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Arquivos Brasileiros de Psicologia

versão On-line ISSN 1809-5267

Arq. bras. psicol. vol.72 no.1 Rio de Janeiro jan./abr. 2020

http://dx.doi.org/10.36482/1809-5267.ARBP2020v72i2p.140-158 

ARTIGOS

 

Adolescentes ofensores sexuais atendidos em uma instituição de saúde do Centro-Oeste do Brasil

 

Adolescents sexual offenders attended at a health care institution in the center-west region of Brazil

 

Adolescentes agresores sexuales atendidos en una institución de salud del medio oeste de Brasil

 

 

Mariana Miranda BorgesI; Liana Fortunato CostaII

IMestre em Psicologia Clínica e Cultura. Universidade de Brasília. Brasília. Distrito Federal. Brasil
IIDoutorado em Psicologia Clínica. Universidade de São Paulo. São Paulo. Estado de São Paulo. Brasil

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

Este artigo tem o objetivo de caracterizar o adolescente que cometeu ofensa sexual atendido em uma instituição de saúde da Região Centro-oeste do Brasil. O método foi a análise documental dos prontuários de 25 adolescentes atendidos nos anos de 2015 a 2017, sendo utilizada a frequência, média e o teste qui-quadrado para analisar os dados sociodemográficos e da cena da ofensa sexual. Na análise dos dados utilizou-se o referencial teórico da Terapia Familiar Sistêmica. As informações coletadas resultaram em dois eixos de discussão: 1) Características dos adolescentes que cometeram ofensa sexual - foi observada a predominância da prática ofensiva por adolescentes do sexo masculino, idade média da prática ofensiva de 12 anos; 2) Características da violência sexual - há proximidade de parentesco entre a vítima e o adolescente, a vitimização ocorreu no domicílio do adolescente, e houve ausência de aplicação de medidas de proteção e/ou de responsabilização dos adolescentes. Em síntese, os casos de ofensa sexual são caracterizados como violência sexual oportunista.

Palavras-chave: Violência sexual; Ofensor sexual; Adolescente.


ABSTRACT

This article aims to characterize the adolescent who committed sexual offenses attended at a health institution in the center-west region of Brazil. The method was documentary analysis of the medical records of 25 adolescents attended in the years 2015 to 2017, using the frequency, mean and chisquare test to identify socio-demographic data and sexual offense scene. The information gathered resulted in two discussion axes: 1- the adolescent who committed sexual offense - was observed to the predominance of the offensive practice by male adolescents, average age of the offensive practice of 12 years of age; 2 - scene of the sexual offense - pointed out that there is proximity of kinship between the victim and the adolescent; victimization occurred in the adolescent's home; and there was no application of protection measures and / or accountability of adolescents. Thus, cases of sexual offense are characterized as opportunistic sexual violence.

Keywords: Sexual Violence, Sexual Offender, Adolescents.


RESUMEN

Este artículo pretende caracterizar al adolescente que cometió un delito sexual tratado en una institución de salud en la región del medio oeste de Brasil. El método fue el análisis documental de los registros médicos de 25 adolescentes atendidos en los años de 2015 a 2017, utilizando la frecuencia, el promedio y la prueba de chi cuadrado para analizar los datos sociodemográficos y la escena del delito sexual. En el análisis de datos utilizamos el marco teórico de la Terapia Familiar Sistémica. La información recopilada resultó en dos áreas de discusión: 1) Características de los adolescentes que cometieron delitos sexuales: predominó la práctica ofensiva en adolescentes varones, la edad promedio de la práctica ofensiva de 12 años; 2) Características de la violencia sexual: existe una estrecha relación entre la víctima y el adolescente, la victimización se produjo en el hogar del adolescente y no se aplicaron medidas de protección ni responsabilidad de los adolescentes. En resumen, los casos de delitos sexuales se caracterizan como violencia sexual oportunista.

Palabras clave: Violencia sexual; Agresor sexual; Adolescente.


 

 

O adolescente que cometeu ofensa sexual

A ofensa sexual cometida por adolescentes é um fenômeno multifacetado, complexo e contextual. A literatura internacional (Chagnon, 2008; Gonzalez-García & Carrasco, 2016; Ryan, 2012; Worling & Langton, 2012a; 2017) utiliza o termo da ofensa sexual para referir-se ao ato do abuso sexual, sendo definida por Ryan (2012) como uma prática sexual de forma física ou verbal cometido contra outra pessoa, executada com coerção, manipulação ou qualquer tipo de relação desigual, sem o consentimento. A ofensa sexual na adolescência geralmente ocorre da puberdade até a maioridade, em ambiente intrafamiliar, entre irmãos (Gonzalez-García & Carrasco, 2016; Ryan, 2012). O citado comportamento pode ser exemplificado como toques nos órgãos genitais, estimulação sexual, penetração entre um adolescente e uma criança e o compartilhamento de pornografia.

De acordo com Worling e Langton (2017), na dimensão biológica, este comportamento é suscetível à fase da adolescência pelo córtex pré-frontal ainda estar pouco desenvolvido e o aumento dopaminérgico. A região cerebral citada é responsável pelo julgamento, planejamento e autorregulação. A dimensão desenvolvimentista enfoca a adolescência como uma fase de inúmeras mudanças, no plano corporal e social, em especial o amadurecimento sexual. O processo de desenvolvimento da sexualidade é composto pelas alterações hormonais, maturação cerebral e estímulo externo. Por este motivo, a expressão do afeto e da sexualidade é intensificada (Murrie, 2012). Os adolescentes que são expostos à violência estrutural (familiar, comunitária) constituem-se em vulnerabilidade associada ao aumento ou precocidade da atividade sexual em relação a vários parceiros, acrescido da falta de supervisão parental. A violência estrutural é a condição de sobrevivência que ocorre em meio a falta de acesso à saúde, a estabilidade financeira, a escolaridade e a pobreza, de forma geral (American Psychology Association- APA, 2015). Acresce-se a essas dimensões uma conjuntura social que valoriza a identidade pessoal e o exercício da masculinidade de dominação que moldam uma expressão violenta durante a fase de desenvolvimento da adolescência. Destaca-se que este período, o adolescente possui uma interdependência de outros grupos sociais (Andolfi & Mascellani, 2012; Pflugradt, Allen, & Marshall, 2018).

Inequivocamente, o contexto de carência material, característico de zonas periféricas das cidades, é um fator preditivo do surgimento de sexo ativo precoce (Hollist, Hughes, & Schaible, 2009; Lansford et al., 2007; Lauritsen & Carbone-López, 2011; Rodgers & McGuire, 2012). Diante disso, nota-se que adolescência é uma fase que possibilita a vivência de diversos comportamentos de risco, em especial, o sexual, como uma maneira de experimentar diferenciações necessárias para construção da identidade. Ryan (2012) complementa que as inúmeras mudanças e o processo de construção da identidade oportunizam que uma intervenção sobre a ofensa sexual seja realizada com maior eficácia, neste período do desenvolvimento.

Em relação à história da vida familiar destes adolescentes, é destacada a vivência da violência como um aspecto de construção subjetiva, sendo exposta às suas diversas formas: psicológica, física, estrutural, sexual (Costa, Junqueira, Meneses, Stroher, & Moura, 2012; Grant, Indermaur, Thornton, Steves, Chamarette, & Halse, 2009). Costa e Costa (2013) afirma que a experiência da violência impacta na forma de comunicação destes adolescentes com as demais pessoas. As relações familiares acontecem em um cenário composto pela ausência ou fragilidade da figura paterna e a limitada expressão afetiva materna. A mãe utiliza violência, desqualificação, coisificação e desconfiança como práticas educativas devido à dificuldade em exercer a autoridade diante da sobrecarga do papel materno. Desta maneira, o exercício da parentalidade é autoritário e a autonomia do filho, temida, restando a ele a função de execução das atividades domésticas. Nestas condições, o adolescente sente raiva e ódio da mãe por desejar ser protegido e compreender que está preso às expectativas maternas (Conceição, Penso, Costa, & Carreteiro, 2014). Diante deste contexto familiar, Said, Junqueira e Costa (2016) defendem que estas violências sexuais cometidas pelos adolescentes se constituem em um acting out, ou seja, um comportamento que viabiliza a inversão dos papéis estabelecidos nas relações de poder dentro da família, bem como um pedido de socorro frente ao seu sofrimento.

O comportamento da ofensa sexual é praticado por ambos os sexos, no entanto, há maior reconhecimento desse ato realizado pelo adolescente do sexo masculino. Worling e Langton (2017) salientam que a ofensa sexual praticada por meninos é estimulada pela aprendizagem e a convivência com o patriarcado, o que reforça os padrões de masculinidade a partir dos estereótipos da violência e alta potência sexual. Já no caso das meninas, nota-se que a ofensa sexual é uma resposta às diversas experiências de violência (Cauffman, 2008). Strickland (2009) aponta que a prevalência do abuso sexual cometido por mulheres indica um percentual em torno de 4% em relação aos dados gerais. Além disso, reconhece-se que estes dados são, de fato, muito desconhecidos. Van der Put (2015) menciona que as adolescentes que cometem ofensa sexual geralmente foram vítimas de violência física e/ou sexual, transtornos mentais, conflitos familiares e uso abusivo de substâncias psicotrópicas.

As autoras deste artigo acreditam que a ofensa sexual seja um pedido de socorro emitido pelos adolescentes que evidencia um rompimento dos laços sociais e familiares, além de tentar obter uma reação, dos adultos responsáveis, sobre seus vínculos afetivos e a definição dos papéis familiares. Este contexto é influenciado pela construção da masculinidade, alta descarga hormonal sexual, experiências anteriores de situações de violência.

 

Método

Contexto

Desde 2009, o Serviço de saúde no qual os prontuários foram consultados oferece atendimento grupal a adolescentes que cometeram ofensa sexual, e pertence à Secretaria de Saúde (SES) do Governo do Distrito Federal. Este atendimento privilegia uma compreensão de que a intervenção com adolescentes deve ser realizada em uma perspectiva familiar (Andolfi & Mascellani, 2012; Minuchin, Nichols, & Lee, 2009). O programa executado vem oferecendo, de forma sistemática, atendimento grupal aos adolescentes do sexo masculino que cometeram ofensa sexual, seguindo um cronograma que inclui: acolhimento, avaliação de risco de reincidência, organização do grupo, oferecimento da intervenção grupal, finalização da avaliação de risco, e oferecimento de sessões adicionais para aqueles adolescentes e/ou familiares que tenham apresentado uma condição média e/ou alta de risco de reincidência do ato violento. Esse modelo de atendimento foi sendo implantado no decorrer da execução do grupo e aperfeiçoando a intervenção e o registro das informações. O critério de adoção dos adolescentes constantes desta amostra, ou seja, atendidos nos anos de 2015 a 2017, deve-se a este processo de construção/reformulação/sistematização da intervenção. Portanto, trata-se de uma pesquisa documental realizada com os prontuários de uma amostra clínica intencional (Flick, 2009).

Participantes

Foi realizado um levantamento com todos os registros dos adolescentes que cometeram ofensa sexual, sendo totalizados 25 prontuários. A seleção dos prontuários ocorreu através dos seguintes critérios: ser adolescente (12 a 18 anos), ter cometido ofensa sexual e ter sido atendido no serviço de saúde nesse período. A amostra em questão corresponde a 100% dos adolescentes atendidos.

Procedimento

Trata-se de u pesquisa quantitativa que envolve uma parceria entre uma universidade pública e uma instituição pública de atendimento na área da saúde, onde os atendimentos ofertados são supervisionados pela instituição de ensino superior, bem como, estudantes de graduação, mestrado e doutorado compõem a equipe profissional. Em contra partida, há uma facilitação do acesso das pesquisadoras ao público-alvo do estudo. Os prontuários foram acessados por intermédio de uma profissional da instituição juntamente com uma pesquisadora. Nesses prontuários foram analisadas as seguintes características: idade, escolaridade, renda familiar, local de moradia e a cena da violência praticada. Os dados levantados foram interpretados a partir da análise de frequência, média e o teste qui-quadrado que possibilita verificar a confiabilidade dos resultados através do software IBM SPSS. As aplicações estatísticas foram utilizadas para avaliar as informações populacionais e a dispersão. A frequência e a média informaram os intervalos presentes na amostra. Já a dispersão permitiu informar se existe um desvio significativamente do que é esperado nos dados. Diante disso, o resultado foi dividido em dois eixos de análise: Eixo 1) Características dos adolescentes que cometeram ofensa sexual; e Eixo 2) Características da violência sexual.

Cuidados éticos

Este estudo foi ealizado após aprovação do projeto no Comitê de Ética em Pesquisa do Instituto de Ciências Humanas da Universidade de Brasília, com o parecer no 2.054.880, na data de 9 de maio de 2017 e a devida autorização do acesso às informações documentais.

 

Resultados

A partir da consulta dos prontuários dos adolescentes atendidos no serviço de saúde foram elaborados as Tabelas 1 e 2 e as Figuras 1, 2 e 3, com a sistematização das informações.

 

Discussão

Estudos sobre as características dos adolescentes que cometeram ofensa sexual e o ato praticado possibilitam a compreensão do sujeito e da dinâmica do comportamento ofensivo. Estas informações viabilizam a qualificação das intervenções de atendimento a esta população como uma forma de produzir cuidado, interrupção da violência, humanização do adolescente e de suas interações familiares e sociais. Além disto, este conhecimento auxilia na construção de ações de prevenção à violência sexual.

Eixo 1- Características dos adolescentes que cometeram ofensa sexual

O primeiro eixo de análise informa sobre as condições socioeconômicas e familiares dos adolescentes. A amostra está distribuída em relação ao sexo, idade, período da primeira ofensa sexual, escolaridade, renda e estrutura familiar. De acordo com o resultado do teste qui-quadrado todas as informações apresentam dados significativos, exceto a estrutura familiar.

Nota-se que a maior quantidade de ofensa sexual foi cometida por adolescentes do sexo masculino, o que mantém o resultado em consonância com a pesquisa de Benedicto, Roncero e Gonzalez (2017), realizada com adolescentes do Centro de Internação de Madri, na Espanha. Além disto, é importante mencionar que o cometimento da violência sendo realizado em alta incidência por adolescentes do sexo masculino possui correlação com os estudos de gênero. Grollmus (2012) afirma que a masculinidade hegemônica é expressa através da virilidade, força, agressão, sendo que a violência seria uma ação dos sentidos produzidos no ser menino.

Cabe ainda ressaltar que o aparecimento de um único caso de violência sexual cometido por uma adolescente do sexo feminino demonstra a necessidade de serem reavaliadas as práticas nas pesquisas científicas, intervenções psicossociais e clínicas, a respeito desta particularidade. Mathews, Hunter e Vuz (1997) defendem que a população feminina não é identificada como ofensora sexual pela presença de percepções preconceituosas na prática desta violência. Matos e Machado (2012) ainda corroboram que isso ocorre, pois, na perspectiva feminista criminológica (ciência que estuda a pessoa que comete o crime ou contravenção penal), não é reconhecida a racionalidade e a voluntariedade no cometimento do ato infracional ou criminal da mulher. De acordo com essas duas autoras, é necessário romper com a dicotomia de vítima versus ofensor baseada no gênero a fim de que possa compreender a complexidade dos casos e a interação desses dois personagens, de forma que a mulher possa também ser apropriada ao papel de ofensora. Destaca-se que pesquisas anteriores (Benedicto et al., 2017; Ramirez-Mora, 2002) não indicaram a presença de amostra desta natureza.

Em relação à idade (Gráfico), observa-se que 40% da amostra encontrava-se na fase inicial da adolescência (12 e 13 anos) e o mesmo ocorre quando avaliada a primeira ofensa sexual praticada. Destaca-se que essa faixa etária com maior quantidade de prática da ofensa sexual é caracterizada como o momento de passagem da infância para adolescência. A idade de 12 anos, além de significar mudanças biopsicossociais, apresenta o sentido da experiência de novas interações. Pode-se pensar que essa idade-limite também está informando sobre um sentido de demanda por proteção e/ou atenção. Marcelli e Braconnier (1989) consideram que o acting out seja uma comunicação do adolescente de que ainda precisa de cuidado (interdependência), no entanto, já necessitando de estabelecer uma diferenciação e/ou separação dos pais (independência). Estes autores falam em dois processos simultâneos, individuação e individualização, sendo que o primeiro é relativo ao crescimento biopsicossocial individual, e o segundo é relativo ao processo de separação afetivo emocional dos adultos que vêm cuidando do adolescente até aquele momento. Então, na perspectiva de Marcelli e Braconnier (1989), o ato da ofensa sexual, nesta faixa etária, pode possuir um sentido de ruptura com os papéis estabelecidos pelos pais, ao mesmo tempo em que significa um pedido de socorro e atenção. Isto aponta para dificuldades interacionais no grupo familiar referente ao período em que o adolescente precisa experimentar sua atuação no mundo, mudanças em relação ao seu corpo e desejo sexual, e ainda ser protegido em suas incursões de independência (Costa et al., 2012; Minuchin et al., 2009).

Ainda sobre as ofensas ocorridas dos oito aos 11 anos, Hassan, Killion, Lewin, Totten e Gary (2015) defendem que este é o início de um comportamento sexual devido à ocorrência da puberdade. Costa et al. (2012) alertam para a necessidade de se avaliar a complexidade do fenômeno devido à baixa idade e a presença de atos violentos e invasivos, tais como ameaças e forçar que a outra criança execute o comportamento sexual. Ainda neste contexto, autores discutem a linha divisória entre brincadeira e violência, pois a ofensa sexual pode ser facilitada e naturalizada como um processo pertencente à descoberta da sexualidade (Costa, Marreco, Barros, & Chaves, 2015; Domingues et al., 2015; Hershkowitz, 2014). Costa et al. (2015) apresentam sua contribuição por meio de pesquisa qualitativa, que indica a linha divisória entre brincadeira sexual e violência sexual como muito tênue. Assim, os casos de violência sexual de meninos cometidos por adolescentes com faixa etária próxima aos 12 anos devem buscar aprofundamento em suas análises para melhor avaliar a qualidade da violência praticada.

O presente artigo orienta que a identificação da violência seja considerada pelos seguintes fatores: presença da diferença de idade, atos de manipulação e invasivos. Em relação à diferença de idade, os autores Costa et al. (2012) e Benedicto et al. (2017) avaliam a disparidade de quatro anos como o suficiente para o adolescente ter algum poder sobre a criança, podendo dominá-la devido estarem em fases discrepantes do desenvolvimento da sexualidade (Murrie, 2012). Os atos invasivos possuem uma gama de comportamentos que vai da exposição de imagens pornográficas à penetração anal (Habigzang, Corte, Hatzenberger, Stroeher, & Koller, 2008). Além disso, ressaltam-se as ações com teor de violência seja através de ameaças, barganhar sexo por brinquedos, espancamentos e machucados, dentre outras como características do ato de manipulação.

Sobre a escolarização, nota-se que todos os adolescentes estão frequentando a escola. Isto indica um possível aspecto a ser investigado, pois traça uma diferença marcante em relação aos adolescentes que cometem ato infracional de natureza social, como é discutido em Conceição et al. (2014). No entanto, a amostra demonstra que apenas seis adolescentes se encontram de acordo com a classificação de idade-série, e 15 apresentam algum nível de distorção. A diferença apresentada vai de um a cinco anos, sendo que a média é 2,28% anos. O valor médio equivale à distorção idade-série brasileira (Fundo das Nações Unidas para a Infância - Unicef, 2018), o qual demonstra o atraso no desenvolvimento escolar e possivelmente apresenta ausência das habilidades e competências esperadas. É importante destacar que o motivo da distorção de idade-série é multicausal. Neste texto, aponta-se a vivência da violência como um desses fatores. A American Psychology Association (APA, 2015) afirma que as vivências de violências promovem a diminuição da frequência escolar, assim a escolarização é prejudicada. Esse contexto pode influenciar na evasão escolar por desinteresse ou bullying. Pesquisa de Benedicto et al. (2017) classifica os adolescentes que cometem ofensa sexual em dois grupos, o primeiro que ofende crianças e o segundo que ofende os seus pares ou pessoas mais velhas. Estes autores informam que nos dois grupos de ofensores ocorre a evasão escolar, sendo que, no primeiro grupo, é motivada pelo bullying sofrido pelos pares e, no segundo grupo, por serem expulsos devido à prática de atividades antissociais.

Sobre a renda familiar, houve seis famílias com renda desconhecida e as demais variam de zero a oito salários mínimos. Informa-se que o número zero indica as famílias que possuem renda abaixo do salário mínimo definido pelo Decreto-Lei nº 9.255/2017 (Decreto lei n. 9.255, 2017). O Decreto-Lei nº 2.162/1940 institui o salário mínimo garantindo que todo(a) trabalhador(a) receba uma remuneração básica para que possa suprir a alimentação, habitação, vestuário, higiene e transporte (Decreto lei n. 2.162, 1940). A partir desta normatização, o Departamento de Informação de Estudos Socioeconômicos (DIEESE) elabora estudos mensais a respeito do valor da cesta básica das capitais brasileiras. Neste sentido, no mês de junho de 2018, o DIEESE divulgou que a família brasiliense precisa de R$ 413,02 para que possa adquirir a cesta básica (Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos - Dieese, 2018), de forma que a amostra analisada apresenta uma família que, a partir da renda socioeconômica e valor da cesta básica, não consegue garantir alimentação familiar. Segundo as informações coletadas a respeito da renda familiar, nota-se que 48% da amostra possui renda mediana.

O Distrito Federal é dividido por 31 regiões administrativas, sendo composto por uma região central (plano piloto), outras regiões próximas de Brasília - plano piloto e as cidades periféricas, que são distritos de pequeno e médio porte que se localizam cerca de seis a 25 Km da região central (Companhia de Planejamento do Distrito Federal - Codeplan, 2017). Em relação à renda média, nota-se que este valor é diversificado em cada região administrativa, entre o valor da maior e menor renda socioeconômica há uma diferença de 18 vezes (Companhia de Planejamento do Distrito Federal - Codeplan, 2014). As informações levantadas sobre o local de moradia dos adolescentes constataram que 19 deles residem em cidades periféricas do Distrito Federal, que são consideradas locais com menor poder aquisitivo, e apenas um adolescente é residente na área nobre da cidade. Gonzaléz-Garcia e Carrasco (2016) corroboram com essa informação, quando afirmam que a marginalidade e as dificuldades psicossociais propiciam históricos de violência sexual. Desta maneira, nota-se que não é só a falta de condição financeira que tem proporcionado esse contexto de vulnerabilidade, mas possivelmente a convivência em espaços que a exposição à violência urbana é alta, assim como o uso abusivo de drogas e conflitos familiares. Esta amostra ainda expressa que por mais que a violência ocorra com maior frequência em bairros periféricos (APA, 2015), a violência sexual acontece em todas as classes sociais, não sendo exclusivo das populares.

Os arranjos familiares identificados nessa pesquisa foram: família reconstituída, monoparental, nuclear, extensa, tutelada. Compreende-se, aqui, que as famílias reconstituídas são aquelas formadas após segunda união; famílias monoparentais são aquelas que apresentam apenas uma figura parental, somente a mãe ou o pai; famílias nucleares são as famílias que possuem pai, mãe e filhos; e a família extensa é aquela que inclui membros de gerações anteriores, como os avós, tios(as), primos(as), os bisavós (Féres-Carneiro, Magalhães, & Zivani, 2006). As famílias tuteladas são os grupos que tiveram o poder destituído e a guarda passa a ser acompanhada por instituições da rede de proteção. Na presente pesquisa, assim como na de Benedicto et al. (2017), não é possível fazer o apontamento de qual dinâmica familiar é mais frequente nos casos de ofensa sexual, uma vez que as mesmas são heterogêneas, sendo possível apenas afirmar a diversidade. Diante da amostra deste texto observa-se que a estrutura familiar não é um condicionante para que tal violência possa ser praticada (Benedicto et al., 2017), mas sim, a dinâmica, como já apontada por Conceição et al. (2014) anteriormente. De acordo com Zappe e Dias (2012), as famílias em situação de violência apresentam redes sociais deficitárias, fragilidades nos laços afetivos. Já Moreira e Sousa (2012) afirmam que os grupos familiares possuem fronteiras rígidas e hierárquicas em especial com as questões que envolvem geração e gênero. Estas características citadas pelos(as) autores(as) identificam famílias centrípetas e com a tendência de tentar resolver os conflitos dentro do próprio grupo, tendendo a um circuito fechado de interações (Conceição et al., 2014; Costa & Costa, 2013).

Eixo 2 - Características da violência sexual

Com o intuito de verificar as características da violência praticada, foram analisados os seguintes aspectos: sexo da vítima, idade da vítima, local da ocorrência da violência, relacionamento da vítima com o ofensor e reincidência do ato ofensivo. Destaca-se que o número das características da violência sexual é superior ao montante da amostra devido ao fato de que oito adolescentes cometeram mais de uma ofensa sexual. De acordo com o resultado do teste do qui quadrado em relação aos dados pertencentes a esse eixo, apenas o do sexo das vítimas que não é significativo.

No entanto, nota-se que o resultado deste estudo sobre o sexo das vítimas é discrepante em relação às pesquisas de Gonzaléz-Garcia e Carrasco (2016), Ramírez-Mora (2002), Benedicto et al. (2017) e Segovia Ramirez (2016). Nos estudos destes autores citados, o abuso sexual se deu em maior número com vítimas do sexo feminino. Já, na presente pesquisa, cerca de 65% das ofensas ocorreram com crianças do sexo masculino. Gonzaléz-Garcia & Carrasco (2016) salientam que esse dado não informa sobre a orientação sexual dos adolescentes, no entanto, comunica a dinâmica da violência praticada. Sendo assim, os adolescentes possuem, provavelmente, maior acesso e facilidade às crianças do sexo masculino. Diante disso, a violência informa uma relação de poder, na qual um dos sujeitos é tornado objeto de forma que a sua voz não é legitimada e os seus desejos não são respeitados. A violência sexual cometida por homens adultos, no geral, comunica essa opressão em relação à mulher. Em relação aos adolescentes do estudo, observa-se que isso é informado também, no entanto, a mensagem que é mais enfática está relacionada às forças em relação à diferença entre as gerações (Hershkowitz, 2014).

Em relação à idade da criança que sofreu a violência, observa-se que o espectro se encontra entre um e 11 anos, sendo predominante a faixa etária de quatro e cinco anos. A diferença média da idade entre o adolescente que cometeu a ofensa sexual e a criança que sofreu a violência é referente a oito anos. Hohendorff, Habingzang e Koller (2017; 2013) apontam que, no Brasil, não há consenso quanto a esses dados, embora haja uma tendência de que as vítimas tenham menos de 12 anos. Outro dado nacional ainda indica que o maior risco de ocorrência de violência sexual com meninos se situa entre os três e os seis anos de idade (Serafim, Saffi, Achá, & Barros, 2011). Há, portanto, uma consonância entre as idades obtidas de estudos nacionais e a amostra da pesquisa em tela.

Quanto ao local da ocorrência da violência, percebe-se que a ofensa sexual tem ocorrido em maior preponderância no domicílio do adolescente que cometeu ofensa sexual. Apesar disto, todos os abusos aconteceram em locais onde deveria ter havido a supervisão de adultos responsáveis, sejam de familiares ou de professores. Este dado possibilita observar os efeitos da condição de abandono afetivo e/ou físico, ausência de supervisão e autoridade sobre o adolescente e a parentalização destes adolescentes. A parentalização constitui-se em uma dinâmica familiar, na qual um membro do subsistema filial passa a desempenhar funções do subsistema parental (Boszormenyi-Nagy, 1983). Estes fatores possibilitam que o adolescente tenha maior acesso, sem intermediação de uma autoridade, às crianças que permanecem sob seus cuidados.

Por outro lado, autores (Bogaerts, Buschman, Kunst, & Winkel, 2010; Worley, Church, & Clemmons, 2011; Nunes, Hermann, Malcom, & Lavoie, 2013) chamam atenção para as diferenças entre o abuso sexual intrafamiliar e o extrafamiliar, apontando que a violência sexual intrafamiliar pode ser mais duradoura, mais violenta e trazer como consequência maiores danos para as vítimas, pois se revestem de segredos, de maior continuidade, maiores dificuldades em sua interrupção, confusão sobre os papéis. Há ainda o reconhecimento de que o ambiente de carências materiais influencia as famílias a se organizarem de modo socialmente desconectado da comunidade, o que traz isolamento e iniciativas familiares individualizadas no enfrentamento das dificuldades de cuidarem e protegeram os membros da família (Spilsbury & Korbin, 2013).

Sobre a relação de parentesco do adolescente que cometeu ofensa sexual e a pessoa que sofreu a violência sexual, foi observado que, em sua maioria, a violência foi perpetrada por um irmão, seguido por primo, sobrinho, vizinho, colega de escola e uma situação na qual a mãe do ofensor era cuidadora da vítima. Desta maneira, observa-se que as vítimas possuíam um grau de proximidade e/ou parentesco com o ofensor. Houve apenas um caso em que a vítima era desconhecida. Valente (2005), nos Estados Unidos, Mercado-Justiano (2014), em Porto Rico, e Peter (2009), no Canadá, informam em suas pesquisas que as ofensas sexuais ocorrem com maior preponderância no ambiente familiar. Diante destas informações, avalia-se que as violências ocorrem de maneira oportunista, devida à condição de maior acesso às crianças, com a construção de uma equação que associa a ausência de supervisão parental a um período de explosão da sexualidade, acrescida à condição de cuidador que o adolescente é obrigado, muitas vezes, a assumir em relação às crianças menores da família.

Dos 25 casos avaliados, em 10 houve a reincidência da ofensa sexual. Vale ressaltar que em 11 casos não houve notificação da violência sexual cometida e/ ou aplicação de medida protetiva ou socioeducativa na primeira ofensa sexual cometida. Apenas três desses casos foram notificados na segunda ofensa sexual. É importante estabelecer uma diferenciação entre notificação e reincidência, uma vez que a primeira consiste na comunicação oficial às autoridades sobre a ocorrência para que sejam adotadas ações de proteção e responsabilização (Sousa, Mascarenhas, Silva, & Almeida, 2012). O segundo termo refere-se ao cometimento de um novo ato de ofensa sexual. Pretende-se aqui traçar uma ligação entre esses dois momentos: não havendo uma notificação, as chances de reincidência parecem ter espaço.

Ryan (2012) defende que a ofensa sexual cometida por adolescentes acontece, geralmente, uma única vez quando o autor é responsabilizado. Diante disso, observam-se falhas na ruptura dessa violência. A responsabilização do adolescente, nos casos de abuso sexual, é de extrema importância não somente por diminuir as possibilidades de uma nova incidência deste comportamento, mas também, porque a violência sexual é consolidada em diversos mitos (como parte de rito de passagem, a criança como propriedade do adulto, a mulher como objeto sexual) que a naturaliza e banaliza. Adultos e/ou adolescentes que cometem ofensa sexual não reconhecem o dano causado ao outro indivíduo por não considerarem grave o que realizaram (Worling & Langton, 2017). O processo de responsabilização possibilita a construção de um espaço para que o adolescente possa reconhecer o que fez e os danos provocados à vítima.

A legislação brasileira estabelece formas de responsabilização de crianças e adolescentes, a partir das medidas de proteção e socioeducativa. No caso da criança, o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) (Lei n. 8.069, 1990) afirma que devem ser aplicadas apenas medidas protetivas, uma vez que o processo de amadurecimento do adolescente deve ser levado em consideração, incluindo as necessidades pedagógicas com a intenção de privilegiar o fortalecimento dos vínculos familiares e comunitários. De acordo com o artigo 100 do ECA, a medida de proteção é aplicada pelos conselheiros tutelares e juízes da Vara da Infância e Juventude, quando os direitos de crianças e adolescentes foram violados por ação ou omissão do Estado; por falta, omissão ou abuso dos pais ou responsáveis; ou, ainda, por conduta dos mesmos. Na aplicação desta medida, as crianças e os pais podem ser encaminhados para atendimento, orientação, acompanhamento da frequência escolar e dentre outros (Art. 101). Já as medidas socioeducativas são aplicadas para os adolescentes (a partir dos 12 anos), quando é cometido um ato infracional (conduta correspondente a um crime ou contravenção penal), podendo ser cumprida por meio da advertência, prestação de serviços, liberdade assistida, semiliberdade, internação, segundo o artigo 112 (Lei n. 8.069, 1990). Desta maneira, avalia-se a necessidade da aplicação de uma destas medidas com intenção educativa para que este sujeito possa compreender a gravidade do ato praticado com consequente dano a outra pessoa. Assume-se aqui a posição de que esses adolescentes que cometeram ofensa sexual necessitam de que na medida aplicada possa representar o papel de responsabilização e de proteção simultâneos. Assim, pode-se ofertar um espaço relacional e psicoeducativo para que o adolescente reconheça e compreenda os danos causados a outrem, e construa formas mais assertivas de estabelecer relação com outros sujeitos. Caso não haja nenhuma responsabilização da ofensa praticada será dificultado o processo de identificação deste ato como uma violência, aumentando a possibilidade de risco de uma nova reincidência (Worling & Curwen, 2012b).

A reincidência da ofensa sexual traz dois aspectos em relação à pessoa que sofreu a violência a serem considerados: revitimização sexual e a intensidade do dano psíquico. A revitimização sexual refere-se à vítima ser violentada mais de uma vez por um mesmo ofensor ou por diferentes ofensores. Esta situação expressa a dinâmica das violências sexuais, as quais acontecem em escalada, ou seja, a cada nova ofensa, o ato torna-se mais invasivo. Quanto maior a quantidade de vitimizações e a invasividade do ato, maior a intensidade dos danos causados na vítima. Estes fatores elencados possibilitam o desenvolvimento de condutas agressivas sexuais e violadoras, mais adianta na fase da adolescência (Hershkowitz, 2014).

 

Considerações Finais

Os dados desta pesquisa apontaram que os adolescentes que cometeram ofensa sexual apresentam precocidade da idade da prática da ofensa sexual; o abuso sexual foi cometido em maior medida com vítimas do sexo masculino; o ato abusivo pode ser considerado como oportunista; houve falta de aplicação de medidas de proteção e responsabilização a esses adolescentes e às vítimas que sofreram violência sexual. Além disto, foram verificadas situações de vulnerabilidade para a ocorrência da ofensa sexual, que são: falta de supervisão permanente dos pais ou responsáveis, somada ao fácil acesso às vítimas, o pertencimento a ambientes de grande vulnerabilidade psicossocial. Acredita-se que estes fatores evidenciam que o adolescente se encontra em abandono afetivo e, muitas vezes, físico; que há falta de orientação sobre o desenvolvimento da sexualidade; e sobre vários outros aspectos da vida de uma pessoa que ainda está em desenvolvimento.

A diminuição da idade para o cometimento da ofensa sexual nesta amostra apresenta dois agravantes: falta de aplicação de medidas que promovam a proteção e a responsabilização, e a compreensão equivocada dos familiares e atores da comunidade de que a ofensa sexual nesta idade seja uma brincadeira ou parte do desenvolvimento da sexualidade. Estes dois fatores possibilitam que o adolescente não identifique esta prática como violência e banalize a ofensa sexual.

A sistematização destas informações possibilitou compreender ainda que a prática da violência sexual está vinculada a uma violência estrutural, a qual se refere ao efeito das desigualdades sociais e a não garantia dos direitos sociais básicos à condição de desenvolvimento peculiar de um sujeito. Por este motivo, é importante o trabalho de diminuição da estigmatização que estes adolescentes sofrem ao serem percebidos apenas pelo ato violento que cometeram. Uma destas possibilidades é a viabilidade de atendimento com a finalidade de identificar e mudar os fatores de risco que possibilitaram a execução deste comportamento. Estas informações caracterizam as carências múltiplas desta população, sendo necessárias intervenções que considerem a complexidade das interações familiares e da inserção das famílias na comunidade. Nesse sentido, sugerem-se propostas de atendimento a este público necessitam serem integradas a várias disciplinas (interdisciplinaridade) e setores (intersetorialidade) das políticas públicas. Essa recomendação encontra-se em consonância com as proposições apontadas no Plano Nacional de Enfrentamento da Violência Sexual contra Crianças e Adolescentes (PNEVSCA) (Comitê Nacional de Enfrentamento à Violência Sexual contra Crianças e Adolescentes, 2013), que aponta a promoção da atenção integral ao adolescente que cometeu ofensa sexual.

Este texto estimula a construção de uma clínica comprometida com os direitos humanos de crianças e adolescentes. Os dados coletados demonstram a importância de que, a reunião das informações a respeito da pessoa que cometeu ofensa sexual tenha a intenção de qualificar a compreensão dos danos psíquicos dos adolescentes, de promover a denúncia e/ou notificação, como orientado no artigo 9° do Código de Ética do Psicólogo (Conselho Federal de Psicologia - CFP, 2005) e no Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei n. 8.069, 1990). A notificação da violência sexual perpetrada deve ampliar seu objetivo além da responsabilização, garantindo a proteção à vítima, e ao próprio adolescente que cometeu ofensa sexual. Destaca-se que todos esses apontamentos podem ser utilizados como norteadores para o atendimento dessa população de maneira adequada.

Por último, ressalta-se que este estudo não possui intenção de generalização destas características para adolescentes atendidos em outras instituições e outras regiões do país, devido à amostra ser reduzida. Diante disso, sugere-se estudos longitudinais a fim de verificar as possíveis modificações das características dessa população. Porém, os achados desta pesquisa possibilitaram identificar a dinâmica das histórias da ofensa sexual, e estes aspectos podem facilitar e ampliar a visão dos profissionais a respeito do tema, bem como, qualificar as intervenções realizadas com estes adolescentes.

 

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Endereço para correspondência:
Mariana Miranda Borges
marianamiborges@terra.com.br

Liana Fortunato Costa
lianaf@terra.com.br

Submetido em: 12/09/2018
Revisto em: 27/04/2019
Aceito em: 31/05/2019

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