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Pesquisas e Práticas Psicossociais

versão On-line ISSN 1809-8908

Pesqui. prát. psicossociais vol.11 no.1 São João del-Rei jan./abr. 2016

 

PesquisarCOM: efeitos de uma oficina de experimentação corporal com pessoas cegas e com baixa visão

 

ResearchCom:effects of a body experimentation workshop with visually disabled and blind people

 

InverstigarCON: efectos de un taller de experimentación corporal con personas ciegas y con baja visión

 

 

Marcia Oliveira MoraesI; Alexandra Justino SimbineII; Beatriz Pizarro dos Santos LopesIII; Carolina Sarzeda Reis CoutoIV; Dandara Chiara Ribeiro TrebisacceV; Gabrielle Freitas ChavesVI; Juliana Pires Cecchetti VazVII; Larissa Ribeiro MignonVIII; Lia Paiva PaulaIX; Luana de Assis GarciaX; Raffaela Petrini de OliveiraXI; Thais Amorim SilvaXII

IProfessora Titular do Instituto de Psicologia da Universidade Federal Fluminense. Doutora em Psicologia Clínica pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Financiamento de pesquisa: Faperj, Cnpq
IIMestranda em Psicologia na Universidade Federal Fluminense. Bolsista pelo programa CNPq PEC/PG. Docente no curso de Psicologia da Universidade Eduardo Mondlane, Maputo/Moçambique
IIIGraduanda em Dança pela Universidade Federal do Rio de Janeiro
IVGraduanda em Psicologia pela Universidade Federal Fluminense
VGraduanda em Psicologia pela Universidade Federal Fluminense. Bolsista Jovens Talentos. Iniciação Científica / Capes
VIGraduada em Psicologia pela Universidade Federal Fluminense. Mestranda em Psicologia pela Universidade Federal Fluminense. Bolsista Capes
VIIGraduanda em Psicologia pela Universidade Federal Fluminense. Bolsista de Extensão. UFF/Proex
VIIIGraduanda em Psicologia pela Universidade Federal Fluminense. Bolsista de Extensão. UFF/
IXGraduanda em Psicologia pela Universidade Federal Fluminense. Bolsista de iniciação científica. CNPq
XGraduanda em Dança pela Universidade Federal do Rio de Janeiro
XIGraduanda em Psicologia pela Universidade Federal Fluminense. Bolsista de iniciação científica. Faperj
XIIGraduanda em Psicologia pela Universidade Federal Fluminense. Bolsista de iniciação científica. CNPq

 

 


RESUMO

A pesquisa Perceber sem Ver realiza-se no Instituto Benjamin Constant (IBC) e conta com um dispositivo-intervenção, as Oficinas de Experimentação Corporal, oferecidas às pessoas cegas e com baixa visão. Nas oficinas, exploramos o encontro entre corpos-músicas-bexigas-sons e investigamos aquilo que o corpo pode vir a criar. Definimos corpo como corporeidade, existência que se realiza na prática de experimentar-se. A perda da visão exige uma (re)elaboração da relação entre cada corpo singular e o mundo. Perguntamos: quais os efeitos de uma oficina de experimentação corporal com pessoas cegas e com baixa visão? Lançando mão do método pesquisarCOM, afirmamos que o trabalho corporal coloca em cena um eu-corpo sabido de si mesmo, que no caminho de experimentar-se, apreende de si e partilha essas descobertas em conjunto. O corporeisar-se, dado nas oficinas, passa corporeisar a cegueira, passa também pelo corporeisar nossos próprios corpos de pesquisadoras, nossos próprios referenciais visuocêntricos.

Palavras-chave: Corporeidade; PesquisarCOM; Deficiência Visual.


ABSTRACT

The research Perceive without Seeing is conducted at the Benjamin Constant Institute (IBC) and offers intervention-devices, Body Experimentation Workshops, offered to visually disabled and blind people. During the workshops we explore the meeting of bodies-music-balloons-sounds and we investigate what the body can be able to create. We define body as corporeity, an existence that takes place in the practice of trying oneself out. The loss of vision demands a (re)elaboration of the relation between each singular body and the world. We ask: what are the effects of a body experimentation workshop with visually disabled and blind people? Making use of the research With method, we affirm that the corporal work sets into scene an I-body known by oneself, which in the path of self-experiencing, learns about oneself and shares these discoveries in group. The self-embodying, experiencied at the workshops, begins to embody blindness, and also embodies our own researcher bodies, our own visually centred benchmarks.

Key words: Embodiment; Research With, Visual Disability.


RESUMEN

El grupo de investigación Percibir sin Ver se realiza en el Instituto Benjamim Constant (IBC) y cuenta con un dispositivo-intervención, les talleres de Experimentación, ofrecidas a las personas ciegas y con baja visión. En les talleres, exploramos el encuentro entre cuerpo-musicas-globos-sonidos y investigamos aquello que se podría el cuerpo llegar a crear. Definimos cuerpo como corporeidad, existencia que se realiza en la práctica de experimentarse. La perda de la visión exige uma (re)elaboración de la relación entre cada cuerpo singular y el mundo. Preguntamos:¿cuales los efectos de una oficina de experimentación corporal con personas ciegas y con baja visión? Lanzando mano del método investigarCON, afirmamos que el trabajo corporal pone en escena un yo-cuerpo sabido de sí mismo, que en el camino de experimentarse, aprehende de sí y comparte esos descubrimientos en conjunto. El corporeisar dado en los talleres pasa pelo corporeisar la ceguera, pasa también pelo corporeisar nuestro propio cuerpo de investigadoras, nuestros propios puntos de referencia visuocêntricos.

Palabras clave : Corporeidad; InvestigarCON; Discapacidad Visual.


 

 

Introdução

A pesquisa Perceber sem Ver1 é realizada no Instituto Benjamin Constant (IBC)2, através de uma parceria com a Universidade Federal Fluminense (UFF). Dentre outras atividades, contamos com um dispositivo-intervenção, as Oficinas de Experimentação Corporal, oferecidas a 20 pessoas cegas e com baixa visão, com idades entre 25 e 70 anos, que buscam o IBC para realizar atividades de reabilitação. Estes são momentos de encontro, que trazem à cena atividades com diferentes materiais e dinâmicas corporais. Buscamos explorar no encontro entre corpos-músicas-bexigas-sons..., aquilo que o corpo pode vir a criar. As oficinas oferecem um percurso de vivências relacionais utilizando estes materiais como forma de intermediação com o outro e de integração de um corpo que muitas vezes, em função da cegueira recém-adquirida, apresenta restrições de movimentos, dificuldades no andar e no equilíbrio.

Muitas vezes, o espaço da reabilitação institui que o cegar implica em uma perda de movimento, marcando-o como uma falta. Nós apostamos na reabilitação como um modo de experimentação que não tenha como ponto de partida a falta, mas a reconexão com o movimento que é próprio da vida e da sua auto-regulação. Nas oficinas, inúmeros outros projetos de corpo aparecem para além da cegueira. O corpo que envelhece, o corpo que cria, que padece de outras dores. São, portanto, todos esses diferentes corpos, e não somente o corpo com cegueira, que são ativados na oficina de expressão corporal, espaço de criação de novas possibilidades: de ampliar e alargar a harmonização do corpo e promover outras versões para além do ser cego (Barros, 2013). Entendendo este movimento como um processo que nunca é finalizado, as oficinas passam a respeitar a temporalidade do grupo e a necessidade de cada participante.

Apostamos assim nos devires3, nas invenções, nas versões articuladas a partir do movimento. Essa aposta dá passagem àquilo que traz sensação, que faz o corpo falar, que divide memórias e costura, no coletivo, novas histórias. Tomamos este corpo enquanto corporeidade, existência que se realiza apenas enquanto prática de experimentar-se. Sustentamos que cada corpo está constantemente recriando-se, redesenhando suas bordas, a partir de cada encontro, cada relação que estabelece consigo e o mundo. Trata-se, então, ao contrário de pensar o corpo como uma instância finalizadora, pensá-lo enquanto um viver-se, uma experiência de corporeisar-se (Elias, 2013). Corporeidade aqui é entendida enquanto corpo indiviso, que se dá como presença, ação. Um corpo que parte do primado da relação (Latour, 2007). Ou seja, que só é possível com o outro. Dessa maneira, o corpo é trabalhado nas oficinas buscando essa presença dinâmica que constrói redes e se articula no afeto. Assim, o movimento torna-se precursor da vida. Os participantes se movem em uma cadência singular e nós pesquisadoras somos parte desse ritmo, vivendo momentos de harmonia ou desarmonia com ele.

Por isso mesmo, os efeitos que surgem desse trabalho são sempre marcados pelo lugar de onde partem: daqueles que experimentam o mundo a partir da cegueira. A perda da visão, exige uma (re)elaboração da relação entre corpo e percepção e consequentemente, da relação entre cada corpo singular com o mundo. Agitadas, portanto, por esses processos diários de reinvenção, guiamos a escrita desse trabalho por um fio questionador: quais são os efeitos de uma oficina de experimentação corporal com pessoas cegas e de baixa visão?

A discussão desse fio questionador será feita a partir de extratos de diários de campo que redigimos durante a realização da pesquisa. Os diários de campo são escritos de memória, depois dos encontros que realizamos com as pessoas cegas e com baixa visão. São lidos e debatidos pelo grupo de pesquisa e são tomados não apenas como registros do que se passou, mas como o que força o pensar, como materialidade sobre a qual o grupo se debruça para levantar questões, planejar novas oficinas, seguir pistas que orientam os trabalhos seguintes. Ainda que o diário de campo seja escrito por uma de nós, a leitura e o debate coletivos, em roda, no grupo de pesquisa, adensam as histórias que naquele texto se tecem, abrem novos caminhos e levantam inquietações inéditas ao grupo. Desse modo, se o texto do diário de campo é redigido na primeira pessoa do singular, as consequências que dele tiramos são escritas na primeira pessoa do plural, nós, que assinamos em coautoria o presente artigo. Em última instância, se não separamos a escrita dos seus efeitos, afirmamos que a autoria dos diários de campo é coletiva, é tecida a muitas mãos, permeada dos afetos que pulsam no encontro com os reabilitandos e que reverberam no grupo, no coletivo de pesquisa. Para compor este texto, lemos e debatemos em grupo os diários de campo do período de 2013 a 2015. Os trechos que compõem este artigo foram escolhidos a partir da discussão do grupo, tendo como foco a questão norteadora desse trabalho. A fim de destacarmos os trechos dos diários de campo na tessitura do presente texto, eles serão apresentados em itálico, com recuo na margem esquerda, seguidos da indicação da data dos diários de campo, assinados como Pesquisa Perceber sem Ver. Parafraseando Rosa (1956), com o manejo que temos feito dos nossos diários de campo afirmamos que pensar é mutirão de muitos.

 

Histórias únicas4

Havíamos planejado a oficina do "Escravos de Jó" pensando em trabalhar os ritmos, a atenção, o coletivo com a roda. Essas palavras do planejamento eram as que reverberavam em minha cabeça enquanto nos dedicávamos à atividade. Elas se colocavam como interrogações durante todo tempo: tentava decifrar, no rosto de cada um que ali estava, se ritmo, atenção, coletivo se apresentavam de alguma forma. A oficina logo chegou a seu fim, anunciado pelas questões que colocávamos. "Como foi? O que acharam? O que trabalhamos hoje?" Algumas reticências em alguns rostos e achei que não partilharíamos muito naquele dia. De repente, Zeca - 48 anos, participante da oficina, cego há cinco anos - tomou a palavra e começou a falar sobre o que ele tinha achado do encontro. Falava o quanto havíamos trabalhado nos exercitando e quão bom era fazer isso. Doou-se, então, a nos explicar sobre o movimento. Zeca dizia:

"É bom se exercitar, se mexer. Porque a gente tem que se movimentar, isso nos faz mais vivos. A vida é movimento. O que está vivo se move. Mesmo quando a gente não está fazendo nada, quando a gente está parado, o nosso corpo, nossos órgãos, nosso sangue... tudo está circulando."

Prestávamos atenção e aprendíamos com ele. Nos contava sobre os sistemas circulatório, respiratório. Reafirmava que a vida é movimento.

"E a gente só para mesmo de se mover quando morre. Quando não mexer mais, pode ver que está morto. Mas enquanto vivo, tá se mexendo, tá circulando! Enquanto vivo, movimento!" (Diário de campo, Pesquisa Perceber sem Ver, 29 de maio de 2015).

Partimos da estranheza. Há um estranhamento que se faz presente na relação entre diferentes: o encontro não é óbvio nem prescrito. O espaço entre nós e eles é cheio de marcas únicas. As marcas em nossos corpos são e falam de lugares e experiências completamente distintas que não se encerram no ver e não ver (Moraes & Kastrup, 2010). Tal como a aproximação entre estrangeiros em um novo mundo, um desconhece a língua do outro. Um experimentou com seu corpo certos cantos do mundo, enquanto o outro habitava outros caminhos. O que os faz se engajarem em um encontro não é dado. Na oficina, espaço desse engajamento, a relação entre diferentes é artesanalmente performada. Artesanalmente, entre pesquisadoras e pesquisadoras, entre participantes e participantes, entre participantes e pesquisadoras, o espaço "entre" se transforma em um convergir.

Por isso, o trabalho com o corpo enquanto corporeidade traz como consequência uma pesquisa pessoal simultânea ao processo de viver-se. Experimentar-se é questionar-se também sobre o que é ser corpo. Isso quer dizer que corporeisar-se (Elias, 2013) é também estar no caminho colhendo pistas sobre essa experiência. É abrir-se para a pesquisa da experimentação/criação/atualização de ser. Assim, nas oficinas, nós com eles e eles conosco, caminhamos juntando pistas sobre a experiência de sermos corpo. Essa colheita das pistas não é exclusiva nossa. Se põe em prática em coletivo. Isso nos dá um novo sentido de pesquisarCOM (Moraes, 2010).

A partir do trabalho corporal, corporeisamo-nosCOM, descobrimos novas pistas e seguimos pesquisando, tecendo novas versões sobre o que é ser corpo. Somos seguidamente afetados por falas, gestos, toques, expressões que dizem respeito a esse tipo de saber sobre o corpo e que, repetidamente, desenham novas bordas ao corpo. Como já sublinhado nesse texto, afirmamos que o corpo se faz e se tece nos encontros. Desta feita, se dizemos que novas bordas do corpo são tecidas, são desenhadas, é justamente porque o que importa não é o que um corpo é, como se ele tivesse uma essência, mas o que ele pode, o que ele afirma como potência de afetar e ser afetado. A pesquisa COM, dessa maneira, aparece a partir da partilha de pesquisas que estão na memória do corpo de cada um que das oficinas participa. A pesquisa não aparece apenas na dimensão institucional e, nem tampouco, está somente em nossa atuação: faz parte de um movimento de descobrir, arranjar, criar, manejar, ensaiar os relevos presentes na experiência de ser corporeidade. E se faz COM tanto porque esta é uma direção ética do trabalho - o fazerCOM o outro a pesquisa e não SOBRE o outro -, mas também porque é em coletivo que os movimentos se tecem.

Assim, podemos dizer que suscitar o corpo como matéria de nosso trabalho faz com que surjam, para nós, questões que o levam em conta. As questões que nos atravessam como pesquisadoras, então, têm a ver com essas vivências, experiências e intensidades de nossos corpos em coletivo. Os efeitos desse trabalho corporal vêm sempre através do corpo. Corpo de Zeca, corpo de Carolina, corpo de Lia, corpo de Dulcineia, corpo de Biba, corpo de Pedro, corpos que formam o coletivo oficina-pesquisa.

A pele, esse extenso-intenso que temos a nosso contorno traz novas narrativas a cada nova oficina. Avaliamos que é porque a oficina, justamente, toma o corpo enquanto corporeidade que essas narrativas se produzem sempre dotadas de saber sobre o que é ser corpo. Isso porque o corpo de oficina produz uma abertura para fazer falar através das durezas do corpo-organismo, corpo-transeunte-de-um-mundo-duro. Trabalhar o corpo traz oportunidade para a partilha translateral, na medida em que nos atravessa todos de uma vez, de saberes sobre ele. Partilhamos novas e velhas descobertas, novas e velhas angústias, novas e velhas histórias sobre o que é ser um eu-corpo.

Por isso, o corporeisar-se, dado nas oficinas, passa sempre pelo viver e corporeisar a cegueira, passa ainda pelo viver e corporeisar nossos próprios corpos de pesquisadoras, nossos próprios referenciais visuocêntricos5. Os corpos que compõem a Oficina são a todo tempo interpelados pela cegueira. E as pistas que dele colhemos trazem sempre essas marcas. Mas, ainda, são sempre tecidos e fiados com as miudezas, histórias únicas (Conti, 2015), percepções e descobertas únicas, de cada um e principalmente, pelas singulares formas e versões da cegueira que são ali partilhadas.

Achamos interessante nos aprofundarmos nesse corporeizar-seCOM a partir de uma narrativa retirada de um diário de campo do dia 25 de maio de 2015. Planejamos para essa oficina experimentarmos a entrega de nosso corpo e nosso peso ao toque e suporte do outro. Como todas as outras, essa oficina foi planejada e pautada em uma pista que uma participante nos indicou na semana anterior. Ela, com o apoio do grupo, comentava o quanto podia ser incômodo o toque inesperado do outro que, ansioso para ajudar, invadia o corpo da pessoa cega, a tocar-lhe e puxar-lhe a fim de oferecer ajuda e orientação. O que nos era narrado era que o encontro entre cegos e videntes era, muitas vezes, permeado de pressuposições. Supondo que um cego precisa de orientações e indicações, muitas vezes os videntes são invasivos em suas ofertas de ajuda. Invasivos porque pressupõem que sabem o que um cego - ou qualquer cego - precisa. Pois foi a partir dessa discussão que planejamos uma oficina para experimentarmos o toque do outro e foi com essa discussão que a oficina nos brindou com nossas próprias pressuposições acerca do que um outro precisa para orientar-se no mundo. Durante a oficina, nos encontramos com Pedro, um homem de 65 anos, que além da cegueira, experimentava uma diminuição na sua capacidade auditiva. Precisaríamos, então, gritar para falarmos com ele?

Tateando os colchões em volta, cada um achou um espacinho para se deitar. Gabi trouxe a sensação de bolinhas pesando nos olhos e construímos um caminho para que o peso do corpo fosse entregue aos colchões.

Eu, Ju e Gabi, fomos para perto de cada um deles. Gabi com Maria, Ju com Carmen e eu com Pedro. Havia algo em mim que, desde a primeira vez que o vi, me aproximava dele. Todos estavam de olhos fechados. Antes de tocarmos em seus braços, falei que, neste momento, nos aproximaríamos e pedi licença para tocá-los. Pedimos para que deixassem pesar o braço e que confiassem na gente.

Comecei tocando a pele de Pedro. As pintinhas escuras pelo braço me lembravam as mesmas pintinhas da minha vó. A pele macia e com poucos pelos dava lugar ao toque. Comecei pela mão. Abrindo seus dedos, mexendo nas pequenas articulações...Passei então para essa parte larga e dura do braço, erguendo-a levemente. Era difícil para Pedro soltar todo peso. Quando eu começava um movimento, ele logo mobilizava o braço para me ajudar. Giramos o cotovelo, depois a parte dos tríceps, depois o ombro - este no começo estava erguido, próximo à orelha, mas que depois desceu e se esparramou no colchão.

Tentei chamá-lo e pedir que confiasse seu peso a mim, mas ele não escutou. Percebi que Pedro não escutava bem. Ao invés de falar mais alto com ele, segui pelo contato. Ele me ajudando com os movimentos. Senti que ele estava confortável, e eu também. Com o outro braço, eu já começo a ficar com calor. Havia muita energia circulando.

Quando fomos para cabeça, fui primeiro aproximando minhas mãos às laterais. Com a cabeça apoiada no colchão, conduzi pequenos nãos para que ele sentisse onde e como sua cabeça estava apoiada.

Fui então erguer um pouco a cabeça de Pedro. Cabeça pesa, né? Senti que neste momento, Pedro entregou seu peso a mim. Eu pude segurar sua cabeça, ele pôde soltá-la em minhas mãos. E fomos nós. Era hora então de me dedicar mais. Eu precisava de força para erguê-la. Estava fazendo uma experimentação também com o meu corpo. Apoiava meus cotovelos nos joelhos e fazia uma alavanca. Respirava fundo e na expiração, levantava sua cabeça do chão por alguns segundos. Meus braços estavam entregues ao exercício. Ao terminarmos, minha mão estava tão quente que precisei mantê-la ainda um pouco próxima de Pedro para uma despedida mais demorada. (Diário de campo, Pesquisa Perceber sem Ver, 25 de maio de 2015).

Para fiar um espaço de encontro no "entre" são necessários deslocamentos mútuos. O encontro pede o engajamento de um corpo que se faz sensível ao outro e às inúmeras possibilidades que podem emergir dessa relação. Para estar COM, há uma presença necessária, uma inteireza para poder perceber e estar aberto a modulações. Diversas vezes, ao compormos o coletivo das oficinas, nos vemos diante de impasses porque nossos corpos (de pesquisadoras e videntes) estão habituados a repertórios organizados a partir do referente visual. É tão somente a partir desses encontros e de seus impasses que nos achamos em vias de alargar nossos repertórios corporais e de encontrar novos "eu-corpo", compostos agora por atravessamentos trazidos pela cegueira e por mais quaisquer singularidades que compõem o corpo do outro.

A pesquisa corporal abre caminhos para uma redescoberta singular do próprio corpo. Despertar sensorialmente o corpo possibilita movê-lo no sentido de uma atenção aos seus próprios movimentos, ampliando suas possibilidades e repertórios corporais, esmiuçando e expandindo seus limites. É tal apropriação do corpo que permite conectá-lo ao presente, aos acontecimentos, sensações e afetos produzidos no encontro entre corpos-cegueiras-objetos-vidências-palavras. Nesses encontros, o que tecemos são formas únicas e singulares de ver e não ver.

Dulcinéia ficou um tempão segurando a esponja, não quis interferir, fui sendo guiada pelo tempo deles. Depois de alguns minutos, ela quis dividir conosco a sensação que a esponja provocara: era como se ela estivesse absorvendo todos os seus problemas. Neste dia, Dulcinéia chegou na oficina bastante preocupada com seu filho que saíra sozinho pela manhã para um lugar distante. A esponja ajudou a criar um outro lugar para esta angústia vivida. Disse ainda que quando for lavar louça a partir de agora, irá lavar com ela a sua mente também. Dulcinéia é participante da oficina de experimentação corporal, está passando pelo processo de cegar, possui baixa visão e tem 53 anos. (Diário de campo, Pesquisa Perceber sem Ver, 2013).

Uma experimentação corporal com uma esponja seria capaz de se conectar com a angústia de uma mãe? O contato da esponja nas mãos poderia suscitar a sensação de absorção dos problemas sentidos? Um ato cotidiano como o de lavar louças poderia ganhar novos contornos e significados? A experimentação corporal, no sentido que a apresentamos nesse texto, implica, como dissemos, tecer conexões. Nessa tessitura, humanos e não humanos entram em relação para fazer um corpo possível. É interessante notar que Latour (2007) afirma que ter um corpo envolve aprender a ser efetuado e movido por diferentes entidades. Experimentar a textura de uma esponja, aprender a ser movido e efetuado por essa materialidade envolve compor um mundo ainda inédito e inaudito.

Quando o movimento entra em cena, ativa-se junto a ele o plano do imprevisível - somos tomadas pela surpresa do que o corpo pode vir a criar em suas conexões mais improváveis. Nas oficinas, inúmeros outros projetos de corpos aparecem para além da cegueira. O corpo que envelhece, o corpo da mãe preocupada, o corpo que cria, que também padece de outras dores, o corpo que ouve pouco. Se a cegueira, inicialmente, implica em restringir o movimento, a oficina de experimentação corporal é um espaço de criação de novas possibilidades. De ampliar e alargar o corpo e promover outras versões para além do ser cego.

Assim, no nosso processo laborioso de pesquisar o corpo, o fio condutor novamente nos retoma: como podemos perceber os efeitos de uma oficina de experimentação corporal com pessoas cegas e de baixa visão? O fio que nos conduz já aponta uma relação, que nos é muito precisa e preciosa, entre o conhecer e o cuidar. Apostamos que, num processo de pesquisa, de produção de conhecimento, podemos produzir também cuidado. Isso porque produzimos ciência COM o outro. Na ação de pesquisarCOM, nossa direção ética se efetiva, a preposição COM é tornada verbo, pesquisamos com o outro e não sobre o outro, isso implica tornar-se junto (Haraway, 2008), corporeisar-seCOM o outro na própria ação de pesquisar, um fazer-COM até o fim.

Esses efeitos são colhidos de maneira simples, porém não fácil. Ao poder escutar o que surge para além da prescrição da cegueira; ao poder perceber que o corpo que cega tem outros projetos, outras conexões como dançar, lavar louças, viajar, envelhecer e muito mais; ao compartilhar as rotas desviantes desses corpos, produzimos saúde, colhemos os efeitos daqueles corpos corajosos, corajosos porque são capazes de se arriscar. O corpo é corajoso quando se lança a experimentar, a pôr-se a prova. Nas histórias que colhemos dos corpos que cegaram ou estão em vias de cegar, o corpo é investido de coragem a cada momento, pois, muitas vezes, o mundo aparece como um mundo ameaçador, como o mundo das quedas.

Ouvir o que está para além da meta desses corpos que cegam é produzir outros caminhos possíveis, desvios nas rotas reguladoras de uma reabilitação normalizadora (Moser, 2000). Entendemos que a reabilitação se faz nas pequenas provas, nos riscos sutis ou ousados, que o corpo imbuído de coragem investe. A reabilitação, para nós, implica o ato mínimo que seja de se afirmar as coragens do corpo. Os efeitos das oficinas que realizamos tornam-se palpáveis, visíveis, dizíveis quando a reabilitação é tornada verbo, quando se costura, faz e desfaz, no gerúndio do viver. Entre um projeto de corpo e o processo de tê-lo inúmeros desvios traçam outros destinos, outros corpos possíveis. Reabilitação nos sopra como plasticidade.

 

Considerações finais temporárias

Aquele-que-só-diz-obrigado [é cego, tem 60 anos] me causa angústia, muita angústia. Ele tem o corpo encolhido, as pernas não esticam, sempre estão dobradas, incomodamente - aos meus olhos - dobradas. Ele me parece frágil - será que aquele corpo pode estar na Oficina? O que faremos com ele? Pernas dobradas, tensas, locomoção difícil, minha impressão é de que ele não se move há anos. E lá vem ele, apoiado por alguém, caminhando com dificuldade, passinho atrás de passinho, equilíbrio instável. Chega ao tatame - e eu, fico exausta só de pensar no que me parece ser aquele enorme esforço. E ele chega dizendo obrigado, está tudo muito bom, muito bom, está gostando da experiência, graças a Deus. Logo, penso, tudo tão bom, tão bom, tudo nos conformes, nos conformes. Será mesmo?

O objetivo da Oficina era experimentar o expandir e o contrair começando pela audição concentrada inicialmente fora da sala, depois dentro da sala, depois no próprio corpo. Mãos na barriga. E, com as mãos na barriga, começam a sentir o movimento provocado nesta parte do corpo pela respiração.

Aquele-que-só-diz-obrigado não encosta as pernas no chão quando deita. Elas nunca esticam. E ele fica deitado, numa posição que me parece improvável. Como abrir-se ao outro? Por que aquele corpo me parece desconfortável?

Inspirar e expirar percebendo os movimentos do corpo - eis o que está em jogo agora. Em seguida: mão direita no peito, mão esquerda na barriga. É possível perceber o coração batendo?

Uma de nós passa a oficina ao lado de Aquele-que-só-diz-obrigado, encontra um jeito de se articular com o corpo dele, sintonizando um mundo com um corpo muito diferente do seu próprio. E para Aquele-que-só-diz-obrigado está tudo muito bem, muito obrigada, tudo bem, não, não dói não, obrigada, tudo bem, bem, sim, tudo bem, graças a Deus.

E o coração, estão sentindo ele bater? Sim, tudo bem, sim, tudo bem, bem, bem, graças a Deus - diz Aquele-que-só-diz-obrigado.

Indicamos que eles não precisam dizer que percebem o coração se de fato não estiverem sentindo o coração bater, não tem problema não perceber isso, dizemos nós, em uníssono. Aquele-que-só-diz-obrigado se deixa afetar por estas palavras e se conecta com aquilo que se passa com ele: Ah, então, se é assim, olha, vou dizer a verdade: Eu não sinto o coração não!

"Bingo!", eu pensei. Finalmente Aquele-que-só-diz-obrigado não concordou com alguma coisa. Não, ele não percebe o coração quando coloca a mão no peito!! Isso me enche de alegria, um segundinho, um momento tão curto e Aquele-que-só-diz-obrigado sai do "tudo bem, obrigada, bem, sim, tudo bem, obrigado, obrigado, graças a Deus".

A coordenadora que estava o tempo todo ao lado D'aquele-que-só-diz-obrigado fala ao meu ouvido, bem baixinho e assustada: "Eu também não sinto o coração dele! Que estranho!" Talvez o não sentir o coração de Aquele-que-só-diz-obrigado seja para ela um enigma: será que ele está ali mesmo? De minha parte, pareceu-me que o "não sentir o coração" foi um modo de Aquele-que-só-diz-obrigado estar presente na Oficina, inteiro, ele, uma forma de presença longe do sim, sim, tudo bem, tudo ótimo, tá bom, sim tá bom, graças a Deus. Talvez a coordenadora não tenha se dado conta disso...

Mãos ao longo do corpo, palmas para o teto. Inspirar e expirar abrindo e fechando as mãos. Observar a inspiração, sem mover as mãos.

Ouço Aquele-que-só-diz-obrigado de novo no tudo bem, sim, tá bom, sim, sim, sim, obrigada, bom...enquanto faz o exercício.

A coordenadora me parece dançar ao lado de Aquele-que-só-diz-obrigado. Serena, vai buscando com seu corpo os ajustes que permitam a Aquele-que-só-diz-obrigado mover-se, estar na Oficina e encontrar o jeito dele de estar no seu corpo, deitado no tatame, mexendo mãos, respiração...

Aquele-que-só-diz-obrigado se manifesta por frestas. Corpo-fresta, aberturas pequenas num mundo encolhido, encurtado. Pelas frestas ele pode dizer: não, não sinto isso não. Ele pode discordar. Mas são frestas, eventuais, aparecem aqui e ali. Noto que esta Oficina e as experimentações corporais parecem abrir uma fresta, uma frestinha que faz Aquele-que-só-diz-obrigado discordar - ali, na discordância, ele me parece mais humano, mais ele mesmo... ainda que eu não saiba direito como dizer isso. Um sopro de Aquele-que-só-diz-obrigado, num mar de sim, tudo bem, sim, obrigada, sim, sim, tudo ótimo, sim, ótimo, obrigada, muito obrigada, graças a Deus. (Diário de campo, Pesquisa Perceber sem Ver, ano 2009. Retirado de Conti, 2015).

Ousamos afirmar que as oficinas de experimentação corporal engendram efeitos que dizem respeito a experiências possíveis e distintas de cegar, de corporeisar-se a partir da cegueira. Colhemos esses efeitos junto a esses corpos que se arriscam mesmo com medo, com dor, mas também cheios de coragem, corpos que se lançam nas vicissitudes do viver. Em nossas oficinas nos distanciamos da ideia de cura, reabilitar-se, no sentido de alcançar um padrão corporal pré-definido, não é uma meta a ser alcançada, mas um processo a ser vivido, a ser experimentado nas frestas (Conti, 2015), nas idas e vindas de fazer um corpo a partir das conexões que se abrem no dia a dia. Retomando o filósofo Canguilhem (2000), afirmamos que o corpo são não é o corpo sem doença, é o corpo que se experimenta, que pode se arriscar, que pode arriscar ampliações, retrações pois, está no mundo e está se fazendo no mundo.

Colhemos os efeitos de nossas oficinas de experimentação corporal quando podemos ouvir as coragens dos corpos que ali estão, porque naquilo em que foi corajoso ampliou a vida em mais um grau, e aí a vida já não pode mais voltar o que era antes, porque já ficou diferente, porque já foi um passo além, já criou uma pele a mais.

 

Referências

Barros, L. P. (2013). Movimento Sensível e Vital: Uma oficina articulando a cegueira com o mundo. Tese de doutorado, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro.         [ Links ]

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Recebido em 30/11/2015
Aprovado em 25/04/2016

 

 

1 Pesquisa aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos.
2 O Instituto Benjamin Constant (IBC) é um centro de referência nacional na área da deficiência visual, localizado na cidade do Rio de Janeiro. Para mais informações, ver www.ibc.gov.br
3 Sublinhamos que tomamos o termo devir em um sentido afim ao que Deleuze propõe na conversa com Parnet: "Devir é jamais imitar, nem fazer como, nem ajustar-se a um modelo,seja ele de justiça ou de verdade. Não há um termo de onde se parte, nem um ao qual se chega ou se deve chegar. Tampouco dois termos que se trocam. A questão "o que você está se tornando?" é particularmente estúpida. Pois à medida que alguém se torna, o que ele se torna muda tanto quanto ele próprio. Os devires não são fenômenos de imitação, nem de assimilação, mas de dupla captura, de evolução não paralela, núpcias entre dois reinos. As núpcias são sempre contra natureza. (...) Como os pássaros de Mozart: há um devir pássaro nessa música, mas tomado em um devir-música do pássaro, os dois formando um único devir, um único bloco, uma evolução a-paralela (
) Os devires (...) são atos que só podem estar contidos em uma vida e expressos em um estilo" (Deleuze & Parnet, 1998, p.3).
4 Conti (2015) salienta a importância de se distinguir entre as únicas histórias e as histórias únicas. Se as únicas histórias são aquelas que se repetem e que antecipam o que sabemos acerca dos outros, as histórias únicas, ao contrário, são singulares, caracterizadas pelas descobertas, pela abertura a novas versões acerca do outro. Investigando por exemplo as histórias da cegueira, Conti nos adverte que as únicas histórias da cegueira nos dizem que a deficiência é um déficit, uma falta, um desvio por relação a uma normalidade tomada como padrão. Já as histórias únicas, singulares, que a autora colhe com as pessoas cegas com quem pesquisa informam que a cegueira é uma forma de vida povoada por muitos outros sentidos e sensorialidades para além da visão, povoada, em última instância por experiências densas e extremamente articuladas em torno das singularidades que marcam cada corpo atravessado pela cegueira. Nesse trabalho, seguimos com a definição de histórias únicas tal como proposta por Conti (2015).
5 Belarmino (2004) define o paradigma visuocêntrico como marca da modernidade ocidental. O visuocentrismo consiste, para a autora, na identificação entre ver e conhecer. As pesquisas da autora apontam para a urgência de se problematizar a hegemonia desse paradigma a partir do que define como mundividência tátil, isto é, a chave cognitiva por excelência da pessoa cega. Reconhecer e incluir a mundividência tátil na educação e na formação da pessoa cega é, para a autora, propiciar a heterogeneidade das formas de conhecer, suas necessárias e múltiplas articulações.

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