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Pesquisas e Práticas Psicossociais

versión On-line ISSN 1809-8908

Pesqui. prát. psicossociais vol.15 no.1 São João del-Rei ene./mar. 2020

 

Abordagens conceituais da vulnerabilidade no âmbito da saúde e assistência social

 

Conceptual approaches to vulnerability in health and social care

 

Enfoques conceptuales de la vulnerabilidad en el ámbito de la salud y la asistencia socia

 

 

Magda DimensteinI; Maurício Cirilo NetoII

IProfessora titular do Departamento de Psicologia da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN). Doutora em Saúde Mental
IIMestre em Psicologia pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN)

 

 


RESUMO

Este estudo objetiva destacar as principais abordagens em torno da categoria vulnerabilidade e problematizar a maneira como vêm sendo utilizadas no campo da saúde e assistência social. Realizou-se revisão não sistemática da literatura e posterior análise discursiva das publicações selecionadas. O conceito de vulnerabilidade na saúde coletiva é usado no intuito de superar os limites da categoria risco, evidenciando a determinação social do processo saúde-doença-cuidado. No campo das ciências humanas e sociais, é associado a grupos privados de recursos materiais e simbólicos e/ou em situação de marginalização, exclusão e insegurança social. Tanto no âmbito da saúde quanto da assistência social, observou-se que há uma tendência ao reducionismo, naturalização e individualização dos processos de vulnerabilização das populações.

Palavras-chave: Vulnerabilidade. Políticas públicas. Saúde. Assistência social.


ABSTRACT

This study aims to highlight the main approaches around the vulnerability category and to problematize the way they have been used in the field of health and social assistance. A non-systematic review of the literature and subsequent discursive analysis of the selected publications were carried out. The concept of vulnerability in collective health is used in order to overcome the limits of the risk category, evidencing the social determination of the health-disease-care process. In the field of human and social sciences it is associated with private groups of material and symbolic resources and/or in situations of marginalization, exclusion and social insecurity. In terms of both health and social assistance, it has been observed that there is a tendency towards reductionism, naturalization and individualization of the processes of vulnerability of populations.

Keywords: Vulnerability. Public policies. Health. Social assistance.


RESUMEN

Este estudio tiene como objetivo destacar los principales abordajes en torno a la categoría vulnerabilidad y problematizar la manera en que vienen siendo utilizadas en el campo de la salud y asistencia social. Se realizó una revisión no sistemática de la literatura y posterior análisis discursivo de las publicaciones seleccionadas. El concepto de vulnerabilidad en la salud colectiva es usado con el fin de superar los límites de la categoría de riesgo, evidenciando la determinación social del proceso salud-enfermedad-cuidado. En el campo de las ciencias humanas y sociales se asocia a grupos privados de recursos materiales y simbólicos y/o en situación de marginación, exclusión e inseguridad social. Tanto en el ámbito de la salud y de la asistencia social, se observó que existe una tendencia al reduccionismo, naturalización e individualización de los procesos de vulnerabilidad de las poblaciones.

Palabras clave: Vulnerabilidad. Políticas públicas. Salud. Asistencia social.


 

 

Introdução

A categoria vulnerabilidade emergiu em diferentes campos disciplinares, passando a ser amplamente utilizada por órgãos internacionais e governamentais para a análise do processo saúde-doença e sua relação com as condições de vida das populações. Figueiredo, Weihmüller, Vermelho e Araya (2017) apontam que a ideia de vulnerabilidade surgiu no campo jurídico como modo de reconhecer situações de fragilidade que atingem certas populações, principalmente no que concerne à não garantia de seus direitos civis, políticos e sociais. Já para Monteiro (2011), a categoria vulnerabilidade apareceu em um contexto de esgotamento da matriz analítica da pobreza enquanto restrita às questões econômicas e de renda.

No campo da saúde coletiva, especificamente, o combate à epidemia de HIV/Aids propiciou o destaque do conceito de vulnerabilidade (Bertolozzi et al., 2009). Nos anos 1980, as práticas de combate e cuidado restritas aos "grupos de risco" não foram capazes de responder adequadamente ao avanço do agravo, principalmente quando se tratava de populações socialmente desfavorecidas, mulheres, negros e as residentes em territórios pobres (Silva, Maris Peres, Gonçalves Wolff & Azevedo Mazza, 2014). No contexto da pandemia, a ideia de vulnerabilidade permitiu a compreensão do processo saúde-doença em direção às dimensões macro e microestruturais. Nesse sentido, ampliou-se, consoante Ayres (2014), o espaço político dos atores sociais anteriormente estigmatizados e renovou as práticas de saúde considerando os direitos humanos das populações.

Nos diversos campos de saberes, vulnerabilidade é uma noção em permanente construção nas ciências da vida, nas ciências naturais e sociais, com especial destaque na área da geografia, demografia, economia, saúde e bioética (Schumann & Moura, 2015). A marcante polissemia do conceito é apontada por Ayres (2014) como um dos desafios teóricos para os estudos sobre vulnerabilidade, no entanto, é um desafio que não pode ser entendido como um problema em si. Ao contrário, ele incita ao diálogo e à produção de novas ramificações conceituais, de modo que possa responder à delicada complexidade dos processos saúde-doença-cuidado das populações. Como apontam Martins, Tavanti e Spink (2016), mais do que o consenso, é preciso manter o debate, abarcando aproximações e dissensos de ordem epistemológicas, metodológicas, éticas e políticas. No âmbito dessa discussão, este texto apresenta as principais abordagens conceituais e versões presentes na literatura sobre vulnerabilidade e problematiza a maneira como vêm sendo utilizadas no campo da saúde pública e assistência social.

 

Aspectos metodológicos

Trata-se de um estudo teórico, ancorado na revisão não sistemática de literatura. O levantamento ocorreu entre o período de agosto de 2017 e fevereiro de 2018, como etapa de um projeto de pesquisa em desenvolvimento que tem como foco a integralidade da atenção em saúde mental em áreas de assentamentos rurais e comunidades quilombolas. Foram consultadas as seguintes bases de dados: Scientific Electronic Library Online (SciELO), Portal de Periódicos Eletrônicos de Psicologia (PePSIC) e Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde (Lilacs). Utilizou-se como descritores de busca a palavra "vulnerabilidade" e suas respectivas traduções em inglês e espanhol. Foram incluídos somente artigos com resumos e textos completos disponíveis com acesso gratuito e disponibilizados nos idiomas português, inglês ou espanhol. Para a constituição do banco de textos e análise dos artigos, privilegiou-se: a) estudos mais recentes; b) estudos de maior impacto na literatura e que são sempre referenciados; c) trabalhos de pesquisadores de maior destaque na temática e que são comumente citados nesses campos de discussão; d) estudos teóricos, tendo em vista o objetivo de problematizar as abordagens conceituais da vulnerabilidade no campo da saúde e da assistência social.

 

Do risco à vulnerabilidade: a emergência do conceito na saúde coletiva

Originária do campo epidemiológico, o conceito "fator de risco" busca identificar relações de causa-efeito entre eventos, apontando a probabilidade em termos matemáticos da ocorrência de determinado agravo em saúde (Gama, Campos & Ferrer, 2014). Para Bosi e Guerreiro (2016), o trabalho com probabilidades transforma os grupos, os sujeitos e questões de saúde em um conjunto de aspectos individuais e independentes, em detrimento da contextualização sociopolítica, econômica e cultural destes.

Tecendo severas críticas às abordagens de risco, Ayres e colaboradores (2003), em texto paradigmático sobre vulnerabilidade, criticam a política identitária atrelada ao conceito de risco. Segundo o autor, uma vez que o conceito de grupo de risco parte de determinados traços considerados inerentes aos sujeitos, algumas variáveis acoplam-se a eles e, ao serem reconhecidas como indutores do adoecimento, orienta práticas em saúde focalizadas, restritas aos grupos ditos de risco e, portanto, discriminatórias.

Diante de tais críticas, surgiram as estratégias de redução de risco, a partir do conceito-chave "comportamento de risco", como tentativa de dirimir o estigma associado aos grupos até então considerados de risco (Bosi & Guerreiro, 2016). No entanto, o enfoque nos comportamentos individuais apenas camuflou a estigmatização e a intolerância em relação a esses grupos. O discurso em torno do envolvimento individual, nos moldes da prevenção e promoção em saúde, serviu para reforçar as estratégias biopolíticas e disciplinares de poder, ao transferir unicamente a responsabilidade do estado de saúde sobre os indivíduos, culpabilizando tais sujeitos pelas situações de adoecimento (Foucault, 2008; 2009; 2014). Essa perspectiva produziu uma explosão de enunciados discursivos, entre eles "estilo de vida", noção vastamente utilizada, que trata do modo como os sujeitos devem agir em seu cotidiano de vida em termos de atitudes socialmente consideradas saudáveis.

No contexto da pandemia de HIV/Aids nos anos 1990, os estudos sobre vulnerabilidade emergem questionando as abordagens de risco e o cuidado em saúde orientado por esse marco conceitual. Ayres e colaboradores (2003) salientam a importância dos estudos de risco epidemiológico no que se refere à distribuição dos problemas de saúde em termos populacionais, mas levantam severas críticas ao que consideram como limites dessa abordagem. Nessa direção, para Figueiredo e colaboradores (2017), a noção de risco passa a ser progressivamente compreendida como uma situação complexa, deslocando o foco do problema dos grupos e indivíduos para os contextos sociais e ambientais produtores de saúde ou adoecimento. Sobre essa transmutação conceitual, risco passa a ser entendido como a possibilidade de sofrer danos, e não meramente uma probabilidade casuística.

Com o objetivo de sintetizar o conceito, Ayres e colaboradores (2003, p. 23) consideram a vulnerabilidade como a "chance de exposição das pessoas ao adoecimento", decorrente de um conjunto de componentes individuais, sociais e programáticos, bem como a maior ou menor disponibilidade de recursos protetivos a essas situações. Reforçando essa perspectiva, para Bosi e Guerreiro (2016), a marca da vulnerabilidade é a complexidade, a partir da qual uma série de fatores interdependentes e interatuantes, mesclados e ativos, em cada grupo ou indivíduo, processam saúde ou doença. Além disso, evidencia a dinamicidade e singularidade do processo de vulnerabilização, pois esta pode ser experienciada de modo diferenciado entre os diferentes sujeitos e grupos, de acordo com os contextos históricos e histórias de vida.

Outros autores corroboram com essa perspectiva da complexidade da vulnerabilidade. Indicam uma gama de aspectos envolvidos na produção da vulnerabilidade, muitos dos quais estão fora do alcance decisório individual, como alimentação deficiente, analfabetismo ou escolarização precoce, carência de renda, profunda desigualdade social, desemprego, condições de trabalho insalubres, condições sanitárias inadequadas, situações de violência, bem como as relações de gênero, raciais e de poder que perpassam a organização social e as experiências de vida. Somando-se a isso, destaca-se a minimização da presença do Estado nos últimos anos na garantia de políticas públicas de bem-estar social, no campo e na cidade, propiciando situações de desproteção e desamparo social, que impacta diretamente no processo saúde-doença-cuidado das populações (Barra, Lanzoni, Maliska, Sebold & Meirelles, 2010; Silva, Maris Peres, Gonçalves Wolff & Azevedo Mazza, 2014).

Fica evidente na literatura pesquisada a multidimensionalidade da vulnerabilidade, referenciada em três níveis de determinação ou de composição. O componente individual refere-se ao grau e qualidade das informações que uma pessoa tem sobre uma questão de saúde; à capacidade de elaborar e incorporar o conhecimento em seu cotidiano e transformar seus modos de vida a partir de práticas protetivas e preventivas no seu contexto social. Já o componente social da vulnerabilidade trata da obtenção dessas informações, do poder de transformá-las em práticas de saúde, que dependem do tipo de acesso aos meios de comunicação, escolarização, da disponibilidade de recursos, até a possibilidade de influenciar nas decisões políticas e institucionais. Por fim, o componente programático está relacionado aos recursos sociais e políticas públicas ligadas a determinado problema. Refere-se ao planejamento necessário, à capacidade disponível em termos de recursos humanos e materiais necessários, às estratégias de gestão e de avaliação dos serviços e ações desenvolvidas. Ademais, refere-se ao vínculo estabelecido entre serviço e o território de abrangência, até aos recursos sociais existentes na área e às práticas de cuidado em saúde, indo da promoção à reabilitação (Ayres et al., 2003; Barra et al., 2010; Bertolozzi et al., 2009; Sevalho, 2017).

A vulnerabilidade pode ser compreendida, portanto, como o entrelaçamento de condições materiais, políticas, culturais, jurídicas e subjetivas, que direcionam os saberes e práticas em saúde. É uma abordagem conceitual que permite análises multidimensionais, tornando-se um conceito mediador de ações e mecanismos de enfrentamento às condições sociais adversas, orientando intervenções políticas a partir das múltiplas relações entre os elementos existentes nos diferentes contextos sociais (Sevalho, 2017).

No vasto campo de estudos sobre as "vulnerabilidades", encontram-se outros repertórios conceituais que focam mais precisamente a vulnerabilidade social, materializada principalmente nas discussões sobre políticas e programas sociais. Nesse campo, Ayres (2014) compreende que o foco da vulnerabilidade passa a ser menos as identidades pessoais/sociais do que as relações sociais que alicerçam as situações de vulnerabilidade e de negligência ou violação de direitos humanos, como as relações de gênero, raciais, geracionais, socioeconômicas, etc.

 

Vulnerabilidade e as relações ambiente/saúde: perspectivas interdisciplinares

As discussões advindas da geografia, da justiça ambiental e dos estudos sobre ambiente-saúde acerca da vulnerabilidade apresentam uma perspectiva mais integradora em termos de análise das condições de vida e saúde das populações. Freitas e Cunha (2013), ao fazerem uma análise dos estudos sobre vulnerabilidade no Brasil e em Portugal, observaram a maior presença do termo vulnerabilidade socioambiental em terras brasileiras, o que revela a tentativa de realizar uma abordagem interdisciplinar, decorrente da complexidade da interação de dimensões naturais, sociais, econômicas e culturais.

Os problemas ambientais são sempre, em alguma medida, socioambientais e, em função disso, abarcam simultaneamente diversos níveis de complexidade. Todavia, o reconhecimento da complexidade da relação entre saúde e ambiente não significa uma leitura crítica sobre a produção social da saúde e da doença. Sevalho (2017) indica que as abordagens sobre esse prisma de análise, frequentemente, não explicitam os processos sociopolíticos envolvidos e, sobretudo, tendem a ocultar a condição de sujeitos coletivos portadores de direito e alvos de processos de vulnerabilização. Nessa perspectiva crítica, para Araújo e Oliveira (2017, p. 282), a vulnerabilidade socioambiental resulta, então, "de estruturas socioeconômicas que produzem, simultaneamente, condições de vida precárias e ambientes deteriorados". Por conseguinte, a superação desse processo envolve concomitantemente a produção de fraturas na dinâmica de desenvolvimento socioeconômico e proteção socioambiental.

A revisão das abordagens socioambientais tem se dado principalmente na América Latina, fazendo o contraponto aos determinismos natural e ambientalista, que de maneira descontextualizada ignorava a dimensão social da vulnerabilidade. Influenciados pela economia política, verificou-se que os atingidos pelos desastres naturais e ambientais eram comumente os desfavorecidos socialmente, populações excluídas em países com histórico de desigualdade socioespacial, revelando a operação dos processos de vulnerabilização (Acselrad, 2013; Araújo & Oliveira, 2017; Freitas & Cunha, 2013; Porto, 2011).

Os trabalhos sob essa óptica fazem uso de diferentes escalas de análise, indo além das tradicionais escalas global-local, como escalas em nível de países, regiões ou até municípios (Araújo & Oliveira, 2017). Nesse sentido, a utilização de diferentes escalas de análise de vulnerabilidade, como global, regional e local, permite compreender a macrodeterminação dos processos de vulnerabilização, bem como identificar as divergências no que se refere aos pontos de resistência em escalas regional e local. Outrossim, as variáveis selecionadas e as metodologias de tratamento de dados são múltiplas e constantemente fazem recortes diante da diversidade de variáveis. Entre as dificuldades apontadas pelos estudos que tratam dos índices sintéticos de vulnerabilidade, está ade manejar um único modelo de análise em territórios singulares e complexos (Amendola, Alvarenga, Latorre & Oliveira, 2017; Araújo & Oliveira, 2017; Schumann & Moura, 2015). Em vista disso, não se deveria insistir na extenuante tentativa de criar modelos únicos e universais, mas multiplicar esses índices analíticos de modo que se adaptem à diversidade de territórios.

O ponto de partida para a análise crítica das condições de vulnerabilidade deve ser o reconhecimento do contexto em que se insere o grupo social envolvido, em termos socioeconômicos, políticos, ambientais e culturais. Esse é o primeiro passo para que a análise das vulnerabilidades produza práticas de saúde eficazes, em termos éticos e políticos e de enfrentamento aos complexos processos de vulnerabilização.

 

Vulnerabilidade e as políticas de assistência social

As discussões de cunho sociológico, principalmente no que se refere ao debate sobre as respostas dadas referente à chamada questão social, por meio das políticas sociais, constituem outro território de emergência para os estudos sobre vulnerabilidade. Nesse campo, como salienta Romagnoli (2015a; 2015b), a noção de risco também se faz onipresente, sendo invariavelmente abordada em conjunto com a concepção de vulnerabilidade.

Ao analisar as políticas de assistência social brasileira, Santos, Roesch e Cruz (2014) afirmam que não há uma distinção entre as noções de risco e vulnerabilidade, mas uma relação de complementaridade. Para esses autores, a vulnerabilidade aparece como uma condição das pessoas e famílias relacionadas à inserção e estabilidade no mercado de trabalho, aos recursos sociais e ao acesso e qualidade dos serviços públicos disponíveis. Nesse sentido, as situações de vulnerabilidade quando não prevenidas tornam-se situações de risco.

Por sua vez, o Banco Mundial, em seus receituários políticos, concebe o risco como uma variedade de situações que impactam a vida de indivíduos, famílias, grupos e comunidades. Para o organismo, os riscos podem ser naturais, de saúde - relacionados aos ciclos de vida, sociais, econômicos, ambientais e políticos. A compreensão do risco é revestida de um caráter subjetivo, ou seja, os indivíduos compreendem de modo diferenciado as condições de vulnerabilidade, o que vai limitar ou potencializar a capacidade de enfrentá-lo. Em vista disso, diante de uma mesma condição objetiva de vulnerabilidade, os indivíduos correm maior ou menor risco, a depender dos sentidos construídos, de enfrentar ou decair diante de tais eventos (Romagnoli, 2015a; 2015b).

Nesse campo de reflexão teórica, a categoria vulnerabilidade é alvo de muitas críticas no que concerne ao projeto político ao qual está vinculado. Critica-se a sua falta de alcance no enfrentamento das contradições sociais, servindo de suporte para a histórica manipulação das populações que vivem à margem em nosso sistema social (Shimoguiri & Rosa, 2017). Na óptica de Monteiro (2011), é uma noção alternativa ao conceito de exclusão social, o qual é amplamente utilizado na intervenção dos Estados e na proposição de políticas sociais seletistas, indo na contramão da universalidade dos direitos sociais. Assim, vulnerabilidade é uma noção que não problematiza a desigualdade social como produtora de tais vulnerabilidades e riscos, não desvela as tensões históricas que marcam a sociedade brasileira, a qual se inseriu de modo diferenciado no sistema capitalístico mundial (Monteiro, 2011). A construção de políticas sociais nesse marco conceitual precisa ser criticamente repensada pelos trabalhadores do campo para que sua atuação não seja mera mantenedora das relações socioeconômicas desiguais.

 

Usos e efeitos do conceito de vulnerabilidade na saúde e assistência social

O discurso da vulnerabilidade produz normas sociais e concepções determinadas de saúde e de vida; leis voltadas à proteção dos grupos sociais; práticas e intervenções de saúde e proteção social; e, por fim, subjetividades, ou seja, os modos como os sujeitos se compreendem, vivem e se relacionam uns com os outros. A emergência da categoria vulnerabilidade ocorre em determinadas condições sociais e culturais e está inserida em uma teia de relações de saber-poder. Colocar em xeque os efeitos dos usos da noção de vulnerabilidade significa analisar as forças em jogo nos processos de vulnerabilização dos grupos sociais. Nesse sentido, a quem interessa o discurso da vulnerabilidade? Em que condições alguém ocupa o lugar de "revelar" a vulnerabilidade do outro? Por que uma população é considerada vulnerável? Em que medida pode-se enfrentar os processos de vulnerabilização das populações?

No tocante às reflexões sobre as situações de pobreza, de miséria e de sofrimento psicossocial, Gama, Campos e Ferrer (2014) indicam que é comum as inferências de que essas situações são as produtoras de vulnerabilidade social ou individual, e não o contrário. Esse efeito, a inversão dos processos de vulnerabilização, mascara as condições sociais e de saúde das populações e mantém intacta as relações sociais, econômicas e políticas que sustentam as desigualdades. Bellenzani, Malfitani e Valli (2005) exemplificam que sujeitos em condições de máxima fragilização social, como crianças e adolescentes em situação de rua, vivenciam processos de subjetivação em que o sofrimento psicossocial é depreendido como transtornos de conduta, agressividade generalizada, hiperatividade, uso abusivo de substâncias psicoativas, invisibilizando as histórias de vida marcadas pela pobreza e ineficiência dos sistemas de proteção social, tais como a educação, saúde e assistência social. Além disso, para os autores citados, é recorrente o entendimento de que seriam tais questões as causas para a condição de vulnerabilidade em que vivem.

A indagação sobre a quem interessa o discurso da vulnerabilidade nos remete àquilo que é valorado como ideal, adequado ou normal, uma vez que a normalização da sociedade tem como uma de suas consequências a vulnerabilização das populações (Foucault, 2009). Vale sublinhar que não se está questionando as frágeis condições materiais das populações, mas as múltiplas formas de viver que invariavelmente são lidas como vulneráveis. Isso nos leva a indagar se as próprias políticas de saúde e assistência social são vetores de vulnerabilização ao tomar determinadas de formas de viver como padrão e referência. Por outro lado, é paradoxal, pois é a não adequação a esses padrões que viabilizam a proteção social. Nesse sentido, Santos e Heckert (2017) pontuam que nos serviços do Serviço Único de Assistência Social (Suas) é preciso enquadrar as pessoas como "vulneráveis" para que elas recebam benefícios, destacando como os conceitos de risco e vulnerabilidade têm operado para a regulamentação da vida das pessoas. Dessa maneira, Demetri (2018, p. 143) afirma que "as políticas públicas, mesmo bem intencionadas, ganham um significado especialmente biopolítico quando delimitam determinadas populações 'vulneráveis' como aquelas que requerem maior cuidado e controle por parte do Estado".

Conforme a analítica do poder foucaultiana (Foucault, 2008; 2009; 2014), em toda relação de poder há resistência. Essa perspectiva faz pensar em que medida os grupos sociais constroem estratégias que constituem focos de objeção aos processos sociais que produzem precárias condições de vida e de subjetivação capitalísticos que massificam as existências. Nesse sentido, vulnerabilizar-se pode ser também resistir à serialização ou homogeneização dos modos de vida. As populações das florestas, das águas e dos campos, por exemplo, frequentemente são consideradas vulneráveis. Primeiro, na dimensão macroeconômica e social, pela associação entre condições de vida no campo, pobreza e vulnerabilidade. Segundo, na dimensão psicossocial e cultural, na medida em que apresentam modos de vida, arranjos familiares, concepções de saúde e trabalho, formas de sociabilidade e práticas de saúde diversos dos modelos instituídos e padronizados socialmente. As múltiplas formas de viver e trabalhar são analisados como vulneráveis por não reproduzir as normativas sociais encontradas em contextos urbanizados. As práticas de saúde consideradas informais, uma vez que não é produto dos saberes-poderes biomédicos, podem ser ignoradas quando não rechaçadas no cotidiano do cuidado desenvolvido pelas equipes (Cirilo Neto & Dimenstein, 2019; Dimenstein et al., 2017; Dimenstein et al., 2016a).

Nesse sentido, Romagnoli (2015b) encontra efeitos nefastos na desqualificação de certos modelos e formas de funcionamento familiar. Isso ocorre devido ao desconhecimento das diversas formas de funcionamento das famílias das camadas sociais populares e de contextos rurais, por exemplo. As políticas de saúde e assistência social, a partir da institucionalização do Serviço Único de Saúde (SUS) e do Suas, passaram a ser orientadas por modelos mais complexos e diversificados de família. Entretanto, o padrão hegemônico de família nuclear é uma poderosa linha de força que continua orientando uma atuação profissional normativa e patologizante em relação aos diversos arranjos familiares existentes. A concepção de "família desestruturada" ainda é amplamente utilizada, induzindo à culpabilização das famílias pelas suas condições e modos de funcionamento, estabelecendo hierarquias de saber e poder entre os técnicos e a população e criando efeitos de medicalização das heterogeneidades nos modos de vida.

No âmbito das práticas em saúde, a categoria vulnerabilidade separa, de um lado, os não vulneráveis, representados pelo Estado, seus operadores e os profissionais de saúde; e os vulneráveis, os usuários que demandam cuidados em saúde, de outro lado. Mas, como alguém pode determinar quem é vulnerável? A naturalização do sujeito vulnerável ocorre nas malhas de saberes e poderes que regulam as relações sociais. Adolescentes gestantes são sujeitos "naturalmente" consideradas vulneráveis na óptica das equipes de saúde da família, sujeitos usuários de álcool e outras drogas também são assim considerados sob o olhar dos profissionais. Demarca-se, de antemão, uma relação de saber-poder, em que os primeiros conhecem, calculam, esquadrinham e monitoram a vida dos outros, pois como populações ditas vulneráveis, necessitam de ações e intervenções dos especialistas, mesmo que ainda não se tenha manifestado demandas em saúde. A literatura traz uma crítica acerca desses processos e alerta para o fato de que, muitas vezes, o que orienta o cuidado não é a promoção da saúde, mas o caráter essencialmente vulnerável da população, que requer ações de prevenção ou ajuste de condutas julgadas inadequadas e a maximização dos comportamentos normalizados.

Outro efeito que perpassa as práticas de saúde é a individualização da vulnerabilidade. Como discutido anteriormente, a noção de vulnerabilidade contempla diversos níveis de análise, do indivíduo à sociedade. Realizando uma análise crítica sobre a contribuição do conceito para a prática do enfermeiro, Silva e colaboradores (2014) indicam que a enfermagem vem utilizando conceitos que focam a dimensão individual, o que contribui para a prática clínica com famílias e a implementação de intervenções que subsidiam o enfrentamento de dificuldades em saúde. Sem embargo, é crucial abordar os níveis macrossociais, o que introduz uma atuação crítica no processo cuidador, pois permite compreender a produção dos fenômenos sociais e de saúde.

Sob o mesmo ponto de vista, a vulnerabilidade compõe uma equação delicada, em que estão envolvidas questões individuais, institucionais e sociais. Embora uma mudança individual não tenha força suficiente para operar mudanças em processos de vulnerabilização mais amplos, é inescusável atentar para as experiências singulares, produzidas nos interstícios dos cotidianos de vida, o que produz sentidos variados para as mesmas condições de vida. Ayres (2014) corrobora ao apontar que o caráter individual deve ser entendido como intersubjetividade, ou seja, como identidade pessoal permanentemente reconstruída nas interações entre eu-outro. Reside aí a debilidade em pensar a singularidade dos aspectos individuais da vulnerabilidade não se levando em conta o contexto social, histórico e espacial no qual os sujeitos estão imersos.

A discussão em torno da singularização da vulnerabilidade também é referenciada por Bosi e Guerreiro (2016). As autoras indicam que todos somos vulneráveis em algum momento e em alguma medida, e as pessoas podem experienciar condições de vulnerabilidades muito diferentes, mesmo vivenciando as mesmas condições sociais. Por esse ângulo, há o entrelaçamento de questões de gênero, raça/etnia, sexualidade, geracionais, aspectos culturais e econômicos, entre outros, que produzem as singularidades das situações. Conquanto se situe no campo social, os processos de síntese e construção subjetiva não podem ser diluídas nas dimensões macrossociais, correndo o risco de resultar em análises simplificadoras, e contribuir para as armadilhas biopolíticas de controle e regulação das populações. A título de exemplo, as populações das florestas, dos campos e das águas constituem uma multiplicidade de modos de vida que se torna impossível reduzi-las por pressuposição. A despeito da conquista que representa as políticas de saúde voltadas para esses segmentos populacionais, conduzir programas e ações de saúde não atentando para as singularidades aí postas implica práticas insensíveis culturalmente, com efeitos de regulação e controle da vida. No que diz respeito às práticas profissionais, a desmontagem dos processos de subjetivação e formação dos operadores da saúde e assistência social é outro grande desafio, pois reconhecemos o quão formatados estamos, fato que não nos permite reconhecer distintos modos de sofrimento e de existir, estabelecer vínculos com as pessoas que favoreça a produção de cuidados singularizados e operar a integralidade como um norte ético do trabalho (Cirilo Neto & Dimenstein, 2017).

No lastro dessa discussão, entre as artimanhas da vulnerabilização está a de reificar a própria condição em si. Schumann e Moura (2015), em análise da literatura sobre os índices de vulnerabilidade, percebem os perigos da substituição do conceito que se deseja medir pela própria medida, objetivando o índice e fornecendo espaço para observações vazias e distorcidas das condições sociais das populações. São questões levantadas para a ciência, pois enquanto prática discursiva, é produtora de realidades. Destarte, a mesma ciência que busca o enfrentamento das vulnerabilidades é a mesma que contribui para sua produção, pois parte de pressupostos desconectados das existências concretas dos sujeitos sociais. Em que medida é permitido aos sujeitos participar ativamente das pesquisas e comunicar os significados, sentidos, percepções e representações sobre as suas próprias vidas? Nesse sentido, as fortes críticas ao modo como a ciência opera para as populações ditas vulneráveis referem-se a todo o processo de produção do conhecimento, desde a escolha das temáticas e objeto de estudo, os espaços de intervenção, a definição das ferramentas metodológicas, até o modo como os pesquisadores concebem o problema de pesquisa e se situam no campo. Logo, é uma crítica referente às dimensões ontológica, epistemológica, metodológica e ético-política (Bosi, 2012; Bosi & Guerreiro, 2016; Costa, Landim & Borsa, 2017; Dantas et al., 2018).

Em torno da necessidade do reposicionamento ético diante da precarização da vida, também está a reflexão sobre o que essa vida pode. Gama e colaboradores (2014), além de Cestari e colaboradores (2017), pontuam um efeito niilista ou de ceticismo nos usos da vulnerabilidade. O primeiro autor acredita ser importante reconhecer os elementos que permitem perceber os territórios vulneráveis com outros olhos, atentando para uma potência que se alicerça exatamente nos processos de exclusão. Para ele, as abordagens da vulnerabilidade apresentam um sujeito passivo, receptáculo das relações sociais, dificultando, por exemplo, a potencialização de sua participação nos contextos dos serviços de saúde com vistas à promoção de saúde como afirmação de vida, e não apenas como restabelecimento do equilíbrio e da normalidade.

Nessa linha de raciocínio, Butler (2015) apresenta uma tese poderosa para a discussão sobre as concepções e usos da vulnerabilidade. A filósofa parte de uma ontologia social do sujeito marcada pela precariedade da vida, ou seja, pela condição humana de vulnerabilidade. Enquanto disposição relacional, a vulnerabilidade ocorre em um campo de forças, objetos e paixões que afetam a todos. Para Butler (2014), a vulnerabilidade não é uma característica inerente ou subjetiva, mas um "modo de relacionalidade do corpo" (Demetri, 2018, p. 142) com o mundo, com determinadas condições históricas, sociais, econômicas, que escapam ao controle individual. É esse conjunto de relações que envolve objetos, organizações, processos vitais, instituições, que constituem a possibilidade ou não de uma vida vivível. Contudo, a autora escapa inteiramente da associação entre vulnerabilidade e passividade, na medida em que essa condição vulnerável de nossa existência não significa necessariamente assujeitamento. Aposta nos diversos modos de apropriação desse conjunto de forças e discursos pelos sujeitos, rompendo amarras da normatização, abrindo possibilidades de resistências.

Seguindo esse pensamento, Figueiredo e colaboradores (2017) desfocam a preocupação em torno de como medir a vulnerabilidade de um grupo social para o conhecimento dos seus mecanismos de produção. Francisco (2015) argumenta que a vulnerabilidade deve ser percebida e reconhecida para que haja um encontro ético. Ao partir da vulnerabilidade enquanto um campo relacional ou relacionalidade (Wernet, Mello & Ayres, 2017), aberta às possibilidades, questiona-se a negatividade comumente atrelada ao conceito de vulnerabilidade para pensar as suas potencialidades. Butler (2014, p. 14), indica, por exemplo, que o reconhecimento das situações de vulnerabilidade tem se convertido em uma ferramenta política para a articulação de lutas por diferentes coletivos. Refere-se à produção de uma "agentividade política" ou de resistências para enfrentar a invisibilidade da vulnerabilidade de grupos e pessoas "indesejadas", vistas como ameaças. Essa resistência é marcada pela superação das posições de passividade e vitimização comumente atreladas àqueles considerados vulneráveis.

Estabelecendo aproximações com essa perspectiva, Romagnoli (2015b) refere ainda o perigo da ressonância das vulnerabilidades como um dos efeitos de seu uso. Essa autora discute os efeitos da reverberação das vulnerabilidades no campo da assistência social, o que diminui os espaços de criação, mobilização e produz trabalhadores, famílias e usuários desmotivados e ressentidos. A mobilização de forças para a efetivação da política de proteção social deve ocorrer por meio da compreensão das vulnerabilidades em jogo, inclusive da própria equipe, supostos detentores de saber sobre a vida das populações ditas vulneráveis. Isso levanta a necessidade de garantir espaços de autoanálise para essas equipes, de modo que se possa refletir sobre o jogo de forças que interferem desde o cotidiano de trabalho até as condições de vida das populações. Esse modo de trabalho se assenta em uma ética ancorada na desconstrução dos discursos naturalizantes em torno da vulnerabilidade de certos grupos sociais, na compreensão dos processos políticos de precarização da vida individual e coletiva, na perseverança em direção à construção de relações democráticas e de alianças desestabilizadoras das lógicas individualizantes tão presentes na atualidade (Cirilo Neto et al., 2016; Dimenstein et al., 2016b).

Assim, com o intuito de potencializar os usos da vulnerabilidade, reafirmamos que os estudos devem incluir não apenas as suscetibilidades aos agravos, eventos e enfermidades, mas também as potencialidades e recursos existentes para o seu enfrentamento. Há, nos processos de vulnerabilização, não apenas o polo da debilidade, mas também os pontos de resistência, das capacidades criadoras dos grupos sociais. A análise das forças em jogo possibilita apreender as dinâmicas singulares dos cotidianos de vida, o que abre espaço para o agenciamento de novas relações entre a saúde e as comunidades, entre a assistência social e os territórios das populações que vivenciam condições precárias. Destacar essa superfície de criação abre fissuras para reverter os discursos que produzem grupos vulneráveis com intenções sub-reptícias de controle de suas vidas, como é o caso de diversas políticas de saúde e assistência social que não conseguem reverter concretamente os processos de vulnerabilização.

 

Considerações finais

Assiste-se, nas duas últimas décadas, a uma proliferação de concepções sobre vulnerabilidade. Na discussão apresentada, deu-se relevo aos diferentes usos do conceito no campo da saúde e assistência social, seus efeitos e reverberações no cotidiano de trabalho e de vida da equipe profissional, famílias e usuários. Nesse sentido, diferentes concepções produzem diferentes modalidades de intervenções em saúde, bem como de ações de proteção social (Santos & Heckert, 2017; Siqueira & Lino, 2013).

Levando em consideração os aspectos expostos, acredita-se que a reflexão em torno do conceito de vulnerabilidade pode promover a renovação das práticas de cuidado, produzindo integralidade e equidade. O reconhecimento da complexidade dos processos de vulnerabilização psicossocial e ambiental das comunidades, grupos e sujeitos, incorporando determinantes macro e micropolíticos, que vão desde o modo de organização social, até as dinâmicas cotidianas e modos de vida singulares, permite o fortalecimento do protagonismo destes, a mobilização de recursos e potencialidades existentes nos territórios (Pinto, Salete, Neyara, Figueiredo & Aquino, 2017; Trad, Paiva, Aliaga, Pedrana & Carvalho, 2017). Dessa forma, possibilita a apreensão da determinação social da vida e da saúde e estimula práticas contextualizadas, históricas e intersetoriais (Bertolozzi et al., 2009).

Destaca-se, por fim, a necessidade de acolher as vulnerabilidades e dependências mútuas, não para estigmatizar e incapacitar sujeitos e grupos, mas instigar processos de enfrentamento e transformação. Nesse sentido, é apostar na potência da vulnerabilidade, com o intuito de abrir fendas, admitir uma instabilidade que, de alguma forma, viabilize algo inédito, na saúde, na assistência social e nos diversos territórios onde a vulnerabilidade seja um indicador de iniquidade, injustiça e desigualdade social (Chaves & Ratto, 2018).

 

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Recebido em: 15/5/2018
Aprovado em: 29/10/2019

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