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Pesquisas e Práticas Psicossociais

versão On-line ISSN 1809-8908

Pesqui. prát. psicossociais vol.14 no.1 São João del-Rei jan./mar. 2019

 

Relações entre habilidades sociais de pais e comportamento dos filhos: uma revisão da literatura

 

Relationship between parents' social skills and children's behavior: a literature review

 

Relaciones entre habilidades sociales de padres y comportamiento de los hijos: una revisión de la literatura

 

 

Erika Borges dos SantosI; João WachelkeII

IUniversidade Federal de Uberlândia
IIProfessor na Universidade Federal de Uberlândia

 

 


RESUMO

O presente artigo teve como objetivo efetuar uma revisão bibliográfica narrativa focada nas habilidades sociais (HS) dos pais e sua influência no modo como criam seus filhos e no repertório social destes. HS é um conjunto de capacidades utilizadas para se comportar no meio social. As HS educativas seriam um conjunto específico utilizado na tarefa de educar. Foi feita uma análise de artigos encontrados nas bases de dados: Lilacs e Scientific Electronic Library Online. A literatura aponta que pais com níveis mais elevados de HS educativas (HSE) têm filhos socialmente habilidosos e com menos problemas de comportamento. Além disso, o envolvimento positivo dos pais nas atividades em geral dos filhos faz com que estes sejam mais competentes socialmente e academicamente. Treinamentos em habilidades sociais, tanto educativas quanto educativas parentais, mostraram-se eficazes na melhora do repertório social de pais e filhos, bem como na relação entre eles.

Palavras-chave: Habilidades sociais. Relacionamento pais e filhos. Habilidades sociais educativas. Treinamento de habilidades sociais.


ABSTRACT

The present article aimed at carrying out a narrative bibliographical review focused on the social skills (SS) of parents and their influence on the way they raise their children and on the latter's social repertoire. SS are a set of capacities used to act in the social environment. Educational SS would be a specific set employed in the task of education. An analysis of the papers found in the Lilacs and Scientific Electronic Library Online databases was conducted. The literature points out that parents with higher levels of Educational SS (ESS) have socially skilled children with less behavior problems. Moreover, positive parental involvement in children's activities in general leads them to being more socially and academically competent. Social skills training, considering both educational and parental educational skills, were effective in the improvement of parents' and children's repertoire, as well as in their relationship

Keywords: Social skills. Parents and children relationship. Educational social skills. Social skills training.


RESUMEN

El presente artículo tuvo como objetivo efectuar una revisión bibliográfica narrativa enfocada en las habilidades sociales (HS) de los padres y su influencia en el modo como crean sus hijos y en el repertorio social de éstos. HS es un conjunto de capacidades utilizadas para comportarse en el medio social. Las HS educativas serían un conjunto específico utilizado en la tarea de educar. Se realizó un análisis de artículos encontrados en las bases de datos: Lilacs y Scientific Electronic Library Online. La literatura apunta que los padres con niveles más altos de HS educativas (HSE) tienen hijos socialmente habilidosos y con menos problemas de comportamiento. Además, la participación positiva de los padres en las actividades en general de los hijos hace que éstos sean más competentes social y académicamente. Los entrenamientos en habilidades sociales, tanto educativas y educativas parentales, se mostraron eficaces en la mejora del repertorio social de padres e hijos, así como en la relación entre ellos.

Palabras clave: Habilidades sociales. Relaciones padres y hijos. Habilidades sociales educativas. Entrenamiento de habilidades sociales.


 

 

Passamos grande parte de nossas vidas investindo em alguma forma de relacionamento interpessoal, seja no contexto familiar, escolar, seja no trabalho. Vemos que no contexto familiar os pais têm grande influência sobre os filhos, e acreditamos que é nesse contexto no qual a aprendizagem das HS começam. Por isso, analisar os estudos empíricos publicados até o momento sobre o tema se faz imprescindível para guiar pesquisas futuras, as quais poderão vir a auxiliar na produção de novos métodos clínicos que auxiliem os pais na tarefa de educar os filhos.

Este trabalho consiste em uma revisão bibliográfica narrativa e, portanto, um estudo qualitativo que descreve e discute o desenvolvimento de uma área específica (Rother, 2007), com foco nas habilidades sociais (HS) dos pais e como estas influenciam na criação e nas habilidades dos filhos. Diante disso, primeiramente, será apresentada uma concepção geral do tema principal e dos conceitos relacionados a ele. Por fim, será explicitada a análise dos artigos encontrados em duas bases de dados, Lilacs e Scientific Eletronic Library Online (SciELO), de modo a avaliar o estado atual da arte e as direções de pesquisa na literatura acadêmica brasileira sobre o assunto.

 

Habilidades sociais educativas parentais

Cotidianamente, somos expostos a diversos meios sociais que demandam a decodificação de sinais explícitos e implícitos, a capacidade de aperfeiçoá-los e a decisão de emitir ou não comportamentos, ou seja, aprendemos a decifrar os sinais por meio da percepção, a selecionar as frases e a deliberar sobre o contexto social. É nesse cenário que ocorre a aprendizagem de desempenhos sociais, os quais dependem de um repertório de HS que é desenvolvido desde a infância por meio do ambiente (Del Prette & Del Prette, 2001).

Para compreender melhor o conceito de HS, primeiramente é preciso saber o que é desempenho social e competência social. Segundo Del Prette e Del Prette (2017), desempenho social remete à expressão de comportamentos em situações sociais, desempenhos estes favoráveis ou não para o relacionamento. Já a competência social está relacionada aos efeitos que o desempenho social produz, num sentido avaliativo, o resultado que este gera, se atende às demandas do contexto. Assim, habilidades sociais são um conjunto de comportamentos sociais aceitos pela respectiva cultura, que proporciona um desempenho social competente e gera resultados positivos para o indivíduo em sua relação com o outro, o que pode vir também a colaborar para a competência social (Del Prette & Del Prette, 2018).

Del Prette e Del Prette (2018) listaram classes e subclasses das principais habilidades sociais: a) de comunicação - fazer e responder perguntas, dar e pedir feedback, gratificar, elogiar, iniciar e manter conversações; b) de civilidade - falar por favor, cumprimentar, despedir-se; c) assertivas - defender os próprios direitos e os dos outros, manejar críticas, discordar, aceitar e recusar pedidos, desculpar-se, admitir falhas e lidar com a raiva do outro; d) empáticas - colocar-se no lugar do outro, expressar compreensão, escutar, manter o contato visual; e) fazer e manter amizade - expressar sentimentos, manter contato e responder ao contato, incentivar confidências, iniciar conversa, realizar e aceitar convites; f) expressar afeto e intimidade - demonstrar afeto por meio do toque, sorriso, demonstrar gentilezas, prezar pelo bem-estar do outro, alimentar o bom humor, lidar com relações íntimas e estabelecer limites quando necessário; g) manejar conflitos e resolver problemas interpessoais - manter a calma, exercitar o autocontrole, identificar e definir o problema, reconhecer em você e no outro comportamentos que levam a ter problemas, procurar possíveis soluções; h) expressar solidariedade - reconhecer as necessidades do outro, participar de campanhas solidárias, oferecer ajuda, apoiar, doar alimentos ou objetos, expressar compaixão; i) coordenar grupos - organizar e dividir tarefas, dar feedback, parafrasear, resumir, saber explicar, incentivar a todos, cobrar desempenho; j) falar em público - usar um tom de voz audível, distribuir o olhar pelos ouvintes, fazer e responder perguntas, utilizar instrumentos audiovisuais adequados. Devido à variabilidade e complexidade das relações interpessoais, sobreposições dos conjuntos são inevitáveis.

Os pais são os maiores modelos para os filhos. Os responsáveis devem utilizar suas próprias habilidades para ensinar as crianças a se expressarem, apontando, assertivamente, os comportamentos desejáveis e malquistos dos filhos, elogiando quando necessário e solicitando mudanças, explicando suas motivações e as possíveis consequências positivas ou negativas. Dessa forma, os pais evitam práticas coercitivas que os afetam negativamente e a seus filhos (Bolsoni-Silva, 2003). Pais que não oferecem suporte social e não demonstram afeto para a criança infligem nela sentimentos de vulnerabilidade e incapacidade, prejudicando seu desenvolvimento e deixando-a despreparada para suas interações futuras. Ao contrário destes, os pais habilidosos têm maior repertório para criar um ambiente acolhedor (Cardoso & Soares, 2011).

Assim, pode-se observar que o meio onde a criança vive favorece tanto os comportamentos socialmente habilidosos quanto os considerados desadaptados. O comportamento dos filhos também influi significativamente na relação com os pais; diante disso, ressalta-se a necessidade de estudos sobre tais relacionamentos para compreender a dinâmica e as consequências destes para ambos (Boas & Bolsoni-Silva, 2010).

 

Conceitos relacionados

Em meio a diversas maneiras que existem para orientar a conduta dos filhos, encontram-se na literatura fenômenos comportamentais que alicerçam os seguintes conceitos: a) práticas parentais, b) estilos parentais e c) habilidades sociais educativas parentais (HSE-P). As práticas educativas parentais são padrões e estratégias comportamentais utilizados pelos pais para educar, comunicar-se, impor limites, ensinar valores e responsabilidades, transmitir a cultura e promover as HS dos filhos. Essas práticas podem ser divididas em duas categorias: 1. Indutivas - nas quais os pais estimulam os filhos a automanejar suas condutas, apontando as consequências destas; 2. Coercitivas - por meio das quais os pais usam da força, privações e punições físicas para educar os filhos, suscitando obediência por medo e sem reflexão sobre a necessidade de alteração de comportamento (Cassoni, 2013).

O modelo dos estilos parentais, proposto originalmente por Baumrind (1966) e modificado posteriormente por Maccoby e Martin, mencionado por Bolsoni-Silva (2003) e Cassoni (2013), é classificado em quatro tipos: autoritário, autoritativo, indulgente e negligente. O estilo autoritário refere-se a pais muito rígidos e exigentes, que não valorizam o diálogo e utilizam punições severas para a manutenção da ordem e da disciplina. Os indulgentes adotam uma postura "liberal" diante dos filhos; são afetuosos, porém não estabelecem regras ou limites, satisfazem as vontades das crianças, deixando que elas se monitorem. Pais negligentes demonstram pouco afeto e pouca exigência, não procuram se aproximar ou se envolver com as atividades dos filhos. No estilo autoritativo, os pais sabem balancear entre exigência e monitoramento, corrigem e gratificam quando necessário, mantêm a comunicação clara e aberta, são afetivos, responsivos às necessidades de seus filhos e propiciam um maior desenvolvimento das habilidades e da autonomia das crianças.

Com o objetivo de classificar os estilos parentais, Gomide, Salvo, Pinheiro e Sabbag (2005) elencaram sete práticas parentais comumente divididas em positivas (comportamentos pró-sociais) e negativas (comportamento antissocial). As primeiras são subdivididas em monitoria positiva - diz respeito à atenção dos pais para com as atividades gerais e gostos dos filhos, envolvendo expressões de carinho e afeto; tal acompanhamento é realizado de forma saudável e não exagerada; e comportamento moral - prática na qual os pais transmitem, por intermédio do ensino ou do exemplo, valores e proporcionam condições para que seus filhos desenvolvam senso de justiça, empatia, responsabilidade, generosidade, discriminar o certo e errado.

Já as práticas parentais negativas indicam o uso de formas agressivas e passivas de educar, classificadas como negligência, punição inconsistente, monitoria negativa, disciplina relaxada e abuso físico. A negligência diz respeito à ausência de demonstração de afeto e de interesse e às responsabilidades e ajuda omitidas pelos pais, o que pode levar a criança a se portar de forma agressiva ou indiferente. Punição inconsistente ocorre quando os pais agem de acordo com seu estado de humor na hora de educar a criança, não levando em consideração se o comportamento do filho foi ou não adequado. Na monitoria negativa, os pais supervisionam, excessivamente, a vida de seus filhos, causando um ambiente hostil. Disciplina relaxada se manifesta quando as regras estabelecidas não são cumpridas, havendo confronto entre os filhos e pais, e os genitores acabam por desobrigar-se ao estabelecimento de limites, escolhendo omitir-se. Abuso físico refere-se às punições corporais, que machucam e humilham os filhos, por exemplo, mordê-los e queimá-los (Gomide et al., 2005; Marturano et al., 2010).

De acordo com Del Prette e Del Prette (2008), as HSE são definidas como um conjunto de competências utilizadas com o objetivo de promover o desenvolvimento e aprendizado do outro, em contextos como o formal (instituições de ensino) e informal (familiar, comunidade). As HSE podem ser divididas em quatro classes mais gerais e suas subclasses, as quais podem ser observadas por meio das seguintes categorias: 1. Estabelecer contextos interativos potencialmente educativos, como saber organizar o material disponível e ser mediador das interações; 2. Transmitir ou expor conteúdos sobre HS, que seria saber parafrasear, apresentar possíveis consequências para determinados comportamentos e saber apresentar objetivos e informações; 3. Estabelecer limites e disciplina, chamar a atenção para as regras, saber apontar/descrever comportamentos desejáveis e indesejáveis e solicitar a mudança desejada; 4. Monitorar positivamente, elogiar, incentivar, demonstrar empatia e interesse pelo outro.

No cenário informal, em particular o familiar, Boas e Bolsoni-Silva (2010) definem as HSE-P como um conjunto de habilidades específicas utilizadas pelos pais na educação dos filhos. Para os autores, as mais importantes são: estabelecer limites e diálogo; expressar opiniões e sentimentos positivos/negativos; solicitar mudança comportamental; cumprir promessas; harmonia do casal quanto à criação dos filhos; e saber se desculpar.

A combinação de determinadas práticas educativas resulta no estilo parental. As HSE-P englobam as práticas educativas e auxiliam na identificação destas e no reconhecimento dos comportamentos que precisam ser modificados e daqueles que devem ser incentivados. Outros autores apontam que pais com HS utilizam como estratégia educativa a monitoria positiva e o comportamento moral (Bolsoni-Silva & Marturano, 2008; Gomide et al., 2005).

 

Estudos empíricos

Realizou-se uma busca nas bases de dados Lilacs e Scientific Eletronic Library Online (SciELO em janeiro de 2017 utilizando os termos "habilidades sociais pais e filhos". Dos artigos encontrados, selecionamos 24, os outros foram excluídos por serem revisões bibliográficas, artigo teórico, ou não estarem de acordo com o tema. Primeiramente, apresenta-se um relato sobre os estudos empíricos encontrados e suas contribuições, que serão divididos de acordo com o tema e o ano de publicação: 1. HS e problemas de comportamento, 2. HS e práticas parentais, 3. HS e envolvimento entre pais e filhos, e 4. Treinamentos em HS com pais e filhos. Por último, propõe-se uma breve análise sobre o que já foi visto e as potenciais lacunas nas linhas de pesquisa.

 

Habilidades sociais e problemas de comportamento

Bolsoni-Silva (2003) realizou um estudo cujo objetivo foi comparar as HSE de pais com filhos com indicativo de problemas comportamentais e pais com filhos com indicativo de conduta socialmente habilidosa, as indicações foram feitas pelos professores. Os resultados mostraram que as mães emitem, com maior frequência, ações relacionadas à HSE-P: expressar sentimentos e manter comunicação. De modo geral, os pais de filhos socialmente habilidosos destacaram-se dos demais por terem níveis maiores de HSE-P, cumprindo promessas, demonstrando carinho e comunicando-se mais frequentemente.

Leme e Bolsoni-Silva (2010a) expandiram a análise das HSE-P e sua influência nos problemas comportamentais avaliando as contingências dessas condutas, ou seja, quando e como os filhos emitem seus comportamentos e de que modo as mães respondem a isso. As crianças foram indicadas pelos professores. Constatou-se que crianças sem problemas de comportamento apresentam, com maior frequência, HS do que crianças que exibem problemas de conduta na hora de expressar sentimentos, enfrentar obstáculos e interagir socialmente de maneira positiva. O grupo com problemas comportamentais também apresentou maior frequência de conduta externalizante. Adicionalmente, as mães do grupo com problemas relataram que quando os filhos as desobedeciam ficavam irritadas e recorriam, frequentemente, a práticas educativas não habilidosas.

Leme e Bolsoni-Silva (2010b) também avaliaram as HS e os problemas de comportamento de crianças pré-escolares pela análise das contingências e das respostas das mães. Comparando o grupo clínico com o não clínico, nota-se que os escores médios de HSE-P do grupo não clínico são maiores do que as do grupo clínico. Foi visto que as mães do grupo não clínico conseguem reforçar mais positivamente as habilidades dos filhos, enquanto as do grupo clínico apresentaram nas praticas negativas. Assim como os estudos anteriores, este corrobora para a confirmação de que mães com HSE-P apresentam mais frequência de práticas educativas positivas em diversos ambientes, e seus filhos têm menos problemas de comportamento, já com as mães menos habilidosas socialmente ocorre o oposto.

Em relação ao ambiente familiar, Boas e Bolsoni-Silva (2010) realizaram um estudo buscando detalhar as HSE de mães separadas e sua interferência no comportamento habilidoso ou inadequado do filho. Observou-se uma correlação entre problemas de comportamento das crianças e práticas negativas, em que mães com menor índice de estabelecimento de limites tinham filhos com maiores problemas de comportamento, já mães com habilidades de comunicação têm filhos com bom repertório social. Como em outros estudos, o grupo sem problemas de comportamento, não clínico, apresentou maiores escores em HSE e menos práticas negativas. Não foi encontrada relação entre HS e estado civil.

Considerando as variáveis dos problemas conjugais como influenciadora de problemas de comportamento das crianças, Bolsoni-Silva e Marturano (2010) compararam a relação conjugal de pais de filhos com indicativo de problemas de comportamento e com indicativo de conduta socialmente habilidosa. Em relação à qualidade de comunicação e à frequência de características positivas relatadas, verificou-se que pais de filhos com indicativo de conduta socialmente habilidosa obtiveram maiores escores. Porém, os autores chegaram à conclusão que apesar do relacionamento conjugal influenciar no comportamento dos filhos, ele é só uma das variáveis envolvidas. Ademais, admitiram que a falta de associação entre satisfação conjugal e problemas de comportamento pode ter sido devida ao instrumento utilizado.

Leme, Marturano e Fontaine (2014) fizeram um estudo com o intuito de avaliar semelhanças e diferenças entre famílias nucleares e recasadas em relação às habilidades sociais, problemas de comportamento, indicadores de adaptação e competência acadêmica. Em relação às HS e problemas de comportamento, os resultados mostraram que, de acordo com a descrição das mães de famílias nucleares, seus filhos têm mais habilidades sociais de amabilidade e de autocontrole/civilidade se comparadas às de famílias recasadas. Em relação aos filhos de famílias recasadas estáveis, os filhos de famílias nucleares apresentaram maior frequência de HS de cooperação e de autocontrole/passivo. Além disso, as mães de famílias recasadas estáveis e recentes relatam que seus filhos têm mais problemas de comportamento (em particular externalizante), se comparada aos filhos de famílias nucleares. Segundo as professoras, o tipo de família não diferenciou nem nas HS nem na competência acadêmica das crianças. Isso mostra que no ambiente familiar houve mais impacto do recasamento nas HS e problemas de comportamentos hiperativos e externalizante, o que não ocorre no ambiente escolar, sugerindo que o comportamento da criança está suscetível a efeitos negativos do ambiente familiar.

 

Habilidades socais e práticas parentais

Alguns autores vêm correlacionando as práticas educativas com as habilidades sociais educativas, outros operacionalizaram as práticas educativas positivas em habilidades sociais educativas parentais. Utilizando o modelo de estilo parental constituído por práticas parentais positivas e negativas, Gomide, Salvo, Pinheiro e Sabbag (2005) correlacionaram essas práticas com habilidades sociais, depressão e estresse. Os resultados indicaram correlação positiva entre estilos parentais e HS, principalmente em relação à habilidade de expressar afeto positivo: estilos positivos associaram-se a maiores níveis de habilidade social; e correlação negativa entre estilos parentais positivos, estresse e depressão.

Marturano et al. (2010) realizaram uma pesquisa com o intuito de descrever as condutas dos filhos, as práticas parentais e HS de pais que procuram atendimento psicológico, comparando grupo de pessoas que abandonam e aquelas que continuam participando, bem como a diferença de escores entre meninos e meninas. A frequência de HSE-P foi correlacionada negativamente com práticas negativas, e positivamente com as HS das crianças e práticas positivas dos pais. Também foi observado que cuidadores que têm HSE-P baixas têm maior probabilidade de abandonar o tratamento que os com melhor repertório.

Analisando relações entre práticas parentais aplicáveis às HSE e a variável deficiência, Bolsoni-Silva et al. (2010) compararam práticas negativas e positivas de mães de crianças com deficiência de linguagem (DL) e auditiva (DA), e crianças sem deficiência (grupo não clínico). As crianças do grupo DL não apresentaram diferenças significativas em relação às HS com o grupo não clínico. No grupo DA, tanto as mães quanto as crianças apresentaram menores níveis de HS que as do grupo não clínico. Foram verificadas correlações positivas entre qualidade da interação dos pais-filhos e HS das crianças, e associações entre práticas educativas negativas e problemas de comportamento, fornecendo mais evidências de que a relação das crianças com as mães é essencial para a aquisição e preservação das HS.

Bolsoni-Silva e Loureiro (2011) compararam as práticas educativas das mães com comportamentos de crianças com indicativo de problemas de comportamento e sem indicativo. As mães do grupo não clínico tiveram resultados mais positivos que as do grupo clínico na expressão de sentimentos negativos, concordância com cônjuge, habilidades sociais educativas e infantis e estabelecimento de limites. Em contraste, o grupo clínico teve médias maiores ao conversar sobre certo e errado e problemas de comportamento internalizantes ou externalizantes.

Para caracterizar a multiplicidade da relação entre afeto parental, habilidades socais, controle comportamental, controle psicológico, competência acadêmica e variáveis demográficas, Martins et al. (2014) realizaram uma pesquisa de acordo com o relato de cuidadores. Os autores concluíram que pais mais afetivos, responsivos e que exercem controle positivo têm maior probabilidade de que os filhos tenham um bom desempenho acadêmico. Pais que não fazem uso de controle psicológico tem filhos mais sociáveis.

 

Habilidades sociais e envolvimento entre pais e filhos

Levando em consideração a importância da competência social na vida das crianças e como um ambiente acolhedor é favorável para um padrão de comunicação saudável entre pais e filhos, Cia, Pamplin e Del Prette (2006) compararam indicadores de envolvimento dos pais com os filhos e esse envolvimento com o repertório de habilidades sociais, e também com problemas de comportamento internalizantes e externalizantes. O estudo destaca-se por avaliar o envolvimento por meio do relato dos filhos. Medidas de comunicação e participação dos pais na vida dos filhos correlacionaram-se ao repertório de HS em relação à frequência e adequação às reações habilidosas.

No mesmo ano, Cia, Pereira, Del Prette e Del Prette (2006) também realizaram um estudo sobre o envolvimento pais-filhos e indicadores de HS, sendo que neste o envolvimento foi avaliado pela visão dos pais. O estudo indica que quanto maior for o repertório de HS dos pais melhor será a comunicação entre eles e seus filhos, e maior será também a participação deles na vida do filho.

Cia e Barham (2009) compararam indicadores de envolvimento paterno com habilidades sociais e problemas de comportamento, em que não só os pais avaliaram os filhos, mas também os professores. Constatou-se, novamente, que o bom relacionamento entre pais-filhos e o envolvimento destes nos cuidados, nas atividades escolares, de lazer e na comunicação entre eles pode proporcionar um repertorio de HS adequado e também diminuir os índices de problemas de comportamento externalizantes e internalizantes.

Semelhante aos estudos anteriores, Cardozo e Soares (2010) correlacionaram indicadores de habilidades sociais de pais com envolvimento destes na educação dos filhos, mas a diferença é que dessa vez a amostra foi composta por pais de filhos com deficiência, em particular diagnóstico de retardo mental. Os autores observaram que os pais são mais assertivos que as mães, e estas têm mais desenvoltura social e habilidades de conversação que os pais. Elas também são mais envolvidas nas atividades dos filhos com retardo mental que os pais. Constatou-se também que casais que expressam com mais facilidade sentimentos positivos tendem a demonstrar mais cuidados com os filhos, já os que participam dos cuidados pessoais do filho tendem a apresentar mais dificuldades de serem assertivos.

Custodio e Cruz (2008) realizaram um estudo com o objetivo de verificar as relações das representações mentais que as crianças têm em relação aos pais como figuras de afeto (prazer, bem-estar do filho) e de disciplina (modo como age quando considera o comportamento da criança inadequado), e sua relação com a competência social. Os filhos de pais com baixa escolaridade percebiam seus pais como mais rejeitadores e punitivos. Relacionando as representações e a competência social, observou-se que as crianças que percebiam seus pais como mais rejeitadores foram avaliadas pelos professores como tendo menos comportamentos de autocontrole, de asserção e mais problemas internalizados e pouca competência acadêmica. As crianças que associavam seus pais à representação de punição física foram avaliadas como menos competentes e com mais problemas internalizados.

 

Treinamentos em habilidades sociais com pais e filhos

Muitos estudos na literatura estrangeira vêm mostrando a eficácia de trabalhos preventivos com pais, filhos e professores na área de treinamento de habilidades sociais. Tendo em vista que o treinamento de habilidades sociais é eficaz não só para problemas clínicos, mas também para não clínicos, Salvo, Mazzarotto e Löhr (2005) realizaram programas de intervenção para o desenvolvimento de habilidades sociais com crianças. Os programas tiveram caráter preventivo, e enquanto essas crianças recebiam o treinamento de HS, os pais estavam em outra sala recebendo sessões de orientações em grupo. Suas descobertas foram que a intervenção combinada com pais e filhos tem efeitos positivos nas atividades, socialização e na diminuição dos problemas de comportamento internalizante e externalizante dos filhos.

Defendendo a ideia de que o estilo parental e as habilidades sociais educativas influenciam no desenvolvimento e na relação entre pais e filhos, Pinheiro, Haase, Del Prette, Amarante e Del Prette (2006) realizaram um programa de treinamento em habilidades sociais educativas que teve como objetivo a capacitação dos pais, os quais escolhiam qual filho achavam que tinham mais problemas de comportamentos para ser o foco de sua atenção no programa. A avaliação do programa mostrou que este teve efeitos de intensidade moderada. Na análise qualitativa, feita por meio das entrevistas, observou-se que os pais continuaram as atividades ensinadas no programa, e muitos chegaram a dizer que conseguiram conversar melhor com os filhos depois disso e seus comportamentos inadequados diminuíram. A melhora das HS dos pais repercutiu no relacionamento deles com os filhos e na diminuição de problemas de comportamentos dos últimos, apesar de estes não terem participado.

Coelho e Murta (2007) executaram um programa de treinamento em grupo para pais com o intuito não só de promover habilidades sociais, mas também de práticas parentais positivas e estratégias para enfrentamento de problemas. Buscaram desenvolver, também, um trabalho para os filhos paralelamente ao grupo dos pais, no qual estes passavam por um treinamento em HS. Analisando as entrevistas feitas, os autores consideraram a intervenção eficaz, pois os pais diminuíram suas práticas educativas negativas, melhoraram as positivas, ampliaram suas habilidades em enfrentar eventos estressores e também avaliaram as mudanças dos filhos de forma positiva, tanto no que diz respeito às atividades acadêmicas como de cuidados consigo mesmo.

Bolsoni-Silva, Salina-Brandão, Versuti-Stoque e Rosin-Pinola (2008), efetuaram um programa de intervenção em grupo para pais que procurou promover HSE. Os resultados de pré e pós-teste demonstraram, assim como nos outros estudos, que houve aprendizagem de algumas HSE, tais como, expressar sentimentos positivos, agradecer, fazer pedidos e estabelecer limites. Porém, diferentemente dos outros, para outras habilidades alguns participantes demonstraram redução dos escores, que foi explicada como sendo devido à capacidade crítica adquirida pelos participantes ao aprenderem sobre as HSE.

Considerando a importância de se intervir nos problemas de comportamento por meio de alterações estratégicas no modo como os pais lida com os filhos, Bolsoni-Silva, Silveira e Marturano (2008) descreveram uma intervenção feita com um grupo de pais que teve como objetivo desenvolver a competência social e melhorar o relacionamento destes com os filhos. Houve melhora nas HSE-P, em particular nas categorias "comunicação", "expressividade" e "consistência", os filhos também apresentaram melhora nos problemas de comportamento. Na avaliação feita seis meses após a intervenção, na categoria "consistência" ,os escores não se mantiveram. Apesar dos ganhos em consistência não terem sido mantidos, os resultados sugerem que o programa ajudou os participantes em comunicação e expressividade.

De modo similar, Fernandes, Luiz, Miyazaki e Marques Filho (2009) efetuaram um programa com o intuito de ensinar e melhorar as HSE. Sua diferença com os anteriores é que não só os pais participaram, mas cuidadores de crianças com transtorno psiquiátrico, e também foram feitas sessões para follow-up 30 dias após o fim do grupo e outro 60 dias depois. Não houve melhora significativa no desempenho escolar, o que era esperado devido o diagnóstico de TDAH. Porém, houve melhora significativa nos problemas de comportamento, e pôde-se perceber que com o treinamento dos pais os filhos com transtorno psiquiátrico diminuíram a incidência de comportamentos inadequados.

Considerando a variável de tempo para a eficácia dos programas de intervenção, Bolsoni-Silva e Borelli (2012) descreveram a avaliação de 2 programas de intervenções realizados com pais/cuidadores, os quais se diferiram apenas em relação ao tempo de ministração, em que o Grupo 1 teve sessões uma vez por semana durante um ano letivo, e o Grupo 2 tinha duas vezes por semana durante um semestre letivo. Analisando os resultados, foi observada uma melhora no Grupo 1, em particular nas HSE-P e nas habilidades sociais infantis. Já no Grupo 2 observou-se uma melhora nas práticas educativas, sendo que as negativas diminuíram e os problemas de comportamento dos filhos também. Apesar de os dois grupos apresentarem resultados positivos, acredita-se que para aprender melhor sobre HS e consolidar o repertório é preciso mais tempo, o que foi demonstrado pelos resultados do Grupo 1.

Utilizando um delineamento experimental com grupo controle, Rocha, Del Prette e Del Prette (2013) avaliaram os efeitos de um programa de treinamento de habilidades sociais educativas com pais de crianças com diagnóstico de Transtorno do Deficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH) em relação às habilidades sociais, problemas de comportamento e competência acadêmica dos filhos. Observou-se que a intervenção gerou mudanças positivas significativas nas HS das mães e dos filhos, assim como na competência acadêmica dos filhos. Isso leva a crer que programas de intervenção para mães de crianças com TDAH são eficazes na promoção de práticas educativas positivas, de um desenvolvimento de qualidade para as crianças e uma melhor interação entre mãe-filho. Diferente do estudo de Fernandes, Luiz, Miyazaki e Marques Filho (2009), este observou uma melhora na competência acadêmica.

 

Reflexões críticas e síntese

Em geral, podemos constatar em publicações que pais que participam com mais frequência das atividades diárias dos filhos e que têm uma comunicação de qualidade com eles apresentam níveis mais elevados de habilidades sociais. Até mesmo pais de filhos com deficiência e, em consequência, seus filhos também são mais socialmente habilidosos e emitem com menos frequência condutas inadequadas. Crianças com deficiência de linguagem que apresentam um bom repertório de HS têm uma interação de mais qualidade com os pais. Apesar de ambos os pais participarem da vida dos filhos, as mães se destacam, em particular na comunicação com os filhos, participação nas atividades escolares e tarefas diárias, culturais e de lazer (Cia et al., 2006; Cia, Pereira, Del Prette & Del Prette 2006; Cia & Barham 2009; Cardozo & Soares, 2010; Bolsoni-Silva et al., 2010). Elas também se mostraram mais socialmente habilidosas que os pais em diversas categorias, tais como habilidades de comunicação (fazer perguntas, ouvir perguntas sobre sexo) e expressividade (expressar sentimentos positivos e opiniões), o que pode estar relacionado com essa maior participação delas na vida dos filhos, algo que poderia ser investigado mais a fundo (Bolsoni-Silva, 2003; Leme & Bolsoni-Silva, 2010a; Leme & Bolsoni-Silva, 2010b).

Crianças consideradas socialmente habilidosas ou sem indicativo de problemas de comportamento têm pais mais socialmente habilidosos e que emitem com mais frequência (em diversas situações) HSE-P, tais como cumprir promessas, concordar com o cônjuge, estabelecer limites, expressar sentimentos e discriminar comportamentos adequados. Já pais de crianças com indicação de problemas de comportamento internalizantes e externalizantes emitem com menos frequência HSE-P e usam de práticas educativas negativas e coercitivas, principalmente diante de comportamentos inadequados dos filhos. Apesar de pais de crianças socialmente habilidosas e crianças com problemas de comportamento usarem praticas negativas em algumas situações do cotidiano (por exemplo, quando a criança faz birra), o que diferencia ambos é a frequência com que o fazem, e também o fato de os pais de crianças com problemas de comportamento não reforçarem condutas adequadas dos filhos. Uma das questões levantadas pelos próprios autores foi a relação de causa e efeito entre o comportamento inadequado do filho e as práticas educativas negativas dos pais, levando a indagar se seria por conta do comportamento inadequado do filho que o pai utilizaria de práticas coercitivas ou as práticas dos pais que levam à conduta inadequada (Bolsoni-Silva, 2003; Leme & Bolsoni-Silva 2010a; Leme & Bolsoni-Silva, 2010b). Apesar de alguns autores procurarem analisar a influência do comportamento do filho sobre o pai, seria preciso uma análise mais detalhada das contingências para se saber o efeito que a conduta dos pais provoca nas HS dos filhos. Isso ajudaria na formulação de treinamentos mais eficazes para os filhos. Vimos também que grande parte das avaliações de comportamento e HS dos filhos foram realizadas por pais, professores ou ambos, as quais poderiam ser expandidas para colegas com quem o sujeito convive diariamente e até mesmo outros familiares. Na maior parte dos estudos, os próprios pais se avaliavam, não havendo oportunidade para que os filhos também o fizessem.

No que diz respeito ao âmbito familiar, alguns estudos (Boas & Bolsoni-Silva, 2010; Bolsoni-Silva & Marturano, 2010) não identificaram relação entre a separação dos pais e as HS dos filhos. Observou-se também que casais com filhos mais socialmente habilidosos avaliaram os cônjuges com características mais positivas quanto à comunicação, e comparando tipos de famílias, observaram diferença nas HS entre filhos de familiar nuclear e recasada, em que as crianças da família nuclear apresentaram maiores níveis de HS de amabilidade e autocontrole/civilidade. Porém, isso foi verificado apenas no âmbito familiar e não no escolar, em que as professoras avaliaram as crianças como socialmente habilidosas e academicamente competentes (Leme, Marturano & Fontaine, 2014; Bolsoni-Silva & Marturano, 2010). Dentre os relatos de pesquisa considerados, não foram observadas comparações das HS do sujeito em diferentes ambientes (escola, trabalho, família), e fica evidente, após análise dos resultados encontrados, que há diferença entre eles: na escola as crianças são avaliadas de uma forma e em casa de outra. Isso indica a pertinência de estudos posteriores sobre o impacto que o ambiente exerce sobre as HS do sujeito e sua manifestação

As práticas educativas negativas foram correlacionadas com problemas de comportamento dos filhos, em que pais com HS utilizam práticas parentais positivas com mais frequência e seus filhos têm menores índices de problemas comportamental (Marturano et al., 2010; Bolsoni-Silva & Loureiro, 2011). Observou-se também que famílias com estilo parental positivo são mais habilidosas socialmente e expressam mais sentimentos positivos que famílias com estilo parental negativo. Isso nos mostra que as HS de comunicação, expressão de afeto, concordância com o cônjuge e habilidades relacionadas à consistência são importantes no âmbito familiar e para a educação dos filhos (Gomide, Salvo, Pinheiro & Sabbag, 2005).

Constata-se também que pais vistos como mais rejeitadores têm filhos com menos autocontrole, mais problemas de comportamento internalizantes e baixa competência acadêmica e social, e que aqueles que não fazem uso de controle psicológico nas práticas educativas têm filhos mais sociáveis (Custodio & Cruz, 2008; Martins et al., 2014). Isso aponta o quão importante é ouvir os filhos e saber a percepção que eles têm dos pais e seu relacionamento.

Os treinamentos feitos com os pais, com o objetivo de influenciar os filhos com ou sem transtorno psiquiátrico (Pinheiro et al., 2006; Bolsoni-Silva et al., 2008; Bolsoni-Silva, Silveira & Marturano, 2008; Fernandes et al., 2009; Bolsoni-Silva & Borelli, 2012; Rocha, Del Prette & Del Prette, 2013), obtiveram melhoras nas HSE-P em geral e também em particular nas de comunicação (manter dialogo, dizer não), expressividade (agradecer, elogiar, expressar sentimentos) e consistência, habilidades que vimos anteriormente como importantes para a qualidade da relação entre eles. Já as crianças, com as mudanças dos pais, melhoraram os problemas de comportamento e competência social. Treinamentos em conjunto para pais e filhos (Salvo, Mazzarotto & Löhr, 2005; Coelho & Murta, 2007) também foram eficazes na melhora das HS de ambos, nos problemas de comportamento e no desempenho acadêmico dos filhos e diminuição das práticas negativas dos pais, em que muitas estavam com classificação clínica no início e passaram para não clínico no fim, demonstrando que ambos os métodos foram efetivos para as HS.

Avaliações feitas certo tempo depois dos treinamentos mostraram que, apesar dos ganhos obtidos nas HSE, houve também redução nos escores (Bolsoni-Silva et al., 2008; Bolsoni-Silva, Silveira & Marturano, 2008, Fernandes et al., 2009; Rocha, Del Prette & Del Prette, 2013), o que gera a questão do que aconteceu para isso ocorrer: se foi apenas por conta do aprendizado sobre HS e consequente aumento da autocrítica, ou se foram características da intervenção que levaram a isso, tais como tempo da intervenção e conteúdo proposto. Antes de começar uma intervenção, é importante avaliar a necessidade dos participantes para realizar um plano que possa ser eficaz; nenhum dos treinamentos fez uma pesquisa inicial sobre quais HS mais precisavam ser aprendidas; alguns realizaram adaptações durante ou antes das sessões para se adequarem à população, mas não um levantamento inicial. As intervenções realizadas com os pais e seus filhos eram feitas separadamente. Seria interessante que pais e filhos pudessem trabalhar em conjunto para melhorar suas HS e também seu relacionamento. Afinal, como visto, os pais são grandes exemplos para os filhos e ambas as partes seriam beneficiadas se houvesse ocasiões para trabalharem em conjunto.

Alguns estudos detectaram correlação entre competência acadêmica e HS (Coelho & Murta, 2007; Rocha, Del Prette & Del Prette, 2013), outro não (Fernandes et al., 2009), o que torna a situação inconclusiva, e nos leva a pensar se o tipo de escola frequentada pela criança foi levado em conta na hora da coleta dos dados, se algumas delas têm tutoria, ou então, que para algumas pessoas é necessária mais do que intervenção de HS para a melhora no desempenho acadêmico.

Observou-se que é preciso mais tempo de intervenção para consolidar as HS. Porém, a grande dificuldade que os pesquisadores vêm enfrentando é o frequente abandono dos treinamentos, o que dificulta a análise de sua eficácia (Bolsoni-Silva & Borelli, 2012).

Devido à escassez de medidas na área, nem todos os instrumentos utilizados nas pesquisas foram validados, o que frequentemente levou à construção de instrumentos próprios para as avaliações, tanto das pesquisas feitas quanto dos treinamentos, o que nos leva a questionar qual o impacto que isso gera nos resultados. Um artigo em particular (Bolsoni-Silva & Marturano, 2010) citou esse problema como a possível causa de os resultados encontrados não serem estatisticamente significativos.

Em síntese, a literatura brasileira na área tem evidências sólidas de que intervenções em grupo para habilidades sociais são eficazes e que o treinamento ajuda a melhorar o repertório social de pais e filhos, além de diminuir os problemas de comportamento destes. Pode-se concluir que pais com habilidades sociais influenciam na competência social e acadêmica dos filhos, no comportamento adequado deles e também que eles participam mais das atividades diárias dos filhos, o que favorece o envolvimento entre eles. Em termos de lacunas e caminhos abertos para desenvolvimentos futuros, apontamos a necessidade de estudos para verificar a influência dos pais sobre as HS dos filhos em outros contextos além do familiar, e também avaliar como outros cuidadores interferem nas HS dos filhos.

 

Referências

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Recebido em: 13/6/2018
Aprovado em: 27/2/2019

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