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Arquivos Brasileiros de Psicologia

versão On-line ISSN 1809-5267

Arq. bras. psicol. vol.67 no.1 Rio de Janeiro  2015

 

ARTIGOS

 

Impacto da religiosidade na relação entre pais e filhos adolescentes

 

Impact of religiosity on the relationship between parents and adolescents

 

Impacto de la religiosidad en la relación entre padres e hijos adolescentes

 

 

Ana Paula Sesti BeckerI; Tânia Paza MaestriII; Sueli Terezinha BobatoIII

IMestre em Psicologia. Programa de Pós-Graduação em Psicologia. Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Florianópolis. Estado de Santa Catariana. Brasil
IIGraduada em Psicologia. Universidade do Vale do Itajaí (UNIVALI). Itajaí. Estado de Santa Catarina. Brasil
IIIDocente. Curso de Psicologia. Universidade do Vale do Itajaí (UNIVALI). Itajaí. Estado de Santa Catarina. Brasil

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

A qualidade da relação familiar constitui-se como a vinculação entre os membros familiares, quando norteada por fatores protetivos, tornando-se especialmente relevante na adolescência. Nesta perspectiva, as práticas religiosas têm repercutido no relacionamento familiar, mas têm sido pouco exploradas nas pesquisas nacionais. Diante do exposto, esta pesquisa investigou o impacto que um movimento cristão exerce sobre a qualidade da relação entre pais e filhos adolescentes. O estudo caracterizou-se como qualitativo, utilizando-se para a coleta de dados a técnica de grupo focal com um grupo de pais e outro de adolescentes. Os dados foram analisados a partir da análise de conteúdo temático categorial, subdividido em quatro categorias. Evidenciou-se que a aderência ao movimento religioso se constituiu como uma rede de apoio social e afetiva e possibilitou mudanças no subsistema familiar filial e conjugal, bem como nas práticas educativas e no envolvimento parental.

Palavras-chave: Adolescência; Família; Religiosidade; Espiritualidade.


ABSTRACT

The quality of family relationship was established as the link between family members, when it is guided by protective factors, making it especially relevant in adolescence. In this perspective, religious practices have affected the family relationship, but it has been little explored in national polls. This research investigated the impact that a Christian movement has on the quality of relationship between parents and adolescents. The study was characterized as qualitative, using for data collection the focus group technique with a group of parents and other adolescents. Data were analyzed from the categorical content analysis divided into four categories. It was evident that adherence to the religious movement was constituted as a network of social and emotional support and possible changes in the branch and marital family subsystem, as well as in educational practices and parental involvement.

Keywords: Adolescence; family; religiosity; spirituality.


RESUMEN

La calidad de la relación familiar se establece como el vínculo entre los miembros de la familia, cuando guiados por los factores de protección, convirtiéndose especialmente relevante en la adolescencia. En esta perspectiva, las prácticas religiosas han afectado a la relación familiar, pero han sido poco exploradas en las encuestas nacionales. Teniendo en cuenta lo anterior, esta investigación estudió el impacto que un movimiento cristiano ejerce sobre la calidad de la relación entre padres e hijos adolescentes. El estudio fue caracterizado como cualitativo, utilizando para la recolección de datos la técnica de grupos focales con un grupo de padres y otro de adolescentes. Los datos fueron analizados a partir del análisis de contenido categórico dividido en cuatro categorías. Quedó evidente que la adhesión al movimiento religioso constituye una red de apoyo social y afectivo y permitió cambios en el subsistema de la familia filial e conyugal, así como en las prácticas educativas y de participación de los padres.

Palabras clave: Adolescencia; familia; religiosidad; espiritualidad.


 

 

Introdução

Na contemporaneidade a família tem vivenciado transformações significativas no que se refere à relação entre pais e filhos, especialmente quando estes estão na fase da adolescência (Newman, Harrison, Dashiff, & Davies, 2008). Evidencia-se, portanto, um interesse da comunidade científica em investigar a qualidade da relação familiar entre pais e filhos adolescentes a partir das últimas décadas (Ramires, 2004).

A qualidade da relação familiar constitui-se como a vinculação entre os membros familiares, quando esta é norteada por fatores protetivos que podem ser identificados a partir da afetividade, tipo de comunicação estabelecida, envolvimento dos pais, práticas educativas e estilo parental aderido, clima conjugal estabelecido, bem como das práticas religiosas (Assis, Pesce, & Avanci, 2006; Newman et al., 2008; Weber, Prado, Salvador, & Brandenburg, 2008).

Conforme apontam Assis et al. (2006), a aderência das práticas religiosas pode ser considerada como um fator protetivo, uma vez que permite o fortalecimento de vínculos no relacionamento familiar, na provisão de apoio, suporte e respeito mútuo. Pode possibilitar ainda a promoção do desenvolvimento de uma autoestima positiva, autocontrole, bem como características de temperamento afetuoso e flexível. Tais autores consideram que os grupos religiosos constituem-se como um dos fatores protetivos significativos para o desenvolvimento juvenil.

Neste estudo torna-se relevante a distinção entre os conceitos de religiosidade e espiritualidade. De acordo com Liz (2011), a religiosidade refere-se ao conjunto de crenças e práticas estabelecidas por uma religião na vida de um indivíduo, com base em um sistema de adoração ou doutrina específica partilhada por um grupo. Portanto, a religiosidade está relacionada a uma instituição religiosa, por meio da qual o indivíduo segue uma crença ou prática proposta por determinada religião. Já o termo espiritualidade norteia questões voltadas ao propósito da vida e à razão de viver. Não se limita a tipos específicos de crenças ou práticas e pode ou não estar relacionada à religiosidade, podendo haver aproximação entre os dois conceitos na vida pessoal de quem a pratica (Liz, 2011; Paiva, 2011).

Frente à relevância de estudos que investiguem o impacto que a religiosidade e a espiritualidade exercem nas relações familiares e na sociedade contemporânea, esta pesquisa tem como objetivo analisar a qualidade da relação entre pais e filhos adolescentes a partir da aderência a um movimento cristão. Para tanto, propôs-se a descrever as práticas religiosas desenvolvidas por pais e adolescentes que frequentam o movimento; identificar os significados atribuídos à prática religiosa na percepção desses participantes; bem como analisar as repercussões dessas práticas na relação familiar entre os adolescentes e seus pais.

 

Método

A pesquisa constituiu-se como exploratório-descritiva, de caráter qualitativo, tendo em vista a finalidade de compreender a natureza do fenômeno, suas características e variáveis. A pesquisa qualitativa trabalha com significados, motivos, aspirações, crenças e atitudes, o que se configura como um espaço profundo das relações, dos processos e dos fenômenos que não podem ser quantificados (Minayo, 1998).

 

Participantes

Fizeram parte deste estudo 14 participantes, sendo seis adolescentes e oito adultos. Os adolescentes foram designados no estudo como A1, A2, A3, e assim sucessivamente. Já os adultos, contemplando pais e mães de adolescentes, serão nomeados como P1, P2... e M1, M2, e assim sucessivamente. A idade dos adolescentes variou entre 12 e 18 anos (média = 15 anos), sendo dois do sexo feminino (A1 e A6) e quatro do sexo masculino (A2, A3, A4 e A5). Dois cursavam o Ensino Fundamental (A3 e A6), enquanto outros dois, o Ensino Médio (A1 e A4) e os demais já haviam ingressado no Ensino Superior (A2 e A5). O tempo de aderência ao movimento cristão variou de 1 a 6 anos (média = 3 anos e meio).

Entre os adultos pesquisados, as idades variaram entre 36 e 54 anos (média = 45 anos), sendo cinco homens e três mulheres. Cinco possuíam Ensino Superior completo, um possuía Ensino Superior incompleto e dois tinham o Ensino Fundamental. O tempo de aderência ao movimento cristão variou entre 2 e 20 anos (média = 11 anos). Todos eram casados e tinham filhos adolescentes.

Portanto, a pesquisa contemplou dois grupos de participantes: um grupo foi composto por 5 pais e 3 mães que possuíam filhos na faixa etária entre 12 e 18 anos incompletos; enquanto o outro grupo foi composto por 6 adolescentes com idades entre 12 e 18 anos. Como critérios de inclusão, pais e adolescentes deveriam estar frequentando o movimento cristão há no mínimo um ano, com pelos menos duas frequências mensais nas reuniões que acontecem semanalmente. A fim de contextualização, o movimento religioso se configura como uma associação internacional de empresários e jovens associados que promovem eventos e encontros semanais para compartilharem experiências profissionais e de espiritualidade que vivenciam. É oportuno ressaltar que o movimento não se constitui como uma igreja e não tem denominação religiosa, no entanto, tem como princípio os valores do Cristianismo em todos os seus encontros e atividades. Salienta-se ainda que os pais e adolescentes participantes não possuíam vínculos familiares, uma vez que não foi utilizado esse critério para participação, nem se constituiu como objetivo da presente pesquisa.

 

Instrumento

Utilizou-se a técnica de grupo focal para coleta dos dados com os dois grupos de participantes. De acordo com Trad (2009), o grupo focal é uma técnica de pesquisa qualitativa, derivada de entrevistas em grupo, que coleta informações por meio das interações grupais. Como objetivo principal, aponta-se reunir informações detalhadas sobre um tópico específico a partir de um grupo de participantes selecionados.

 

Procedimentos

O contato com os participantes do estudo foi realizado após a aprovação pelo Comitê de Ética em Pesquisa de uma Universidade do Sul do Brasil. O convite à participação foi realizado a 5 casais e 10 adolescentes da Associação do movimento religioso, apresentando-lhes o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. Àqueles que aceitaram participar da pesquisa foi agendada uma data para a realização dos encontros, em horários diferenciados para pais e adolescentes. No caso destes últimos, solicitou-se a autorização dos responsáveis.

Para a realização do grupo focal utilizou-se um roteiro semiestruturado com as seguintes questões norteadoras: atividades praticadas nos encontros do movimento, significado atribuído a essas práticas e as repercussões da participação no movimento religioso na relação entre pais e filhos. Cada um dos encontros, com os pais e com os adolescentes, teve a duração de uma hora, aproximadamente. Os relatos foram gravados em áudio e posteriormente transcritos na íntegra, garantindo-se a fidedignidade dos dados.

 

Análise de dados

Para a análise dos dados foi utilizada a técnica de análise de conteúdo temático categorial, a qual se constitui como um conjunto de técnicas de análise das comunicações, tendo por finalidade compreender criticamente o sentido manifesto ou latente das comunicações (Bardin, 1977).

Os dados foram organizados em categorias temáticas, com base nos objetivos pelos quais se delineou o presente estudo, bem como nos conteúdos que emergiram na dinâmica dos grupos focais, totalizando quatro categorias: (1) Práticas e propostas do movimento cristão; (2) Significado atribuído às experiências religiosas-espirituais; 3) Rede de apoio social e afetiva; e (4) Repercussão das práticas religiosas na relação entre pais e filhos adolescentes.

 

Resultados e discussão

Práticas e propostas do movimento cristão

As atividades comumente desenvolvidas no movimento religioso contemplam encontros semanais, com depoimentos de vida ou testemunhos, seminários com grupos diversificados e temáticas variadas, palestras, retiros de jovens, jantares e chás. Os participantes do grupo de pais salientaram a relevância de compartilhar experiências pessoais, a partir do envolvimento espiritual-religioso, o qual pode ser entendido como uma estratégia de enfrentamento e resolução de problemas, conforme evidenciado no recorte ilustrativo:

Cada um vai e conta a sua experiência pessoal de vida, compartilha essa experiência pessoal em que Deus está te auxiliando de alguma forma [...]. Tem testemunhos de várias áreas ou mesmo problemas com filhos e como essas pessoas encontraram uma saída em Deus [...] trabalha principalmente com depoimentos, com testemunhos, com esse compartilhar de histórias de vida. (M1)

Quanto à percepção do grupo de adolescentes sobre as práticas e propostas do movimento a que aderem, foi citado:

[...] Mensagem, testemunhos de vida, reuniões [...]. (A2)

[...] Tem orações, geralmente eles fazem no início para que a reunião seja abençoada, e quando acaba [...]. Retiro de carnaval, que é o momento que os adolescentes têm bastante convivência pra descontrair, e encontros de jovens [...]. (A3).

Conforme Peres, Simão e Nasello (2007), as práticas religiosas ou rituais religiosos, como a oração, depoimentos de experiências com o Sagrado, leituras bíblicas e preces, são compreendidas como estratégias que promovem a autoconfiança do sujeito em lidar com as adversidades e estabelecer comportamentos de aprendizagem positiva.

No que concerne à filosofia e propostas apregoadas, constata-se que a adesão às práticas religiosas sugere uma vivência de espiritualidade, a qual repercute nas escolhas pessoais dos participantes quanto a um estilo de vida saudável. Isso pode ser evidenciado no relato de P2, ao explanar sobre a finalidade das práticas no sentido de oportunizar momentos de alegria na ausência de fatores como drogas e bebidas, comumente experimentadas pelos jovens na atualidade. Verifica-se ainda nos relatos que os valores como o amor e a crença no ser humano são aspectos preconizados. Os relatos a seguir ilustram essas concepções:

A proposta é acreditar no ser humano [...]. Ela veio para mostrar o Cristianismo saudável. (P2)

O lema é: Sua bandeira sobre nós é o amor. (M2)

Existe esse encontro espiritual que está muito pobre hoje [...]. E é um ambiente sadio, gostoso, sabe? [...] eles fazem retiro, dançam, pulam sem drogas, sem bebidas. Nós temos o apoio jovem aqui e são jovens saudáveis, são felizes... E daí, chega alguém e pergunta, mas é possível ser feliz sem pagar consequências? (P2)

De acordo com Mandarino (2005), há uma forte tendência na atualidade de os adolescentes buscarem o lazer religioso, ou seja, mediante grupos de convivência cristã juvenil os participantes estabelecem novas formas de relação com o Sagrado, tendo em vista os recursos midiáticos que se apresentam no panorama social. Complementando a temática, Jungblut (2007) sinaliza que é crescente no Brasil a onda gospel entre os jovens contemporâneos, os quais têm incorporado a dimensão religiosa nos aspectos esportistas, moda, estética moderna, músicas, mídia e marketing, apresentando um estilo alternativo de valores cristãos na juventude.

O significado das experiências religiosas-espirituais

Os participantes relatam ter vivenciado mudanças significativas em suas vidas no que se refere às experiências religiosas-espirituais e indagações com o Sagrado, a partir das práticas e propostas do movimento. O relato do grupo de pais demonstra o impacto das vivências experienciadas no sentido de fortalecimento da fé, a partir do significado que as pessoas atribuem à manifestação divina:

[...] Porque, falando assim de espiritualidade, houve uma manifestação da presença de Deus, assim, muito forte. Eu tenho uma sensibilidade, assim, muito grande pra sentir a presença de Deus [...]. Aquele encontro impactou a minha vida e de certa forma alimentou a minha fé. Porque a presença de Deus, ela não vem em vão, né? Ele trabalha nas pessoas de formas diferenciadas. (M3)

Porque uma hora, mesmo que você não tenha, chega o momento que você vai ter essa experiência com Deus. Então, isso é a nossa fé... Deus é que move as coisas. (P5)

Os discursos sugerem que as experiências descritas repercutem de maneira contundente na vida espiritual e religiosa dos participantes. Isso confirma o que Amatuzzi (2000) propõe acerca das experiências religiosas, as quais representam acontecimentos marcantes que o sujeito estabelece em relação ao Sagrado, atribuindo significados, cujo entendimento pode se constituir como senso religioso.

No que se refere ao significado que atribui aos encontros do movimento religioso, o grupo de adolescentes enfatizou o processo de como foram instauradas as primeiras experiências de âmbito religioso-espiritual, no sentido de oportunizar o desenvolvimento religioso:

Desde pequeno minha mãe orava na cama comigo... Daí, mais tarde eu aceitei a Jesus. Foi num jantar da [...] só que eu já era apresentado pra Jesus e tudo, né? Só que um encontro de verdade com Deus, foi quando eu aceitei a Jesus em minha vida. (A4)

Deus pra mim é tudo, sabe? Desde quase sete anos o pai dizia: "vamos lá na frente aceitar a Jesus" (é uma oração que se faz para receber a Cristo como Senhor e Salvador); eu dizia: "eu não quero". Tipo, eu era um "peso morto", ia na igreja muito tempo, daí me afastava, mas também era muito obediente. Um dia me afastei mais e ano passado, quando fui adquirindo mais maturidade, pensava: "pô, porque acontece com ele e não acontece comigo?" Porque, cara, ele busca isso... Daí eu pensava: "vou orar toda noite"; daí eu ficava sabendo: "vai ter retiro, eu dizia vamos! Ah, vai ter oração lá, eu tô dentro!". (A3)

Verifica-se que ambos os adolescentes passam a estabelecer os significados atribuídos às vivências espirituais, não somente pela identificação parental num processo heterônomo, mas à medida que se identificam com o próprio grupo de jovens no movimento religioso e que estabelecem experiências religiosas-espirituais com o Sagrado. Nesse processo desenvolvem suas próprias crenças, instaurando-se o predomínio da autonomia no desenvolvimento religioso, como "quando você conhece a Deus, tem intimidade com o Espírito Santo e você começa a buscar isso" (A2). Portanto, o sentido religioso é construído a partir da mediação de pessoas significativas no decorrer de seu desenvolvimento, podendo ser representado pelo grupo de jovens, pelas figuras de autoridade espiritual - pastor, padre, líder do movimento religioso - e ainda pelos membros familiares.

Sarti (2005) discorre que, no desenvolvimento juvenil, os adolescentes caracterizam-se justamente pela busca de outros referenciais para a constituição de sua identidade fora da família, como parte de seu processo de individuação frente ao mundo familiar, social e espiritual.

Nesse sentido, a teoria do desenvolvimento religioso aponta que este se processa concomitantemente ao desenvolvimento moral, cognitivo, social e afetivo; isto se houver estímulos, vivências sistemáticas e contínuas dos rituais e experiências religiosas. Ao se relacionarem os estágios do desenvolvimento moral e cognitivo ao desenvolvimento religioso, concebe-se que a religiosidade na adolescência se dá no processo de formação do eu que o adolescente estabelece ao partir em busca de quem ele realmente é, para além daquela criança que se definia a partir da família à qual pertencia. Nesse movimento ocorre a transição da heteronomia para a construção de uma autonomia moral (Amatuzzi, 2000). Compreende-se que essa transição ocorre no processo de formação da identidade do adolescente. Tal processo não é diferente na esfera religiosa-espiritual, uma vez que o jovem começa a questionar a identidade religiosa recebida da família e passa a buscar experiências espirituais e religiosas a partir de escolhas pessoais, de maneira mais autônoma.

Fernandes (2011) argumenta que a religiosidade se constitui numa dimensão fundamental na vida dos jovens, sendo que o vínculo às identidades religiosas é um pilar essencial na construção da identidade social do jovem, bem como da sua visão de mundo e de sociedade.

No que concerne ao grupo de pais, estes relacionaram o impacto e a aprendizagem que o movimento cristão oportunizou quanto ao desenvolvimento de sua vida religiosa e espiritual, conforme se verifica em suas falas:

Falavam pra mim de Jesus, eu não sabia quem era Deus, quem era Jesus [...] você vê que eu era um cristão não participante. Então, pra mim, eu fui aprender muita coisa sobre a vida espiritual na [...]. (P4)

O maior testemunho hoje do Cristianismo é a transformação de vida [...]. As experiências da minha esposa com Deus foram na [...]. Até a forma dela ver o Reino, dela ver a família. (P2)

Nessas falas também se evidencia a relevância dada à Bíblia Sagrada como uma referência de direcionamento e instrumentalização, constituindo-se como um recurso de apoio frente às decisões a serem tomadas, conforme evidenciado no relato abaixo:

A Bíblia é como "Manual do fabricante" [...]. O ser humano não foi simplesmente colocado aqui na terra e Deus disse: "vai lá e se vira". Não! Quando Deus fez o homem e a mulher, Ele fez um manual. Pra você ter uma bússola, uma condução pra sua vida. Ali tem conselhos para todas as áreas: como você vai ser feliz, como você vai criar teu filho [...]. Ali tem as instruções [...]. Então, imagina a vida da gente, os filhos da gente, a família da gente, se você não tiver uma instrução? (M1)

O grupo de pais faz menção à Bíblia como referencial a fim de nortear as diversas circunstâncias que se apresentam, especialmente no âmbito familiar com a educação dos filhos. Outro ponto a se considerar sobre essa questão reside no entendimento de que a Bíblia, aqui, constitui um mediador entre a crença e o significado religioso. Pinezi (2009) identifica que a referência à Bíblia e às pregações nos encontros religiosos, bem como os testemunhos da manifestação divina em relação à transformação de vida dos fiéis, são práticas frequentes no cenário religioso de igrejas e grupos cristãos.

Além da leitura da Bíblia como um recurso mediador, também pôde ser constatado nos relatos dos pais uma explanação sobre o processo de identificação entre os participantes a partir dos testemunhos de vida nas reuniões do movimento. Essas práticas parecem mobilizar no sujeito uma identificação direta em relação aos problemas e experiências pessoais que tem vivenciado, mediadas pela figura do palestrante, o qual passa a se constituir como um modelo a ser seguido. Tais evidências aparecem nos seguintes relatos:

A questão da proposta é de identificação [...] isso leva as pessoas a ver que se aconteceu na vida do outro também pode acontecer na minha. (P2)

[...] Os filhos da gente acabam se identificando também [...]. Porque não é uma coisa que tá escrita lá num livro... Ele viu que tem uma pessoa que passou por aquela experiência e teve um êxito, né? E ele sabe como encontrar o caminho, que é em Deus. (M1)

Os relatos acima sintetizam a relevância que os participantes atribuem ao sentimento de identificação a partir de testemunhos que comumente acontecem nas reuniões e demais eventos do movimento religioso. Conforme a teoria do Desenvolvimento Religioso preconizado por Amatuzzi (2000), pode-se compreender neste estudo que as práticas e recursos religiosos, como as leituras bíblicas, orações, retiros e especialmente os testemunhos de vida, são concebidos como aspectos mediadores que viabilizam a relação entre o indivíduo e o Sagrado. Isso evidencia que as significações de senso religioso ou experiências religiosas espirituais podem ser construídas a partir das vivências sistemáticas e contínuas no processo de desenvolvimento do ciclo vital, mediadas por pessoas significativas a partir dos recursos mencionados. Esse processo permite a construção dos significados que o sujeito vai estabelecendo a partir das experiências vivenciadas, possibilitando que se identifique com os aspectos religiosos, o que pode conduzi-lo às experiências de cunho espiritual. E cada participante, entre pais e adolescentes, pode estar em etapas distintas desse processo.

Para melhor compreensão a respeito do processo de identificação dos adolescentes relacionado às experiências religiosas-espirituais, a partir do que foi evidenciado nos relatos dos participantes, foi elaborado o seguinte esquema ilustrativo, conforme se visualiza na figura 1.

 

 

Rede de apoio social e afetivo

O movimento religioso parece assumir um importante papel como rede de apoio social e afetivo, principalmente no que tange à formação de vínculos, a partir dos dados obtidos. Destaca-se a amizade como fator unânime apontado pelos dois grupos pesquisados, além da identidade grupal, do reconhecimento e das estratégias de enfrentamento às adversidades que o movimento disponibiliza aos participantes.

O grupo de pais abordou a troca de afetos entre os membros participantes como aspecto fundamental preconizado, vivenciada a partir dos encontros. Ainda concebe a questão da afetividade como fator proeminente que motiva os adolescentes a permanecerem e se envolverem com o movimento, o que pode ser observado nos relatos a seguir:

[...] Quando você chega ali, você sente a presença de Deus. É impressionante, você vai num jantar, numa reunião, e é ganho pelo amor [...]. E eu experimentei isso. (P4)

A [...] não é só um braço voltado para ajudar as pessoas espiritualmente, mas em relacionamento e amigos também [...]. O legal é que quem vem morar aqui e vai na [...] sabe que tem uma família. (P2)

E os jovens que vão nesses encontros se perguntam: mas o que é isso? Aí ficam impactados... por essa questão do amor, desse grupo gostoso. (P2)

Os relatos demonstram a ênfase conferida ao amor como um dos fatores vivenciados pelos participantes. Essas reflexões suscitam a relevância atribuída à afetividade, a qual pode ser encontrada nesses grupos religiosos enquanto rede de apoio social e afetivo.

Couto (2005) aponta a rede de apoio social como fonte promotora do bem-estar, pois é capaz de promover autoestima, vínculos afetivos, aumento da competência, reforço do senso de pertença, fortalecimento da imagem social e promoção do senso de autoeficácia. Constitui-se ainda como suporte ao enfrentamento de crises, sob a exposição a fatores de risco ou em situações estressantes.

Pietrukowicz (2001) salienta que as práticas religiosas permitem às pessoas interagirem com outras ou em grupo, a partir do estabelecimento de um contato sistemático, criando vínculos de amizade e pertencimento. Assim, o apoio social recebido oportuniza um efeito benéfico como expressão de saúde para as pessoas que participam das atividades.

Verificou-se ainda que o movimento pesquisado, como rede de apoio social e afetivo, parece desempenhar uma função que reforça a participação de seus membros. O significado dos relacionamentos a partir da integração social entre os sujeitos e grupos é passível de verificação nos relatos do grupo adolescente:

O amor que tem uns com os outros é o que mais impacta, porque lá fora no outro dia parece que ninguém tá nem aí contigo, né? Você sai se diverte, mas no outro dia ninguém liga pra ti, não quer saber... Lá tem esse diferencial, tipo o pessoal mantém contato um com outro e acaba formando vínculo forte, e o pessoal de fora vê essa diferença. (A1)

Eu vejo pela vida do pai, assim, pela comunhão, pelos novos amigos que ele tem... uma coisa muito bacana, sabe? Porque tipo, hoje em dia, o pessoal não é mais como antigamente, que tu fazia amigos facilmente, hoje é meio cada um por si. Então, eu vejo que a [...] tem ajudado muito. (A3)

Os depoimentos trazidos por esses adolescentes demonstram a relevância atribuída ao estabelecimento dos vínculos afetivos entre o grupo de jovens, bem como na vida de seus familiares. Observa-se que as redes sociais de apoio tornam-se uma alternativa no panorama contemporâneo, o que, para Meneses e Sarriera (2005), constitui-se como um conjunto de relações que uma pessoa e um grupo possuem, sendo fontes de reconhecimento, de sentimento de identidade, do ser, da competência e da ação. Verifica-se que um dos aspectos comumente encontrado nas redes sociais de apoio refere-se ao senso de pertença ou pertencimento (Couto, 2005; Lacerda, 2010), o que, nessa perspectiva, vem repercutir no sentimento de identidade grupal entre os membros envolvidos.

Outro aspecto emergente a partir dos discursos refere-se à finalidade que o movimento cristão exerce na qualidade de auxílio emocional destinado aos membros familiares, no que tange ao enfrentamento de adversidades, visando à superação dos conflitos, conforme o relato demonstrativo a seguir:

Desde que eu nasci meus pais são da [...], só que se não fosse a [...] meus pais não teriam se convertido, estariam separados hoje, por causa que meu pai teve um filho fora do casamento. Superar essa fase foi complicado, e eu tive que aguentar essa barra, do problema no casamento dos meus pais, bem na minha infância, foi bem complicado assim. Daí a [...] foi bem importante para restaurar tudo. Hoje minha mãe ama esse filho que meu pai tem fora do casamento. (A4)

O depoimento do adolescente (A4) sinaliza que a participação no movimento religioso torna-se relevante nos momentos de crise e de ruptura nos laços familiares que seus membros vivenciaram. A partir dos relatos, constata-se que o movimento religioso pode ser concebido como uma estratégia de enfrentamento e suporte às crises, atuando como uma rede de apoio social protetiva.

Repercussão das práticas religiosas do movimento cristão no relacionamento familiar

Constata-se que a aderência ao movimento parece ter possibilitado algumas mudanças no contexto familiar para ambos os grupos pesquisados, especificamente na qualidade do relacionamento entre pais e filhos adolescentes, no subsistema conjugal, nos paradigmas e valores, bem como na concepção de adolescência e engajamento paterno. O grupo de pais foi enfático quando a essas mudanças:

Hoje a minha família tem outro sentido, porque eu já participei de seminários, palestras... Eu sei como mostrar para os meus filhos, pra minha esposa, os valores cristãos [...]. Esses encontros interferiram na minha vida familiar, religiosa e pessoal. (P4)

Então, é isso que muda numa família, o modo que você fala, que você entende os filhos, o amor entre marido e mulher [...]. Claro, você é um homem, mas você deixa de procurar uma coisa diferenciada pra se alegrar, entendeu? Então, você vê que nada melhor que a família... Porque a vida passa tão curta, tão rápida, que você pensa: "puxa, o que eu tô fazendo?". (P5)

Os relatos compartilhados evidenciam, num primeiro momento, mudanças em relação aos valores e princípios adotados pela família; o que no momento presente expressa-se sob a ótica cristã, a partir da participação no movimento religioso. Os dados sugerem maior qualidade no relacionamento familiar, uma vez que a mudança nas condutas e comportamentos influencia na compreensão dos filhos adolescentes. Já no subsistema conjugal familiar, o discurso de P5 parece demonstrar mudanças de concepções quanto à afetividade do casal e à priorização da família, como um aspecto essencial na vida do participante, permitindo reflexão e questionamentos em relação à dimensão existencial frente à brevidade da vida.

Rabinovich, Costa, Lins e Franco (2008) salientam que há diversos aspectos que interferem diretamente na vida do sujeito e que o mobilizam para aderir aos movimentos religiosos, como igrejas e grupos de oração. Reportando essa busca espiritual para o âmbito familiar, verifica-se que, a partir da aderência a esses movimentos, é comum que os participantes relatem mudanças significativas na qualidade da relação com seus filhos e cônjuges, uma vez que há o encontro com algo maior que permite perceber um significado existencial e um sentido de vida nas atividades cotidianas.

No que se refere à concepção dos adolescentes acerca das mudanças e influências na relação familiar a partir do envolvimento no movimento, os resultados expressaram transformações de âmbito relacional na família, especificamente no clima emocional, afetivo, e ainda no casamento dos pais, conforme se pode observar abaixo:

Influencia totalmente, né? Porque quando você tem uma harmonia de fé, seja na igreja, na [...], você consegue levar isso pra dentro da casa. Como todos vão, cria-se tipo mais que uma relação de pai, mas uma grande amizade, fica uma paz... Antigamente eu vejo que com o meu pai era feio o negócio (risos), ele brigava bastante em casa. Hoje vejo que com Deus na vida do meu pai, mudou muito. Isso fez uma grande mudança, ele ir nesses encontros e ter um encontro com Deus. Hoje, meus pais raramente brigam, hoje eles dão curso de "casados para sempre". (A5)

Percebe-se a relevância que os adolescentes atribuem ao engajamento dos pais no movimento religioso, uma vez que isso pode oportunizar novas condutas e hábitos familiares, especialmente da figura paterna. Observa-se que os laços afetivos tornam-se mais estreitos na medida em que há o envolvimento da família no movimento, o que implica minimização dos desentendimentos entre o casal e "mudanças dentro de casa" (A5). Em vista disso, Sanchez e Nappo (2008) enfatizam que a fé promove a qualidade de vida pessoal e relacional dos indivíduos, por permitir a adoção de referenciais e de práticas religiosas, produzindo mudanças substanciais no intercâmbio social e, portanto, nas relações familiares.

De acordo com Weber, Brandenburg e Salvador (2006), outro fator preponderante que repercute na qualidade da relação familiar relaciona-se ao envolvimento paterno. Esse conceito remete à ideia de interação, acessibilidade e responsabilidade da figura paterna com o filho. Observou-se que a vivência no movimento religioso parece ter contribuído para o maior cuidado e participação na vida dos filhos, especialmente da figura paterna, como uma construção que se estabeleceu desde a infância, como evidenciado nos seguintes relatos:

A minha filha começou indo comigo com quatro aninhos na [...] porque eu fui pai e mãe ao mesmo tempo, e como foi importante esse convívio que eu tive com a [...]. Veja bem, se eu tivesse ido para um outro caminho, o que a minha filha teria sido hoje? A minha filha hoje é uma bênção. (P4)

[...] Nossos filhos pequenos vão crescer com essa mentalidade, com um coração limpo, sabendo que os seus pais estarão presentes [...] e acredita num poder sobrenatural que estará ali ajudando. Às vezes, quando eles ficam doentes, nós pegamos e oramos. Coisa que eu não fazia antes [...]. (P5)

Evidencia-se no relato de P4 que a participação do pai com a filha de forma sistemática nos encontros religiosos não somente fortaleceu o envolvimento paterno, como, concomitantemente, possibilitou o desenvolvimento do senso religioso, mediado pela figura do pai a partir dos rituais religiosos, a exemplo da oração, conforme expressado no relato de P5. Observam-se ainda os valores religiosos a que os filhos serão conduzidos a partir da aderência dos pais ao movimento, o que pode contribuir para a segurança quanto ao papel parental desempenhado, bem como à transmissão da crença sobre "um poder sobrenatural que estará ali te ajudando" (P5).

No que se refere ao grupo de adolescentes pesquisados, dos seis participantes, cinco mencionaram a relevância que atribuem ao envolvimento parental com suas famílias. Relacionaram-se aspectos de cooperação com os pais a partir das atividades desenvolvidas no movimento religioso, bem como a importância que os jovens atribuem aos princípios religiosos recebidos e o tempo que os pais dedicam para estarem com eles, conforme expõem os recortes ilustrativos:

O meu pai sempre jogava futebol com os amigos, uma coisa que fazia falta era de ficar com a família também... Daí, ele vindo aqui, tudo ajudou e ele fica mais com a gente. Porque, ouvindo os testemunhos das pessoas ele vai ganhando experiências, né? Sobre Deus, a fé, a família... (A3)

Todos os dias meus pais oram comigo, a gente sempre faz devocional (oração matinal), essas coisas. Isso influencia a nossa família, a minha vida [...] isso é muito bom. (A6)

Constata-se no relato dos jovens a relevância que estes atribuem à presença, acompanhamento e participação dos pais em seu desenvolvimento, ou seja, o quanto estes os apoiam, são sensíveis às suas reações, estão presentes, disponíveis e demonstram afeto. Observa-se ainda que os princípios cristãos recebidos pelos participantes constituem-se como um referencial que os subsidia na condução de sua trajetória e influencia no clima familiar de maneira positiva, como constatado no relato a seguir:

[...] Eu aprendi os princípios e esses princípios influenciam o modo de viver, mas como eu posso te dizer?... Gera um clima sem tribulações na família. (A2)

O grupo de pais também considerou como sua atribuição, a partir da aderência ao movimento, transmitir aos filhos os princípios religiosos, o que em sua concepção é visto como aspecto importante para o êxito pessoal, assertividade no relacionamento familiar e formação espiritual, conforme ilustrado nos depoimentos materno e paterno a seguir:

A gente acaba aplicando esses conceitos em casa com os filhos da gente [...] A minha turminha lá em casa foi muito influenciada por esses retiros, palestras, evento [...] Então, eu não tive dificuldades nenhuma com os meus filhos, com a educação deles. Porque foi feita essa base. (M1)

A minha filha não conviveu com uma religião, mas ela conviveu com a Palavra de Deus. Eu vejo a importância hoje do que criou na mente dela. (P4).

Às vezes, os pais dão o melhor carro do ano, dão o melhor quarto, os melhores jogos, mas não dão o que é melhor: a formação espiritual. Porque a gente é um ser espiritual. (P2)

Vislumbra-se nesses discursos que transmitir valores cristãos e espirituais aos filhos parece uma possibilidade de ser assertivo na educação dos adolescentes, propiciando a afetividade entre pais e filhos, o que contribui para o desenvolvimento religioso/espiritual destes. A transmissão dos valores e da religiosidade cristã implica o desenvolvimento de habilidades sociais imbuídas nos aspectos morais e éticos, os quais possibilitam ao desenvolvimento do indivíduo um espaço de suporte, ajuda mútua e autonomia (Mota, 2005).

 

Considerações finais

O relacionamento familiar entre pais e filhos adolescentes a partir das vivências religiosas e espirituais experimentadas pela família nos permite um novo olhar sobre a formação de conceitos e fenômenos que têm emergido no cenário contemporâneo. A partir da análise dos dados, evidenciaram-se percepções diversas no que tange às práticas religiosas que o movimento cristão proporciona, bem como ao significado destas, ora delimitando as experiências religiosas-espirituais, ora enfocando a dimensão de rede de apoio social e afetivo. Os resultados evidenciaram o impacto da religiosidade/espiritualidade no relacionamento familiar e na vida pessoal dos participantes, destacando-se o envolvimento parental e a transmissão dos valores religiosos cristãos, concebidos como estratégias que visam auxiliar nas práticas educativas e no desenvolvimento do ser humano como um todo.

Em relação ao significado das experiências religiosas-espirituais, tanto o grupo de pais quanto o dos adolescentes demonstraram o impacto dessas experiências sobre suas vidas, especialmente no que se reporta ao fortalecimento da fé e às concepções de senso religioso. Evidenciou-se o processo do desenvolvimento religioso dos adolescentes, inter-relacionado ao desenvolvimento cognitivo e moral, com vistas à transição entre a heteronomia e o ensaio da autonomia religiosa-espiritual, o que pôde ser constatado nos discursos dos jovens.

À guisa de conclusão, podem-se apontar algumas dificuldades encontradas na coleta de dados, como a ausência de alguns integrantes, tanto do grupo de pais quanto do grupo de adolescentes, na realização do grupo focal. Além disso, após a revisão de literatura, verificou-se que pesquisas sobre religião e espiritualidade desenvolvidas no panorama acadêmico ainda são abordadas de forma incipiente, sendo pouco difundidas em âmbito nacional, principalmente relacionadas às repercussões no relacionamento familiar. Em vista disso, sugere-se o desenvolvimento de pesquisas envolvendo temas relacionados a religiosidade e espiritualidade e suas repercussões na família.

A continuidade de estudos nessa perspectiva poderá contribuir para o avanço científico e auxiliar não somente os pais, como os profissionais que atuam com famílias, a considerar a dimensão religiosa-espiritual como um aspecto integrante no desenvolvimento do ser humano que pode atuar como fator protetivo, capaz de promover a saúde, a resiliência e a qualidade de vida em diferentes contextos sociais.

 

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Endereço para correspondência:
Ana Paula Sesti Becker
anapaulasbc@hotmail.com
Tânia Paza Maestri
taniamaestri@hotmail.com
Sueli Terezinha Bobato
suelibobato@hotmail.com

Submetido em: 11/03/2013
Revisto em: 30/11/2014
Aceito em: 03/02/2015

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