SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
 número34Ciberacoso y depresión en adolescentesSignificados y motivos de suicidio en personas con intento prévio índice de autoresíndice de materiabúsqueda de artículos
Home Pagelista alfabética de revistas  

Psicologia para América Latina

versión On-line ISSN 1870-350X

Psicol. Am. Lat.  no.34 México dic. 2020

 

Ideação e tentativa de suicídio em adolescentes

 

Suicidal Ideation and Attempts in Adolescents

 

Ideación y Intento Suicida en Adolescentes

 

 

Alexandre Castelo Branco HerênioI; Daniela Sacramento ZaniniI

IPontifícia Universidade Católica de Goiás, GO, Brasil

Contato com os autores

 

 


RESUMO

Este estudo tem como objetivo descrever e analisar os índices de ideação e tentativa de suicídio entre uma amostra de adolescentes da cidade de Goiânia. Analisou-se também a relação entre ideação e tentativa de suicídio destes adolescentes com o autorrelato de problemas de comportamentos. Para tanto, foi pesquisada uma amostra de 240 adolescentes de 12 a 18 anos, por meio do Youth Self Report. Os resultados indicam um índice ideação suicida inferior ao encontrado em outros estudos, e um índice tentativa de suicídio superior ao encontrado em outros estudos, para a amostra de adolescentes goianos. Este dado sugere uma característica impulsiva do comportamento suicida dos adolescentes deste município. Também se encontrou uma relação estatisticamente significativa entre ideação e tentativa de suicídio e todos os problemas de comportamento e o grupo de adolescentes que relataram problemas de comportamento apresentaram significativamente mais ideação e tentativa de suicido quando comparados com os demais.

Palavras-chave: Suicídio, Ideação Suicida, Tentativa de Suicídio, Adolescência.


ABSTRACT

This study aims to describe and analyze the ideation and attempted suicide rates among a sample of adolescents in the city of Goiânia. We also analyzed the relationship between ideation and attempted suicide of adolescents with self-reported behavior problems. For this purpose, a sample of 240 adolescents aged 12 to 18 years old was surveyed through the Youth Self Report. The results Indicate that Goiania has a suicidal ideation index lower than that found in other studies, and attempt suicide index higher than that found in other studies, for the sample of Goiânia's adolescents. This Suggests an impulsive feature of suicidal behavior of adolescents in this city. Moreover, a statistically significant relationship between ideation and suicide attempt and all problem behavior was found and the adolescents who reported problem behavior shows significatively more suicide ideation and attempt comparing to other adolescents.

Keywords: Suicide, Suicidal Ideation, Attempted Suicide, Adolescence.


RESUMEN

Este estudio tiene como objetivo describir y analizar los indices de ideación y intento suicida entre uma muestra de adolescentes de la ciudad de Goiânia. Tambien fue analizado la relación entre ideación y intentos suicidas y problemas de comportamiento. Para esto, una muestra de 240 adolescentes de 12 a 18 años fue examinado por el Youth Self Report. Los resultados indican un indice de ideación suicida menor que se encontró en otros estudios, y un indice de intento suicida más grandes que se encontró en otros estúdios para la muestra de adolescentes de Goiânia. Esto sugiere una característica impulsiva en la conducta suicida de los adolescentes en esta ciudad. El estudio también encuentro una relación estadísticamente significativa entre la ideación y el intento suicida, y problemas de comportamiento y o grupo de adolescentes que relatarón problemas de comportamiento presentarón significativamente más ideación y tentativa de suicídio cuando comparados com los demás.

Palabras clave: Suicidio, Ideación Suicida, Intento Suicida, Adolescencia.


 

 

Introdução

Segundo dados da Organização Mundial da Saúde (OMS, 2014) o suicídio é a causa da morte de 800 000 pessoas por ano em todo o mundo, perfazendo uma morte a cada quarenta segundos, considerando todas as idades. Além disso, é considerada a segunda maior causa de morte entre os jovens de 15 a 29 anos. Dados da OMS (2018) apontam que, em comparação com outros países do mundo, o Brasil apresenta taxas relativamente baixas de suicídio (6,5 a cada 100 mil habitantes). No entanto, em algumas faixas etárias, como por exemplo a adolescência, observa-se um crescimento destas taxas. De acordo com o Ministério da Saúde (2006) o Brasil aparece na oitava posição mundial em quantidade bruta de suicídios, sendo o quarto país em crescimento das taxas de suicídio dentre os países latino-americanos. Neste sentido, os estudos sobre ideações e tentativas de suicídio na adolescência se tornam relevantes, uma vez que estas são consideradas fortes preditoras do suicídio (World Health Organization, 2002; CFP, 2013).

Além da associação com o suicídio propriamente dito, ideações e tentativas de suicídio na adolescência podem ser indicadores de problemas de comportamento na idade adulta. Esta relação foi encontrada em um estudo longitudinal realizado por Brière, Rohde, Seeley, Klein e Lewinsohn (2015). Estes autores investigaram o prognóstico das tentativas de suicídio na adolescência em uma amostra de 816 participantes. Os resultados permitiram concluir que as tentativas de suicídio na adolescência, independentemente do tipo ou letalidade, estão associadas a diversos problemas na vida adulta, contudo, algumas variáveis intervenientes podem afetar essa relação, como por exemplo problemas pessoais e familiares ou outras vulnerabilidades.

Em uma revisão sistemática da literatura sobre ideação e tentativas de suicídio na adolescência, Souza, Barbosa e Moreno (2015) concluem que estes fenômenos são relativamente comuns neste período da vida. Outros estudos indicam que 7 a 40% dos adolescentes da população geral já tiveram, em algum momento de suas vidas, uma ideação suicida séria (Barrios, Everett, Simon & Brener, 2000; Field, Diego & Sanders, 2001).

Esta alta incidência de ideações e tentativas de suicídio neste período da vida pode ser explicada pelos conflitos típicos da adolescência (Hildebrandt, Zart, & Leite, 2011; Borges, Werlang & Copatti, 2008). Sukiennik (2000) explica que tais conflitos podem gerar sentimentos intensos de baixa autoestima e favorecerem o desenvolvimento de quadros psiquiátricos. Com o objetivo de se livrar de tais conflitos e do sofrimento a eles associados, a OMS (2002) pontua que o adolescente pode considerar o suicídio como uma alternativa. Este fator contribuiria para o surgimento de ideações e tentativas de suicídio nesse momento da vida.

Botega, Barros, Oliveira, Dalgalarrondo e Marín-león (2005) sinalizam que a presença de ideias suicidas representa um elevado risco de uma futura tentativa de suicídio, havendo entre estas duas variáveis uma forte relação. Ideações e tentativas de suicídio na adolescência são, para Bouvard e Doyen (1996), a primeira manifestação de perturbações psicológicas que evoluem, podendo levar ao suicídio do adolescente. Esta relação entre a evolução das perturbações psicológicas neste período da vida e a ocorrência do suicídio, pode contribuir para explicar os achados de Carlson e Cantwell (1982), que sustentam uma relação entre o aumento da idade com o aumento do risco de suicídio, principalmente após a puberdade.

Vários fatores associados ao autoextermínio na adolescência podem contribuir para explicar as origens de tais perturbações psicológicas (Kaess, Parzer, Haffner, Steen Roos, & Resch, 2011; Balàzs, Miklósi, Keresztény, Hoven, & Carli, 2013; Hamzaa, Stewartb & Willoughby, 2012). Estudos descritos pela OMS (WHO, 2002) demonstram uma associação entre fatores sociodemográficos e o autoextermínio na adolescência. Estes fatores sociodemográficos são: problemas financeiros ou desemprego na família, bem como fatores familiares, como transtornos psiquiátricos e suicídio na família, dinâmica familiar violenta e abusiva, pouco cuidado dos pais, expectativas demasiadamente elevadas ou baixas dos pais para com os filhos, pais que exercem a autoridade de maneira excessiva ou inadequada, rigidez familiar e divórcios .

Outros fatores associados ao suicídio na adolescência consideram a associação entre o suicídio neste momento da vida e fatores cognitivos e de personalidade, como humor instável, comportamento antissocial, impulsividade, irritabilidade, rigidez de pensamento, falta de habilidade para resolver problemas, tendência ao refúgio na fantasia, autoestima instável, sentimentos de frustração, ansiedade, depressão, desesperança, isolamento, comportamentos imprudentes e comportamento agressivo (Braga & Dell'Aglio, 2013; WHO, 2002).

Sheri, Russell e Jenny (2013) indicam a relação entre o suicídio na adolescência e fatores ligados a perdas, ou a separação recente de amigos ou parceiros íntimos, bem como a morte de uma pessoa significativa. Estes mesmos autores trazem fatores ligados a doenças físicas, como dor somática, e fatores ligados a problemas de relacionamento, como violência, bulliyng e problemas legais. Segundo Turner, Finkelhor, Shattuck e Hamby (2012) um processo de vitimização recente também pode aumentar as chances de suicídio na adolescência.

Hess e Falke (2013) destacam a associação entre ideação e tentativas de suicídio na adolescência, e sintomas depressivos e/ou transtornos psiquiátricos, problemas de comportamento do tipo internalizantes e sentimentos de desesperança. Fombonne (1998) explica essa associação pontuando que a presença de características psicopatológicas e o uso de drogas ilícitas tornam o adolescente vulnerável a outras complicações comportamentais, e a uma deterioração de sua dinâmica psicossocial, tanto pelas características dos transtornos quanto por efeito dos medicamentos psicotrópicos. Este autor aponta a depressão como a transtorno mental mais incidente na adolescência, e o mais associado ao comportamento suicida em todo o mundo.

Em função de sua grande importância para a compreensão do desenvolvimento humano durante a adolescência, ideações e tentativas de suicídio são fenômenos amplamente estudados no mundo. Em uma revisão sistemática da literatura sobre este tema, Evans, Hawton, Rodham, Psychol e Deeks (2005) investigaram a presença destes fenômenos entre adolescentes nos Estados Unidos, Europa, Austrália, Nova Zelândia, Ásia, America latina e África. O estudo analisou produções científicas que pesquisaram ideações e tentativas de suicídio em populações de 12 a 20 anos de idade. Segundo estes autores, 17,0% dos adolescentes destas regiões do mundo relataram algum tipo de ideação suicida nos últimos seis meses, e 7,0% fizeram algum tipo de tentativa de suicídio neste mesmo intervalo de tempo. O menor índice de ideação suicida encontrado foi de 12%, e o maior de 22%. Com relação ao relato de tentativas de suicídio, o menor índice encontrado foi de 4,5%, e o maior de 9,4%.

Em outro estudo, Medina, Herrera e Kullgreen (2011) buscaram descrever as taxas de ideação e tentativas de suicídio entre 378 adolescentes da Nicarágua. Os participantes tinham idades entre 15 e 18 anos, e os dados foram coletados por meio do Youth Self Report – YSR,que dentre outras informações, avalia o relato de ideações e tentativas de suicídio nos últimos seis meses. Os resultados também indicam maiores taxas de ideação e tentativa de suicídio em adolescentes do sexo feminino. No total, 22,6% dos adolescentes relataram ideações suicidas e 6,5% relataram alguma tentativa de suicídio nos últimos seis meses.

Na Grécia, Kokkevi, Rotsika, Botsis, Kanavou, Malliori e Richardson (2014) encontraram um índice de tentativa de suicídio para adolescentes de 15 a 19 anos daquele país de 11,3%. Outro levantamento feito com adolescentes chineses, encontrou uma taxa de ideação suicida de 10,86% para aquela população (Shang, Li, Li, Wang & Siegrist, 2014). Estes índices estão em acordo com os descritos pela OMS (2014) em termos das taxas de ideação e tentativa de suicídio de adolescentes em geral.

Em um estudo realizado na cidade de Porto Alegre – RS, Werlang, Borges e Fensterseifer (2005) pesquisaram uma amostra de 526 adolescentes com idades entre 15 e 19 anos. Os dados foram coletados por meio da Escala Beck de Ideação Suicida, que identifica a presença de ideações suicidas ao longo da vida. O índice encontrado pelos autores foi de 35,7%. Estes pesquisadores ainda apresentam como fatores que se relacionam positivamente com ideações suicidas, o consumo de álcool e outras drogas, problemas de comportamento do tipo internalizante e sentimentos de desesperança. Também na cidade de Porto Alegre, Braga (2011) encontrou um índice de ideação suicida de 20,7% e um índice de tentativa de suicídio de 7,5%. Os dados foram coletados por meio do Questionário da Juventude Brasileira em uma população de 691 adolescentes de 12 a 19 anos.

Souza, Ores, Oliveira, Cruzeiro, Silva, Pinheiro e Horta (2010) pesquisaram uma amostra de 953 adolescentes de 11 a 15 anos da cidade de Pelotas, Rio Grande de Sul. Por meio da versão adaptada para o Brasil do Children's Depression Inventory que, dentre outras informações, identifica a presença de ideações suicidas recentes. Foi encontrado um índice de ideação suicida de 14%. Para a população de 15 a 18 anos, Souza, Jansen, Kuhn, Horta e Pinheiro (2009) encontraram uma taxa de 7,7%.

Considerando-se as informações levantadas sobre a adolescência e suas relações com as dimensões do suicídio, o presente estudo tem como objetivo descrever e analisar os índices de ideação e tentativa de suicídio de uma amostra de adolescentes da cidade de Goiânia/GO. Pretende-se também avaliar a relação entre ideação e tentativa de suicídio destes adolescentes com o autorrelato de problemas de comportamentos.

 

Método

Participantes

Participaram deste estudo 240 adolescentes provenientes de escolas públicas da cidade de Goiânia/GO. No momento da coleta de dados, os participantes cursavam os anos escolares correspondentes ao Ensino Fundamental II, sendo 22% do sexto ano, 26% do sétimo ano, 24% do oitavo ano e 28% do nono ano. As idades variaram de 12 a 18 anos. Destes, 112 (46,8%) eram meninos e 128 (53,2%) meninas.

Instrumentos

Youth Self Report - YSR(Achenbach, 1991)Adaptado por Rocha (2012). É um questionário de autorrelato para rastreio de indicadores psicopatológicos, com o objetivo de estudar problemas de comportamento dos adolescentes, entre 12 a 18 anos. No que diz respeito às propriedades psicométricas, Bordin, Rocha, Paula, Teixeira, Achenbach, Rescorla e Silvares (2013) indicam uma confiabilidade média do teste-reteste de 0,82, e um índice de consistência interna (alfa de Cronbach) que variou de 0,67 a 0,95 para a versão brasileira.

O instrumento está organizado em duas partes. Na primeira parte, sete questões sobre atividades cotidianas, hábitos sociais e familiares, amizades e rendimento escolar são analisadas e computadas como domínio de competências sociais. Na segunda parte, formada por 112 itens avaliados em uma escala tipo Likert de três pontos (0: não é verdadeiro, 1: algo verdadeiro, 2: muito verdadeiro), os jovens respondem em que medida as afirmações lhes caracterizam nos últimos seis meses. Estas afirmações referem-se a comportamentos desadaptados relativos a oitos síndromes psicopatológicas. Neste estudo foi utilizada apenas a segunda parte deste instrumento.

Os itens organizam-se em oito escalas clínicas específicas. São agrupações sindrômicas referentes a: I) isolamento, II) queixas somáticas, ansiedade/depressão, problemas sociais, problemas de pensamento, problemas de atenção, comportamento delinquente e comportamento agressivo. Estas escalas organizam-se em dois fatores. A escala referente às Síndromes ou problemas internalizantes, que agrupa as manifestações sindrômicas de isolamento, queixas somáticas e ansiedade/depressão, e a A escala de Externalização, que agrupa as manifestações sindrômicas do tipo comportamento delinquente e comportamento agressivo. As outras escalas (problemas sociais, problemas de pensamento e problemas de atenção) configuram quadros sindrômicos mistos. O teste oferece também uma pontuação total que mede o nível geral de mal-estar psicológico relatado pelo adolescente.

Questionário sócio-demográfico - Foi utilizado para coletar dados complementares que descrevem os participantes com informações gerais, tais como: sexo, idade, estado civil, vida acadêmica/laboral, uso de medicação, cirurgia, psicoterapia e outros temas julgados relevantes.

Procedimentos

Após a aprovação do projeto pelo comitê de ética da instituição a ele vinculada (protocolo número CAAE 02778012.0.0000.0037), foram selecionadas as escolas participantes e, em seguida, foi realizado o contato com elas. Após esclarecimentos necessários quanto à participação, foi enviado o Termo de Assentimento Livre e Esclarecido para os adolescentes com idades inferiores a 18 anos, e o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido para seus respectivos responsáveis para que autorizassem a participação no estudo.

Os participantes foram submetidos em grupos, de até 30 sujeitos, à aplicação dos instrumentos, iniciado pelo questionário sociodemográfico e seguido pelo YSR, em sua própria sala de aula durante o período escolar, com duração média de 30 minutos cada aplicação Foi garantido a todos os participantes o sigilo dos dados, e a possibilidade de retirada do consentimento a qualquer momento do processo de pesquisa sem resultar em qualquer tipo de ônus.

Análise dos dados

Os dados dos participantes foram organizados em uma planilha do Statistical Package forthe Social Sciences (SPSS) versão 20, onde foram realizados os testes Qui-Quadrado, o teste de comparação entre médias, a correlação de Pearson, os cálculos de probabilidade as análises descritivas. Os resultados dos itens que se referem a ideação e tentativa de suicídio foram comparados com outros aspectos do instrumento, como as agrupações sindrômicas e as síndromes externalizantes e internalizantes. Para algumas análises, os sujeitos foram separados em dois grupos: Grupo clínico e grupo não clínico. Os sujeitos eram incluídos no grupo clínico quando suas pontuações nos problemas de comportamentos do YSR eram superiores a 70, e quando eram superiores a 65 na avaliação das síndromes internalizantes e externalizantes.

 

Resultados

A primeira análise diz respeito a distribuição dos sujeitos por relato de ideação e tentativa de suicídio, bem como o Qui Quadrado destes dados. Do total dos 236 adolescentes, 82,2% não pensaram e não tentaram suicídio nos últimos seis meses. 9,3% dos adolescentes pensaram e tentaram suicídio, 3,8% pensaram, mas não tentaram e 4,7% tentaram suicídio, mas não tiveram ideações suicidas nos últimos seis meses.

Para avaliar a probabilidade da ocorrência de suicídio foi utilizada a fórmula para cálculo de probabilidade em que Probabilidade = ad/bc.100 (Bracarense, 2012). Desta forma, encontrou-se uma probabilidade de 14% dos adolescentes desta amostra cometerem suicídio (33/236= 0,14). Além disso, os adolescentes que já pensaram em suicídio apresentam uma probabilidade ou chance de 66% de tentarem suicídio (22/33=0,66) e aqueles que não pensaram em suicídio apresentam uma chance de 33% (11/33=0,33) de efetivamente tentarem suicídio. Dos adolescentes que não pensaram em suicidar, 5,4% tentaram suicídio, apesar de não apresentarem ideação (11/205=0,054).

A Tabela 1 apresenta um teste de comparação entre médias para os sujeitos do sexo masculino e feminino, considerando-se os relatos de ideação e tentativa de suicídio. Observa-se que não houve diferença estatisticamente significativa entre os relatos dos adolescentes do sexo masculino e as adolescentes do sexo feminino.

 

 

A Tabela 2 apresenta a correlação de Pearson entre ideações e tentativas de suicídio com problemas comportamentais do YSR. Observa-se que ideação e tentativa de suicídio apresentaram correlações estatisticamente significativas com todos os problemas de comportamento. Esta associação indica maior magnitude na relação entre ideação suicida com problemas de pensamento, tentativa de suicídio com isolamento e depressão, e síndromes internalizantes associaram-se com maior intensidade a ideação e tentativa de suicídio, em comparação as síndromes externalizantes. Esta informação confirma dados da primeira análise, que apresenta uma relação entre ideação e tentativa de suicídio.

 

 

A Tabela 3 apresenta o quantitativo de sujeitos que relataram ideações e tentativas de suicídio. O quantitativo de tais relatos é apresentado de acordo com o grupo clínico e grupo não clínico, para cada um dos problemas comportamentais considerados pelo YSR. Observa-se que a frequência do relato de ideação e tentativa de suicídio dentre os indivíduos pertencentes aos grupos clínicos, é superior à frequência encontrada para os indivíduos do grupo não clínico.

 

 

Discussão

Este estudo teve como objetivo descrever e avaliar os índices de ideação e tentativa de suicídio entre os adolescentes da cidade de Goiânia. Além disso, pretendeu-se relacionar ideação e tentativa de suicídio com o autorrelato de problemas de comportamento.

O índice de ideação suicida encontrado para adolescentes desta amostra é de 13,1%. Este índice é inferior ao encontrado na Nicarágua por Medina, Herrera e Kullgren (2011), de 22,6%. É inferior também à média dos índices de 11 países do mundo pesquisados por Evans, Hawton, Rodham, Psychol e Deeks (2005), que foi de 17%. Dentre os índices encontrados, o menor foi de 12%, e o maior de 22%. Desta forma, pode-se inferir que os adolescentes avaliados apresentam um nível de ideação suicida inferior aos índices encontrados na maior parte dos países pesquisados por estes autores.

Um resultado semelhante foi observado quando comparado o índice encontrado para estes adolescentes ao encontrado para adolescentes da cidade de Porto Alegre – RS, por Werlang, Borges e Fensterseifer (2005). Estes autores encontraram um índice de ideação suicida de 35,7%. Este índice representa mais do que o dobro do valor encontrado para a amostra deste estudo. Entretanto, ressalta-se que o tipo de instrumento utilizado pelos autores considera o relato de ideações suicidas ao longo da vida, e o YSR considera o relato de ideações suicidas ocorridas nos últimos seis meses. Esta diferença na característica dos instrumentos utilizados pode contribuir para explicar a magnitude da diferença entre os índices dos dois municípios. Outra variável que pode ter influenciado esta diferença diz respeito a seleção dos participantes. O estudo de Werlang, Borges e Fensterseifer (2005) pesquisou uma amostra de adolescentes de 15 a 19 anos, neste pesquisou-se uma amostra de 12 a 18 anos. A diferença encontrada nas duas amostras pode expressar a diferença da prevalência de ideações suicidas nas duas faixas etárias.

Em um estudo mais recente, também realizado com adolescentes da cidade de Porto Alegre, Braga (2011) encontrou-se um índice de ideação suicida ao longo da vida de 20,7% para adolescentes de 12 a 19 anos. Observa-se que este índice é inferior ao encontrado por Werlang, Borges e Fensterseifer (2005) e mais próximo ao índice encontrado na cidade de Goiânia. A maior proximidade entre estes índices pode ser atribuída ao fato da faixa etária pesquisada na amostra de Braga (2011) estar mais próxima a faixa etária pesquisada neste estudo.

Souza et al (2009) encontraram um índice de ideação suicida para a cidade de Pelotas - RS, de 14,1% para 960 adolescentes de 11 a 15 anos. Já para a faixa etária de 15 a 18 anos, encontrou-se um índice de 7,7%, para este mesmo município (Souza et al, 2010). Estes dados posicionam o índice de Goiânia (13,1%) acima do valor encontrado para a população entre 15 e 19 anos (7,7%), e bastante próximo ao índice encontrado para a população entre 11 e 15 anos (14,1%).

Os índices de ideação suicida encontrados no estado do Rio Grande do Sul parecem variar de acordo com o a cidade pesquisada. O índice da cidade de Goiânia se apresentou inferior aos índices encontrados na capital, Porto Alegre, mas se apresentou bastante próximo aos índices descritos por Souza et al. (2009; 2010) para a cidade de Pelotas - RS. Ressalta-se que Souza, Minayo e Malaquias (2002) consideram o Rio Grande do Sul o estado brasileiro com as maiores taxas de ideação e tentativa de suicídio no País.

Com relação ao índice de tentativa de suicídio, o valor encontrado para adolescentes da cidade de Goiânia foi de 14%. Este valor é superior encontrado para adolescentes da Nicarágua por Medina, Herrera e Kullgreen (2011) de 6,5%. É superior também à média dos índices encontrado para 8 países pesquisados por Evans, Hawton, Rodham, Psychol e Deeks (2005), que foi de 7%. Dentre os índices encontrados neste estudo para relatos de tentativas de suicíadio nos últimos seis meses, o menor foi de 4,5%, e o maior de 9,4%.

Entretanto, Evans, Hawton, Rodham, Psychol e Deeks (2005) também pesquisaram o índice de tentativa de suicídio em adolescentes considerando os relatos sobre a ocorrência desta tentativa no último ano, e encontraram um índice médio de 6,4% (com índices que variaram de 5,4% a 7,5%), para 31 países. Considerando o critério de relato de tentativas de suicídio em algum momento da vida, o índice médio encontrado foi de 9,7% (com índices que variaram de 8,5% a 10,9%), considerando um quantitativo de 60 países pesquisados. Conclui-se, portanto, que o índice de tentativa de suicídio encontrado para adolescentes da cidade de Goiânia, é superior aos índices encontrados em todos os países pesquisados por Evans, Hawton, Rodham, Psychol e Deeks (2005), em um levantamento sobre índices de tentativa de suicídio entre adolescentes de diversos países do mundo.

Quando comparado a um estudo realizado na cidade de Pelotas – RS, que encontrou um índice de tentativa de suicídio de 7,5% (Braga, 2011), o índice de Goiânia se mostra superior. Ressalta-se o estado do Rio Grande do Sul é considerado por Souza, Minayo e Malaquias (2002) o estado brasileiro com as maiores taxas de suicídio em todas as faixas etárias.

Em suma, as taxas de ideação e tentativa de suicídio dos adolescentes desta capital apresentam uma característica peculiar. Tal peculiaridade reside no fato de que as tentativas de suicídio aparentemente superarem a ocorrência de pensamentos e ideias suicidas. Isto pode ser explicado pela característica impulsiva associada ao suicídio nesta etapa do desenvolvimento (Rodav, Levy & Hamdan, 2014).

As análises aqui realizadas também indicam uma correlação estatisticamente significativa entre ideação e tentativa de suicídio, e todos os problemas de comportamento. Este dado confirma achados da literatura que indicam a presença de um ou mais problemas de comportamento como fatores de risco para o desenvolvimento de ideações e tentativas de suicídio (Bouvard & Doyen, 1996; WHO, 2002).

 

Considerações Finais

Em suma, este estudo encontrou um índice de ideação suicida para uma amostra de adolescentes da cidade de Goiânia que se mostrou inferior aos índices encontrados na maior parte dos estudos realizados em outros países do mundo, e em duas cidades do Rio Grande do Sul. Entretanto, destaca-se que o índice de tentativa de suicídio encontrado para estes adolescentes foi superior ao encontrado para uma amostra da cidade de Pelotas – RS, bem como mostrou-se superior aos índices de tentativa de suicídio encontrados em diversos países do mundo.

Percebeu-se também que os relatos de ideação e tentativas de suicídio tiveram uma correlação estatisticamente significativa com todos os problemas de comportamento. Neste sentido, destaca-se a presença de um ou mais problemas de comportamento como preditores da ideação e tentativa de suicídio. Para a realização de estudos futuros, sugere-se a utilização de dados que ampliem as variáveis relacionadas à ideação e tentativa de suicídio, bem como propostas metodológicas que explorem mais detalhadamente tais variáveis.

 

Referências

Achenbach, T. M. (1991). Manual for the Youth Self-Report and 1991 Profile. Burlington, VT: University of Vermont Department of Psychiatry.         [ Links ]

Barrios, L.C., Everett, S.A., Simon, T.R., & Brener, N.D. (2000). Suicide ideation among US college students: Associations with other injury risk behaviors. Journal of American College Health, 48, p. 229-233.         [ Links ]

Balázs, J., Miklósi, M., Keresztény, A., Hoven, A. & Carli, V. (2013). Adolescent subthreshold-depression and anxiety: Psychopathology, functional impairment and increased suicide risk. Journal of Child Psychology and Psychiatry. 54(6), p. 670–677.         [ Links ]

Bouvard, M.P., & Doyen, C. (1996). Le suicide chez l'adolescent. L'Encéphale, 37(4), p. 35-39.         [ Links ]

Bordin, I. A., Rocha, M. M., Paula, C. S., Teixeira, M. C. T. V., Achenbach, T. M., Rescorla, L. A., & Silvares, E. F. M. (2013). Child Behavior Checklist (CBCL), Youth Self-Report (YSR) and Teacher's Report Form (TRF): An overview of the development of the original and Brazilian versions. Cadernos de Saúde Pública, 29(1), 13-28.         [ Links ]

Borges, V. X., Werlang B. S. V. & Copatti, M. (2008) Ideação Suicida em Adolescentes de 13 a 17 anos. Barbarói. Santa Cruz do Sul. 28, p. 33-41.         [ Links ]

Botega, N. J., Barros, M. B. A., Oliveira, H. B., Dalgalarrondo, P. & Marín-leon, L. (2005) Suicidal behavior in the community: prevalence and factors associated with suicidal ideation. Revista Brasileira de Psiquiatria. 27(1), p. 45-53.         [ Links ]

Bracarense, P. A. (2012) Estatística Aplicada às Ciências Sociais. Curitiba: IESDE Brasil S.A.         [ Links ]

Brasil, Ministério da Saúde (2006) Prevenção do Suicídio Manual dirigido a profissionais das equipes de saúde mental. Unicamp, Campinas.         [ Links ]

Braga, L. L. (2011) Exposição a violência e comportamento suicida em adolescentes de diferentes contextos. Dissertação de mestrado, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre - RS, Brasil.         [ Links ]

Braga, L. L. & Dell'Aglio, D. D. (2013). Suicídio na adolescência: Fatores de risco, depressão e gênero. Contextos Clínicos. 6(1), p. 2-14.         [ Links ]

Brière, F. N., Rohde, P. Seeley, J. R., Klein, D. & Lewinsohn, P.M. (2015). Adolescent suicide attmpts and adult adjustment. Depression and Anxiety. 32, p. 270-276.         [ Links ]

Carlson, G. A., & Cantwell, D. P. (1982) Suicidal behavior and depression in children and adolescents. American Academy of Child Psychiatry, 21(4), p. 361-368.         [ Links ]

Conselho Federal de Psicologia (2013). O Suicídio e os Desafios para a Psicologia, Brasília.         [ Links ]

Evans, E. B. S., Hawton, K. D. S., Rodham, K., Psychol, D. B. S. & Deeks, J. (2005). The Prevalence of Suicidal Phenomena in Adolescents: A Systematic Review of Population-Based Studies. Suicide and Life-Threatening Behavior. 35(3), p. 239-250.         [ Links ]

Field, T., Diego, M., & Sanders, C. (2001). Adolescent suicidal ideation. Adolescence, 36(142), p. 241-248.         [ Links ]

Fombonne, E. (1998). Increased rates of psychosocial disorders in youth. European Archives of Psychiatry and Clinical Neuroscience, 248(6), p. 14-21.         [ Links ]

Hamzaa, C. A., Stewartb, S. L. & Willoughby, T. (2012). Examining the link between nonsuicidal self-injury and suicidal behavior: A review of the literature and an integrated model. 32(6) p, 482–495.         [ Links ]

Hess, A. R. & Falke, D. (2013). Sintomas internalizantes na adolescência e as relações familiares: Uma revisão sistemática da literatura. Psico-USF, 18(2), p. 263-276.         [ Links ]

Hildebrandt, L. M., Zart, F. & Leite, M. T. (2011) A tentativa de suicídio na percepção de adolescentes: um estudo descritivo. Rev. Eletr. Enf. 21(2), p.110-121.         [ Links ]

Kaess, M., Parzer, P., Haffner, J., Steen R., Roos, J. & Resch, F. (2011) Explaining gender differences in non-fatal suicidal behaviour among adolescents: a population-based study. BMC Public Health, 11(5), p. 582:597.         [ Links ]

Kokkevi, A., Rotsika, V. Botsis, A., Kanavou, E., Malliori, M. & Richardson, C. (2014) Adolescents' Self-reported Running Away from Home and Suicide Attempts During a Period of Economic Recession in Greece. Child and Youth Care Forum. 43(6), p. 691-714.         [ Links ]

Medina, C. M. O, Herrera, A. & Kullgren, G. (2011). Suicidal Expression in Adolescents in Nicaragua in Relation to Youth Self-Report (YSR) Syndromes and Exposure to Suicide. Clin Pract Epidemiol Ment Health. 7, p. 89–96.         [ Links ]

Organização Mundial de Saúde (2014). Preventing suicide: a global imperative. Retirado de http://apps.who.int/iris/bitstream/handle/10665/131056/9789241564779_eng.pdf;jsessionid=AC24BA27E1642806BA96BAADE3850299?sequence=1.         [ Links ]

Organização Mundial de Saúde (2018). World Health Statistics: Monitoring Health for the Sustainable Development Goals. Retirado de http://www.who.int/gho/publications/world_health_statistics/en/.         [ Links ]

Rocha, M. M. (2012). Um estudo comparativo entre duas traduções brasileiras do Inventário de Auto-Avaliação para Jovens (YSR). Tese de Doutorado não publicada. Universidade de São Paulo, São Paulo.         [ Links ]

Rodav, O. Levy, S. Hamdan, S. (2014) Clinical characteristics and functions of non-suicide self-injury in youth. European Psychiatry. 29(8), p. 503-508        [ Links ]

Shang, L. Li, J. Li, Y. Wang, T. Siegrist, J. (2014) Stressful psychosocial school environment and suicidal ideation in Chinese adolescents. Social Psychiatry and Psychiatric Epidemiology. 49(2), p. 205-206.         [ Links ]

Sheri, B., Russell, T. & Jenny, W. (2013) Associations among bullying, cyberbullying, and suicide in high school students. Journal of Adolescence. 36(2), p. 341-350.         [ Links ]

Sukiennik, P. B. (2000) O Aluno Problema. 2 ed. Porto Alegre: Mercado Aberto.         [ Links ]

Souza, L. D. M., Ores, L., Oliveira, G. T., Cruzeiro, A. L. S., Silva, R. A. Pinheiro, R. T. & Horta, B. L. (2010) Ideação suicida na adolescência: Prevalência e fatores associados. J Bras Psiquiatr. 59(4), p. 286-292.         [ Links ]

Souza, L. D. M. Silva, R. A., Jansen, K., Kuhn, R. P. Horta, B. L. & Pinheiro, R. T. (2009) Suicidal ideation in adolescents aged 11 to 15 years: Prevalence and associated factors. Revista Brasileira de Psiquiatria. 32(1), p. 37-41.         [ Links ]

Souza, E. R., Minayo, M.C.S. & Malaquias, J.V. (2002) Suicide among young people in selected Brazilian State capitals. Cadernos de Saúde Pública. 18(3), p. 673-683.         [ Links ]

Souza, A. C. G., Barbosa, G. C. & Moreno, V. (2015) Suicídio na Adolescência: Revisão da literatura. Revista UNINGÁ. 43(2), p. 95-98.         [ Links ]

Turner, H, A., Finkelhor, D., Shattuck, A. M. A. & Hamby, S. (2012). Recent Victimization Exposure and Suicidal Ideation in Adolescents. Arch Pediatr Adolesc Med. 166(12), p. 149-1154.         [ Links ]

Werlang B. S. G., Borges V. R. & Fensterseifer L. (2005) Fatores de risco ou proteção para a presença de ideação suicida na adolescência. R Interam Psicol. 39(2), p. 259-66.         [ Links ]

World Health Organization (2002). Background [On-line]. Disponível: http://www.who.int.mental-health/suicide. Acesso em 17/03/2015.         [ Links ]

 

 

Contato com os autores:
Pontifícia Universidade Católica de Goiás
Av. Universitária s/n, Setor Universitário
Goiânia-GO, Brasil
CEP: 74000-000

Recebido em: 26/09/2019
Revisado em: 30/11/2020
Aprovado em: 15/01/2020

 

 

Sobre os autores:
Alexandre Castelo Branco Herênio
Psicólogo, Mestre em Psicologia, Especialista em Saúde Mental e Dependência Química, é tutor da Residência Multiprofissional em Infectologia do Hospital Estadual de Doenças Tropicais de Goiânia e docente no Centro Universitário Alfredo Nasser. Tem experiência na área clínica e institucional, na assistência a saúde e na gestão dos serviços públicos de saúde e segurança pública.
ORCID: https://orcid.org/0000-0003-4966-8477
E-mail: herenioacb@gmail.com
Daniela Sacramento Zanini
Graduação em Psicologia pela Pontifícia Universidade Católica de Goiás. Doutorado em Psicologia Clínica y de la Salud pela Universidad de Barcelona, Espanha e Pós-doutorado pela mesma instituição. Professora da Pontifícia Universidade Católica de Goiás na graduação e Pós-graduação em Psicologia (mestrado e doutorado). Tem experiência na área de Psicologia, com ênfase em Avaliação Psicológica e Tratamento e Prevenção Psicológica.
ORCID: https://orcid.org/0000-0003-2515-2820
E-mail: dazanini@yahoo.com

Creative Commons License