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Revista da Abordagem Gestáltica

versão impressa ISSN 1809-6867

Rev. abordagem gestalt. vol.18 no.1 Goiânia jun. 2012

 

ARTIGO

 

O significado da psicologia e da terapia holística para terapeutas holísticos graduados em psicologia

 

The meaning of psychology and holistic therapy to holistic therapists graduated in psychology

 

El significado de la psicología y terapía holística para terapeutas holísticos graduados en psicología

 

 

Daniel MartynetzI; Carlos Augusto SerbenaII

IGraduado em Psicologia pela Universidade Federal do Paraná. E-mail: daniel.olorum@gmail.com
IIPossui Graduação em Engenharia Elétrica e em Psicologia pela Universidade Federal do Paraná, Mestrado em Psicologia pela Universidade Federal de Santa Catarina e Doutorado Interdisciplinar em Ciências Humanas pela Universidade Federal de Santa Catarina. Atualmente é Professor Adjunto do Departamento de Psicologia da Universidade Federal do Paraná. Endereço Institucional: Universidade Federal do Paraná, Departamento de Psicologia, Praça Santos Andrade, 50 (Centro). CEP 80000-000. Curitiba/PR. E-mail: caserbena@yahoo.com e nedhu@ufpr.br

 

 


RESUMO

A terapia holística é uma prática recente no campo terapêutico e por vezes utilizada também por psicólogos, apesar de não ser reconhecida como cientificamente válida. Na presente pesquisa, pretendeu-se investigar junto a terapeutas que recorrem às práticas holísticas, mas que também são graduados em psicologia, os significados que eles atribuem tanto à terapia holística quanto à psicologia e os motivos de suas escolhas pela terapia holística - sendo que eles podem ter optado por continuar como psicólogos ou não. Os participantes demonstraram unir a psicologia e a terapia holística nas suas práticas e adotar profissionalmente uma ética pessoal em oposição ao Código de Ética Profissional dos Psicólogos por questionarem este e os parâmetros científicos na psicologia.

Palavras-chave: Psicologia; Significado; Terapia holística.


ABSTRACT

The holistic therapy is a recent practice on the therapeutic field and sometimes is used also by psychologists, despite of not being recognized as scientific. In this research, it was intended to investigate with therapists that use holistic practices, but that are also graduated in psychology, the meanings that they attribute to holistic therapy and to psychology and the motives of their choice for holistic therapy - considering that they may or may not have chosen continuing as psychologists. The participants showed that they join psychology and holistic therapy and adopted a personal ethic in opposition to the Psychologists' Professional Ethic Code because they disagree with it and with the scientific parameters in psychology.

Keywords: Psychology; Meaning; Holistic therapy.


RESUMEN

La terapia holística es una práctica reciente en el campo psicoterapéutico. Algunas veces es también utilizado por los psicólogos, aunque que no reconocida como científicamente válida. En esta investigación, tratado de investigar con los terapeutas que recurren a prácticas holísticas, pero que también son licenciados en psicología, los significados que atribuyen a la psicología y la terapia holística y las razones de su elección por parte de la terapia holística - y puede haber elegido para continuar como psicólogos o no. Los participantes mostraron que unen la psicología y la terapia holística en sus prácticas y adoptan una ética personal, en oposición al Código de Ética de los psicólogos profesionales porque cuestionan esto y los parámetros científicos en la psicología.

Palabras-clave: Psicología; Sentido; Terapia holística.


 

 

Introdução

Em 2008, um grande hospital de São Paulo passou a incluir práticas como meditação, yoga, acupuntura e reiki no tratamento do câncer. O modelo, chamado de medicina integrativa - por integrar a medicina convencional e as técnicas complementares -, é semelhante aos adotados em instituições de referência internacional em oncologia. A inclusão dessas técnicas, até bem pouco tempo desacreditadas na área médica, tem sido motivada pela grande demanda de pacientes que procuram por tratamentos complementares quando têm um diagnóstico de câncer. Além disso, atualmente, há vários estudos controlados demonstrando a eficácia e a segurança delas.

Para que tais técnicas complementares sejam adotadas, de acordo com os médicos, são necessárias evidências científicas de que elas funcionam e de que não prejudicarão a terapia convencional. Quando bem indicadas, muitas das técnicas complementares podem ser úteis para melhorar a qualidade de vida dos pacientes e suas respostas aos tratamentos clínicos. Como exemplo, o yoga ajuda a diminuir a ansiedade, o medo e os pensamentos negativos, sendo utilizado junto a pacientes oncológicos e como tratamento coadjuvante de distúrbios psiquiátricos e psicológicos1.

Assim, um dos importantes fenômenos contemporâneos brasileiros na área da saúde é o surgimento das Terapias Holísticas - também denominadas alternativas, integrativas ou complementares (quando se considera apenas a utilização de determinadas técnicas) - que não possuem validação científica e, conseqüentemente, ocorre um debate sobre a real eficácia e eficiência de tais terapias, considerando-se os aspectos metodológicos e as implicações epistemológicas dos estudos (Gauer, Souza, Dal Molin & Gomes, 1997).

Com a finalidade de entender a controvérsia acerca de tais terapias, é importante compreender o que são as terapias holísticas e qual o seu percurso histórico. Segundo o SINTE (Sindicato dos Terapeutas), em seu tutorial escrito pelo terapeuta holístico Henrique Vieira Filho, o terapeuta holístico,

em geral, procede ao estudo e à análise do cliente, realizados sempre sob o paradigma holístico, cuja abordagem leva em consideração os aspectos sócio-somato-psíquicos. Faz uso da somatória das mais diversas técnicas, pois cada caso é considerado único e deve-se dispor dos mais variados métodos, para possibilitar a opção por aqueles com os quais o cliente tenha maior afinidade: promove a otimização da qualidade de vida, estabelecendo um processo interativo com seu cliente, levando este ao autoconhecimento e a mudanças em várias áreas, sendo as mais comuns: comportamento, elaboração da realidade e/ou preocupações com a mesma, incremento na capacidade de ser bem-sucedido nas situações da vida (aumento máximo das oportunidades e minimização das condições adversas), além de conhecimento e habilidade para tomada de decisão. Avalia os desequilíbrios energéticos, suas predisposições e possíveis conseqüências, além de promover a catalização da tendência natural ao auto-equilíbrio, facilitando-a pela aplicação de uma somatória de terapêuticas de abordagem holística, com o objetivo de transmutar a desarmonia em autoconhecimento (Vieira Filho, 2004, p. 4).

Dentre as possíveis profissões incluídas na terapia holística, temos "acupunturistas, terapeutas florais, psicanalistas, fitoterapeutas, terapeutas em estética, cromoterapeutas, terapeutas corporais, quiropraxistas, terapeutas ortomoleculares, radiestesistas, reikianos, etc." (Vieira Filho, 2004, p. 3), e, segundo o SINTE, a abordagem holística vem sendo o fundamento de diversas práticas há milhares de anos, somando as tradições das mais variadas culturas, práticas essas sempre nomeadas das mais diferentes formas em diferentes locais (Vieira Filho, 2004).

Entretanto, o surgimento e desenvolvimento das terapias holísticas remontam à década de 1960, integrando o movimento social urbano denominado Contracultura, (Tavares, 2003; Luz, 2005; Souza & Luz, 2009). Momento em que uma juventude revolucionária buscava novas soluções terapêuticas como forma de terapias e como símbolos de revolução, orientando-se principalmente a partir de filosofias orientais (Luz, 2005; Souza & Luz, 2009).

Esses modelos de saúde distintos da racionalidade médica ocidental foram iniciados nos EUA e na Europa a partir dos anos 1960 e prolongados nos anos 1970, sendo que, principalmente na década de 1980, atingiram os países latino-americanos (Luz, 2005). Na década de 1990, a terapêutica alternativa denominada comumente de "nova era" alcançou visibilidade social, as práticas oraculares foram redefinidas terapeuticamente e surgiram várias técnicas propriamente ditas. Também havia a oferta de práticas, técnicas, vivências e cursos de formação, além de uma consolidação de várias redes de afinidades pessoais e grupais, o que delineou um complexo mercado em suas relações com campos do conhecimento terapêutico oficial e do conhecimento tradicional não-oficial (Tavares, 2003).

Tal complexidade atingiu de forma intensa também a área psicológica, de modo que o Conselho Federal de Psicologia (CFP) travou uma luta por anos com as terapias alternativas - devido ao expansivo interesse de psicólogos por tais práticas -, luta esta que teve diferentes fases em relação à postura do Conselho Federal de Psicologia: no começo dos anos 1990, uma postura denunciativa das técnicas alternativas como não-científicas, como se elas fossem uma questão externa à psicologia; depois, em 1993, adotou-se uma postura proibitiva da utilização de tais técnicas, já reconhecendo a questão como algo interno do campo da psicologia; e, em 1997, a postura utilizada foi a de regulamentação dessas técnicas holísticas para além das fronteiras do psicológico, sendo que, para fins de pesquisa, era lícito aos psicólogos se utilizar delas (Tavares, 2003). Esta regulamentação consta atualmente no Código de Ética Profissional dos Psicólogos, no qual o Conselho Federal de Psicologia (2000) afirma que, no tocante às responsabilidades do psicólogo, no Artigo 2º, é vedado ao psicólogo "prestar serviços ou vincular o título de psicólogo a serviços de atendimento psicológico cujos procedimentos, técnicas e meios não estejam regulamentados ou reconhecidos pela profissão", proibindo categoricamente a utilização das terapias holísticas não reconhecidas pela psicologia por parte dos psicólogos.

O crescimento do interesse por terapias holísticas se apresenta de tal forma que já em 1997 afirmava-se que:

(...) o número de pessoas que praticam terapias ditas alternativas e de 'centros de terapias alternativas' é consideravelmente grande, e tende a aumentar, bem como suas clientelas. [...] Em Cursos de Psicologia encontram-se muitos estudantes que são admiradores destas terapias, alguns que já são praticantes e outros que pretendem dedicar-se a essas atividades. Um indicativo desta tendência é o grande número de cartazes anunciando cursos, encontros e serviços nos corredores de nossas universidades, próximo aos cursos de psicologia (Gauer & cols., 1997, p. 21).

Em 2004, o SINTE - Sindicato dos Terapeutas - apresentou uma estatística segundo a qual, naquele ano, o Brasil contava com cerca de 150 mil profissionais atuantes na terapia holística. Além disso, no exterior também há uma crescente demanda para esse tipo de profissional, pois nos EUA, em 2004, o número de consultas com terapeutas holísticos foi 30% maior do que as com profissionais da área de medicina (Vieira Filho, 2004).

Este aspecto de interesse pela terapia holística é intensamente presente no campo da psicologia, onde existe entre a formação científica e uma visão integral de homem uma forte tensão prática e epistemológica. Deste modo, o presente estudo tem como objetivo pesquisar os motivos pelos quais alguns profissionais que realizam a formação em psicologia - área científica e institucionalizada, decidem seguir o caminho profissional como terapeutas holísticos - área alternativa e não-científica. São investigados os significados atribuídos por estes profissionais para a psicologia e para a terapia holística, levando-se em consideração as suas trajetórias dentro das duas áreas e o que os levou a procurar a terapia holística. Assim, o campo central dessa pesquisa corresponde às subjetividades de tais profissionais, ao invés de seguir o enfoque objetivo em relação à eficácia das técnicas alternativas - preocupação maior de vários estudos.

 

1. Método

A metodologia utilizada foi a qualitativa, sendo utilizada a análise psicológica fenomenológica de entrevistas semi-estruturadas, tendo como referência o modelo proposto por Rubin & Rubin (1998) - semelhante ao proposto por Giorgi (Kude, 1997) -, por se prestar à análise especialmente de entrevistas qualitativas, explorando o conteúdo psicológico destas, com cinco participantes escolhidos por conveniência. Estes são necessariamente terapeutas holísticos - podendo usar as mais variadas técnicas incluídas nessa categoria; graduados em Psicologia, sendo que o tempo mínimo necessário de atuação como terapeuta holístico é de cinco meses, atuando conjuntamente como psicólogos clínicos e inscritos no Conselho Regional de Psicologia da 8ª Região (CRP-08), correspondente ao Paraná.

Os participantes possuem idade entre 29 e 46 anos (média de 38,6 anos), sendo 3 homens e 2 mulheres, graduaram-se em psicologia de 2 a 25 anos (média de 9,2 anos), estudam terapia holística de 8 meses a 20 anos (média de 8,3 anos) e atuam como terapeuta holístico de 5 meses a 5,5 anos (média de 2,2 anos). Eles relataram adotar as seguintes linhas teóricas: Gestalt-terapia, Psicologia Transpessoal, Psicologia Analítica e Psicologia Corporal com 2 participantes. Também narraram que adotam as seguintes práticas holísticas: Florais de Bach, Massoterapia, Xamanismo, Ayurveda e Yogaterapia, com um participante adotando 2 práticas holisticas e outro 3 práticas.

As entrevistas realizadas com os sujeitos da pesquisa - T1 a T5 - duraram cerca de 45 minutos cada, sendo que foi realizada somente uma entrevista semi-estruturada com cada participante no local de trabalho deste, na cidade de Curitiba. Estas entrevistas foram todas gravadas e transcritas integralmente para posterior análise realizada em quatro etapas: (1) Apreensão do sentido do todo das entrevistas; (2) Discriminação de unidades manipuláveis de significado; (3) Transformação em linguagem psicológica das expressões do sujeito; (4) Síntese coerente das unidades de significado transformadas (Kude, 1997; Rubin & Rubin, 1998). Ainda foi feita uma triangulação entre os dados obtidos nas entrevistas e as informações contidas em sites de Internet referentes às terapias holísticas.

 

2. A Relação entre Terapia Holística e Psicologia

2.1 Complementariedade e Integração

Levando em consideração que todos os entrevistados trabalham tanto com a Psicologia quanto com a terapia holística no mesmo consultório, unindo ambas, podemos nos perguntar como seria feita essa união de práticas, a princípio, bastante diferentes. Quanto a isso, todos os terapeutas entrevistados afirmaram que ocorre uma forte complementaridade entre ambos os tipos de práticas - a holística e a psicoterapêutica - porque elas se fundamentam principalmente nas suas crenças, nos seus pressupostos pessoais. Assim, eles acabam por absorver de ambas as práticas terapêuticas o que consideram útil para o seu exercício profissional, havendo uma adequação dessas diferentes terapias a partir da cosmovisão dos participantes. Tal adequação é vista como necessária por esses terapeutas de tal modo que eles chegam a considerar que utilizar apenas uma das formas de terapia, por mais que seja um sistema completo por si só, é insuficiente.

Com essa complementaridade e a utilização concomitante de ambos os tipos de terapia, há uma soma significativa na prática terapêutica na visão dos terapeutas entrevistados, seja pela aceleração do processo terapêutico ou pelo aumento de recursos para o exercício profissional. Podemos perceber isso claramente nas palavras de T2, que afirmou que

(...) a [terapia] reichiana trabalha muito nesse desbloqueio e a massoterapia ajuda nesse desbloqueio. Então ela acaba catalisando isso. Acaba sendo um processo mais rápido até. Então isso que eu vejo, a complementaridade" (T2).

Além disso, como o ser humano é sempre percebido como integral e complexo por esses terapeutas, há ainda a consideração de que não é apenas uma única teoria ou sistema que irá conseguir abordar em sua totalidade o ser humano, sendo muito útil uma flexibilidade no trato terapêutico dos mais variados tipos de clientes e suas demandas.

2.2 O Fundamento da "Energia"

A partir disso, surge o questionamento de como pode haver uma complementaridade entre uma prática não reconhecida cientificamente - como as práticas holísticas em geral - e uma prática reconhecida cientificamente (como a psicologia), sendo que, a princípio, ambas aparentam ter uma distância epistemológica muito grande. De forma geral, é enfática a observação de todos os entrevistados de que, de acordo com suas visões de mundo, existe uma fortíssima semelhança paradigmática entre os diferentes sistemas terapêuticos por eles usados, sendo que, para os sujeitos, os pressupostos das terapias holísticas e psicológicas por eles utilizadas confluem e ambos os sistemas possuem o conceito de energia como fundamento primeiro, de tal forma que as dimensões humanas psicológica e energética se encontram fortemente entrelaçadas. Tal convergência de pressupostos está bem ilustrada na concepção e nas palavras de T1, quando esta está explanando sobre os florais de Bach:

Ele trabalha no campo energético da pessoa, e eu por mais que haja uma distinção dita falada aí, eu vejo que a terapia também faz isso, só que a terapia faz de um jeito, vem no consultório, é falado, mas também existe uma coisa de trabalhar a energia da pessoa, porque eu vejo que quando o paciente vem, se encontra com o terapeuta, também é trabalhado a energia dele, porque se você for a um terapeuta que você chegue lá e não dizem assim: "não deu química", você não volta mais e vai embora, isso acontece quando não há um "entre" legal que a gente fala na Gestalt. [...] Eu acho que se você buscar [a concepção de energia] declaradamente na literatura [gestaltista] você não encontra assim, mas de uma outra forma é isso que está entendido ali. Eu pelo menos entendo assim (T1).

2.3 Mudança de Paradigma

Essa questão mostra que, para os entrevistados, as fronteiras entre o que é reconhecido socialmente como científico e o que não é se mostram extremamente tênues e até irrelevantes, o que será mais bem explorado mais adiante. Além disso, os participantes também informaram que, para que eles possam confiar ou não em alguma técnica terapêutica, é fundamental experimentá-las pessoalmente e tirar as conclusões por conta própria, sendo que o reconhecimento científico de tal técnica não é considerado de suma importância, ao contrário do posicionamento do Conselho Federal de Psicologia (2000).

Também referente aos questionamentos por parte dos sujeitos referentes à ciência temos que todos os participantes apresentaram percepções de mudanças dentro da ciência brasileira oficial em geral - inclusive da psicológica -, dando a entender que não são apenas eles, mas também várias outras pessoas realizam as mesmas indagações em relação à ciência atual. Os terapeutas entrevistados relataram perceber também mudanças na aceitação e conscientização, por parte da população, de um lado considerado não científico - como a dimensão energética, fundamental nas terapias holísticas. Segundo alguns dos participantes, na ciência, atualmente, há uma gradativa e lenta abertura para conhecer as práticas holísticas, através de pesquisas e trabalhos universitários, sendo que, mais adiante, o paradigma científico materialista deve ser superado por um espiritualista. Nas palavras de T1,

(...) algumas coisas irão acontecer e, na hora que acontecer, muitas coisas irão ficar liberadas (T1).

Essas mesmas transformações percebidas pelos participantes são descritas por Capra (1980) que afirmava estar ocorrendo uma mudança paradigmática da visão mecanicista cartesiana e newtoniana para uma visão holística, espiritualista e ecológica - "semelhante às visões dos místicos de todas as épocas e tradições", sendo esta visão holística referente a "uma compreensão da realidade em função de totalidades integradas cujas propriedades não podem ser reduzidas a unidades menores" (Capra, 1980, p. 9).

Tal transformação se faz necessária devido aos seus efeitos também no campo da saúde, pois, com o atual modelo mecanicista cartesiano, há um sério prejuízo da saúde individual e social (Capra, 1980), com o que os terapeutas entrevistados parecem concordar, devido à sua busca por um modelo teórico basal diferente para atuação na área da saúde. Além disso, quase todos os sujeitos entrevistados relataram perceber que uma aceitação de um novo paradigma está ocorrendo lenta e gradativamente pelos cientistas e pela sociedade como um todo.

Outro fator importante a ser acrescentado referente às relações epistemológicas entre a Psicologia e a Terapia Holística na percepção dos entrevistados - abordadas anteriormente - é a influência da visão holística na formação de psicologia dos participantes, que pode suscitar o questionamento de até que ponto tal influência não restringiu a formação e não permitiu uma maior abertura para se conhecer mais profundamente as visões de homem de outras correntes psicológicas - apesar das correntes por eles escolhidas já serem reconhecidas como científicas. Sobre esse tópico, todos os participantes se consideram explicitamente abertos - desde antes de se tornarem psicólogos - a conhecer as diferentes visões de homem defendidas pelas diferentes escolas teóricas psicológicas, absorvendo os conhecimentos que julgam ser úteis e práticos de cada uma dessas correntes. Dessa forma, com essa visão mais prática, incorrem em um ecletismo e relativismo epistemológico.

2.4 Especificidade da Terapia Holística: Efetividade e Ser Humano Integral

Sabemos até então como os participantes vêem como intensamente ligadas e complementares entre si as suas práticas holísticas e psicológicas, mas é importante também trazer à luz o que esses terapeutas consideram como únicos das suas práticas holísticas e as contribuições que somente elas trazem às suas terapias. Todos os terapeutas entrevistados relataram que as suas práticas holísticas propiciam a possibilidade de um exercício profissional mais eficaz, seja pela técnica em si ou pelo extenso arcabouço teórico que proporciona um melhor entendimento sobre o ser humano. Como exemplo, temos a percepção de T3, segundo o qual o grande beneficio da sua prática holística - o Xamanismo - consiste em que:

ele tenta resgatar uma coisa não cartesiana, que é um contato assim que não se comprova, não tem lógica, é algo que não parte da razão, parte da experiência pura, seria uma espécie de empirismo, você perceber sem utilizar recursos intelectuais, por exemplo. E a psicologia, ela se fixa hoje em dia nos recursos intelectuais, das comprovações, da repetição, os resultados repetidos (T3).

Além disso, percebe-se que, para esses terapeutas, a terapia holística possui um grande valor ao visar outras facetas do ser humano, abordando de maneira mais efetiva a totalidade do ser humano.

Muito foi falado pela maioria dos entrevistados sobre energia, sobre como se trabalha com a energia dos pacientes em consultório e sobre como esse conceito de energia embasa tanto as suas práticas holísticas quanto as suas práticas psicológicas. Por isso, esses terapeutas que citaram essa energia foram questionados sobre o que seria ela, sobre como pode ser definida, ao que responderam que a energia está estreitamente relacionada à idéia de vitalidade, mas que permeia tudo, está no ar, é invisível e até espiritual - dimensão que, segundo T3, vai além da racionalidade e tridimensionalidade e é ligada à totalidade e essência das coisas.

O conceito de energia é próximo da discussão realizada por Jung (1928/2002) sobre a mana, que não seria bem um conceito abstrato, mas uma representação no estágio concretista preliminar da idéia abstrata que tem como base a percepção da relação dos fenômenos e as experiências com estes.

É nítida a semelhança entre as características de mana apresentadas por Jung (1928/2002) e Malinowski (1948/1984) e as características da energia relatadas pelos participantes, como, por exemplo, a energia ligar-se às pessoas e coisas, ser uma força não física que se mostra na força física em algum poder ou qualidade de um indivíduo - T5 e T1 citaram um possível contágio no contato com a energia das pessoas, além da energia ser invisível - e poder ela ser conduzida a qualquer lugar e não estar fixada em algum lugar, isto é, "estar no ar" - nas palavras de T5. Além disso, é importante observar que há semelhança também entre a base das práticas holísticas e das práticas mágicas, tendo ambas como pedra angular o conceito de energia.

2.5 Contribuições da Psicologia para a Terapia Holística

Apesar de recorrerem às suas respectivas práticas holísticas para o exercício terapêutico, os terapeutas entrevistados se utilizam também da psicologia, pois esta oferece algumas contribuições únicas para as suas práticas profissionais. De uma maneira geral, os participantes concebem um importante papel da psicologia nas suas práticas devido aos conhecimentos específicos restritos a essa área que possibilitam uma intervenção mais significativa. Tais conhecimentos são tidos como valiosos, por serem parte de um embasamento teórico acadêmico sólido e por ofertarem uma visão de facetas do ser humano não vislumbradas pelas práticas holísticas, como, por exemplo, certos conhecimentos específicos acerca do inconsciente. Como exemplo de contribuição específica da Psicologia para a sua prática, T4 citou o seguinte:

Eu te digo isso porque a cultura do oriente é mais um pouco, ela é mais disciplinada. Por exemplo, o Yoga é uma prática extremamente disciplinada. E a gente vê que às vezes essa tendência de ser muito disciplinada pode levar a um nível de rigidez psicológico, coisa que autores como Lowen, Reich conseguiram olhar exatamente o oposto, essa coisa de não ser inflexível, de conseguir ter essa flexibilidade, que às vezes a gente não encontra muito no oriental. Se você for ver na cultura japonesa, por exemplo, mostra muito isso, essa rigidez dos valores, de não ter uma flexibilidade maior (T4).

Além disso, de acordo com os entrevistados, a formação acadêmica em Psicologia proporciona uma melhor preparação para a construção de uma relação profissional com os clientes - pois há, por exemplo, o ensino de como cobrar os honorários do cliente, como deve transcorrer aproximadamente uma sessão terapêutica e como lidar com certas questões em terapia, como a transferência -, além de um título acadêmico com o qual se obtém reconhecimento social e maior credibilidade junto aos clientes.

2.6 A "Missão" do Terapeuta

Para compreender as escolhas e significações dos entrevistados, podemos também recorrer às suas histórias tecidas enquanto terapeutas, vislumbrar seus caminhos tomados no decorrer de suas vidas e entrar em contato de uma forma um pouco mais ampla com suas dimensões subjetivas. Ao abordar suas histórias e trajetórias enquanto terapeutas, todos os participantes declararam que já possuíam uma forte influência da visão holística desde mesmo antes de se formar em Psicologia, como podemos observar nas palavras de T2:

Diferentemente de muitas pessoas que vieram para a faculdade, quando eu entrei na faculdade de psicologia, eu já sabia exatamente para onde que eu ia, tanto que o primeiro curso de massoterapia eu fiz antes de começar a faculdade de psicologia (T2).

Em alguns casos, se percebe uma procura por esse lado tido como espiritual desde até mesmo a infância, segundo relatos dos entrevistados, como num tipo de busca espiritual, sendo que a prática profissional pode ser interpretada como uma espécie de "missão" ou "chamado espiritual". T3 declarou explicitamente estar numa busca espiritual há muito tempo, desde a infância, e, pela citação do lado espiritual e esotérico por parte dos outros entrevistados, pode-se inferir que estes também se consideram no cumprimento de uma "missão espiritual".

Dessa forma, como a visão holística se encaixa muito bem com uma visão espiritualista, pode-se inferir que, ao atender a um "chamado espiritual" de cuidar dos seus próximos, esses terapeutas recorreram ao que mais se aproxima das suas visões espiritualistas de mundo e que embasa práticas terapêuticas - a visão holística - para poder cumprir a sua "missão espiritual". Além disso, seguindo essa inferência, pode-se interpretar que também houve a busca dos participantes pela psicologia devido ao seu reconhecimento social como ciência através da qual se cuida e ajuda os outros seres humanos, trazendo assim tanto aprovação social quanto conhecimentos teóricos fortemente embasados para que a "missão" de ajudar aos seus próximos possa ser concretizada. Assim, não apenas a psicologia, mas também a terapia holística se torna um meio para que esses terapeutas possam atender aos seus "chamados espirituais" e cumprir suas "missões". Tal inferência compõe um interessante assunto para que se possa iniciar uma nova pesquisa ou realizar um aprofundamento nesse tema, trazendo maior clareza acerca das significações dos terapeutas holísticos graduados em Psicologia.

2.7 Tensão entre a Psicologia e a Terapia Holística

Um dos tópicos importantes explorados junto aos sujeitos é o fato deles atuarem como psicólogos e terapeutas holísticos no mesmo consultório e, portanto, infringirem as regras do CFP, o que pode resultar em processo ético no âmbito dele. Isto devido ao artigo 2º do Código de Ética Profissional dos Psicólogos (CFP, 2000); possibilidade da qual todos os participantes estão cientes. A postura destes em relação a essa questão denota uma nítida oposição frente à regulamentação profissional de Psicologia, pois, além da maioria não temer qualquer sanção vinda do órgão regulamentador, todos discordam explicitamente do Código de Ética Profissional dos Psicólogos ao afirmar que, apesar de estarem incorrendo em uma postura profissional "ilegal", estão agindo eticamente junto aos seus clientes.

Os entrevistados se posicionam, assim, vinculados profissionalmente ao órgão regulamentador (os Conselhos Regionais de Psicologia) e à psicologia, e independentes em relação ao Código de Ética Profissional dos Psicólogos, utilizando somente o que lhes convém da profissão de psicólogo, como a imagem com reconhecimento social e credibilidade ligada a tal ocupação.

Na realidade, interpreta-se que os entrevistados desenvolvem uma ética pessoal em suas práticas terapêuticas profissionais. Segundo um dos informantes, pode-se agir contra as regras do CRP e ao mesmo tempo agir eticamente, o que traz à luz certos questionamentos relativos à ética dentro do exercício da profissão de psicólogo por parte dos entrevistados, denotando que eles operam em suas práticas, com uma ética pessoal em oposição ao Código de Ética Profissional dos Psicólogos.

De um modo geral, os entrevistados questionam enfaticamente os critérios adotados pelo Código de Ética Profissional dos Psicólogos para considerar se um determinado profissional está agindo eticamente ou não. Os entrevistam relatam que adotam uma ética pessoal completamente independente do órgão regulamentador da profissão de psicologia e utilizando seus próprios meios, experiências e conceitos para definir o que é ético ou não. São sugeridas pelos participantes idéias de que, se a prática terapêutica está apenas ajudando, e também de que, caso o terapeuta explicite para o cliente que ele está utilizando tanto a Psicologia quanto a Terapia Holística e qual destes sistemas teóricos é reconhecido cientificamente, tal exercício profissional terapêutico não deveria ser considerado aético. Foi afirmado ainda pelos sujeitos que, com o atual Código de Ética Profissional dos Psicólogos, práticas que realmente prejudicam os clientes são consideradas éticas e práticas que apenas beneficiam os clientes são vistas como aéticas, pois afinal - nas suas concepções -, ser ético é diferente de seguir à risca as regras do órgão regulamentador.

Além disso, segundo os informantes, o questionamento do Código de Ética Profissional dos Psicólogos também está presente na própria atitude de alguns psicólogos que não trabalham com terapia holística e que acabam por não denunciar psicólogos conhecidos que trabalham com terapia holística. Por fim, todo esse questionamento referente à ética no exercício profissional dos psicólogos leva inevitavelmente ao questionamento da psicologia enquanto ciência e dos próprios padrões científicos por parte dos terapeutas entrevistados. Esse questionamento da psicologia científica está vinculado a uma percepção de rigidez do órgão regulamentador de psicologia por parte dos participantes, o que os leva a seguir uma ética que julgam ser mais adequada para seu exercício profissional, uma ética pessoal independente e que contraria o Código de Ética Profissional dos Psicólogos.

No que tange à Psicologia enquanto ciência, os sujeitos entrevistados posicionaram-se como verdadeiros questionadores quanto ao que é científico e o que não é científico, de tal forma que os limites entre ambas as categorias são fragilizados. Essa fragilidade, nas suas perspectivas, se deve também à idéia de que aquilo que é científico é dependente da concepção de mundo subjacente à pesquisa que validou o objeto de estudo como científico. Dessa forma, de acordo com os sujeitos, enquanto a visão de mundo que sustenta a ciência for mudando, a cientificidade de determinadas técnicas, por exemplo, também irá sendo alterada. Tal concepção pode ser observada no seguinte trecho da entrevista com T1:

Então tem pessoas que já têm um conhecimento, já conseguem ver a comprovação de uma holística e tem alguns que não. Assim como, apesar de que uma psicologia é uma ciência, tem muita gente que, mesmo ela sendo ciência, não acredita (T1).

Além disso, a própria cientificidade da psicologia é questionada pelos entrevistados, considerando que ela é permeada por processos não concretos e não palpáveis e portadora de técnicas de difícil validação científica. Porém, mesmo assim, os terapeutas participantes percebem a eficácia de tais técnicas, trazendo a perspectiva de que nem tudo que é eficaz é passível de validação pelo atual modelo científico. Segundo um dos sujeitos, isso também pode ser visto na própria atitude de psicólogos que buscam ajuda em âmbitos não científicos, demonstrando crer em algo além do que a própria ciência alega existir. É também questionada pelos participantes a ciência em função da alta preocupação dos cientistas com a imagem desta, o que resulta em uma falta de abertura àquilo que não se encaixa perfeitamente nos moldes científicos. Podemos observar esse questionamento da ciência em si e da psicologia enquanto ciência claramente na seguinte declaração de T1:

Assim como tem outras coisas que eu vejo que ajudam as pessoas e que tem algo que regulamenta e falam que aquilo não é possível, até o momento em que alguém fala que floral pode ser usado por médicos. Daí tudo bem. Eu acho que querem deixar uma coisa com um ar tão de profissional, científico, cuidando para não fugir para um lado esotérico, místico e tem muita coisa que tá liberada para qualquer psicólogo fazer e qual é a comprovação científica? Eu tenho um paciente, trabalhamos através da palavra e isso surte um efeito (T1).

Ainda temos que, segundo alguns dos terapeutas entrevistados, a ciência é altamente relativa em relação ao seu local de origem e sua cultura, sendo que a comprovação de algo como eficaz e verdadeiro é altamente pessoal e dependente da visão de mundo de quem experiencia. Há críticas por parte de alguns dos entrevistados também em relação aos critérios e ao modo de proceder científicos, pois a ciência tende a fragmentar seu objeto de estudo, ao invés de respeitar o seu todo, além de se prender a um reducionismo materialista e racional. Além disso, para os sujeitos, a harmonização do ser humano deveria ser tida como prova suficiente para validação científica.

É interessante observar que a concepção do modelo científico vigente que os terapeutas entrevistados trazem é a de uma ciência positivista, possuidora de um caráter preciso, rigoroso e objetivante, onde "interesses e paixões não podem entrar como elemento de perturbação no conhecimento" (Löwy, citado por Da Silva & Polenz, 2002, p. 400).

 

Considerações Finais

Observando um posicionamento crítico e até de insatisfação com uma limitação do campo da ciência psicológica - e inclusive da ciência de um modo geral - por parte dos sujeitos da presente pesquisa, percebemos que eles buscaram uma ampliação de suas ferramentas e também de suas concepções de mundo e de homem junto às terapias holísticas, as quais exploram a experiência humana de uma maneira diferente - uma maneira que tenta tratar o ser humano em sua totalidade recorrendo à operacionalização do conceito de energia.

Apesar das críticas que alguns dos participantes teceram em relação à psicologia, todos demonstraram unanimemente a importância que conferem a esta, buscando usufruir dos benefícios possíveis da aplicação das ferramentas psicológicas em conjunto com os instrumentos e teorias oriundos das práticas holísticas. Dessa forma, há uma ampliação das intervenções terapêuticas e das formas possíveis de encarar uma mesma questão em terapia por parte dos entrevistados, o que, segundo estes, somente beneficia seus pacientes e seu exercício profissional. Entretanto, apresenta-se uma concepção específica de ciência e de conhecimento, com elementos não passíveis de verificação ou de experimentação.

Como os participantes relatam haver benefícios e uma terapia mais bem-sucedida e há uma grande demanda e busca por estas práticas tradicionais entre os próprios profissionais de psicologia, torna-se um tanto improdutivo simplesmente qualificar as terapias holísticas de charlatanismo sem se abrir para as diferentes experiências obtidas pelos inúmeros indivíduos que recorreram e recorrem a estas práticas mais espiritualizadas e aos seus possíveis significados. Se as terapias holísticas se mantiveram com força no mercado no decorrer do tempo e têm uma demanda cada vez maior, o mínimo que psicólogos e cientistas deveriam fazer é se perguntar sobre o sentido e significado disto e conhecer as diferentes vivências experienciadas pelas pessoas, bem como as várias formas de encarar um mesmo fenômeno, ao invés de recusar o fenômeno ou negar o mesmo.

Considerando que todo e qualquer conhecimento, inclusive o científico, nunca prescinde de uma visão de mundo com seus pressupostos, pode-se traçar com maior nitidez os limites dentro de diferentes áreas do conhecimento e de atuação tendo como ponto de partida também os pressupostos filosóficos que embasam determinadas práticas. Dessa forma, se é possível vislumbrar com maior facilidade a questão da ciência não através do binômio verdadeiro ou falso, mas sim das diferentes epistemologias, que, como não podem ser comprovadas como reais ou não, mas como práticas sociais e humanas que possuem um significado e sentido pelos sujeitos que as exercem.

Os significados atribuídos à psicologia e à terapia holística para os terapeutas holísticos graduados em psicologia levantados nesse trabalho apontam, segundo estes, para a existência de uma complementaridade e uma integração entre a Psicologia e as terapias holísticas; bem como para uma crítica à ciência tradicional e, consequentemente, à psicologia e ao modelo vigente de saúde. Dentro de sua prática relatam que procuram atender ao ser humano integral, colocando a necessidade da mudança de paradigma na prática clínica e na ciência. Para isso, um dos meios é recorrer a um conceito amplo de "energia" como fundamento e substrato de várias práticas e a situar o seu trabalho dentro de um caráter individual e de uma trajetória individual, quase como uma "missão". Estas características parecem indicar o retorno a uma visão de mundo de caráter mitológica ou mítica, ligada à vivência, com uma narrativa que atribui um sentido totalizante, unificado e global à realidade.

A verdade e a efetividade do saber também possuem esta característica de ser vinculada à experiência própria do sujeito gerando, por conseqüência, uma ética ou código de conduta particular e individual, à margem da regulamentação profissional em Psicologia. É importante salientar que, apesar de reconhecerem a importância da psicologia, a prática e sua identidade como terapeuta holístico apresenta-se como mais fundamental e importante que a de psicólogo. Isto traz reflexões sobre as limitações da ciência psicológica em responder ou atender às demandas dos sujeitos no atual contexto social e cultural, das limitações do paradigma de saúde vigente neste contexto e das trajetórias, formas e experimentos que os indivíduos fazem para superar essas limitações e atender às suas demandas, fazendo parte de um fenômeno mais amplo onde os discursos terapêutico, científico e religioso se superpõem e se misturam de diferentes maneiras.

 

Referências

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Recebido em 02.08.11
Primeira Decisão Editorial 12.12.11
Aceito em 14.04.12

 

 

1 "Hospital adota terapia alternativa para ajudar a tratar câncer" (C.Colluci, 2008). Folha de São Paulo, São Paulo. Retirado em 05 de outubro de 2010, de http://www1.folha.uol.com.br/folha/dimenstein/cbn/capital_300608.shtml