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Pesquisas e Práticas Psicossociais

versão On-line ISSN 1809-8908

Pesqui. prát. psicossociais vol.14 no.2 São João del-Rei abr./jun. 2019

 

As implicações dos contextos de vulnerabilidade social no desenvolvimento infantojuvenil: da família à assistência social

 

The implications of the contexts of social vulnerability in child and youth development: from the family to social assistance

 

Las implicaciones de los contextos de vulnerabilidad social en el desarrollo infanto juvenil: de la familia a la asistencia social

 

 

Aline Juliana Nunes da SilvaI; Rafaela Rocha da CostaII; Arles Monaliza Rodrigues NascimentoIII

IUnifavip/DeVry
IIUniversidade Federal da Paraíba
IIIUnifavip/DeVry

 

 


RESUMO

O presente artigo versa sobre as implicações dos contextos de vulnerabilidade social no desenvolvimento infantojuvenil, considerando o papel da família e das políticas de assistência social. Trata-se de uma pesquisa qualitativa, com dados coletados pela técnica da história oral de vida e submetidos à Análise de Conteúdo Temática. A amostra foi composta por sete jovens com idades variando entre 18 e 29 anos, sendo apenas um do sexo masculino. A violência doméstica e as relações afetivas fragilizadas foram identificadas como os principais contextos de vulnerabilidade vivenciados. Entre as estratégias de enfrentamento mais utilizadas estão a oportunidade de ir à escola e a rede mútua de ajuda. Os projetos de vida incluem conseguir emprego e concluir os estudos. Os serviços mais acessados pelos jovens e sua família foram o Programa Bolsa Família (PBF) e atividades de geração e renda, mas eles destacaram os atrasos e falta de informações sobre os serviços.

Palavras-chave: Desenvolvimento infantojuvenil. Vulnerabilidade social. Famílias. Assistência social.


ABSTRACT

This paper discusses the implications of contexts of social vulnerability in child and youth development, considering the role of the family and social assistance policies. This is a qualitative research, with data collected by the oral history technique and submitted to the Thematic Content Analysis. The sample consisted of seven young people aged between 18 and 29 years, with only one male. Domestic violence and fragile emotional relationships were identified as the main contexts of vulnerability experienced; Among the most used coping strategies are the opportunity to go to school and the mutual aid network; Life projects include getting jobs and finishing school; The services most accessed by the youth and their families were the Bolsa Família Program (BFP) and income-generating activities but highlighted the delays and lack of information about services.

Keywords: Child and youth development. Social vulnerability. Families. Social assistance.


RESUMEN

El presente trabajo trata de las implicaciones de los conceptos de vulnerabilidad social en el desarrollo infanto juvenil, considerando el papel de la familia y de las políticas de asistencia social. Se trata de una investigación cualitativa, con datos recolectados por la técnica de la historia oral de vida y sometidos al Análisis de Contenido Temático. La muestra fue compuesta por siete jóvenes con edades que varían entre 18 y 29 años, siendo solo uno de sexo masculino. La violencia doméstica y las relaciones afectivas fragilizadas fueron identificadas como los principales contextos de vulnerabilidad experimentados; Entre las estrategias de afrontamiento más utilizadas están la oportunidad de ir a la escuela y la red de ayuda mutua; Los proyectos de vida incluyen conseguir un empleo y concluir los estudios; Los servicios más solicitados por los jóvenes y sus familias fueron el Programa Bolsa Familia (PBF) y actividades de generación de renta, pero se destacaron los atrasos y la falta de información sobre los servicios.

Palabras clave: Desarrollo infanto juvenil. Vulnerabilidad social. Familias. Asistencia social.


 

 

Introdução

O presente artigo tem o objetivo de analisar as implicações dos contextos de vulnerabilidade social no desenvolvimento infantojuvenil, considerando o papel da família e das políticas de assistência social. Refletir sobre esse público tem sido cada vez mais necessário, pois as crianças e adolescentes são um dos segmentos sociais que mais exprimem o estado da cidadania e do tratamento dos direitos humanos no Brasil hoje, muito embora na prática não se consiga efetiva consolidação, talvez pelas resistências da própria implementação do ECA, como também pelos processos sociopolíticos e econômicos que sempre estiveram presentes, dificultando uma maior abrangência no país.

A Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990, que institui o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), reconhece a criança e o adolescente como sujeitos de direitos e não meros objetos de intervenção estatal. A doutrina da proteção integral evidencia que todos os cuidados protetivos e promotores de desenvolvimento devem ser efetivados, e em toda a sua potencialidade. O ECA (1990) considera que crianças e adolescentes são seres em desenvolvimento e, nesse sentido, são seres "por vir", não são iguais aos adultos desenvolvidos e devem ter consideradas essas condições.

Assim, o ECA surgiu como uma proposta de superar o caráter assistencialista e clientelista1das políticas e leis de proteção destinadas às crianças e adolescentes, como o antigo Código de Menores de 1927, que concebia esses sujeitos como a causa das problemáticas e não como aqueles que sofriam suas consequências. O ECA traz propostas voltadas à cidadania e com finalidade emancipatória das crianças, adolescentes e de todos os atores e segmentos ligados a eles, como escola, comunidade e família (Martins, 2004).

Martins (2004) ainda apresenta reflexões relacionadas ao fato de que há críticas tanto aos direitos que são garantidos pelo ECA como aos que não conseguem ser efetivados diante do caráter assistencialista ainda conservado nas intervenções. Yamamoto e Oliveira (2010) corroboram ao afirmar que a maioria das ações e programas, em particular da política de assistência social, têm um caráter emergencial, descontínuo e compensatório.

O programa mais expressivo na atualidade é o Programa Bolsa Família2 (PBF), pois ainda que se reconheça a contribuição de tais políticas para o alívio da situação de pobreza e desigualdades (Dias & Passos, 2014; Yamamoto & Oliveira, 2010) - necessário no quadro de pobreza brasileiro - para o aumento da frequência escolar e maior efetivação na agenda de acompanhamento da saúde (Dias & Passos, 2014), as intervenções continuam se materializando em práticas assistencialistas que não superam efetivamente as questões sociais.

O que se observa, não tão distante de nossa realidade, é que há uma vasta violação de direitos pessoais e sociais desse público, principalmente associado à exposição dos fatores de riscos ligados à vulnerabilidade em seu aspecto global, tanto as violações relacionadas à precariedade de renda quanto a fragilização de vínculos afetivos familiares e sociais, vulnerabilidades essas ligadas à desassistência das políticas públicas (Cronemberger & Teixeira, 2013).

Nessa perspectiva, a vulnerabilidade - além de um termo que designa fragilidade de direitos, como se originou juridicamente, ligada ao campo da prática de saúde - está relacionada ao conjunto de aspectos e razões que expõem o indivíduo a quaisquer danos à sua integridade, sendo esses aspectos não apenas individuais, mas também coletivos e contextuais (Ayres, França Júnior, Calazans & Saletti Filho, 2003).

A vulnerabilidade social - que em si é um problema que afeta todos os envolvidos no contexto -, quando se remete às crianças e adolescentes, tende a trazer um olhar preocupante por parte de alguns setores, devido à possível falta de perspectiva de vida que muitas vezes é gerada. Como afirma Sales (2007), a situação da infância e adolescência compreende uma questão social, logo está articulada com os demais desafios societários do país.

Considera-se, então, que há infinitas condições de risco proporcionadas pela vivência em vulnerabilidade social que afetam o desenvolvimento do referido público, fatores ligados à falta de alimentação, educação e relações familiares fragilizadas, contribuindo para o surgimento de problemáticas no campo físico, psíquico e/ou social e, portanto, a iminência de violação de seus direitos. Então, o ECA (1990) impõe à família, à sociedade e ao Estado o dever de respeitá-los com a mais absoluta prioridade, colocando-os a salvo de qualquer forma de discriminação ou opressão.

Costa (2011) ainda ressalta a centralidade na família no que se refere às políticas públicas como sendo o ponto de confluência das realidades da criança, do adolescente e demais membros familiares, independentemente das situações de conflitos e ambiguidades geradas ao plano de fundo da vulnerabilidade social. A própria Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, no art. 226, traz que a família é a base da sociedade (Brasil, 1988).

No entanto, de acordo com Stacciarini (2013), essa centralidade preconizada e estendida ao Estado não se sustenta, haja vista que o acesso aos direitos fundamentais das famílias em vulnerabilidade social não obedece a tal igualdade, refletindo as desigualdades sociais e de renda das famílias, o que afeta suas condições de sobrevivência.

Gomes e Pereira (2005) situam a condição socioeconômica como o fator que mais implica em relações familiares conflituosas, pois resulta em uma falta de perspectivas de futuro e de qualidade de vida, trazendo crises à família em condição de pobreza, o que muitas vezes precipita a ida de seus filhos para a rua e, na maioria das vezes, o abandono da escola, a fim de se inserir precocemente nas atividades laborais para ajudar no orçamento familiar.

Como toda instituição, a família tem características culturais; como núcleo afetivo e solidário, cada membro que o compõe é influenciado pelos contextos que são vivenciados no convívio. Sarti (2004) explica a constituição familiar como de ordem singular, em que cada família e cada pessoa constrói um conceito de família de acordo com sua vivência.

É importante destacar também a rede de ajuda mútua comum a quem vivencia o contexto de vulnerabilidade, que fala dos arranjos que os membros familiares buscam para convivência e sobrevivência, uma espécie de consciência coletiva sobre a necessidade de se ajudar. Como corrobora Fonseca (2005, p. 54), "As circunstâncias socioeconômicas, que são em grande parte alheias à vontade individual, são parte de qualquer modo de vida", obrigando as pessoas a se organizarem de forma diferente, que na prática, muitas vezes, diz do abdicar de si para cuidar do outro.

Destaca-se aqui que não é somente família em ordem consanguínea que contribui nesse processo, mas os diferentes arranjos e vínculos afetivos construídos com a comunidade em que vive (Fonseca, 2005). Pode-se dizer, então, que o espaço social a que uma família pertence se relaciona com a forma de existir e perceber o mundo dos indivíduos que ela compõe.

No caso de crianças e adolescentes, cujas necessidades mais específicas estão salvaguardadas no ECA, há uma peculiaridade no que diz respeito à proteção, visto que, mesmo considerados sujeitos de direitos jurídicos, a rigor não são protagonistas autônomos da luta que tem por inspiração a sua causa e condições, mas sim coordenadas por adultos: familiares, profissionais, militantes, políticos, dentre outros (Sales, 2007).

Assim, numa perspectiva universal, as políticas públicas se exprimem nessa direção de garantias dos direitos sociais que, por meio de ações elaboradas e executadas sob o apoio do setor público, representam respostas às demandas sociais decorrentes do desenvolvimento econômico e das interlocuções entre a sociedade e as gestões governamentais (Gonçalves, 2010).

Com a finalidade de prevenir ou minimizar os impactos dos contextos de vulnerabilidade, o Estado - com a Política Nacional de Assistência Social (Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome [MDS], 2005) - oferece redes e ações sociais voltadas para pessoas em situação de vulnerabilidade decorrente da condição de pobreza e/ou cujos direitos estejam ameaçados. Um dos tipos de proteção é a chamada Proteção Social Básica (PSB), que trabalha com o objetivo de prevenir situações de risco por meio do desenvolvimento de potencialidades e o fortalecimento de vínculos familiares e comunitários (Cronemberguer & Teixeira, 2015).

O principal serviço da PSB é o Serviço de Proteção e Atendimento Integral à Família (Paif), que - baseado na metodologia do trabalho social com famílias, no respeito aos diferentes arranjos familiares e ênfase no diálogo - busca combater todas as formas de violência, discriminação e estigmatização nas relações familiares. As ações têm o objetivo de oportunizar às famílias o aumento do conhecimento e acesso aos direitos e diferentes serviços (MDS, 2012).

O Paif é realizado exclusivamente pelos Centros de Referência de Assistência Social (Cras), uma rede pública de referência que atua para atingir os objetivos da PSB, bem como para a promoção do acesso a serviços, benefícios socioassistenciais, projetos e programas de transferência de renda para o enfrentamento às situações de risco e vulnerabilidade social (MDS, 2013).

Além do Paif, o Cras acompanha a oferta e execução do Programa de Erradicação do Trabalho infantil (Peti), que foi criado em 1996, sendo um programa de abrangência nacional, com caráter intersetorial, que envolve, além da transferência de renda, as ações socioeducativas para crianças e adolescentes que se encontram em situação de trabalho e o trabalho social com famílias, como orienta a Lei nº 12.435, de 6 de julho de 2011.

E ainda acompanha e oferta o Serviço de Convivência e Fortalecimento de Vínculos (SCFV), que deve ser realizado em grupos de acordo com o ciclo de vida, a fim de complementar o trabalho social com famílias e prevenir a ocorrência de situações de risco social. Busca estimular e orientar os usuários na construção e reconstrução de suas histórias e vivências individuais e coletivas, de modo a ampliar o sentimento de pertença e de identidade, fortalecendo os vínculos familiares, socialização, conhecimentos de direitos, deveres e potencialidades (MDS, 2013).

Laredo et al., 2017 apontaram algumas problemáticas observadas em relação a diversos aspectos do funcionamento dos SCFVs. Entre eles, destacou-se a escassez de recursos materiais, despreparo dos profissionais, os entraves de trabalhar em rede e, principalmente, a dificuldade de alcançar os objetivos propostos pelo serviço em questão

Embora todos esses serviços e redes socioassistenciais tenham avançado bastante desde a instituição da Seguridade Social (Previdência, Assistência Social e Saúde) na Constituição Federal de 1988, a Assistência Social cresceu pouco se comparada à Saúde Pública, que apesar de suas fragilidades vem desenvolvendo de forma contínua seus profissionais, ações e equipamentos (Yamamoto & Oliveira, 2010). Nas palavras dos autores (2010, p. 19, grifo dos autores), a Assistência Social pode ser compreendida "[...] como uma política 'pobre' voltada aos mais pobres".

Além disso, apesar do foco na família como objeto de intervenção, Takashima (2011) observou que as práticas das políticas sociais sempre foram fragilizadas, considerando a postura reprodutora dos discursos institucionais, que de certo modo é incompatível com a verdadeira realidade familiar e, principalmente, a discutível fraqueza moral em que a sociedade aponta a respeito da família em vulnerabilidades, tendo como qualificação dos conflitos as gerações de crimes em geral.

Assim, observa-se que há uma representatividade importante da família e da comunidade no desenvolvimento infantojuvenil, principalmente quando estes vivenciam situações de vulnerabilidade. No entanto, é preciso ter cuidado, pois essa importância tem se tornado sinônimo de responsabilização da família pelos contextos de vulnerabilidade social, principalmente por instituições que deveriam garantir à família e a todos os seus indivíduos, como sujeitos de direito, proteção social (Cronemberguer & Teixeira, 2015).

Desse modo, este estudo é direcionado para o reforço da proteção à família em vulnerabilidade, em particular para o público infantojuvenil, de modo a entender não só os parâmetros para constituição de políticas públicas e a dinâmica familiar diante dos riscos sociais vivenciados no contexto de vulnerabilidade, mas, principalmente, analisar os dados e relatos sobre as estratégias de enfrentamento das crianças e adolescentes, levando em consideração suas necessidades materiais e simbólicas. Que contribua, assim, para refletir sobre os modos de atuar com esse público, priorizando ações de acolhimento, a empatia e a ética, principais ferramentas para estabelecimento de vínculo.

Para tanto, foi delineado o objetivo geral de "analisar as implicações dos contextos de vulnerabilidade social no desenvolvimento infantojuvenil, considerando o papel da família e das políticas de assistência social". Para atingi-lo, foram trabalhados os seguintes objetivos específicos: caracterizar os principais contextos de vulnerabilidades sociais de crianças e adolescentes e suas famílias; apresentar as estratégias utilizadas pelo público infantojuvenil para enfrentar o contexto de vulnerabilidade social; conhecer os Projetos de Vida dos jovens que vivenciaram uma infância em contexto de vulnerabilidade social; e identificar as ações da Política de Assistência Social acessadas para minimizar e/ou eliminar as situações de vulnerabilidade das crianças e adolescentes.

Pesquisar tais aspectos, tendo a vivência como categoria de análise, faz-se importante porque abarca as condições de vida humana em particular, já que a vivência é sempre vivência de algo, são as ações contínuas que permeiam o processo da vida e a existência da pessoa, na realidade e em seus simbolismos. Assim, "[...] vivenciar é participar de uma realidade impactante, apreendida pelo sujeito sem julgamento a priori" (Toassa & Souza, 2010, p. 762), o que produz no sujeito características pessoais que são construídas no meio em que se encontra, negativas ou positivas, percebidas ou não.

Ao tentar conceituar vivência, Toassa e Souza (2010), a priori, falam de uma condição na qual se expressam mutantes relações dos processos psíquicos individuais, coletivos e contextuais em que o indivíduo constitui uma parte. Trazem a compreensão de que a vivência está relacionada com os contextos expostos, as condições socioculturais que assim influenciam "o bom ou mau" desenvolvimento das crianças e adolescentes até a vida adulta e suas escolhas para a vida.

Já os Projetos de Vida são definidos por Marcelino, Catão e Lima (2009) como a vontade de transformação do sujeito, numa dimensão da perspectiva de futuro que está presente desde a infância, assim compreendida sua categorização social. Tal vontade seria "um conjunto de desejos que se pretende realizar e como uma série de planos e etapas a serem vencidas rumo ao ideal que se tem com vistas à organização e à orientação do próprio futuro" (Marcelino, Catão, & Lima, 2009, p. 551).

Desse modo, os projetos de vida trazem elementos da vivência pessoal - subjetividade, relação familiar -, também no que diz respeito ao social - escola, comunidade, condição financeira -, resultando ao sujeito escolhas e oportunidades que são interpretadas como possíveis de serem concretizadas (Pessoa, Alberto, Amorim & Leite, 2016). Essa é uma analogia pertinente, pois a igualdade de oportunidades não é a mesma para os que têm melhores condições financeiras, de estudo e acesso a espaços que sejam geradores de perspectivas de futuro.

Marcelino, Catão e Lima (2009) evidenciam que o projeto de vida também está relacionado com a tríade "educação/trabalho/família", em que o desejo de conseguir ou alcançar aquilo que se projetou depende dos estudos e, muitas vezes, está relacionado à falta de maturidade e questões familiares; os jovens percebem-se como imaturos diante da responsabilidade de construir esses projetos.

Assim, tomando como categoria o desenvolvimento infantojuvenil, e mais precisamente os projetos de vida desse público inserido num contexto de vulnerabilidade social, é considerável que as vivências ali experienciadas influenciam em suas escolhas para a vida.

 

Método

Como estratégia metodológica, foi desenvolvida uma pesquisa qualitativa, que, de acordo com Minayo, Diniz e Gomes (2016), caracteriza-se como um método de análise descritivo capaz de produzir conhecimento, o que resulta em significações aprofundadas, mesmo por meio de dados categorizados.

O instrumento utilizado como forma de produção de conhecimento foi o método "história oral de vida", que parte do princípio do não controle do discurso do/a participante, que constrói seu relato sem que o/a pesquisador/a confirme a autenticidade dos fatos (Spindola & Santos, 2003). A coleta de dados foi conduzida pela frase norteadora: "Conte-me a história da sua infância a partir de um evento significativo em que você e sua família enfrentaram dificuldades".

Nessa modalidade de pesquisa, o ambiente é a fonte dos dados, assim como o/a pesquisador/a é a principal ferramenta, pois a construção de dados se dá com a comunicação direta com as perspectivas e significações da vida do/a participante. A pesquisa foi realizada em Caruaru/PE com sete jovens com mais de 18 anos que vivenciaram situações de vulnerabilidade social decorrente da situação de pobreza ou extrema pobreza quando crianças ou adolescentes.

O critério utilizado para a definição do tamanho da amostra foi o de saturação, que propõe ao/à pesquisador/a considerar a abrangência necessária para a compreensão do objeto de estudo, ou seja, o entendimento do/a pesquisador/a de saber o momento certo de parar ou continuar a pesquisa (Minayo, 2017). A análise dos dados foi realizada por meio da análise de conteúdo, que procura identificar emoções e tendências na linguagem do participante, com intenções que vão além do rigor matemático, pois busca conteúdos latentes e atribuídos de significados (Campos, 2004).

A modalidade utilizada foi a temática/categorial e partiu da leitura flutuante das transcrições, depois para o processo de categorização - identificando as iniciais das categorias iniciais (ou subcategorias) e relacionando-as às categorias finais - para, por fim, realizar a análise e discussão com base no estado da arte pesquisado. A análise respeitou os princípios da análise de conteúdo temática, a saber: a exaustividade, a exclusividade das subcategorias e a heterogeneidade entre as subcategorias e as respectivas categorias.

Esta pesquisa foi aprovada e está identificada no Comitê de Ética em Pesquisa por meio do Certificado de Apresentação para Apreciação Ética (CAAE) de nº 74150017.5.0000.5666. Foram respeitados os princípios de sigilo, privacidade e participação voluntária dos jovens que colaboraram com a pesquisa. Para tanto, destaca-se que os nomes apresentados ao longo do artigo são fictícios.

 

Resultados e discussões

A análise dos dados encontrados foi contextualizada a partir de uma amostra composta por sete participantes, com idades variando entre 18 e 29 anos, apenas um do sexo masculino, a maioria não concluiu o Ensino Médio, estava desempregada no momento das entrevistas e, de modo geral, foi possível perceber que os serviços e programas mais acessados estão vinculados à Política de Assistência Social, como os cursos do Cras e o PBF. O Quadro 1 permite uma visualização mais detalhada dos dados.

 

 

Os dados estão organizados de acordo com a história de vida de cada participante, ou seja, contextualizados a partir da vivência deles, pois a experiência de cada um(a) é singular (Toassa & Souza, 2010); assim, nem todos vivenciaram os mesmos contextos de vulnerabilidade, estratégias de enfrentamento na vivência em pobreza, acessos a políticas sociais, bem como tiveram os mesmos projetos de vidas.

 

I Principais contextos de vulnerabilidades sociais de crianças e adolescentes e suas famílias

A partir da análise dos dados, foi possível constatar que os principais contextos vivenciados por crianças e adolescentes diante da vulnerabilidade social de sua família referem-se à Violência doméstica (física), Relações afetivas fragilizadas (ausência dos pais), Alimentação precária e uso de drogas, como pode ser observado Quadro 2.

 

 

A partir dos relatos, foi possível observar que dos sete participantes cinco falaram em ter vivenciado contextos de violência verbal (Mari, Ana, Laís, Vera, Yuri), enquanto outros dois mencionaram as relações afetivas fragilizadas (Mari e Vera) como sendo os principais contextos vivenciados. Seguem alguns relatos para exemplificar.

Bom, eu tive uma infância um pouco turbulenta, não era nada fácil a convivência com minha família. É, meus pais brigavam muito, e isso era muito difícil para mim e meu irmãos, para conviver com tudo isso, né? A gente acabava sofrendo por eles dois passarem por aquela situação, de viver brigando [...]. Às vezes passava muito tempo desempregado e a gente tinha que depender da família, de outras pessoas, de vizinho, para ter o que comer dentro de casa, né? Isso acabava que mexendo com nós dois [...]. (Mari, sexo feminino, 22 anos)

Eu saí de casa, não, minha mãe me expulsou duas vezes, aí eu saí de casa na terceira vez e não voltei mais. [...] lá em casa era muita coisa, muita briga, muita discussão. E, eu sofri abuso dentro de casa, [...] por meu padrasto [...], só que minha mãe não sabe, [...] apanhava demais, todo dia eu apanhava, praticamente. [...] E no caso, moça, eu não tive infância, minha infância sempre foi assim... Aí ele mandou escolher entre ele e eu, e ela escolheu ele. Aí eu saí de casa. [...] foi muita verbal e física. Mas a verbal era pior. [...] dizia que iria vender a casa, que iria me abandonar, que iria levar meus irmãos, que iria embora e iria me deixar sozinha. (Vera, sexo feminino, 18 anos)

Nas falas analisadas, foi observado que contextos de pobreza na família, em sua maioria, trazem vivências interpretadas como sofridas e que assim podem comprometer o desenvolvimento integral das crianças e adolescentes. Tal inferência se deu a partir da frequência de relatos de brigas no seio familiar, ora causadas por motivos conjugais ou de desemprego dos pais, ora por fatores peculiares do contexto de vulnerabilidade social, como falta de alimentação e uso de drogas por algum membro familiar. As análises construídas corroboram com Gomes e Pereira (2005) e Cronemberger e Teixeira (2013), mostrando que os vínculos afetivos fragilizados e a renda precária são fatores que implicam em contextos de violação de direitos, principalmente pela falta de assistência das políticas públicas.

Foi possível notar uma similaridade sobre o que pontua Sarti (2004) a respeito dos conflitos gerados no contexto familiar diante da vulnerabilidade social na família, dados aos tantos cenários potencializados de violências e, em consequência, as relações afetivas fragilizadas caracterizadas pelos sujeitos da pesquisa e as dificuldades em lidar entre eles.

Percebe-se que cada vivência, mesmo que experimentada de forma diferente pelos pesquisados, foi vinculada a condições em que a dimensão psicológica foi afetada de alguma maneira na experiência, pois como articulam Toassa e Souza (2010), estas podem afetar os simbolismos que cada jovem dá para as realidades vividas por ele.

 

II Políticas acessadas pelos jovens

A partir da análise dos dados para identificar as políticas acessadas por jovens que vivenciaram uma infância em contexto de vulnerabilidade social de sua família, foi possível observar que entre sete participantes dois pontuaram não ter tido nenhuma assistência de programas sociais, e os que mencionaram falaram sobre: Programas Sociais (Atividades do Cras, PBF, Peti), Projetos Sociais (Organizações não Governamentais), como pode ser observado no Quadro 3.

 

 

A partir dos relatos, foi possível observar que dos sete participantes três caracterizaram as atividades de geração de trabalho e renda do Cras (Ana, Iara, Laís), dois o Programa Bolsa Família (Eva, Mari), um o Programa de Erradicação do Trabalho Infantil - Peti (Mari) e outros dois Projetos Sociais (Ana, Iara) como sendo as políticas assistenciais acessadas, enquanto dois mencionaram não ter tido nenhuma assistência (Mari e Vera) para eles ou sua família. Seguem alguns enunciados para exemplificar.

Eu não gosto de estudar. Eu venho para escola, porque eles pegam muito no meu pé. [...] Psicóloga do projeto,3principalmente, diz para mim não desistir, conseguir um emprego e ser alguém na vida. [...] Ah, fora a escola pela manhã eu fazia lá na casa das irmãs4[...] eu fazia aula de circo lá. [...] da polícia. [...] esse projeto é desde dois mil e onze, aí os policiais do batalhão que organizaram esse projeto. Aí começou a ter uns ensaios lá e comecei a ir. (Eva, sexo feminino, 19 anos)

A minha mãe de/a gente estou, a gente estudou um projeto que era do governo, chamado Peti, aí eu e meus irmãos estudávamos os três, aí a gente estudava no período da manhã e minha mãe recebia um valor que eu não lembro exatamente. E também, o bolsa família minha mãe, na época, sempre recebeu, aí na época que a gente estudava ela recebia. (Mari, sexo feminino, 22 anos)

Nessas falas, foi possível identificar que as políticas socioassistenciais mais acessadas foram compensatórias, além de significadas pelos entrevistados como de difícil aquisição o auxílio para a família. Em articulação com Martins (2004), Yamamoto e Oliveira (2010), podemos dizer que as políticas assistencialistas e emergenciais proporcionam melhorias focais nas condições de vida, mas não contribuem com a emancipação dos membros, pois dificulta a orientá-los sobre a autonomia e protagonismo de si em detrimento de seus direitos.

Também foi possível analisar que as ações de atividades de geração de renda viabilizadas pelo serviço pelo Cras se mostraram significativas para prevenir ou minimizar os impactos dos contextos de vulnerabilidade, sendo consideradas de relevância na prevenção de riscos sociais; quando oportunizadas, além do acesso a serviços geradores de renda, mostrou-se contribuir para um bom desenvolvimento da família e, consequentemente, emancipação dos sujeitos (Ministério do Desenvolvimento Social, 2013).

Aos entrevistados que não tiveram oportunidade de ser beneficiados com alguma política pública, os projetos sociais se mostraram importantes por proporcionar expectativas de futuro para as crianças e adolescentes, prevenindo a inserção em outros contextos de vulnerabilidade social, como as drogas, favorecendo o fortalecimento de vínculos familiares e comunitários.

 

III Estratégias utilizadas pelo público infantojuvenil para enfrentar o contexto de vulnerabilidade social

A partir da análise dos dados para descobrir quais as estratégias utilizadas pelo público infantojuvenil para enfrentar os contextos de vulnerabilidade social, foi possível identificar que entre sete participantes um pontuou não se importar, e os outros mencionaram: Estudar (frequentar a escola), Afetividade familiar (convivência com irmãos), Religiosidade, Atividades complementares (Atividades artísticas) e Outros (Acesso a mídias digitais), como pode ser observado Quadro 4.

 

 

Observando as categorias e relatos, foi possível analisar que dos sete participantes quatro falaram da escola (Eva, Ana, Iara, Vera), enquanto dois mencionaram a convivência com os irmãos (Iara e Vera), como sendo as estratégias mais utilizadas por eles no contexto de pobreza de suas famílias. Seguem alguns trechos para exemplificar.

[...] minha infância foi boa, com muitos irmãos, é, é isso [risos], e tem outras coisas que eu não me lembro bem [risos], mas foi boa, só tenho o que agradecer. [...] eu aproveitei muito com minhas irmãs. E na escola também. (Iara, sexo feminino, 22 anos)

Acho que um contexto que me influenciou muito, para mim chegar/cheguei... parte muito vindo da minha mãe, por ser justamente a mãe que ela é. [...] foi a presença dela. Independente dela ter/algumas horas ela não poder estar conosco, mas eu achei isso importante, porque ela me ensinou sobre os valores corretos da gente, hoje, muita coisa do que sou, vem dela. (Laís, sexo feminino, 22 anos)

[...] a minha alegria era o colégio, era o meu único momento de felicidade, era o colégio e a minha irmã [...]. (Vera, sexo feminino, 18 anos)

Meu tio, ele me ajudou muito, muito mesmo. Me ajuda até hoje, né?... me tirou da rua, me tirou das drogas, e hoje eu sou quem eu sou por causa dele. (Yuri, sexo masculino, 18 anos)

Como pode ser observado nos relatos, tanto a afetividade entre os familiares quanto a oportunidade de ir à escola apresenta-se como um lugar de "fuga" de crianças e adolescentes em vulnerabilidade social no âmbito familiar, o que sugere busca por apoio diante das situações que vivenciam. Atividades extras também se destacaram como de importância para não "lembrarem" do que vivem dentro de casa. Percebe-se também que as estratégias estão mais relacionadas à rede de ajuda mútua, explicada por Fonseca (2005), do que às políticas públicas, reforçando mais uma vez uma realidade mais marcada pela desassistência (Cronemberger & Teixeira, 2013) do que pela assistência e proteção.

 

IV Conhecendo os projetos de vida dos jovens que vivenciaram uma infância em contexto de vulnerabilidade social

A partir da análise dos dados para conhecer os projetos de vida dos jovens que vivenciaram uma infância em contexto de vulnerabilidade social, foi possível observar que entre sete participantes uma pontuou não ter perspectivas, e os que mencionaram falaram sobre: Trabalhar, Estudar (Terminar o Ensino Médio), ter Relacionamento afetivo estável, adquirir um Bem material, Vencer na vida, como pode ser observado no Quadro 5.

 

 

Pelos relatos, foi possível observar que dos sete participantes cinco pontuaram como conseguir um trabalho (Eva, Mari, Laís, Vera, Yuri) e quatro mencionaram terminar o Ensino Médio (Eva, Ana, Vera e Yuri) como sendo os projetos de vida mais desejados para alcançar no seu contexto de vida. Como exemplificado nos trechos a seguir.

Trabalhar, né? Terminar meus estudos, e fazer um curso de polícia. [...] eu faço parte de um projeto da polícia, aí o professor me falou que se eu fizer um curso, para mim vai ser mais fácil, já que eu participo do projeto. (Eva, sexo feminino, 19 anos)

Bom, eu sempre quis ter o meu trabalho, até porque eu sabia que a nossa vida era difícil, e ficar com meus pais e precisar das coisas, e eles não ter condições de me dar. Aí eu sempre quis estudar, trabalhar e conseguir minhas coisas, com meu suor. [...] Atualmente eu tô conseguindo pagar um curso com meu salário, então eu consigo estudar com meu trabalho, e consigo pagar o meu curso. (Mari, sexo feminino, 22 anos)

Bem, meu projeto agora é arrumar um emprego. Porque eu vejo assim, para ser bem sincera e realista, [...] não tenho oportunidades no mercado de trabalho. (Laís, sexo feminino, 22 anos)

Com base nas falas desses jovens, foi possível visualizar que os projetos de vida são desejados tanto pela perspectiva de conseguir um trabalho quanto por algo que deveria ser trajetória garantida por direito para eles, a de concluir os estudos regulares. No entanto, a expressão "trabalhar" foi mencionada em sua maioria como difícil de conseguir pelo fato de serem filhos de família pobres (dos sete, apenas dois mencionaram estar trabalhando), como também foi compreendida a tendência deles de vislumbrar seus projetos na possibilidade de um futuro melhor a partir da realidade mais próxima de ser alcançada: terminar os estudos - o que se relaciona com o que foi identificado no tópico sobre as estratégias utilizadas para enfrentar os contextos de vulnerabilidade social, ou seja, estudar foi a estratégia e continua fazendo parte dos projetos de vidas desses jovens.

Em consonância com Marcelino, Catão e Lima (2009), os projetos se mostraram desejados de acordo com seus contextos, pensados primeiramente numa possibilidade de concluir os estudos, para assim conseguirem um trabalho e constituírem uma família. No entanto, quando esses projetos apresentaram dificuldades de realização, foram gerados sentimentos de incapacidade, mostrando-se visíveis as desigualdades evidenciadas nos contextos de pobreza e da consciência dependente da categorização social que se percebem.

Assim, o projeto de vida desses jovens, de modo geral, é pensado e construído a partir das condições concretas vivenciadas, pois nas falas expressaram o que é ideal e o que é real, entre o que é possível e o que é impossível de ser realizado a partir de seus contextos de vida (Pessoa et al., 2016).

 

Considerações finais

O presente estudo objetivou analisar e compreender quais os contextos e significações que crianças e adolescentes dão à sua vivência em pobreza com sua família. Por meio do delineamento da pesquisa de campo, mostraram-se significativas particularidades frente ao que influencia e é favorável no desenvolvimento nesses contextos.

Ao analisar os relatos, foi possível observar que o público pesquisado se mostrou "irracionalmente" indiferente com sua categoria social ou composição familiar, mas deu importância a com quem convivem e como os tratam, ficando evidente o significado que o afeto na família traz nas significações nos sentimentos subjetivos e projetos de vida deles, pois particularmente mostraram contribuir nas expectativas e nas escolhas da vida de cada um.

A questão da pobreza em si mostrou-se como fator estressor e motivador de conflitos, mas não de fonte esgotável da afetividade entre os membros familiares, o que propicia visualizar a importância de potencializar esse fator nas intervenções e no trabalho social com as famílias, em detrimento do público infantojuvenil.

Com relação à utilização dos serviços socioassistenciais, por meio das entrevistas analisadas foram pontuados discursos de insatisfação com o serviço do Cras de referência, pois nas conversas após a entrevista gravada alguns entrevistados falaram sobre as dificuldades de acesso, como a busca pelo cadastramento do PBF ou pedido de ajuda por algum direito violado, sendo a acolhida sua ou da família frustrante, e que de certa maneira os restringia de ir em busca dos direitos por medo de ter suas informações violadas, apontando que ao atendê-los, estigmatizavam suas condições de vida, ficando evidente o desejo de inclusão e tal dificuldade encontrada.

Ainda sobre as políticas acessadas, foi visto que os acessos ao serviço do PBF foram significativos, programa que surgiu e se tornou uma política nacional que de certo modo vem contribuindo, ainda que de forma pontual. Tal política compensatória foca na renda e vem como forma de oferecer condições mínimas para a população mais necessitada. No entanto, tal política social, além de desconstruir a universalização ao impor condicionantes de acesso para o público em pobreza, não contribui com o pleno desenvolvimento da autonomia dos sujeitos.

Assim, podemos caracterizar o PBF como uma política modernizada, no que diz respeito à sua unificação; no entanto, pode ser entendido como conservador, pois não emite a mudança efetiva das condições de vida do público-alvo. Apesar de produzir alguns efeitos positivos, não permite efetiva saída da pobreza, só de caráter temporário.

Conclui-se, assim, que o ECA é um importante norteador de direitos das crianças e adolescentes, e consequentemente da família como um todo, já que tal Estatuto é incisivo no que tange à proteção e promoção de um desenvolvimento integral e envolve a família e o Estado para garanti-lo. Da mesma maneira, é relevante que todas as políticas sociais considerem essas relações afetivas familiares como potente elo nos conflitos e em sua prevenção, assim como focar nas potencialidades de cada jovem desse contexto.

Diante dos resultados, foram observadas e serão apontadas aqui algumas sugestões para superar as lacunas deixadas neste artigo: pesquisar e dialogar com a família dos participantes; usar estratégias de coleta de dados tanto individuais como coletivas por meio de grupos de discussões; realizar pesquisas com os trabalhadores do Cras para que sejam observadas suas práticas e percepções frente às famílias que atendem no território, oferecendo, desse modo, a oportunidade de uma análise macro para um melhor entendimento.

 

Referências

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Recebido em: 28/2/2018
Aprovado em: 21/5/2019

 

 

1 O caráter assistencialista e clientelista pode ser entendido como o que segue uma lógica de apadrinhamento, de favores e caridade, que não visa à emancipação dos sujeitos (Brasil, 2012).
2 Criado em 2003 para unificar o bolsa-escola, o auxílio-gás e o cartão-alimentação, atua como programa de transferência direta de renda com condicionantes. Para mais informações, ver sítio http://mds.gov.br/assuntos/bolsa-familia/gestao-do-programa/condicionalidades
3 Expressão utilizada para caracterizar o nome da psicóloga do projeto social mencionado na entrevista, do qual a entrevistada participa.
4 Organização não Governamental (ONG) do bairro em que a entrevistada reside.

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