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Arquivos Brasileiros de Psicologia

versão On-line ISSN 1809-5267

Arq. bras. psicol. vol.67 no.3 Rio de Janeiro  2015

 

ARTIGOS

 

Uma comparação do desenvolvimento moral de adolescentes entre duas décadas

 

A comparation of the moral development of adolescents between two decades

 

Una comparación del desarrollo moral de adolescentes entre dos décadas

 

 

Pollyana Lucena MoreiraI; Cleonice Pereira dos Santos CaminoII; Júlio RiqueIII

IDoutoranda. Programa de Pós-Graduação em Psicologia Social. Universidade Federal da Paraíba (UFPB). João Pessoa. Estado da Paraíba. Brasil
IIDocente. Programa de Pós-Graduação em Psicologia Social. Universidade Federal da Paraíba (UFPB). João Pessoa. Estado da Paraíba. Brasil
IIIDocente. Programa de Pós-Graduação em Psicologia Social. Universidade Federal da Paraíba (UFPB). João Pessoa. Estado da Paraíba. Brasil

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

Este estudo comparou a qualidade do julgamento moral de 222 adolescentes de 14 a 17 anos, nos anos de 1996 e 2011. A Teoria do Desenvolvimento Moral de Kohlberg foi usada como suporte teórico. O Defining Issues Test foi aplicado como medida de julgamento moral. Verificou-se que os Estágios 3, 4 e 5 foram dominantes no julgamento moral dos adolescentes na amostra total, com a média do Estágio 4 superior às médias dos demais estágios. Uma comparação do julgamento pós-convencional (Estágio 5) mostrou que a média desse estágio para os adolescentes de 2011 foi superior e significativamente diferente da média desse estágio para os adolescentes de 1996 (p < 0,001; d = 0,30). Atribuiu-se as diferenças encontradas nesse estudo, principalmente no que diz respeito ao uso de julgamentos de Estágio 5 para os adolescentes de 2011, à mudança na política educacional do ensino médio ocorrida em 1996, com a Lei nº 9.394, que estabeleceu as Diretrizes e Bases da Educação Nacional - LDB.

Palavras-chave: Julgamento moral; Adolescentes; DIT; Educação moral.


ABSTRACT

This study compared the quality of moral judgment of 222 adolescents, ages between 14 and 17 years old, in 1996 and 2011. Kohlberg's Theory of Moral Development was used as a theoretical reference. The Definning Issues Test was used as a measure of moral judgment. Results showed for the two decades that Stages 3, 4 and 5 were dominant in the moral judgment of adolescents and Stage 4 was significantly higher in average than the other stages. Still, the post-conventional moral thinking of Stage 5 was significantly higher (p < 0,001; d = 0,30) in 2011 than in 1996. These results, particularly the preference of use of Stage 5 for adolescents in 2011, were attributed to changes occasioned by Law No. 9394, which established the National Guidelines of Education.

Keywords: Moral judgment; Teenagers; DIT; Moral education.


RESUMEN

Este estudio comparó la calidad del juicio moral de 222 adolescentes de 14 a 17 años, en 1996 y 2011. Como soporte teórico, se utilizó la Teoría del desarrollo moral de Kohlberg. Se aplicó, como medida del juicio moral, el Defining Issues Test. Los resultados indicaron que las etapas 3, 4 y 5 fueron dominantes en el juicio moral de los adolescentes en la muestra total, y que la media del Etapa 4 fue superior a las medias de las otras etapas. Una comparación del juicio postconvencional (Etapa 5) mostró que la media de esta etapa, para los adolescentes en 2011, fue superior y significativamente diferente (p < 0,001; d = 0,30) de la media de esta etapa para los adolescentes en 1996. Las diferencias encontradas en este estudio, especialmente acerca del uso de juicios de la Etapa 5 para los adolescentes en 2011, fueron atribuidas al cambio en la política educativa de la escuela secundaria, producida en 1996, por medio de la Ley Nº 9394, que estableció las directrices y bases de la Educación Nacional - LDB.

Palabras clave: Juicio moral; Adolescentes; DIT; Educacíon moral.


 

 

As reflexões propostas neste artigo se referem às mudanças ocorridas no contexto educacional brasileiro entre as décadas de 1970 e 2000, principalmente no que diz respeito à importância dada à educação moral como uma ferramenta do Estado para a formação e desenvolvimento do caráter moral e da consciência ética da cidadania nos jovens. Compreendemos caráter não como traço de personalidade, como comumente é defendido pela educação e psicologia, mas como um conjunto de fatores psicológicos que incluem a capacidade para pensar em termos de justiça (julgamento moral), capacidade empática e de tomada de perspectiva social, e, mais importante, a motivação ou vontade para ações que caracterizam a obtenção de metas voltadas para o futuro com melhorias na sociedade.

A educação moral foi inserida no currículo educacional brasileiro pelo Decreto-Lei nº 869, de 12 de setembro de 1969, que tornou obrigatórias no ensino básico as disciplinas Educação Moral e Cívica, Organização Social e Política Brasileira, e no ensino superior Estudo dos Problemas Brasileiros. Conforme o artigo 2º, do referido Decreto-Lei, essas disciplinas deveriam promover no aluno:

(a) a defesa do espírito democrático e da dignidade da pessoa humana [...]; (b) a preservação e o fortalecimento da proteção dos valores espirituais e éticos de nacionalidade; (c) o fortalecimento da unidade nacional e do sentimento de solidariedade humana; (d) o culto à pátria e aos seus símbolos, tradições, instituições e aos grandes vultos de sua história; (e) o aprimoramento do caráter, com apoio na moral, na dedicação à família e à comunidade; (f) a compreensão dos direitos e deveres dos brasileiros e o conhecimento da organização sócio-político-econômica do país; (g) o preparo dos cidadãos para o exercício das atividades cívicas com fundamento na moral, no patriotismo e na ação construtiva, visando o bem comum; h) o culto da obediência à lei, da fidelidade ao trabalho e da integração na comunidade (Brasil, 1969, Artigo 2º).

No momento do estabelecimento do Decreto-Lei acima mencionado, o Brasil vivia sob o domínio de um regime militar, período de suspensão da democracia, da liberdade civil e do respeito aos direitos humanos. Mesmo mantendo na sua formulação princípios liberais, como a defesa da dignidade e da solidariedade humana, havia nessa diretriz educacional uma imposição da necessidade do respeito ao governo a partir "da preservação, do fortalecimento e da projeção dos valores espirituais e éticos da nacionalidade", do "culto à Pátria, aos seus símbolos e instituições" e do "culto à obediência à lei" (Brasil, 1969, Artigo 2º). Nesse contexto, a formação dos jovens para a cidadania não os preparava para agir na sociedade com pensamento crítico e reflexões acerca da responsabilidade cívica individual em prol do bem-estar comum. O decreto representava antes uma ferramenta utilizada pelo Estado para orientar a conduta individual e grupal, no sentido de promover o consenso na população sobre as normas e valores impostos pelo governo (Correia, 2007). Camino, Paz e Luna (2009), ao realizarem uma análise do conteúdo de manuais de Educação Moral e Cívica das décadas de 1970 e 1980, verificaram que esses manuais ressaltavam a importância dos valores morais para a sociedade, mas não os apresentavam como sendo produto de uma construção individual, a partir das interações sociais. Indicavam, sobretudo, a ideia de moral ligada ao princípio da obediência, ou seja, o uso da moral heterônoma, como apresentado por Piaget (1932/1994), como sendo o modo mais adequado para a formação do cidadão.

No ano de 1985 chegou ao fim o regime militar. O Brasil passou por um processo de redemocratização política, econômica e educacional. Este processo providenciou a saída dos militares do governo, mantendo, porém, os mesmos agentes políticos atuando na administração da nação. Por exemplo, os partidos políticos foram renomeados, mas geridos pelos mesmos representantes que atuavam no governo militar. Com relação à educação, no ano de 1993 foram iniciadas modificações no currículo a partir do Decreto-Lei nº 8.663 (Brasil, 1993), que excluiu a obrigatoriedade do ensino das disciplinas Educação Moral e Cívica, Organização Social e Política Brasileira, e Estudo dos Problemas Brasileiros. Em 1996, a Lei nº 9.394 (Brasil, 1996) estabeleceu as Diretrizes e Bases da Educação Nacional - LDB com a finalidade de reformular o currículo educacional, direcionando o ensino básico para a formação da cidadania e de um espírito ético, com base no pensamento crítico, e estabelecendo metas a serem cumpridas para melhorar a qualidade da educação. Algumas dessas metas consideraram a necessidade da difusão de valores fundamentais ao interesse social, dos direitos dos cidadãos e do respeito ao bem comum e à ordem democrática nos conteúdos curriculares. Para se cumprir as metas estabelecidas pela LDB foram apresentadas diretrizes pelos Parâmetros Curriculares Nacionais - PCNs.

Os PCNs, publicados em sua primeira edição no ano de 1998, mantiveram o ensino da moral e da ética como essenciais para a formação de cidadãos. Entretanto, tendo em vista a exclusão das disciplinas Educação Moral e Cívica e Estudo dos Problemas Brasileiros, devido ao caráter doutrinador que estas receberam durante o regime militar (Brasil, 1998), a educação moral e a ética passaram a ser abordadas como temas transversais, ou seja, foram incluídas nos conteúdos interdisciplinares das disciplinas obrigatórias e em situações que envolviam o cotidiano escolar, não havendo assim disciplinas específicas para seu estudo.

Para os PCNs, moral e ética são conceitos entrelaçados, mas que precisam ser entendidos considerando suas especificidades. A moral é construída nas relações sociais e consiste em um conjunto de princípios, crenças e regras que orientam o comportamento. A ética representa as reflexões sobre princípios morais e sobre a justiça e, de acordo com Pereira e Silva (2008), permite que as pessoas entendam seu papel na sociedade e assumam as responsabilidades de cidadãos. Os autores deste trabalho, particularmente, discordam de uma distinção entre a moral e a ética. Acredita-se que uma formação moral pautada em raciocínios de justiça leva ao pensamento ético como um único domínio do pensamento humano.

Após o estabelecimento da LDB e dos PCNs, discussões sobre a formação da cidadania e sobre o entendimento de questões morais e éticas passaram a ter maior atenção por parte dos programas educacionais desenvolvidos pelo governo federal brasileiro. Como exemplo, temos o Plano Nacional de Educação em Direitos Humanos - PNEDH e o Programa Ética e Cidadania, ambos elaborados nos anos 2000. Estes dois projetos foram desenvolvidos pelo Ministério da Educação com o objetivo de direcionar políticas educacionais para a formação da cidadania a partir do desenvolvimento de um pensamento reflexivo sobre questões éticas, tendo em vista o respeito pelos direitos humanos.

Os investimentos do governo federal, na promoção de uma educação voltada para a formação da cidadania, fomentaram a realização de estudos para verificar a eficácia dessa formação através dos temas transversais (Amarantes, 2010; Menin, Trevisol, & Martins, 2010; Menin & Zechi, 2010; Shimizu, Menin, Bataglia, & Martins, 2010; Trevisol, 2011).

De forma geral, esses estudos investigaram como os agentes escolares (diretores, coordenadores e professores) concebiam a educação moral, quais os temas que deveriam ser abordados nesse tipo de educação, quais os meios de se propor uma educação moral e quais as motivações para se realizar a educação moral. Os resultados dessas investigações indicaram, com relação à concepção de educação moral dos agentes escolares, que para eles o objetivo de uma educação moral era promover uma convivência harmoniosa no ambiente escolar, ensinar aos alunos os valores que não são transmitidos pelas famílias (Shimizu et al., 2010), promover uma consolidação entre valores e cidadania e o respeito nas relações, seja entre os alunos ou entre os alunos e professores (Menin et al., 2010; Menin & Zechi, 2010).

No que diz respeito aos temas trabalhados na educação moral, os estudos indicaram a abordagem de temas relacionados com (1) justiça; (2) direitos humanos: saúde (Shimizu et al., 2010), defesa dos direitos humanos, preconceito racial (Menin & Zechi, 2010); (3) relações interpessoais: valores espirituais (Shimizu et al., 2010), tolerância, cooperação, sensibilidade ao próximo, amizade, humildade, honestidade, solidariedade (Menin & Zechi, 2010), resolução de conflitos interpessoais (Menin et al., 2010); e (4) relações com a sociedade: respeito às leis, civismo, urbanidade (Shimizu et al., 2010), paz e não violência.

Quanto aos meios de se realizar a educação moral nas escolas, esses estudos indicaram o uso de disciplinas obrigatórias, como História e Sociologia, atuando como mediadoras dessa educação (Menin et al., 2010; Shimizu et al., 2010), e indicaram ainda o uso de filmes, debates, palestras e pesquisas como instrumentos de educação moral (Menin et al., 2010; Menin & Zechi, 2010).

Com o entendimento de que a educação moral deve servir como ferramenta para a promoção da cidadania, de forma transversal no currículo escolar, Menin e Zechi (2010) verificaram que a principal motivação para a realização de projetos de educação moral nas escolas consistiu na necessidade de se resolver conflitos interpessoais entre alunos e entre alunos e professores, não sendo mencionadas, em momento algum, as propostas dos PCNs para o desenvolvimento do pensamento moral e ético.

Trevisol (2009), ao investigar os sentidos atribuídos por professores do ensino fundamental e médio sobre a construção de valores na escola, verificou que os professores têm consciência do papel da escola na formação social e moral dos alunos, da necessidade de se preparar o currículo educacional integrando conteúdos formais e éticos, mas apontam que eles próprios (os professores) não possuem a formação necessária para lidar com esse tipo de educação no cotidiano escolar. Camino et al. (2009) acrescentam, com base na literatura, que falta aos professores o conhecimento sobre teorias de desenvolvimento moral que possam auxiliá-los na prática desse processo educativo.

A partir da revisão apresentada, observa-se que nos últimos trinta anos houve uma preocupação do governo brasileiro em apresentar conteúdos morais para a população, seja de forma doutrinária e demagógica, como indica Menin (2002), seja de modo interdisciplinar e preocupado com a participação social, como apresentado pelos PCNs (Brasil, 1998, 2000). A reformulação do conceito e da aplicação dos valores morais pela sociedade, entre as décadas de 1970 e 2000, pode representar um período em que os valores apresentaram-se em crise, como mencionado por Rique (2009): inicialmente concebida com uma representação de valores cívicos e que esteve relacionada com a obediência às leis e tradições sociais, a moral passou a ser relacionada com a cidadania, com o respeito aos direitos coletivos e com a obtenção de um bem-estar social.

Durante o período em que o Brasil esteve sob regime militar, e ainda no pós-regime militar, mais precisamente entre os anos de 1969 e 1993, a moral, apresentada nas escolas e universidades por meio de disciplinas obrigatórias, incentivava a formação de valores relacionados ao patriotismo e ao civismo. Essa concepção de moral foi propagada de modo a promover nos cidadãos o respeito irrestrito às leis e tradições culturais, retirando da população a possibilidade de exercer sua autonomia e de expor um pensamento crítico.

Após o regime militar, o modelo educacional com base na doutrinação em valores foi banido das escolas, inicialmente com a retirada do currículo educacional das disciplinas criadas com esse propósito. A elaboração de um novo currículo educacional, pensado para a construção de uma sociedade democrática, indicava a necessidade de formação de cidadãos comprometidos com esses ideais. E, para isso, era preciso reformular a concepção de moral na educação, que por muito tempo foi compreendida como um ideal doutrinador. O novo currículo educacional, elaborado a partir da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional - LDB, apresentava uma nova proposta de estudo da moral e da ética, que incluía a necessidade de promoção do desenvolvimento de um pensamento crítico, necessário para a formação de cidadãos responsáveis e comprometidos com a justiça social.

Ao considerar a mudança na compreensão do papel da moral para a educação no Brasil entre as décadas de 1970 e 2000, resta saber se as diferenças, no que concerne à apresentação e à compreensão da moral pelas disciplinas ligadas à moral e à ética, promoveram mudanças na qualidade do pensamento moral de adolescentes. Enfatiza-se aqui que teorias cognitivas (Kohlberg, 1984; Selman, 1976) ressaltam a importância do contexto social, a partir das oportunidades de interações sociais, como um fator para o desenvolvimento moral das pessoas. É neste sentido que se justifica o objetivo do presente trabalho: verificar se houve mudanças na qualidade do desenvolvimento moral de adolescentes entre duas décadas distintas.

 

A teoria do desenvolvimento moral de Kohlberg

Kohlberg desenvolveu sua teoria a partir de pesquisas realizadas com adolescentes nos Estados Unidos. A partir desses estudos, a moral foi defendida por Kohlberg como um domínio psicológico consciente, que é responsável por regular as ações das pessoas nas relações interpessoais a partir de julgamentos sobre o que é certo e errado, sendo esses julgamentos feitos com base em princípios de justiça. Na proposta de desenvolvimento moral de Kohlberg (1984), a justiça consiste em um princípio construído ao longo do desenvolvimento ontogenético, tendo o contexto social um papel essencial nesse processo.

A compreensão sobre o desenvolvimento progressivo da ideia de justiça, ao longo do desenvolvimento ontogenético, pode ser atingida quando se entende o paralelismo existente entre o desenvolvimento lógico, o desenvolvimento da tomada de perspectiva social e o desenvolvimento do julgamento moral. Esse paralelismo se apresenta estruturado da seguinte forma: as operações lógicas (Piaget, 2010), que são a base da inteligência e que proporcionam às pessoas a capacidade de agir e interagir no mundo social, possibilitam o desenvolvimento da tomada de perspectiva social (Selman, 1976). Esta, por sua vez, apresenta-se como uma condição necessária para o desenvolvimento do julgamento moral, facilitando este desenvolvimento. Assim, ao se deparar com um novo conhecimento, a pessoa tem a possibilidade de ter avanços no domínio cognitivo, a partir de assimilações e acomodações sobre esse novo conhecimento. As assimilações permitem que o novo conhecimento seja inserido em um esquema de ação da pessoa e a acomodação faz com que esse esquema se adeque ao novo conhecimento, havendo assim uma reorganização de seus elementos. A presença de um novo conhecimento possibilita também avanços no domínio da tomada de perspectiva social, quando a pessoa se torna capaz de coordenar as diferentes perspectivas sociais, possibilitando, assim, a construção de princípios morais.

O desenvolvimento lógico e o desenvolvimento da tomada de perspectiva social se apresentam como necessários para o desenvolvimento moral; e quanto mais complexos os conflitos morais de justiça se apresentam (exigindo uma resolução do problema), mais complexos serão os níveis de desenvolvimento cognitivo e de tomada de perspectiva social que a pessoa chamada a resolver esses conflitos deve apresentar. No entanto, atingir níveis elevados de pensamento lógico e de tomada de perspectiva social não indica, necessariamente, que as pessoas atingirão um nível elevado de pensamento moral ou ético. Mesmo tendo as estruturas lógicas necessárias para um pensamento moral elevado, e mesmo sendo capazes de coordenar diferentes perspectivas dentro de uma mesma situação social, é possível que as pessoas não apresentem essa mesma complexidade no que se refere ao julgamento moral. É na qualidade desse conjunto de habilidades que se define o caráter ético de uma pessoa.

A maturidade do pensamento moral de justiça é apresentada por Kohlberg (1976) em um modelo de desenvolvimento que envolve três níveis, sendo cada nível composto por dois estágios. O nível pré-convencional é caracterizado por um período de egocentrismo e a ideia de justiça é guiada pela obediência heterônoma e pelo respeito à autoridade, sendo moralmente corretas aquelas ações que não acarretam punição para quem as pratica (Estágio 1). Posteriormente, quando se desenvolve a concepção de que em uma mesma situação as pessoas podem ter pontos de vista diferentes, observa-se que as justificativas sobre o que é certo ou errado são construídas de acordo com os interesses individuais (Estágio 2).

No nível convencional observa-se a integração de uma terceira perspectiva nas relações sociais de uma pessoa. Como membro de um grupo, a ideia de justiça está inicialmente ligada à Regra de Ouro: faça aos outros aquilo que você gostaria que fosse feito a você (Estágio 3). Posteriormente, ao se perceber como membro, não só de um grupo, mas de uma sociedade, a ideia de justiça passa a envolver a noção de respeito às leis e às instituições sociais (Estágio 4).

No nível pós-convencional a pessoa se vê não apenas como um membro da sociedade, mas como um agente moral, consciente dos seus direitos, deveres e valores. Nesse nível a noção de justiça é pautada pelo contrato social (Estágio 5), onde as pessoas têm consciência da importância das leis e das normas sociais para o bem-estar coletivo. Entretanto, se percebem que as leis não garantem a proteção aos Direitos Humanos, suas ações passam a ser guiadas com base em princípios que protegem os direitos infligidos. Posteriormente (Estágio 6), os princípios de justiça são assimilados com princípios categóricos (kantianos) e ações e julgamentos são pautados em princípios éticos universais.

A sequência de estágios morais apresentada por Kohlberg (1984) é defendida em seus elementos universais na medida em que componentes invariantes da sequência podem ser observados em diversas culturas. Um desses componentes é a invariância na ordem dos estágios morais, ou seja, todas as pessoas passam pela mesma ordem de avanço nos níveis propostos, não havendo possibilidades de saltos entre os estágios. Kohlberg (1984) indica que conflitos cognitivos motivam o avanço na sequência de estágios. O avanço ocorre quando uma pessoa, em uma situação de conflito entre pontos de vista diferentes, consegue coordenar as diferentes perspectivas em questão, de forma a encontrar uma solução para a situação que reestrutura as perspectivas em jogo.

A importância do conflito cognitivo para o desenvolvimento do pensamento moral foi ressaltada também por Oser (1986), em um estudo no qual este autor realizou um levantamento das propostas de educação moral, com base psicológica, utilizadas para promoção do desenvolvimento moral. Oser verificou que as técnicas de discussões de dilemas morais, sejam eles reais ou fictícios, funcionavam como um fator motivador para o surgimento de um conflito cognitivo. O uso desse tipo de técnica, onde todos os membros do grupo têm a oportunidade de conhecer o ponto de vista dos outros, e também de apresentar o seu próprio, motiva não apenas o surgimento do conflito cognitivo, mas também proporciona as oportunidades de tomada de perspectiva social, e, consequentemente, a coordenação dessas diferentes perspectivas, necessárias para o avanço do pensamento moral.

 

Mensuração do julgamento moral e estudos empíricos no Brasil

Estudos longitudinais realizados por Kohlberg em três culturas foram importantes para verificar as suposições de sua teoria: Estados Unidos (Kohlberg, 1958, citado por Kohlberg, 1984), Turquia (Turiel, Edwards, & Kohlberg, 1978), e Israel (Snarey, Reimer, & Kohlberg, citado por Kohlberg, 1984). Nesses estudos, Kohlberg verificou tanto a invariância na sequência de estágios, como a existência de diferenças culturais no desenvolvimento moral com relação à idade. Essas diferenças estiveram relacionadas com as oportunidades de tomada de perspectiva social que cada cultura oferecia a seus membros, fator responsável pelo ritmo com que o processo de desenvolvimento moral ocorre.

O julgamento moral foi avaliado nesses estudos com uso do Moral Judgment Interview - MJI. Esse instrumento elaborado por Colby e Kohlberg (1987) é composto por um conjunto de nove dilemas morais, agrupados em três versões (cada versão com três dilemas). O dilema de Heinz é, entre todos, o dilema mais conhecido e utilizado mundialmente. Nele, a esposa de Heinz sofre com um tipo raro de câncer que pode matá-la. Um farmacêutico da cidade desenvolveu um remédio que pode curá-la, mas o vende por um preço que Heinz não pode pagar. Com o intuito de salvar a vida de sua esposa, Heinz pensa em roubar o remédio. As questões levantadas sobre esse dilema dizem respeito ao valor e manutenção da vida vs. o respeito às leis. Os outros dois dilemas mais conhecidos do MJI apresentam conflitos sobre a consideração pelo caráter e consciência da própria ação vs. a conformidade com os padrões institucionais de justiça e com a necessidade de punição - dilema sobre o prisioneiro foragido; e sobre a manutenção de contrato social vs. manutenção da autoridade - dilema sobre a promessa.

Por se tratar de uma entrevista estruturada, a análise do nível de julgamento moral demanda muito tempo tanto na sua administração como na análise do conteúdo das respostas. Assim, pensando em simplificar a forma de mensuração do julgamento moral, Rest, Cooper, Coder, Masanz e Anderson (1974) desenvolveram o Defining Issues Test, ou DIT, como é mais conhecido. Esse instrumento consiste em uma medida objetiva para a verificação do julgamento moral, composta por seis dilemas morais, sendo cada dilema seguido por 12 afirmativas, que representam os diferentes estágios de julgamento moral elaborados por Kohlberg (1984). No DIT, o julgamento moral é avaliado a partir da identificação, por parte dos respondentes, com a qualidade dos julgamentos expressados pelos itens.

Com o DIT, além de se verificar o estágio dominante do pensamento moral, que é aquele utilizado com maior frequência por uma pessoa, é possível também se verificar a consistência e a inconsistência no pensamento moral. Rique e Camino (1997) indicam que o período de consistência do pensamento moral representa um momento de estabilidade ou de acomodação de um conhecimento. Já o período de inconsistência representa um momento de instabilidade ou de assimilação de um conhecimento. Nesse momento, o pensamento moral envolve o uso de mais de um estágio, de forma que é possível observar uma frequência de 40% ou mais de uso do estágio dominante, seguido de baixas frequências de uso de um estágio anterior e de um estágio posterior a ele.

No Brasil, os estudos sobre desenvolvimento moral seguindo a proposta teórica de Kohlberg foram iniciados por Ângela Biaggio em 1976. Uma revisão desses estudos mostrou que até o início da década de 2000 as pesquisas utilizando o MJI ou o DIT indicavam o uso predominante de julgamentos de nível convencional por adolescentes, ou seja, julgamentos voltados para a manutenção das expectativas sociais e para a obediência às leis como uma forma de manter a ordem social (Biaggio, 1976, 1985, 1989; Bzuneck, 1979; Camino, Rique, Ribeiro, & Araújo, 1996; Marcolin & Biaggio, 1985; Rique & Camino, 1997; Silva, 1991; Soares, 1996; Viana, 2000), com exceção de um estudo realizado por Gerbase (1984), no qual foi verificado o uso de pensamentos pós-convencionais (Estágio 5). Esses resultados apoiam a proposta kohlberguiana que indica que o julgamento moral de adolescentes ocorre no nível convencional.

Ao considerar que os métodos de educação moral, principalmente aqueles que utilizam técnicas de discussão de dilemas morais, como as indicadas por Oser (1986), e até mesmo a discussão de problemas sociais entre amigos, podem proporcionar a motivação necessária para o conflito cognitivo, e, consequentemente, o avanço no desenvolvimento moral; questiona-se se ocorreram mudanças no julgamento moral de adolescentes como consequência das mudanças realizadas na estrutura educacional brasileira entre as décadas de 1970 e 2000. Mais especificamente, pretende-se avaliar o julgamento moral de adolescentes, que foram e estão sendo educados sob um currículo educacional que propõe o estímulo à discussão de questões morais e éticas nas escolas, quando comparados com adolescentes que tiveram sua educação básica pautada em princípios morais de obediência.

Para atingir o objetivo proposto, comparar-se-á a qualidade do julgamento moral de dois grupos de adolescentes, alunos do ensino médio de uma mesma escola privada, em dois momentos distintos: um grupo de adolescentes do ano de 1996 (ano de implementação da LDB), que foram educados com os princípios educacionais do Decreto-Lei nº 869 (Brasil, 1969); e um grupo de adolescentes do ano de 2011, que estiveram inseridos em nova estrutura educacional que exigia a abordagem de questões morais e éticas, de forma transversal durante o ensino fundamental e médio.

 

Método

Participantes

Participaram do presente estudo 222 adolescentes com idade média de 16 anos (DP = 0,96). Estes adolescentes foram divididos em dois grupos: um grupo correspondente ao ano de 1996 (N = 111 adolescentes; 74 homens e 37 mulheres) e outro grupo correspondente ao ano de 2011 (N = 111 adolescentes, 42 homens e 69 mulheres).

Instrumentos

Questionário Biodemográfico

Um questionário biodemográfico foi utilizado para se obter informações sobre sexo e idade dos participantes.

Defining Issues Test - DIT

Como medida de julgamento moral, foi utilizada uma versão do Defining Issues Test adaptada para o contexto brasileiro por Camino et al. (1996). Esse instrumento foi validado em amostras de adolescentes e jovens, com idades de 11 a 19 anos, e apresentou índices de consistência interna satisfatórios para os estágios de nível convencional (Alfa de Cronbach variando de 0.652 a 0.688) e razoáveis para os estágios pós-convencionais (Alfa de Cronbach variando de 0.435 a 0.481). Foram encontradas também correlações semelhantes às encontradas em outros estudos (Froming & McColgan, 1979; Rest, 1993), no que diz respeito a maior maturidade do julgamento moral com o avanço da idade.

A versão adaptada do DIT utilizada nesse estudo foi composta por quatro dilemas morais (João e o Remédio, O Prisioneiro Foragido, Ocupação pelos Estudantes e o Jornal Escolar) que possuem as mesmas características dos dilemas da versão original do DIT, elaborada por Rest et al. (1974). Cada dilema é seguido de uma questão que visa saber qual seria a atitude correta do protagonista do dilema para a situação apresentada, devendo cada participante escolher dentre as opções "sim", "não", ou "não sei". Após essa questão inicial são apresentadas 12 afirmativas que indicam raciocínios dos diferentes estágios morais propostos por Kohlberg (1984). Os participantes são convidados a atribuir um grau de importância para cada afirmativa, numa escala Likert que vai de "máxima importância" até "nenhuma importância". Após a atribuição do grau de importância para cada afirmativa, é solicitado aos participantes que escolham, entre as 12 afirmativas, quatro que eles consideram como sendo as mais importantes. Esse mesmo procedimento é realizado para todos os dilemas do instrumento.

Procedimentos

Procedimentos éticos

O presente trabalho foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal da Paraíba, e atendeu a todos os requisitos da Resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde.

Procedimento de coleta de dados e de administração dos instrumentos

Os dados de 2011 foram coletados em três escolas privadas na cidade de João Pessoa. Uma dessas escolas foi a mesma que autorizou a realização da pesquisa com seus alunos de ensino médio no ano de 1996. A seleção feita para compor a amostra do ano de 1996 utilizou os arquivos de um Núcleo de Pesquisa com dados de 621 participantes, com idades de 11 a 24 anos, que compuseram a amostra de uma pesquisa realizada neste ano. Considerou-se o critério de idade, sendo escolhidos, dentre os 621 participantes, a mesma quantidade de participantes com idades semelhantes à amostra do ano de 2011. Desse modo, as amostras de 1996 e de 2011 foram compostas por 17 participantes de 14 anos, 26 participantes de 15 anos, 47 participantes de 16 anos e 21 participantes de 17 anos. Esse critério de seleção possibilitou a obtenção de amostras homogêneas com relação à idade, ficando os dois grupos de adolescentes com a mesma média de idade (Midade = 15,65; DP = 0,96). A coleta de dados em 2011 e 1996 foi realizada de forma semelhante em ambiente de sala de aula, com os instrumentos respondidos individualmente em aproximadamente 30 minutos.

Procedimento de análise dos dados

Estatísticas descritivas e inferenciais foram utilizadas para analisar os dados coletados com o DIT e com o Questionário Biodemográfico. Foram efetuados levantamentos de médias, frequências e porcentagens, e realizados testes de comparação de médias e de frequências. Para o DIT, os levantamentos de médias e frequências foram utilizados para verificar o Estágio dominante para os dois grupos de adolescentes. Considerou-se como o estágio dominante aquele para o qual se verificou a maior média. Como mencionado no tópico anterior, os dilemas do DIT são seguidos de itens que apresentam pensamentos referentes aos diferentes estágios morais. No entanto, não se observa uma equivalência na quantidade de itens para cada Estágio moral. Por exemplo, para aos quatro dilemas utilizados nesse estudo, os Estágios 2 e 6 possuem 3 itens cada um, enquanto que os Estágios 3 e 4 possuem respectivamente 12 e 13 itens. Por esta razão, as análises de médias e frequências formam feitas apenas com os Estágios 3, 4 e 5.

 

Resultados

Ao considerar as médias dos níveis de julgamento moral, verificou-se para os adolescentes do ano de 1996 uma maior média para o nível convencional e para aos adolescentes do ano de 2011 uma maior média para o nível pós-convencional (ver Tabela 1). Um Teste-t para amostras independentes indicou diferenças significativas entre as médias dos níveis convencional e pós-convencional nos adolescentes dos dois anos. Um Teste-t para amostras relacionadas indicou diferenças significativas entre as médias do nível convencional e pós-convencional apenas para os adolescentes do ano de 1996 (t = 2,041; p = 0,04; d = 0,26).

A Tabela 2 apresenta as médias dos estágios de julgamento moral para os dois grupos de adolescentes. Por meio de um Teste-t para amostras independentes foram verificadas diferenças significativas entre as médias de todos os estágios nos dois grupos, sendo a média do Estágio 4 superior às médias dos demais estágios. Um Test-t para amostras relacionadas revelou diferenças significativas entre as médias dos estágios de julgamento moral apenas para os adolescentes do ano de 2011. Não foram encontradas diferenças significativas entre as médias dos níveis e estágios de julgamento moral considerando a variável sexo para os adolescentes dos dois anos analisados.

Considerando os três estágios morais analisados, efetuou-se uma análise das frequências de uso de cada um deles para se verificar o tipo de pensamento moral dominante em cada grupo de adolescentes. Como pode ser observado na Tabela 3, tanto para os adolescentes do ano de 1996, como para os adolescentes do ano de 2011, verificou-se uma maior frequência do uso do Estágio 4. A principal diferença entre estes dois grupos consistiu no modo como estes adolescentes organizaram seus pensamentos considerando uma hierarquia de estágios morais. Para os adolescentes do ano de 1996, o Estágio 4 foi seguido, em maior frequência de uso, dos Estágios 3 e 5. Já para os adolescentes do ano de 2011, o Estágio 4 foi seguido, em maior frequência de uso, dos Estágios 5 e 3. Um teste de Qui-quadrado indicou diferenças significativas entre as frequências dos estágios (χ 2 = 16,52; gl = 2; p < .001).

 

Discussão

Os resultados desse estudo mostraram que os adolescentes participantes em ambos os anos de estudo se encontravam no nível convencional, particularmente no Estágio 4, defendendo a ideia de que é por meio do respeito às leis e às instituições sociais que os indivíduos retribuem todos os benefícios que a sociedade lhes oferece. Esses resultados apóiam as expectativas teóricas e empíricas sobre o desenvolvimento moral na adolescência (Bzuneck, 1979; Biaggio, 1975, 1989; Galvão, 2010; Kohlberg, 1984; Marcolin & Biaggio, 1985; Rique & Camino, 1997; Silva, 1991). Aparentemente, a educação oferecida entre os anos de 1996 e 2011, mesmo com as mudanças indicadas no referencial teórico desse estudo, não afetou significativamente o desenvolvimento do pensamento moral dos adolescentes.

Entretanto, defender o respeito às leis pode representar uma visão conservadora, ou seja, o uso da lei como reciprocidade primitiva apoiando punições ou coações a comportamentos sociais. Ou o respeito às leis pode representar uma visão liberal, quando a noção de contrato social lidera a compreensão da importância das leis pelo respeito aos indivíduos. Explicando melhor, a finalidade da obediência às regras sociais é respeitar o cidadão e não as próprias regras (i.e., leis). O desenvolvimento moral por estágios implica os jovens entenderem essa distinção de princípios.

As indicações sobre a trajetória de desenvolvimento podem ser verificadas não somente pela frequência de uso dos estágios, tanto os adolescentes de 1996 como os de 2011 tiveram maior uso do Estágio 4, mas também pela sequência ou ordem de avanço nos estágios. Observando-se essa ordem de avanço, pode-se considerar que os adolescentes do ano de 2011 tiveram um avanço maior do julgamento moral. A ordem de uso dos estágios encontrada para os adolescentes do ano de 1996 indicou que estes possuem um pensamento moral marcado pela valorização do uso das leis (Estágio 4), seguida de um respeito ao indivíduo pelo grupo ao qual ele pertence (Estágio 3). Por outro lado, os adolescentes do ano de 2011 valorizaram as leis (Estágio 4) seguida de um pensamento moral ligado à necessidade de promoção do bem-estar da comunidade como um todo (Estágio 5) e não apenas uma preocupação com aquelas pessoas mais próximas (Estágio 3). Em outras palavras, o estágio dominante de uma pessoa (ex., Estágio 4) é apoiado por um pensamento subjacente do estágio anterior (ex., Estágio 3) e indicações de avanço para um pensamento de estágio posterior (ex., Estágio 5). Sendo assim, os adolescentes em 2011 indicaram avanços progressivos em comparação aos adolescentes de 1996.

É possível supor que este resultado, que favorece o grupo de 2011, seja um efeito das diferenças no contexto educacional entre os anos de 1996 e 2011, mais precisamente no que diz respeito à forma de abordagem dos temas moral e ética na escola, por meio dos temas transversais?

Por um lado, pode-se supor que sim, no sentido em que a inclusão dos temas transversais foi a única mudança na política educacional naquele período. As escolas que autorizaram a realização da pesquisa com seus alunos no ano de 2011 informaram atender aos critérios estabelecidos para o ensino dos temas transversais, abordando estes conteúdos de forma interdisciplinar, durante as aulas e também em feiras culturais. A abordagem destes temas pode ter favorecido nos adolescentes de 2011 o desenvolvimento de um maior pensamento crítico, estimulando-os a discutir com os colegas e com os demais agentes escolares soluções para problemas sociais de âmbito local ou nacional.

Por outro lado, somente uma abordagem longitudinal pode responder sobre avanços e amadurecimento no pensamento moral. Esse estudo se limita a uma comparação horizontal e um levantamento das políticas educacionais entre esses dois períodos na história do Brasil, não nos permitindo afirmações sobre amadurecimento moral ou o efeito dos temas transversais a partir de como o currículo está sendo utilizado nas escolas.

 

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Endereço para correspondência:
Pollyana Lucena Moreira
pollyanadelucena@gmail.com

Cleonice Pereira dos Santos Camino
cleocamino@gmail.com

Júlio Rique
julio.rique@uol.com.br

Submetido em: 27/02/2015
Revisto em: 28/09/2015
Aceito em: 17/11/2015

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