao filho foi categorizado na maioria dos relatos (67,7%) como "amor", nas suas várias formas de expressão como felicidade plena, sentimento maravilhoso e forte emoção; na categoria "realização" (16,2%) se enquadraram as descrições referentes à completude e ao fortalecimento do sentimento de mãe; ao passo que 8,1% das participantes se referiram à "vontade de levar o filho para casa", 3,2% relataram "alívio" por ele agora estar bem, 3,2% "tristeza por ele estar na UTIN" e 1,6% (n=1) não respondeu.

A avaliação das mães quanto à mudança no RN, quando ele estava junto delas, demonstrou que para 77,4% o filho ficava mais calmo, dormia melhor, mostrava sinais faciais de que a reconhecia e sentia mais confiança na sua presença segurando seu dedo com força. Para 14,5% o RN ficava mais dengoso, choroso, como em solicitação de colo ou desperto para ser amamentado; 6,5% não haviam percebido alteração e 1,6% (n=1) não respondeu.

Outra questão investigada referia-se à consequência que o período de internação traria para a relação da mãe com o seu filho no futuro, compondo a categoria de análise expectativas sobre as consequências para a relação mãe-bebê. Para a maioria (66,2%) a resposta foi "nenhuma", justificando que não teria nada que pudesse afetar a relação, já que elas ficavam o tempo todo permitido pela equipe da UTIN, que iriam compensar o tempo após o retorno para casa, que o filho não iria ficar muito tempo internado ou porque elas aprenderam com a equipe da UTIN a manusear e a interagir com o RNPT; para 16,1% a consequência seria o estabelecimento de um elo maior de aproximação, com maior apego na relação; 3,2% relataram que poderia haver dificuldade para estabelecer a amamentação ou para os cuidados em casa, ressaltando a sua inexperiência como primíparas, justificando que na UTIN eles tinham uma forma diferente para cuidar do RN. Oito mães (12,9%) declararam que não sabiam como responder a essa questão e uma (1,6%) não respondeu.

 

4 Discussão

Analisando os dados a partir da avaliação dos processos proximais, principal construto da TBDH (Bronfenbrenner & Morris, 2006), observou-se as vivências e expectativas de mães com RNPTs internados em UTIN acerca da sua percepção desse contexto e os processos proximais iniciais estabelecidos com seus filhos. A realização do estudo em UTINs inseridas em dois contextos sociais distintos objetivou a triagem de participantes com diversidade quanto à classificação econômica e escolaridade. Foram observadas diferenças estatisticamente significantes entre as duas UTINs quanto à variável escolaridade materna e à variável classificação econômica. As demais variáveis do estudo como primiparidade e classificação de prematuridade por idade gestacional (Tabela 2), descrição do ambiente da UTIN (Tabela 3), tempo de internação na UTIN e uso de sonda orogástrica, não apresentaram diferenças estatísticas entre as UTINs A e B e, portanto, foram avaliadas conjuntamente. As comparações por escolaridade e classificação econômica foram realizadas na análise dos eixos temáticos vivência da internação do filho e tempo de permanência da mãe na UTIN.

Avaliando algumas características pessoais e do contexto, observou-se que para a maioria das participantes o RN era seu primeiro filho. Em 56,5% dos casos a idade gestacional era igual ou maior que 34 semanas (pré-termo tardio), 79% dos RNs tinham peso inferior a 2.500 gramas, 90,3% usaram sonda orogástrica e 72,6% permaneceram na UTIN entre cinco e 30 dias. Mesmo para RNPT com maior idade gestacional, a prematuridade e baixo peso podem constituir maior risco ao desenvolvimento (Espírito Santo et al., 2009) e à apresentação de sintomas depressivos e de ansiedade nas suas mães (Miles et al., 2007; Padovani et al., 2009; Wakely et al., 2010), potencialmente capazes de refletir na interação mãe-bebê (Feldman & Eidelman, 2006; Zelkowitz et al., 2009). O baixo peso ao nascimento constitui característica pessoal com potencial limitador da integridade funcional, com risco ao desenvolvimento, devido a sua capacidade de influenciar os processos proximais iniciais (Bronfenbrenner & Morris, 2006).

A maioria das mães não havia recebido informação prévia de que o RN poderia ficar internado em UTIN e nunca tinha sequer pensado nessa possibilidade. Mesmo entre as que haviam sido informadas sobre a necessidade de UTIN, a maioria estava confiante de que poderia completar o tempo gestacional e não se prepararam para enfrentar a situação. Essa constatação reforça a necessidade da assistência humanizada às mães com programas para estimular estratégias de enfrentamento (Melnyk et al., 2008; Miles et al., 2007).

Apesar dessa situação inesperada, o empenho dos profissionais da UTIN pode criar oportunidades para familiarização com o contexto hospitalar (Melnyk et al., 2008; Silva & Silva, 2009; Andrade, 2011), como pode ser observado no presente estudo quanto à percepção materna sobre o ambiente da UTIN, cuja descrição desse contexto na maioria dos casos foi um ambiente de cuidado e atenção, bem equipado e organizado (Tabela 2). A influência das relações estabelecidas pelas mães com os profissionais da UTIN é característica da análise do mesossistema na teoria bioecológica (Bronfenbrenner, 1996; 1994), uma vez que elas estavam inseridas em dois microssistemas ("casa" e "UTIN") e ficou evidenciada pelo destaque positivo que a maioria efetuou à qualidade do atendimento, identificada pela atenção e dedicação dos funcionários. Nessa integração com o ambiente, o que as mães menos gostavam na UTIN eram dos aparelhos que indicavam que a saúde do RN poderia estar se agravando, a tristeza por vivenciar outros RNs em situação mais grave e o momento de retornar para o lar sem o filho. Essa separação física devido à internação do RN pode dificultar a interação inicial mãe-bebê (Camarneiro et al., 2009), o que também legitima o suporte profissional às mães (Melnyk et al., 2008).

Durante a internação hospitalar o foco do atendimento clínico é o bebê pré-termo e sua evolução. Entretanto, o conhecimento acerca dos pensamentos, sentimentos e crenças maternos, enfim, a compreensão do universo psicológico da mãe, é relevante como auxílio para orientar a adequada implantação de estratégias facilitadoras do cuidado individualizado (Correia et al, 2008), visando à redução do tempo de internação (Melnyk et al., 2008; Miles et al., 2007). No presente estudo, o apoio da equipe hospitalar foi percebido pelas mães sob três aspectos principais: apoio total à mãe (45,2%), apoio à mãe e ao RN (41,9%) e cuidado total ao RN (9,7%). Na TBDH o mais importante é como o ambiente é percebido pela pessoa em desenvolvimento (Bronfenbrenner, 1994), de forma que as participantes relataram o apoio da equipe hospitalar direcionado a elas em 87,1% dos casos, além do cuidado inerente ao RN.

A maioria das participantes (93,6%) relatou que recebeu apoio de familiares durante a internação do RN, tanto em relação à visita quanto ao apoio para cuidar dos outros filhos. A importância do apoio familiar foi demonstrada por Taubman-Bem-Ari et al. (2010), quando avaliaram o apoio recebido por mães de gêmeos nascidos pré-termo para superação do stress inicial relacionado à hospitalização. Quanto ao apoio do pai do RN, a maioria (88,7%), neste estudo, respondeu que ele fazia visitas regulares ao filho, fato percebido por elas como apoio fundamental, o que está em consonância com a literatura PSI em situações de doença grave do RN (Lee et al., 2006).

A vivência da internação do filho em UTIN foi descrita com foco nos componentes emocionais das participantes, com forte influência dos processos proximais estabelecidos naquele contexto. O sofrimento da separação, a fragilidade do filho e as intercorrências com os outros RNs foram evidenciados no relato de tristeza e preocupação, que também pode ser percebido na resignação dessas mães ao considerarem essa vivência cansativa, mas necessária à sobrevivência do filho. Mesmo entre aquelas que relatavam mais tranquilidade e felicidade com a recuperação do filho, essa declaração veio precedida do relato de que o período inicial foi muito difícil e doloroso. Essa vivência não diferiu conforme a escolaridade, classificação econômica, tipo de UTIN e classificação de prematuridade por idade gestacional. Como discutido na literatura (Wakely et al., 2010), a hospitalização do RNPT é um evento estressante e emocionalmente desafiador para as mães, capaz de gerar impacto no seu comportamento.

Para minimizar os efeitos das reações emocionais de medo e culpabilidade pela fragilidade do filho tem sido indicado o livre acesso da mãe ao RNPT internado (Camarneiro et al., 2009). No presente estudo, o tempo de permanência da mãe na UTIN na maioria dos relatos (75,9%) correspondia a mais de seis horas por dia em contato com o filho (n=47), enquanto 24,2% das participantes ficaram por seis horas ou menos (n=15), como foi demonstrado na Tabela 4. Na UTIN B uma pequena parcela das mães (19,4%) ficou em alojamento dentro do próprio hospital, o que facilitava o acesso ao filho. Quanto à justificativa sobre a suficiência desse tempo de permanência da mãe na UTIN para estabelecer o vínculo com o RN, as mães que consideraram que o tempo era suficiente, explicaram que tinham disponível o tempo todo permitido pela equipe ou que o vínculo já existia desde a gestação. Já aquelas que consideraram que o tempo não era suficiente, relataram que seria importante também amamentá-lo à noite ou justificaram que não permaneciam um tempo maior devido a problemas de sua própria saúde ou à distância em relação à residência.

A partir da análise do relato das mães pode ser observado que elas elaboraram estratégias de enfrentamento para reduzir o impacto que a separação física poderia gerar na interação mãe-bebê. Uma das categorias analisadas na entrevista foi quanto ao estabelecimento inicial do vínculo com o filho. Pode ser percebida a combinação de três tipos positivos de processos proximais iniciais: o contato físico, a conversa para o RN ouvir a voz da mãe e a amamentação. As estratégias que foram usadas pelas mães encontraram respaldo na literatura quando Jonhson (2007) discutiu o aumento da confiança das mães quando era utilizado o método mãe-canguru, que tem como uma das finalidades a promoção de maior contato físico entre a mãe e o RN, ou quando a influência da mãe cantar para seu bebê foi analisada por Cevasco (2008), ou ainda na análise da importância da amamentação como forma de interação (Feldman & Eidelman, 2003). A internação em UTIN representa um tempo apropriado para o surgimento de interações alimentares positivas entre mãe e RN, intervenção diante de dificuldades e promoção da sensibilidade materna, objetivando otimizar interações iniciais (Silberstein et al., 2009).

Deve ser pontuado neste momento que todas as entrevistas para este estudo foram realizadas quando os RNs estavam na sala do médio risco, nas duas UTINs, o que já permitia uma interação maior entre mãe e filho, incluindo as primeiras tentativas para amamentar ou disponibilizando o próprio leite materno para ser ofertado ao bebê por sonda ou pela técnica de sucção utilizando o copo. Na UTIN B as mães contavam com o apoio de um banco de leite humano no próprio hospital, enquanto na UTIN A as mães eram auxiliadas pela equipe ou recorriam a bancos de leite externos ao hospital.

Compondo a categoria de análise sobre as expectativas sobre as consequências para a relação mãe-bebê, quando questionadas sobre a consequência que o período de internação poderia ter na relação mãe-bebê, a resposta da maioria foi de que não teria consequência, enquanto outras responderam que haveria um maior apego na relação mãe-bebê. Elas argumentaram que iriam compensar o tempo após o retorno ao lar e ressaltaram que aprenderam com os profissionais da UTIN a manusear e a interagir com o RNPT, o que reafirma a importância de se analisar pela TBDH os processos proximais conforme o contexto é percebido pela pessoa. Apesar da inserção em um contexto adverso, elas demonstravam sinais de crescimento pessoal, recorrendo a seus próprios recursos biopsicológicos (Bronfenbrenner, 1996).

A avaliação das mães sobre a reação do filho quando ele estava junto delas já despertava alguns sinais de interação recíproca e processos proximais positivos como a percepção de expressões faciais de que ele reconhecia a mãe, que ficava mais calmo ou até mesmo mais dengoso, choroso, solicitando aconchego no colo. As diferentes configurações das habilidades sociocognitivas e comu­nicativas também observadas por Aquino e Salomão (2011) no primeiro ano de vida, mobilizaram nas mães estilos interativos que evidenciaram a reciprocidade das interações. Vale enfatizar que entre as proposições da TBDH (Bronfenbrenner & Morris, 2006), as condições que limitam a integridade funcional, como o baixo peso ao nascimento, podem influenciar o estabelecimento de processos proximais efetivos, mas a experiência e habilidades que a mãe vai adquirindo e as respostas do bebê podem atrair e ampliar o poder dos processos proximais de forma construtiva, cujo objetivo maior será o de minimizar os efeitos do nascimento pré-termo sobre o desenvolvimento.

 

5 Conclusão

A maioria das participantes do estudo não teve informação prévia de que o filho iria precisar de UTIN e nunca tinha pensado nessa possibilidade. A descrição da UTIN foi principalmente como de um ambiente de cuidado e atenção. O apoio da equipe hospitalar direcionado às mães, além do cuidado inerente ao RN foi percebido por 87,1% das participantes. O apoio de familiares foi relatado por 93,6% e o apoio frequente do pai do RN por 88,7%.

A vivência em UTIN durante o período de internação do filho RNPT foi avaliada pelas mães como um evento impactante nas suas vidas, independente da escolaridade, classe econômica, tipo de UTIN (pública ou particular) e idade gestacional. As categorias extraídas dos relatos foram os sentimentos de tristeza e preocupação, rotina cansativa, mas necessária à sobrevivência do filho e, mesmo entre aquelas que relatavam mais tranquilidade e felicidade com a recuperação do bebê, o período inicial foi descrito como muito difícil e doloroso.

As expectativas com relação às consequências que o período de internação poderia ter na relação mãe-bebê foram avaliadas sob as perspectivas positiva e otimista de que haveria um apego maior na relação, que não teria consequência negativa porque iriam compensar o tempo após o retorno ao lar e algumas até ressaltaram que aprenderam com os profissionais das UTINs a lidar com o RNPT, demonstrando crescimento pessoal. Essa avaliação positiva das mães quanto à expectativa futura pode ser interpretada pela teoria bioecológica como uma predição do estabelecimento de processos proximais efetivos, atuando como indicativo de desenvolvimento saudável para o bebê.

Os processos proximais iniciais para estabelecer o vínculo com o RN resultaram da combinação de três tipos principais: contato físico, conversa e valorização da amamentação como forma de interação para estabelecer o vínculo com o filho. A interação recíproca começou a ser percebida pela mãe a partir das expressões faciais do bebê na sua presença.

O tempo de permanência da mãe em contato com o filho na UTIN, fundamental para a regularidade dos processos proximais, foi maior que seis horas diárias, na maioria dos casos, independente da escolaridade, classe econômica, primiparidade, idade gestacional, tipo de UTIN, avaliação da vivência da internação e da suficiência desse tempo de permanência da mãe na UTIN para estabelecer o vínculo com o bebê. A maioria justificou que o tempo era suficiente para estabelecer o vínculo porque ficava o tempo todo permitido pela equipe ou porque o vínculo já existia desde a gestação. Apesar das adversidades, as mães estavam enfrentando essa transição demonstrando sinais de crescimento pessoal, a partir dos seus próprios recursos biopsicológicos, apoio dos familiares e apoio da equipe hospitalar multiprofissional, impulsionadas pelo amor ao filho e pela realização da maternidade.

Os resultados do presente estudo poderão contribuir na compreensão do universo de sentimentos das mães dos RNPTs internados em UTIN, de forma a subsidiar e reforçar o trabalho dos profissionais que lidam com esta realidade nos seus esforços em promover o vínculo mãe-bebê. Uma das limitações do estudo, considerando a metodologia usada para interpretação dos dados pela teoria bioecológica, foi o seu foco nas respostas das mães, uma vez que a avaliação da bidirecionalidade dos processos proximais não se mostrou possível porque a outra face da díade é o RN. Para futuras investigações, sugerem-se estudos longitudinais para avaliar se houveram consequências negativas na relação mãe-bebê que poderiam estar relacionadas ao período de internação em UTIN.

 

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Endereço para correspondência
Elâine Cristina Vargas Dadalto
Universidade Federal do Espírito Santo
Departamento de Clínica Odontológica - Disciplina de Odontopediatria
Av. Marechal Campos, 1468, Campus Maruípe, CEP 29043-900, Vitória – ES, Brasil
Endereço eletrônico: elainedadalto@gmail.com
Edinete Maria Rosa
Universidade Federal do Espírito Santo
Programa de Pós-Graduação em Psicologia da UFES
Av. Fernando Ferrari, 514, Campus Goiabeiras, CEP 29075-910, Vitória – ES, Brasil
Endereço eletrônico: edineter@gmail.com

Recebido em: 06/03/2015
Reformulado em: 24/06/2015
Aceito para publicação em: 31/07/2015

 

 

Notas

* Doutora em Psicologia pela Universidade Federal do Espírito Santo – Brasil. Professora de Odontopediatria da Universidade Federal do Espírito Santo.
** Doutora em Psicologia Social pela Universidade de São Paulo – Brasil. Professora do Departamento de Psicologia Social e do Desenvolvimento e do Programa de Pós-Graduação em Psicologia da Universidade Federal do Espírito Santo.

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