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Arquivos Brasileiros de Psicologia

versão On-line ISSN 1809-5267

Arq. bras. psicol. vol.73 no.1 Rio de Janeiro jan./abr. 2021

http://dx.doi.org/10.36482/1809-5267.ARBP2021v73i1p.104-120 

ARTIGOS

 

Suicídio e problemas comportamentais em adolescentes do interior de Goiás

 

Suicide and behavioral problems in adolescents of a City of Goiás

 

Suicidio y problemas de comportamiento en adolescentes del interior de Goiás

 

 

Daniela Sacramento ZaniniI; Makilim Nunes BaptistaII; Ana Cristina Gomes Marques de FariaIII; Yngrid D' Lanuse da Silva SantosIV; Danielly Machado A. AraújoV

IPontifícia Universidade Católica de Goiás, Curso de Psicologia e Pôs graduação Mestrado e Doutorado em Psicologia. Goiânia. Goiás. Brasil
IIUniversidade São Francisco - Câmpus São Paulo, Pontifícia Universidade Católica de Campinas, Universidade Federal de São Paulo Escola Paulista de Medicina, Universidade São Judas Tadeu
IIIUniversidade Estadual de Goiás Campus Ceres, curso de Enfermagem. Anápolis. Goiás. Brasil
IVPontifícia Universidade Católica de Goiás, Curso de Psicologia. Goiânia. Goiás. Brasil
VPontifícia Universidade Católica de Goiás, Curso de Psicologia. Goiânia. Goiás. Brasil

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

O suicídio envolve ideações e/ou tentativas que podem levar a morte. Seu aumento na adolescência demanda por políticas públicas preventivas e promotoras de saúde. Objetivos: 1) descrever os índices e métodos de suicídio por sexo em uma cidade de Goiás entre 2005 e 2012; 2) avaliar a prevalência de ideação e tentativa de suicídio entre adolescentes; 3) avaliar a relação entre ideação suicida e tentativa com problemas de comportamentos; e 4) analisar fatores de risco sociodemográficos e clínicos associados à predição de tentativas de suicídio. Responderam ao Youth Self Report 368 adolescentes de 13 a 18 anos. Houve elevada prevalência de suicídio (M = 2,37 casos/ano em uma cidade com cerca de 2.200 adolescentes), 12,8% tentaram suicídio, 18,2% tiveram ideação e destes 47,8% efetivamente tentaram. Ideação e tentativa de suicídio correlacionaram-se com todos os problemas de comportamento pesquisados. A ideação suicida e o tipo de escola foram preditoras de tentativas de suicídios.

Palavras-chave: Adolescentes; Ideação Suicida; Tentativa de Suicídio; Suicídio.


ABSTRACT

Suicide involves ideations and/or attempts that can lead to death. Its increase in adolescence demands preventive and health-promoting public policies. Objectives: 1) to disclose, by means of documentary analysis, the indexes and methods of suicide by sex in a city of Goiás between the years of 2005 and 2012; 2) to endorse the prevalence of ideation and attempted suicide among adolescents; 3) to assess a relationship between idea and suicide attempt and behavioral problems, and 4) to analyze sociodemographic and clinical risks associated with suicide attempts. A probabilistic sample of 368 adolescents (13 to 18 years old), responded to the Youth Self Report. There is a high prevalence of suicide in the city (M = 2.37 cases/year in a city with approximately 2,200 adolescents). 12.8% of the sample reported attempting suicide, and 18,2% thought to commit suicide, of which 47.8% actually attempted suicide. Ideation and attempted suicide correlated significantly with all behavioral problems surveyed. Variables such as suicidal ideation and type of school were predictors of suicide attempts.

Keywords: Teenagers; Suicidal Ideation; Suicide Attempt; Suicide.


RESUMEN

El suicidio implica ideaciones y/o intentos que pueden conducir a la muerte. Su aumento en la adolescencia exige políticas públicas preventivas y de promoción de la salud. Objetivos: 1) Describir las tasas y métodos de suicidio por sexo en una ciudad de Goiás entre 2005 y 2012; 2) evaluar la prevalencia de ideación e intento de suicidio entre adolescentes; 3) evaluar la relación entre ideación suicida y los intentos de los problemas de comportamiento y, 4) para analizar los factores de riesgo sociodemográficos y clínicos asociados con la predicción de los intentos de suicidio. Una muestra de 368 adolescentes de 13 a 18 años respondieron al Youth Self Report. Hubo una alta prevalencia de suicidio (M = 2,37 casos/año en una ciudad con aproximadamente 2.200 adolescentes), el 12,8% intentó suicidarse, el 18,2% tenía ideación y de estos el 47,8% realmente lo intentó. La ideación y el intento de suicidio se correlacionaron con todos los problemas de comportamiento encuestados. La ideación suicida y el tipo de escuela fueron predictores de intentos de suicidio.

Palabras clave: Adolescentes; Ideación Suicida; Intento de Suicidio; Suicidio.


 

 

Introdução

Apesar de não haver um consenso sobre a definição de comportamento suicida, ele pode ser considerado como um conjunto de atitudes que abrange desde a ideação suicida, passando pela tentativa e chegando ao desfecho. Assim, o suicídio pode ser entendido como um ato autoinfligido que ocasiona intencionalmente a morte do próprio indivíduo, e a tentativa de suicídio como autolesão intencional cujo objetivo é pôr fim à própria vida, mas sem atingir o desfecho (Centers for Disease Control and Prevention - CDC, 2018) (De Leo, Burgis, Bertolote, Kerkhof, & Bille-Brahe, 2006; Goodfellow, Kõlves, & Leo, 2018).

Segundo dados da Organização Mundial da Saúde - OMS (2014), o suicídio é a causa da morte de 800 mil pessoas por ano em todo o mundo, perfazendo uma morte a cada 40 segundos, considerando todas as idades. Além disso, é considerada a segunda maior causa de morte entre os jovens de 15 a 29 anos (OMS, 2017). Ainda, segundo a OMS (2017), essas taxas variam de acordo com a região e o sexo, contudo, 78% dos suicídios globais ocorridos em 2015 foram em países de baixa ou média renda. Em comparação a outros países, o Brasil apresenta taxas relativamente baixas de suicídio (6,5 a cada 100 mil habitantes) (OMS, 2018). No entanto, em algumas faixas etárias, como, por exemplo, a adolescência, está havendo um crescimento destas taxas.

O Mapa da Violência divulgou que, do ano de 1980 a 2013, o suicídio aumentou 63,5% (aproximadamente 12% ao ano). Isso corresponde a um acréscimo de 427% em sua participação no total de óbitos de crianças e adolescentes de 0 a 19 anos, ficando atrás apenas do homicídio. Mas, atualmente, Jaen-Varas et al. (2019) descreveram um aumento de 24% nas taxas de suicídio entre adolescentes, de 2006 a 2015, em seis grandes cidades brasileiras (Waiselfisz, 2015).

O Boletim Epidemiológico divulgado pelo Ministério da Saúde aponta que no período de 2011 a 2015 morreram cerca de 55.649 pessoas por suicídio. Tal número pode ser estimado em cerca de 30 mortes por dia. A distribuição de suicídios ficou entre 8,7/100 mil habitantes para o sexo masculino e 2,4/100 mil habitantes para o sexo feminino. Em Goiás, as taxas variam entre 10,1 a 12,8/100 mil habitantes no sexo masculino e entre 2,7 e 3,3/100 mil habitantes no sexo feminino. Dessa forma, Goiás fica à frente da taxa nacional, embora os estados brasileiros descritos com maiores índices de suicídio sejam Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Piauí e Roraima (Brasil, 2017).

Estes dados são alarmantes, sobretudo se observado que, em geral, existe uma subnotificação dos suicídios mesmo em dados oficiais do país. Os casos de suicídio no Brasil são reportados por meio do Sistema de Informação de Mortalidade (SIM), e este conta com uma abrangência de cerca de 75% dos óbitos ocorridos. Adversamente, nem sempre os falecimentos são devidamente declarados e o suicídio em particular pode deixar de ser notificado por vários motivos: incerteza da intencionalidade da morte, dúvida entre hipótese de suicídio, homicídio e/ou morte acidental, tabus culturais ou religiosos relacionados ao tema, entre outros (Botega, 2015).

A respeito da importância da atenção à tentativa de suicídio, Vidal, Gontijo e Lima (2013) realizaram um estudo que computou os Boletins de Ocorrências (BO) correspondentes ao período de 2003 a 2009, na região de Barbarcena (Minas Gerais). A amostra compôs-se de 807 pessoas, entre 15 a 86 anos, com predominância feminina (cerca de 65,8% de mulheres). Observou-se que a tentativa de suicídio é fator de risco para o suicídio consumado, sobretudo no primeiro ano que segue o atentado (90% das mortes por suicídio ocorreram dentro desse prazo), evidenciando que o acolhimento e a rede especializada de apoio são indispensáveis durante todo esse período.

O método utilizado para o suicídio é determinante para a gravidade da lesão e probabilidade da ocorrência do óbito. Lovisi, Santos, Legay, Abelha e Valencia (2009) apresentaram as características clínico-epidemiológicas dos métodos de suicídio no Brasil, nos anos de 1980 a 2006. O enforcamento foi o meio mais utilizado (47,2%), seguido do uso de armas de fogo (18,7%), em terceiro lugar, vários métodos foram agrupados (por exemplo, objetos perfurocortantes, pular de lugar alto, entre outros) (14,4%) e o quarto lugar foi ocupado pelo envenenamento (14,3%). Em um estudo mais recente, Baptista e Gomes (2016) descreveram o enforcamento e uso de arma de fogo como os métodos mais prevalentes de suicídio em uma cidade do interior de Minas Gerais.

Sgobin, Trabali, Botega e Coelho (2015) discutem sobre os custos do suicídio na saúde pública. Foram comparados os gastos de 17 pacientes internados por tentativas de suicídio de alta gravidade com os gastos de 17 pacientes internados por síndrome coronariana aguda, no mesmo hospital e no mesmo período. Os resultados apresentaram gastos similares para os custos diretos, mas significativamente maiores referentes aos pacientes com tentativa de suicídio no custo indireto (familiar e individual) (p < 5%). Tais custos indiretos dizem respeito às perdas salariais decorrentes das faltas ao trabalho (pacientes e de seus familiares) e prejuízos em benefícios ou aposentadorias.

Em um cálculo superficial dos gastos da saúde para com o suicídio, pode-se considerar que: 1) a cada três tentativas de suicídio, apenas uma é atendida em uma unidade de saúde; 2) o custo para cada tentativa pode atingir R$ 12.351,00; 3) o número de pessoas com tentativas de suicídio no país no período de 2011 a 2016 foi de 176.226. Assim, neste intervalo de tempo, o país gastou cerca de R$ 725 milhões para atender, tratar, reabilitar e acompanhar essas pessoas. Um gasto anual de aproximadamente R$ 128 milhões, o que permite estimar que de 2011 até 2020 o país terá investido R$ 1,2 bilhão na reparação da tentativa de suicídio. Os custos emocionais/sociais são altos também, talvez maiores que os custos financeiros, já que a ideação, tentativas e o suicídio geram sofrimento nos indivíduos, erosão nas relações sociais e consequências psicológicas para a vítima e suas relações sociais (Ahmadpanah, Rahighi, & Haghighi, 2017; Botega et al., 2009; Brasil, 2017; Sgobin et al., 2015).

Inúmeras publicações consideram o comportamento suicida uma realidade modificável e passível de prevenção. Algumas citam estratégias adotadas, outras apontam os fatores de proteção e risco ao suicídio. Investir em estudos que, a exemplo desses, possibilitem a construção de intervenções estruturadas e cientificamente válidas para a prevenir o suicídio significaria não apenas uma economia considerável no âmbito da saúde pública, mas a promoção de qualidade de vida e bem-estar, bem como a promoção da própria vida (Breton et al., 2015; Celano et al., 2017; Huffman et al., 2014; Moreira, & Bastos, 2015; OMS, 2014; Santos, Marcon, Espinosa, Baptista, & Paulo, 2017).

No que diz respeito à tentativa de suicídio, Silva et al. (2017) apontam para a relação entre o abuso de drogas, sintomatologia depressiva e ideação com maior probabilidade de ocorrência da tentativa. Botega (2015) assinala diversos outros fatores, como a exposição a abusos (sejam eles físicos, emocionais ou sexuais) e o acometimento de doenças graves. Além disso, explicita a proporção de que a cada três tentativas de suicídio por mulheres, há apenas uma tentativa por um homem. Fator que se inverte em relação ao suicídio consumado (três suicídios masculinos para um feminino). Outros fatores importantes são a existência de transtornos mentais, sentimentos de desesperança, de isolamento, falta de apoio social e conflitos ou perdas nas relações próximas (Franklin et al., 2017; OMS, 2014).

Apesar de o comportamento suicida estar presente, com variadas prevalências em diferentes continentes, países e regiões, o fenômeno é também influenciado por questões culturais. Como visto anteriormente, as regiões no Brasil são apontadas nas estatísticas com diferentes taxas de suicídio, tonando-se necessária uma descrição mais pormenorizada da cidade em que foi realizado este estudo.

O município estudado localiza-se no norte do estado de Goiás e possui uma área total de 748 km2, representando 0,22% do estado, 0,0468% da região e 0,0088% de todo o território brasileiro. Seu Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) é de 0.748. O município se encontra às margens da GO 434 e 251, importante eixo de ligação a BR - 153 e municípios satélites, com distância aproximada de 200 km da capital Goiânia. Trata-se de uma cidade do interior de Goiás com uma população estimada de 19.815 habitantes, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE (2018). Destes, 2.191 são adolescentes com idades entre 12 e 18 anos, segundo dados oficiais do censo escolar do ano de 2012 informados pela Subsecretaria Municipal de Educação desta cidade.

No âmbito da assistência à saúde, o município dispõe de capacidade física instalada para desenvolver ações assistenciais desde o nível básico até o secundário, que se encontram principalmente nos centros de saúde e unidades hospitalares. No atendimento hospitalar, o município conta com três estabelecimentos de saúde que prestam serviço de pronto atendimento 24h. Com relação à rede privada, possui uma pactuação com o serviço, garantindo assim uma melhor cobertura a toda população usuária do Sistema Único de Saúde (SUS).

Até 2008 não existia nenhum serviço de atendimento direcionado à área da saúde mental. No ano de 2009, a Secretaria Municipal de Saúde elaborou projeto com o objetivo de solicitar a implantação do Centro de Atendimento Psicossocial (CAPS). A justificativa era de que este município não fugia à realidade brasileira quanto à deficiência ao atendimento das necessidades básicas da sua população e, em particular, no âmbito da saúde mental, a qual, ainda segundo o projeto, era marcada pela inexistência de uma assistência psiquiátrica adequada e para as demandas existentes, já que só haviam duas opções: deslocar-se para o hospital de urgência psiquiátrica da capital do estado ou de uma cidade distante, a 45 km da capital.

A prática de atendimento às emergências psiquiátricas e toxicológicas era rotineira no município, principalmente nos casos de tentativas de suicídio. Cerca de 50% dos atendimentos a pacientes vítimas de tentativa de suicídio eram advindos do município estudado e esse número poderia chegar a maiores proporções se computados os casos de baixa e média complexidade, segundo informações da secretaria de saúde do município. A grande preocupação era com a reabilitação psíquica desses pacientes que, na sua maioria, são jovens e das mais variadas classes sociais.

Diante da relevância do estudo do suicídio e, levando-se em consideração a região Norte, mais especificamente a cidade em que foi realizada a pesquisa, o presente estudo tem quatro objetivos principais: 1) descrever, por meio de análise documental nos órgãos oficiais, os índices e métodos de suicídio por sexo em uma cidade de Goiás entre os anos de 2005 e 2012, além de analisar a tendência epidemiológica de suicídios neste período; 2) avaliar a prevalência de ideação e tentativa de suicídio entre os adolescentes no ano de 2013; 3) avaliar a relação entre ideação e tentativa de suicídio destes adolescentes com o autorrelato de problemas de comportamentos; e 4) analisar quais fatores de risco sociodemográficos e clínicos estão associados à predição de tentativas de suicídio.

 

Método

Participantes

Participaram deste estudo 368 adolescentes provenientes de duas escolas, uma pública e a outra particular, de uma cidade do interior de Goiás. No momento da coleta de dados, os participantes cursavam os anos escolares correspondentes ao Ensino Fundamental II (sexto ao nono ano). As idades variaram de 13 a 18 anos de idade (m = 15,98, DP = 1,26). Destes, 163 (43,9%) eram meninos e 208 (56,1%) eram meninas.

A seleção da amostra foi realizada de forma probabilística e por conglomerados. Para a sua definição, levou-se em consideração a fórmula sugerida por Richardson, Peres, Wanderley, Correia e Peres (1999) para populações finitas e variáveis nominais ou ordinais, cuja expressão estatística é:

Onde: n = tamanho da amostra; N = tamanho da população; ó = nível de confiança; p = proporção das características pesquisadas no universo; q = proporção do universo que não possui características pesquisadas (1 - p); E2 = erro de estimação permitido.

Para o cálculo, foram estabelecidos os seguintes critérios:

N = 2.191 => População finita; ó = Nível de confiança de 95%, segundo Fonseca e Martins (1996), nas pesquisas sociais costuma-se trabalhar com níveis de confiança de 95%; portanto ó = 1,96; p = Estimativa da verdadeira proporção de um dos níveis da variável escolhida => No caso da impossibilidade de prever com exatidão o valor de "p" deve ser admitido "p = 0,50", pois, dessa forma, tem-se o maior tamanho da amostra (Fonseca, & Martins, 1996, p. 181); q = 1 - p = 1 - 0,50 = 0,50; E2 = erro de estimativa suportado de 5% (E = 0,05), já que, segundo Fonseca e Martins (1996), em pesquisas sociais costuma-se trabalhar com erro máximo de estimativa de 5%.

Portanto, obteve-se:

Quando estes critérios e dados foram aplicados na fórmula, resultaram 326,97 sujeitos que constituíram um subconjunto representativo da população pesquisada. Portanto, pode-se concluir que a amostra de 368 participantes atende aos critérios, sendo representativa da população-alvo, representando ainda 16,8% de toda a população de adolescentes da cidade.

Instrumentos

Para avaliar os comportamentos de risco para suicídio, foi utilizado o Youth Self Report - YSR (1991), um questionário desenvolvido para adolescentes entre 11 e 18 anos de idade por Achenbach (1991) com o intuito de obter respostas de adolescentes a respeito de suas próprias competências e problemas. Para este estudo, foi utilizada a versão traduzida e adaptada do YSR para o português pela equipe da profa. Edwiges Silvares da Universidade de São Paulo (USP).

Esse instrumento é composto por duas partes. A primeira contém sete questões que analisam comportamentos sociais dos adolescentes, tais como atividades cotidianas, amizades, hábitos sociais e familiares e rendimento escolar, formando a escala de competência. A segunda parte é composta por 112 itens que avaliam problemas de comportamento e comportamentos socialmente desejáveis, formando as escalas de distúrbio total e síndromes, referindo-se a sintomas psicopatológicos de naturezas distintas baseados no DSM-IV (American Psychiatric Association, 2009).

Essas escalas são, posteriormente, associadas em dois grandes grupos denominados síndromes internalizantes (manifestações sindrômicas de afastamento, queixas somáticas, ansiedade e depressão) e síndromes externalizantes (compostas pelas escalas relativas a comportamentos delinquentes e condutas agressivas). A pontuação do questionário pode ser calculada segundo as escalas individuais, das grandes síndromes (internalizantes e externalizantes) e também em relação ao distúrbio total ou total de psicopatologia. Esta última representa o somatório total das pontuações nas escalas do questionário. O resultado é ponderado em função do sexo e da idade dos respondentes (Achenbach, 1991).

O YSR está empiricamente baseado em dados de pesquisas desenvolvidas em diversos contextos e culturas. No presente estudo, apenas a segunda parte do instrumento foi analisada e, mais especificamente, analisaram-se as síndromes externalizantes, internalizantes e a pontuação total no questionário (Achenbach, 1991).

Procedimentos

Após a aprovação do projeto pelo comitê de ética da instituição a ele vinculada (protocolo número CAAE 02778012.0.0000.0037), foram selecionadas as escolas que participaram do estudo, que foi uma escola pública estadual e uma escola particular. Em seguida, foi realizado o contato com elas. Após esclarecimentos necessários quanto à participação, foi enviado o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) para os responsáveis e para os adolescentes para que autorizassem a participação no estudo.

Os participantes foram submetidos em grupo à aplicação dos instrumentos em sua própria sala de aula e período escolar. Em estudos epidemiológicos com o objetivo de avaliar a saúde é recomendável o uso de medidas de rastreamento válidas. Neste sentido, a seleção do YSR serve a esse propósito (Bardin, 2013).

Foi garantido a todos os participantes o sigilo dos dados e a possibilidade de retirada do consentimento a qualquer momento do processo de pesquisa sem resultar em ônus para eles. Foram recolhidos 439 formulários (TCLE e questionários), porém, houve a necessidade de descartar 71, pois foram preenchidos de forma incompleta.

Os dados da análise documental foram obtidos na Secretaria de Saúde Municipal de uma cidade do interior de Goiás, e buscou-se a descrição dos índices e métodos de suicídio, por sexo, entre os anos de 2005 a 2012.

Análise dos Dados

Inicialmente, os dados epidemiológicos coletados em órgão oficial da cidade (Cartório de Registro Civil) foram descritos (dados secundários). A taxa de suicídio nos adolescentes foi estimada a cada ano dividindo o número de casos pela população de adolescentes do período multiplicado por 100 mil. Além disso, foi estimada a taxa média nos períodos da série (2005 a 2012). Também foi realizada uma regressão linear de Prais-Winsten para verificar a tendência da taxa de suicídio no período.

Já os dados coletados a partir de escalas de autorrelato (dados primários) foram analisados no programa SPSS, versão 24.0 e Stata, versão 12.0. Inicialmente foi realizada uma análise descritiva da amostra (em 2013), levando-se em consideração as informações sociodemográficas e clínicas, tais como a idade, sexo, tipo de escola, ideação e tentativa de suicídio anterior. Além disso, análise de correlação de Kendall foi realizada para verificar a relação entre tentativa e ideação suicida na amostra. Na sequência foi realizada uma análise de correlação de Spearman para analisar a relação entre ideação/tentativa de suicídio e problemas comportamentais, seguida de regressão linear.

Por fim, para verificar a associação entre tentativa de suicídio (variável dependente) e ideação suicida (exposição), foi realizada análise de regressão de Poisson com variância robusta ajustada pelas covariáveis idade, sexo e tipo de escola. Em todas as análises, valores de p < 0,05 foram considerados estatisticamente significantes.

 

Resultados

Análise dos dados secundários

Entre 2005 e 2012, foram verificados 19 casos de suicídio em adolescentes, o que perfaz uma média de 2,4 casos/ano. A Figura mostra a evolução da taxa de incidência de suicídio (por 100 mil) em adolescentes. A média da taxa foi de 108,4 casos/100 mil adolescentes. Verificou-se que a maior taxa foi observada em 2009 (319,5 casos/100 mil habitantes). Em 2011, nenhum caso de suicídio em adolescentes foi notificado. Contudo, tais dados devem ser avaliados com cautela, pois pode haver subnotificação além de perda de dados referente à troca de gestão no município nestes anos.

A análise de regressão de Prais-Winsten com variância robusta mostrou tendência estacionária da taxa de suicídio em adolescentes no período (β: - 11,23; IC95%: -37,08; 14,62; p-valor = 0,329), já que valores de p < 0,05 indicariam tendência significativa, o que não ocorreu na amostra.

Dos 19 casos de suicídio em adolescentes de 12 a 18 anos, 15 foram meninos e quatro meninas. Destes, verificou-se 15 casos de enforcamento (78,9%), dois de intoxicação exógena (10,5%) e dois por arma de fogo (10,5%).

 

Análise dos dados primários

Prevalência de ideação e tentativa de suicídio no ano de 2013

Participaram do estudo 368 adolescentes, 44,0% do sexo masculino e 56,0% do sexo feminino. A média de idade foi de 16 anos (desvio-padrão: 1,2; Mínimo: 13,0 e Máximo: 18,0). A maioria dos participantes eram de escolas públicas (83,2%). A prevalência de tentativa de suicídio nos últimos seis meses foi de 12,8% (IC95%: 9,7-16,6). Também, 18,2% (IC95%: 14,6-22,5) da amostra relataram ideação suicida nos últimos seis meses e, desses, 47,8% (IC95%: 36,2-59,5) reportaram tentativa de suicídio. Para verificar a relação entre ideação e tentativa de suicídio na amostra realizou-se o estudo de correlação de Kendall's tau-b. O valor r encontrado foi de 0.495 com um intervalo de confiança de p < 0,001, indicando uma relação positiva significativa entre ideação suicida e tentativa de suicídio na adolescência.

Para avaliar a relação entre a ideação suicida e tentativa de suicídio com o autorrelato de problemas de comportamento foi realizado um estudo de correlação entre estas variáveis, conforme dados apresentados na Tabela 1.

Observou-se relação significativa e positiva entre a ideação suicida e a tentativa de suicídio e todos os tipos de problemas de comportamento analisados, com magnitudes variando de fracas a moderadas. Mais especificamente, a ideação suicida relacionou-se significativa, positivamente e, em ordem decrescente, com: ansiedade e depressão, problemas somáticos, comportamento agressivo, problemas sociais, isolamento social e depressão, problemas de pensamento, quebrar regras e problemas de atenção. Em termos de composição de comportamentos houve uma maior correlação com problemas internalizantes, seguido de problemas externalizantes (Tabela 1).

Outrossim, as tentativas de suicídio se correlacionaram, de maneira geral, com menores intensidades, com: problemas de pensamento, ansiedade e depressão, problemas sociais, problemas de atenção, problemas somáticos, comportamento agressivo isolamento social e depressão e quebrar regras. A composição dos comportamentos seguiu a mesma ordem da ideação suicida, também apresentando menores magnitudes (Tabela 1).

A fim de verificar quais dimensões do YSR explicavam a variação na ideação e tentativas de suicídio, foi realizada uma regressão linear tendo estas como variáveis dependentes (VD). Sendo assim, na ideação suicida, as variáveis independentes (VI) problemas somáticos (Beta = 0,21) e problemas de atenção (Beta = 0,16) explicaram a VD (R = 0,5). Já, no caso das tentativas de suicídio, problemas de pensamento (Beta = 0,38) e quebras de regras (Beta = 0,17) foram as variáveis significativas na explicação da VD (R = 0,49).

Por último, a fim de verificar a associação entre ideação suicida (exposição) e tentativa de suicídio (desfecho), foi realizada análise de regressão de Poisson com variância robusta ajustada pelos potenciais confundidores (sexo, idade e escolaridade). Observou-se que a prevalência de tentativa de suicídio foi 10,14 vezes maior (RPaj: 10,14; p-valor < 0,001) em adolescentes com ideação suicida quando comparado aos que não tinham essa característica. Também, a análise ajustada mostrou que estudantes de escolas privadas apresentaram maior prevalência de tentativa de suicídio (RPaj: 1,79; p-valor = 0,049) quando comparado aos de escolas públicas (Tabela 2).

 

Discussão

Este estudo teve como objetivos descrever o perfil epidemiológico dos suicídios de uma cidade de Goiás entre os anos de 2005 e 2012, além de avaliar a prevalência de ideação e tentativa de suicídio entre os adolescentes no ano de 2013, sua relação com o autorrelato de problemas de comportamentos e fatores de risco sociodemográficos e clínicos associados ao comportamento suicida.

Os dados apontam para uma realidade preocupante no município estudado. A análise de dados secundários mostrou a existência de 19 casos de suicídio em oito anos, o que perfaz uma média de 2,375 casos/ano para o período estudado ou 108,39 casos por 100 mil habitantes nesta faixa etária. Este dado está significativamente superior ao encontrado para as crianças entre 10 a 14 anos (0,7 por 100 mil habitantes) e para adolescentes entre 15 a 19 anos (3,9 por 100 mil habitantes), segundo dados de 2012. Neste sentido, pode-se dizer que a cidade pesquisada possui dados que se equiparam e/ou ultrapassam aos índices dos países nórdicos, tornando a situação ainda mais alarmante (OMS, 2014; Waiselfisz, 2014).

A análise de tendência mostra que não há probabilidade de aumento de casos, no entanto, também não há de diminuição. Tais resultados também superam os estudos de levantamento realizados em outros estados, com amostras de larga escala e/ou representativas. Especificamente em estudantes universitários, detectou-se ideação suicida, nos últimos 30 dias, em aproximadamente 10% da amostra e, nos últimos 12 meses, aproximadamente 20% dos estudantes apresentaram sintomas de tristeza e sentimentos de solidão (Fórum Nacional de Pró-Reitores de Assuntos Comunitários e Estudantes, 2014; Santos et al., 2017).

Em relação ao comportamento suicida, observou-se um índice de 18,2% de ideação suicida e de 12,8% de tentativa de suicídio nos últimos 6 meses. Mais preocupante ainda foi observar que dos 12,8% que tentaram suicídio nos últimos meses, 8,7% estavam pensando em fazê-lo. Vidal et al. (2013) apontam alta prevalência de repetição de tentativas de suicídio naqueles que já tentaram anteriormente e relatam que o primeiro ano após a tentativa, sendo esta a primeira ou não, é o mais crítico, em termos de mortalidade, significando que as intervenções que ocorrem de maneira sequencial a qualquer tentativa tende a gerar resultados mais promissores.

Estes dados além de revelarem uma realidade alarmante da presente cidade também evidenciam a relação entre ideação e tentativa de suicídio já apontadas em outros estudos (Moreira, & Bastos, 2015; OMS, 2014). Contudo, alguns aspectos relativos aos dados encontrados merecem destaque e divergem do que classicamente é apontado pela literatura do tema. Primeiramente, no presente estudo as chances de que os adolescentes desta cidade que pensam em suicidar efetivamente o façam é de quase 50%. Este índice é superior àqueles referidos em outros estudos (por exemplo: OMS, 2014). Além disso, neste estudo não foram observadas diferenças significativas entre meninas e meninos para ideação ou tentativa de suicídio contrariando o que é postulado em estudos internacionais de que as mulheres pensariam mais em suicidar, mas os homens tentariam mais (por exemplo: Hamilton, & Klimes-Dougan, 2015).

Constatou-se também que alunos de escola privada tentam mais suicídio que alunos de escola pública. Tal achado é corroborado, em parte, com os estudos de Jatobá e Bastos (2007), nos quais estudantes de escola particular apresentaram tentativas de suicídio associado à ansiedade severa e depressão grave, enquanto alunos de escola pública apresentam ideação suicida associada à ansiedade moderada e depressão leve ou moderada. Autores divergem em relação à associação de condições socioeconômicas e comportamentos suicidas. Para Falcão e Oliveira (2015), indivíduos muito ricos ou muito pobres são considerados grupo de risco para suicídio. No entanto, Dávila-Cervante e Pardo-Montaño (2017) demonstraram maior mortalidade por suicídio na classe média, comparados a indivíduos das classes alta e baixa. A falta de dados na literatura que avaliem a relação entre escolas públicas e privadas e o comportamento suicida entre adolescentes incita a realização de pesquisas posteriores.

O método mais utilizado para o suicídio na amostra foi o enforcamento, embora nos últimos três anos a arma de fogo também tenha sido utilizada. Tal aspecto deve ser avaliado a luz da disponibilidade a tal recurso como forma de autoextermínio e está em consonância com o que é descrito na literatura (Baptista, & Gomes, 2016; Lovisi et al., 2009).

Este estudo também aponta que, em alguns casos, o suicídio pode estar associado a um evento desencadeador e/ou a um ato impulsivo sobretudo entre os adolescentes. Foi encontrada uma porcentagem de 4,1 de adolescentes que relataram não haver pensado em suicídio, mas, ainda assim, atentaram contra a própria vida. Tal dado é corroborado pelo estudo de Buchman-Schimitt et al. (2017), que aponta que acontecimentos estressantes ou adversos são fatores de risco ao suicídio, principalmente se na presença de fatores de risco associados.

Os dados também evidenciaram uma alta taxa de suicídio neste município além de um alto risco de que novos casos ocorram, com um índice de risco de suicídio para esta população de 13%. Neste sentido, sugere-se que uma avaliação sistemática e rigorosa deve ser feita no município estudado com o objetivo de detectar fatores de risco e proteção que possam auxiliar no desenvolvimento de programas de prevenção ao suicídio entre adolescentes. Além do que, o índice de suicídio encontrado nesta população entre os anos de 2005 e 2012 foi superior aos índices nacionais e a probabilidade de que estes adolescentes venham cometer suicídio foi de 13% (Wailselfiz, 2014).

Vários são os fatores psicossociais e biológicos identificados como risco ao suicídio. Franklin et al. (2017) citam as perdas românticas, problemas acadêmicos, tentativas de suicídios anteriores, transtornos mentais, histórico familiar de suicídio, crenças religiosas ou culturais de que cometer o suicídio é um ato nobre, epidemia local de suicídio, isolamento social, impedimento de acesso a serviços de saúde mental, desamparo, impulsividade ou tendências agressivas, histórico de abuso infantil (psicológico e/ou sexual), dentre outros como possíveis fatores descritos pelas principais associações norte-americanas sobre suicídio e/ou saúde mental (por exemplo: National Institute of Mental Health - NIMH; World Health Organization - WHO; American Association of Suicidology (Youths) - AAS).

Desta forma, variáveis como problemas internalizantes e externalizantes, vêm ao encontro dos achados desta pesquisa, em que os índices de suicídio estão relacionados a quadros de depressão, ansiedade e problemas de comportamento. De fato, os resultados da presente pesquisa demonstraram que, embora ideação e tentativa de suicídio se correlacionem com todos os problemas de comportamento, em termos análise preditiva, a ideação foi predita por problemas somáticos e atencionais, ou seja, fadiga, pesadelos e dores em geral, além de problemas com concentração, confusão e dispersão (Botega, 2015; Shain, 2016).

É provável, de acordo com Baptista (2018) que estes comportamentos podem estar associados a diversos transtornos mentais, relacionados com depressão e ansiedade e/ou podem ser seus sintomas. Já as tentativas foram preditas por problemas de pensamentos e quebras de regras, ou seja, pensamentos repetitivos (ruminação), automutilação, além de comportamentos delinquentes, que geralmente estão relacionados com aumento de agressividade. Esses dados corroboram com os achados de Ivarsson, Gillberg, Arvidsson e Broberg (2002). Em seu estudo, as escalas do YSR de ansiedade/depressão, quebrar regras, comportamento agressivo e problemas sociais foram preditoras de ideação e tentativa de suicídio. E com o estudo de Berona, Horwitz, Czyz e King (2016), que encontraram que os perfis latentes provenientes do YSR, predominantemente internalizantes e desregulados emocionalmente (pontuações elevadas em ansiedade/depressão, problemas atencionais e comportamento agressivo), estariam mais associados ao comportamento suicida. Em relação às tentativas de suicídio, a presença de comportamentos externalizantes, como agressividade e impulsividade, apresentou-se como importante característica disparadora dessas tentativas, na linha do que foi encontrado nesta pesquisa.

Embora existam no município programas sociais do governo federal como Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (PETI), ProJovem Adolescente, estes são voltados para jovens de baixa renda e não contemplam todos os adolescentes. Desta forma, há necessidade de se implantar programas educacionais e de convivência entre os jovens com fins de enriquecimento dos vínculos familiares, fortalecimento dos vínculos sociais para prevenção e promoção de saúde.

Para além destes fatores de risco citados anteriormente, estudos futuros poderiam considerar outros aspectos descritos na literatura como possíveis fatores de risco ao suicídio. Estes fatores podem estar influenciando os índices aqui apresentados e/ou insuflando o comportamento suicida na cidade avaliada (King, Foster, & Rogalski, 2013; Liu, Chen, Liu, Wang, & Jia, 2017).

Em suma, o presente artigo contribuiu para a descrição e análise dos índices de ideação e tentativa de suicídio entre adolescentes em um município do interior de Goiás, revelando os altos índices encontrados e uma alta chance de suicídio entre a população estudada. Estudos futuros deveriam centrar atenção aos fatores de proteção e risco aplicáveis a esta comunidade com vistas ao desenvolvimento de programas de prevenção de suicídio em nível de saúde pública. Apesar de não haver total consenso a respeito de quais programas de prevenção são mais eficazes, indícios mostram que aqueles que utilizam uma grande diversidade de estratégias psicossociais seriam os que mais proporcionam resultados (Calear et al., 2016).

A diminuição dos índices a partir da implantação do CAPS nesta cidade poderia ser observada como um importante fator, contudo há de se tomar este dado com cautela haja vista outras questões que podem estar associadas a uma subnotificação relativa ao período de transição de governo. Outras medidas de cunho psicossocial também poderiam ser tomadas a fim de prevenir problemas de comportamento entre os adolescentes e promover maior envolvimento com atividades ligadas a vida e a saúde.

Desta maneira, é imprescindível que sejam tomadas ações ao nível de saúde pública que previnam o suicídio e forneçam apoio efetivo e iminente àqueles que o tentaram. Independentemente de haver iniciativas governamentais a respeito da implementação de programa de prevenção de suicídio, tais como a aprovação da Lei nº 13.819/2019, que institui a Política Nacional de Prevenção da Automutilação e do Suicídio, a ser implementada pela União, em cooperação com os estados, o Distrito Federal e os municípios, tais iniciativas nem sempre refletem, na prática, resultados eficazes. Além disso, há de se considerar o preparo de profissionais de saúde, professores e pais em relação ao fenômeno (Lei Nº 13.819, 2019).

De forma geral, como apontam Zalsman et al. (2016), alguns programas podem ser mais eficazes do que outros, no entanto, aspectos culturais devem ser levados em consideração. Por exemplo, programas que restringem o acesso a métodos legais, programas de conscientização, orientações em mídia, triagem em atenção primária de saúde, detecção e tratamento de casos de transtornos de humor, suportes via internet, linhas telefônicas de ajuda, dentre outros, podem ser importantes no desenvolvimento de políticas públicas de saúde mais amplas.

 

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Endereço para correspondência:
Daniela Sacramento Zaninsi
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Makilim Nunes Baptista
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Ana Cristina Gomes Marques de Faria
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Danielly Machado A. Araújo
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Submetido em: 13/09/2019
Revisto em: 03/01/2020
Aceito em: 27/02/2020

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