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Psicologia para América Latina

versión On-line ISSN 1870-350X

Psicol. Am. Lat.  no.36 México jul./dic. 2021

 

Reflexões Sobre a Socioeducação Feminina a partir do Conceito de Sofrimento Ético-Político

 

Reflections on Female Socio-Education from the Concept Oh Ethical-Politic Suffering

 

Reflexiones sobre la Socioeducación Feminina desde el Concepto de Sufrimiento Ético-Político

 

 

Lívia Rebouças da CostaI; Ilana Lemos de PaivaI

IUniversidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), Natal, Rio Grande do Norte, Brasil

Contato com as autoras

 

 


RESUMO

Historicamente, as mulheres vêm sendo alvo da opressão/exploração dentro da sociedade patriarcalista-racista-classista vigente. Ao se jogar luz sobre o contexto do público feminino do sistema socioeducativo brasileiro, constata-se a radicalidade desse processo, especialmente para meninas negras e periféricas. Diante disso, o presente trabalho objetivou analisar de que forma o sofrimento ético-político, conceito desenvolvido para entender a dialética da exclusão/inclusão perpassa a vivência das adolescentes que cumprem medida socioeducativa de privação de liberdade. Como resultados, constatou-se que a reprodução do racismo e do machismo dentro do sistema socioeducativo se engendram como elementos constituinte desse sofrimento na vida das meninas, que, por sua vez, têm suas subjetividades forjadas a partir desse mecanismo. A partir disso, intentou-se provocar uma reflexão sobre a necessidade de se desenvolverem saberes comprometidos com a transformação da realidade.

Palavras-chave: adolescentes mulheres; medida socioeducativa privativa de liberdade; sistema cisheteropatriarcal-racista-classista.


ABSTRACT

Historically, women have been the target of oppression/exploitation within the current patriarchal-racist-classist society. By shedding light on the context of the female audience in the Brazilian socio-educational system, one can see the radical nature of this process, especially for black and peripheral girls. Therefore, this study aimed to analyze how ethical-political suffering, a concept developed to understand the dialectic of exclusion/inclusion permeates the experience of adolescents who are under a socio-educational measure of deprivation of freedom. As a result, it was found that the reproduction of racism and sexism within the socio-educational system are engendered as constituent elements of this suffering in the lives of girls, who, in turn, have their subjectivities forged from this mechanism. Thus, it was intended to provoke a reflection on the need to develop knowledge committed to the transformation of this reality.

Keywords: teenagers women; socio-education measrure of deprivation of liberty; cisheteropatriarchal-racist-classist system.


RESUMEN

Históricamente, las mujeres han sido objeto de opresión/explotación dentro de la actual sociedad patriarcal-racista-clasista. Al arrojar luz sobre el contexto de la audiencia femenina en el sistema socioeducativo brasileño, se puede ver la naturaleza radical de este proceso, especialmente para las niñas negras y periféricas. Por tanto, este estudio tuvo como objetivo analizar cómo el sufrimiento ético-político, concepto desarrollado para comprender la dialéctica de la exclusión/inclusión, impregna la experiencia de las adolescentes que se encuentran bajo una medida socioeducativa de privación de libertad. Como resultado, se encontró que la reproducción del racismo y el sexismo dentro del sistema socioeducativo se engendran como elementos constitutivos de este sufrimiento en la vida de las niñas, quienes, a su vez, tienen sus subjetividades forjadas a partir de este mecanismo. A partir de ello, se pretendía provocar una reflexión sobre la necesidad de desarrollar conocimientos comprometidos con la transformación de la realidad.

Palabras clave: mujeres adolescentes; medida socioeducativa de privación de libertad; sistema cisheteropatriarcal-racista-clasista.


 

 

Introdução: por que se debruçar sobre a realidade das meninas da socioeducação?

As mulheres vêm sendo marcadas, historicamente, por um processo de exploração/opressão que se constrói de forma diferente e desigual a depender da classe social e da raça às quais pertençam. Tal dinâmica, que conversa estreitamente com os valores e necessidades estruturantes das sociedades em cada época (desde a origem da instituição família aos dias de hoje), tem contribuído para o estabelecimento dos lugares e dos papéis cabíveis a cada mulher: se negras e da periferia, cabem-lhes os trabalhos mais precarizados, mal remunerados e a escassez de tempo para cuidarem de si e de suas famílias; se brancas e de bairros nobres, cabe-lhes a exigência de se fazerem mulheres modernas e independentes, que, teoricamente, não precisam escolher entre a carreira profissional e a família, pois têm recursos financeiros para terceirizar, em parte, as suas atividades domésticas. Contudo, há um ponto fundamental em comum entre elas: o fato de serem corpos submetidos à propriedade do cisheteropatriarcado1, o qual, juntamente ao capitalismo e ao racismo estrutural, se faz determinante nas relações sociais presentes no cotidiano (Cisne & Santos, 2018).

Dessa forma, quando se trata do contexto das populações que lidam diariamente com o não acesso aos direitos fundamentais pela ausência do estado, e que sofrem com os desdobramentos da escassez de recursos materiais, a situação das mulheres - destacadamente as negras e periféricas - vem se tornando cada vez mais alarmante, o que pode ser ilustrado ao se observar o crescente quantitativo do envolvimento das mesmas em trajetórias associadas à criminalidade2. Tal quadro não é uma exclusividade só entre as mulheres adultas, mas também tem se intensificado entre mulheres adolescentes e jovens. Para estas últimas, a conjuntura torna-se ainda mais preocupante ao se considerar fatores como o período peculiar de desenvolvimento no qual tal público se encontra, o seu status de prioridade segundo as leis que regem o país, bem como as consequências que essa trajetória, marcada pela infração e por violências, poderá ter para o presente e futuro dessas meninas. Assim, pertencentes à uma juventude que se caracteriza diversa de outras em virtude de seu contexto cultural, de sua localização territorial, de seu pertencimento racial, social e econômico, essas adolescentes e jovens são alvo de uma opressão/exploração que se conecta a processos de estigmatização e de criminalização de onde podem surgir, como consequência, elementos que serão constituintes de suas subjetividades e coletividades (Froemming, 2016; Diniz, 2017).

Entendendo que a subjetividade se engendra em meio as relações sociais, é possível afirmar que a participação de sujeitos numa dinâmica que exclui e, ao mesmo tempo, inclui de maneira perversa determinados segmentos, é determinante para a construção de quem se é e de como se percebe ser. Dessa forma, a vivência física e simbólica desse mecanismo desencadeia formas específicas de sofrimento, o qual, por sua vez, configura-se também como constituinte dessa subjetivação, possuindo assim uma base material e sendo atravessado por um emaranhado de hierarquias de poder e de diferentes interesses, e fundando-se a partir da lógica de exclusão/inclusão perversa que recai negativamente sobre as populações marginalizadas. Pensando em como analisar o funcionamento dessa dialética da exclusão/inclusão e verificando as peculiaridades que permeiam a forma como isso afeta as pessoas, a pesquisadora Bader Sawaia desenvolve, dentro dos estudos da Psicologia Social no Brasil, o conceito de sofrimento ético-político como uma categoria que possibilite a compreensão dos processos psicossociais presentes no referido contexto. Trata-se de captar a complexidade que caracteriza o movimento dialético entre a exclusão e a inclusão no modo de produção capitalista, considerando que a sociabilidade por ele fomentada é geradora de afetações negativas para a coletividade e para os sujeitos em suas singularidades, manifestando-se assim num sofrimento de dimensões ética e política (Sawaia, 2013; Bertini, 2014).

Desse modo, percebe-se que o sofrimento ético-político está presente de variadas formas na realidade social, ganhando matizes específicos a partir da situação e de quem vivencia tal situação. Diante da já referida opressão/exploração sobre as mulheres e considerando ainda o processo de criminalização pelo qual uma parte significativa delas vem passando, destacou-se, no presente trabalho, como o sofrimento ético-político se dá para adolescentes e jovens mulheres que, capturadas pela lógica seletiva e criminalizante vigentes, cumprem medida socioeducativa de privação de liberdade.

Segundo o Estatuto da Criança e do Adolescente, o ECA (1990), de acordo com a gravidade do ato infracional cometido, à/ao adolescente pode ser determinado, pela Justiça, alguns tipos de medidas socioeducativas, sendo a mais drástica delas a de privação de liberdade, a qual corresponde à internação das/os adolescentes em uma instituição pelo período estipulado judicialmente e que deve ter um caráter de responsabilização e pedagógico, com base numa perspectiva socioeducativa. Contudo, de acordo com Froemming (2016), ao se observar como está posta a realidade do sistema que operacionaliza as medidas, é possível identificar que a lógica punitivista ainda persevera em detrimento da socioeducativa e que a premissa de que as meninas da socioeducação são sujeitos de direitos que devem ser protegidas, mostra-se não materializada nas mais variadas dimensões. São existências marcadas pela opressão/exploração de classe, de raça e de sexo3, sendo nelas encontradas histórias de amargas trajetórias de vida, e estando nelas presentes a dimensão do sofrimento ético-político. Assim, jogar luz sobre o que vivem as adolescentes e jovens mulheres privadas de liberdade se torna um imperativo em virtude da necessidade de maiores cuidados e preocupações com o referido público.

Diante disso, esta pesquisa justificou-se por contribuir para uma desnaturalização sobre o sofrimento manifestado no contexto das relações sociais estruturantes4, situando-o ética e politicamente na medida em que se desvincula-o da ordem puramente existencial e o conecta à concreticidade dos elementos constituintes da sociedade capitalista, estabelecendo assim um caráter de mutabilidade para a dura realidade dos povos oprimidos e explorados, a qual pode ser transformada a partir das condições objetivas de vida dos sujeitos. Nesse sentido, o referido estudo traz a possibilidade de se enxergar criticamente componentes essenciais da construção das subjetividades das adolescentes e jovens privadas de liberdade, e que podem ser tomados como espelho do funcionamento de uma sociedade racista, machista, classista, individualista, meritocrática e discriminatória, e que tem como principais vítimas as mulheres jovens, negras e subalternizadas.

 

Problema de pesquisa e objetivos: o horizonte que nos guia

Com base no que foi apontado até aqui e entendendo a importância de se evidenciar e problematizar o contexto da ainda invisibilizada infração juvenil feminina, põe-se como questão para o presente estudo: Como o sofrimento ético-político se apresenta na vivência das adolescentes que cumprem medida socioeducativa de privação de liberdade?

A partir desse questionamento, estabeleceu-se como objetivo analisar de que forma o sofrimento ético-político perpassa a vivência das adolescentes que cumprem medida socioeducativa de privação de liberdade.

 

Método: a construção da pesquisa5

Esta pesquisa se caracterizou como qualitativa e toma como ponto de partida, numa escolha acadêmico-política, o feminismo marxista como lente para enxergar a realidade, estando a inspiração marxista presente tanto na forma de construir o corpus dos conteúdos levantados quanto na sua análise. Assim, afirma-se aqui a prerrogativa de que a realidade se constitui em uma totalidade, sendo processual, histórica e concreta, construída dialeticamente e forjada em meio a contradições (Serpa, 2012). Tais elementos, quando encarados sob a perspectiva específica do feminismo, chamam atenção ainda para um aspecto crucial dentro desta pesquisa: a afirmação da existência da opressão/exploração sobre os corpos feminizados e negros como engrenagem do sistema capitalista (Cisne, 2015).

Sobre com quem e onde foi operacionalizada a pesquisa, esta realizou-se numa das unidades de internação feminina do sistema socioeducativo brasileiro, especificamente num estado da região Nordeste do país. A unidade em questão é responsável pela execução de medidas socioeducativas para adolescentes e jovens mulheres6, público participante7 deste estudo, e foi nela onde se processou a apreensão dos conteúdos que subsidiaram, juntamente com o aporte do referencial teórico, a tessitura das discussões que se seguirão.

Fazer pesquisa com o público infantojuvenil pode ser desafiador, especialmente quando esse público se encontra num contexto de vulnerabilidade extremada. Diante disso, foram utilizadas duas metodologias na tentativa de melhor apreender o real: a observação participante e a photovoice. Foram três meses de imersão no campo de estudo, durantes os quais a observação participante foi uma constante, e tendo ganhado espaço, em um segundo momento desse intervalo de tempo, a metodologia da photovoice8.

No tocante à observação participante, desenvolvida comumente no contexto de pesquisas antropológicas e sociológicas (Haguette, 2007), ela possibilitou, por meio da imersão no campo de estudo sem a elaboração de espaços de controle de variáveis, uma maior aproximação do ponto de vista do público pesquisado, de maneira que a experimentação, pela pesquisadora, da vida cotidiana daquelas adolescentes e jovens, tornou possível desvelar significados, comportamentos e posicionamentos que não estariam acessíveis de outra forma que não através desse movimento de adentrar e participar da dinâmica cotidiana da unidade (Martins, 1996). Para o registro das informações, foram feitos diários de campo no decorrer desses 3 meses de imersão, a partir dos quais foram feitas análises para as discussões da pesquisa, assim como também pôde ser subsidiada a organização da aplicação da segunda ferramenta eleita: a photovoice.

Esta técnica é uma dentre outras que compõem a gama de possibilidades de um campo que vem se firmando tanto no uso em pesquisas, quanto para intervenções, as metodologias visuais participativas, ganhando destaque especificamente aquelas baseadas em fotografias participativas (Meirinho, 2012). Pensando especificamente no público juvenil da atualidade, a popularização do uso de recursos visuais (e audiovisuais) é uma constante, o que, por si, torna potente o uso da fotografia participativa em intervenções e pesquisas com esse grupo etário.

Sobre a Photovoice, esta consiste na cessão de câmeras fotográficas à pessoas dentro de um contexto específico para que estas possam transformar-se "veículos informativos" daquela realidade por meio dos registros de imagem feitos (sem que haja a necessidade de refinamento técnico visual)9. A expectativa é a de que, com essa dinâmica de protagonismo por parte das pessoas que participam da aplicação da técnica (seja com objetivos de pesquisa ou puramente interventivos), seja alcançado o maior grau possível de espontaneidade e de genuinidade sobre os conteúdos captadas, algo que não seria viável caso as fotografias fossem registradas pelos olhos da pessoa que facilita a aplicação da metodologia e é externa àquele contexto e não o experiencia com autenticidade. Assim, um dos ganhos dessa metodologia é a viabilidade agregada no tocante ao lugar de pessoa ativa que as/os suas/seus participantes ocupam, transformando-se em atrizes/atores, e dirigindo o processo de acordo com sua própria compreensão, daí caracterizar-se como participativa. Wang e Burris (1997) apontam que a Photovoice traz, como um de seus desdobramentos, a promoção de um diálogo com as/os participantes permeado por criticidade, de maneira que o uso dessa ferramenta implica na oportunização da escuta das vozes de populações marginalizadas e oprimidas, abrindo espaço para que venha à tona a vida de verdade dessas pessoas, marcadas muitas vezes por lutas das mais variadas ordens, e dando assim relevo para as formas de pensar e sentir das diferentes gentes.

Desta forma, mais do que fazer uso de uma instrumentalidade para o levantamento de informação, a combinação da observação participante com a photovoice se mostrou também como potente via de mobilização e sensibilização para a situação das participantes da pesquisa, tanto entre elas quanto para a pesquisadora que se constituiu igualmente na condição de agente produtora e de produto nesse processo.

Foram três meses de imersão (abril, maio e junho do ano 2019), no quais foram acompanhadas as rotinas semanais de treze adolescentes e jovens10 da unidade em atividades como as refeições em grupo, as atividades de assistência religiosa, as atividades recreativas, atividades educacionais, encontros de visitas familiares, eventos comemorativos da unidade, atividades de cuidado com a higiene e beleza, atividades socioeducativas e audiências no Tribunal de Justiça. Além destas, a própria pesquisadora foi facilitadora de 4 encontros com as meninas, para além dos encontros de execução da photovoice.

Assim, tendo em vista o objetivo da pesquisa e tomando por base o que a realidade cotidiana vivida na unidade socioeducativa expressava, foram elaborados pela pesquisadora para serem usados como disparadores para a execução da photovoice os seguintes temas: "Meu eu"11, "Liberdade" e "Família". A partir deles, foram realizadas três oficinas de fotografia com as adolescentes e jovens, nas quais era solicitado que, antes de iniciar os registros fotográficos (feitos todos dentro da unidade, em espaços diversos), cada uma das participantes deveria fazer uma chuva de ideias12 com a palavra tema, para assim potencializar a criatividade e a expressão na hora de fotografar. Findas as oficinas fotográficas, foi realizado o encontro coletivo (com meninas que haviam fotografado e também com as que não participaram das oficinas, mas que queriam participar especificamente daquele momento), no qual, a partir tanto das fotografias quanto do material produzido pelas chuvas de ideias, foi construído um diálogo sobre o que aquelas adolescentes e jovens queriam expressar em relação aos temas abordados. Algumas importantes reflexões foram levantadas naquele espaço, e através dela buscou-se realizar o aprofundamento de algumas questões com adolescentes e jovens que trouxeram falas mais marcante e que se dispuseram a serem entrevistadas13.

Em termos de conteúdos apreendidos a partir do desenvolvimento das metodologias escolhidas, destaca-se o seguinte: as fotografias que mais se repetiram foram as que mostravam cadeados (abertos e fechados), o céu e os muros da unidade socioeducativa, apresentando assim nuances da falta que a liberdade que vivem. Já em ternos de discurso, para além da temática da liberdade ("saudade", "liberdade", "família", e etc.), as palavras mais ditas por elas estavam relacionadas a forma como elas acreditam ser percebidas pela sociedade ("vagabunda", presidiária", "bandida", "puta", "preta" e etc.). Assim, de maneira geral, observou-se, que situações discriminatórias, o distanciamento das famílias, e o cerceamento da liberdade são, dentre outros, fatores produtores de sofrimento para as meninas.

Por fim, sobre o desenvolvimento da análise, partindo das falas das meninas tanto na etapa da photovoice quanto nos momentos não estruturados de interação com a pesquisadora, foi realizada a a construção de núcleos de significação (Aguiar e Ozella, 2006), dentre os quais, destacaremos neste artigo, o núcleo de significação "Da afetação por ser e por parecer ser", o qual foi construído a partir da identificação dos pré-indicadores como "puta", "vagabunda", "presa", "presidiária", "bandida", "preta" e "pobre", presentes nas falas das participantes, e do indicador "presidiária". Na sequência, poderá refletir-se sobre como esses elementos vêm se engendrando na forja de quem são, de como são vistas e de como se veem as meninas da socioeducação, sendo marcante nesse movimento os entrelaces entre o sofrimento ético-político e as relações que estruturam a sociabilidade capitalista na formação dessas adolescentes e jovens14.

 

Discussão dos dados e a construção de saberes: implicações do sofrimento ético-político para meninas do sistema socioeducativo

Levantei nervosa. Com vontade de morrer. Já que os pobres estão mal colocados, para que viver? Será que os pobres de outro País sofrem igual aos pobres do Brasil? (Jesus, 2014, p.33)

Ao se falar de sofrimento, comumente é feita a sua associação com uma experiência privativa e fundada em questões individuais, as quais podem até relacionar-se com fatores externos a quem sofre, mas de forma fragmentada, assim como também o é a concepção de que o ser humano pode ser compreendido num binômio entre o corpo e a mente, o psicológico e o sociológico, a cognição e a emoção. Logo acima, encontra-se um trecho do diário de Carolina Maria de Jesus, publicado no livro "Quarto de despejo: diário de uma favelada", no qual, uma mulher negra e favelada fala sobre um sofrimento que beira o impulso da morte, e o qual ela questiona se é sentido por outras pessoas pobres do mundo. Fala de um sofrimento que tem endereço certo e rosto de mulher, que dói no juízo e no corpo, e que é de uma coletividade.

Visando romper com a perspectiva individual e dicotômica, e questionando o lugar desse sofrimento diante da realidade que está posta, a realidade das muitas Marias Carolinas de Jesus espalhadas por aí a fora, e podendo assim estimular reflexões no campo das práticas psicossociais, Sawaia (2013) desenvolve o conceito de sofrimento ético-político, o qual é por ela situado espacial e historicamente, como sendo compartilhado coletivamente e desenvolvido por meio dos afetos em relação às experiências vividas.

Durante o caminho percorrido até o estabelecimento do conceito de sofrimento ético-político, numa tentativa de acercamento deste, Sawaia, influenciada por teóricos como Marx e Sartre, debruça-se sobre o referido fenômeno de ruptura da unidade dialética para viabilizar uma compreensão de como esse rompimento se desdobra na derrogação das emoções/afetos e na extinção da dimensão do conhecimento/pensar na atividade (Bertini, 2014).

Sawaia, na introdução da obra "As artimanhas da exclusão: análise psicossocial e ética da desigualdade social" (2013), justifica a adoção do binômio exclusão/inclusão ao problematizar o uso do termo "exclusão" criticando o caráter monolítico-analítico que o vem acompanhando seja no ambiente acadêmico ou fora deste. De acordo com a autora, como exemplo disso, observa-se que costumeiramente, nas análises focadas na dimensão econômica, vem se empregando o referido termo enquanto sinônimo da condição de pobreza, de maneira a estabelecer-se assim um papel de coadjuvante ou até de invisível para a dimensão subjetiva, física e mental dos sujeitos. Em consonância com isso, aborda-se a exclusão social "sob uma perspectiva ético-política para analisá-la como um processo complexo" (p. 8), de forma que aquela não seja compreendida unicamente apenas como objetiva ou subjetiva, individual ou coletiva, e nem como racional ou irracional, sendo sim um processo sócio-histórico. Nesse sentido, a autora afirma a necessidade de se compreender as diversas particularidades e dimensões da exclusão, destacando-se a objetiva, referente à desigualdade social, a dimensão ética, referente à injustiça, e a subjetiva, referente ao sofrimento. Para a construção dessa compreensão, ressalta-se ainda o caráter contraditório inerente à exclusão, o que determina a existência da sua negação em si própria, sendo esta antítese a inclusão, a qual se manifesta ilusoriamente nas relações sociais. Sobre isso, Sawaia assevera que

Todos estamos inseridos de algum modo, nem sempre decente e digno no circuito reprodutivo das atividades econômicas, sendo a grande maioria da humanidade inserida através da insuficiência e das privações, que se desdobram para fora do econômico (Sawaia, 2013, p.8).

Dessa forma, insere-se aí a ética e a subjetividade como elementos essenciais para viabilizar uma análise sociológica sobre a desigualdade, de maneira que a exclusão passa a ser apreendida como a expressão da falta de compromisso político com o sofrimento vivenciado pela/o outra/o (Sawaia, 2013). Já no que se refere à uma perspectiva de análise psicológica, observa-se a existência de um forte mecanismo de coação social a partir da ideia do "nós", na medida em que, por exemplo, as pessoas pobres são cotidianamente incluídas, por mediações diversas, no "nós" que o excluí, desencadeando assim um processo de culpabilização que, em que pese ser coletivo, é sentido individualmente.

Partindo-se disso, é estabelecido um entendimento de que o que existe é uma dialética da exclusão/inclusão, a qual produz subjetividades peculiares e que dizem respeito, numa gama de possibilidades, ao sentimento de inclusão, ao sentimento de revolta e/ou ao sentimento de discriminação, por exemplo.

É o sujeito quem sofre, mas tal sofrimento não tem sua origem nele, e sim a partir da sociabilidade que é determinada socialmente, entendendo ainda que, ao se considerar os afetos , torna-se possível refletir o tipo de atenção e de cuidado que o Estado destina a esses sujeitos (Sawaia, 2013). Sobre o tipo de comprometimento assumido pelo Estado, por quem e para quem ele atua de maneira comprometida e fiel, retome-se a corajosa poetisa preta e periférica:

A vida é igual um livro. Só depois de ter lido é que sabemos o que encerra. E nós quando estamos no fim da vida é que sabemos como a nossa vida decorreu. A minha, até aqui, tem sido preta. Preta é a minha pele. Preto é o lugar onde eu moro (Jesus, 2014, p.167).

Mais uma vez, a precisão e a simplicidade das palavras de Carolina Maria de Jesus chegam pungentes para mostrar um retrato visceral desse país. Falar em sofrimento do povo brasileiro é falar sobre as favelas e os corpos pretos, é falar da barriga vazia, dos camburões e da luta para manter a vida. Como demonstra Adorno (1996), a contribuição para esse retrato social advém de diversas clivagens, dentre as quais encontramos como alguns determinantes a baixa escolaridade, a condição econômica, o gênero, a origem regional, e a idade, sendo reforçada, nesse contexto, a desigualdade social pelo preconceito e pela estigmatização em associação ao racismo estrutural presentes na sociedade, sendo essa a realidade a disparadora diária de fatores que comporão o sofrimento ético-político.

Ao se falar em dor, várias são as imagens e sons que poderiam remeter a ela. Contudo, ao se olhar para o contexto dos países periféricos e colonizados, como é o caso do Brasil, que tiveram a sua construção societal ancorada no sistema escravista, é possível entender que a dor de que fala Sawaia, como já sinalizado acima no desabafo de Carolina Maria de Jesus (2014), tem sua fundação na cor negra da população africana raptada de seus lares, no cheiro do mar por onde navegaram os navios negreiros, e no sabor ferroso do sangue, tantas vezes derramado, de um povo escravizado por não ser tido como gente.

Em que pese os quase 132 anos datados desde o sancionamento da Lei Aurea, reconhecida como a que estabeleceu a libertação de escravos e escravas do Brasil, esta não se configurou como uma liberdade concreta para os povos herdeiros da Diáspora africana, especialmente quando se fala da situação da mulher negra. De acordo com Lélia Gonzales (1979), no período que sucedeu a dita abolição da escravatura, ficou sob a responsabilidade da mulher negra ser o sustentáculo de sua comunidade. Numa função de gestora da criação e manutenção moral e material de sua família, a condição de "liberta da escravidão" implicou em aumento da carga de trabalho físico (e também mental), de maneira que a mulher passou a trabalhar na casa da patroa, para assim obter rendimentos, sem perder de vista as suas obrigações domésticas com a sua própria família.

Sobre as afetações que o racismo pode gerar, destaque-se aqui, como forma de ilustração desse processo, o seguinte relato episódico a cerca de um momento de diálogo coletivo com as adolescentes participantes da presente pesquisa:

Durante a realização da conversa como parte da execução de uma das etapas da photovoice, Marielle relatou, diante da pesquisadora, de 3 agentes socioeducativas mulheres e das outras adolescentes presentes, que havia passado por uma situação de racismo dentro da instituição em que se encontrava. Segundo a garota, por ser negra, pobre e tatuada, ao ser comparada com uma outra adolescente branca (também pobre e tatuada), por uma profissional da instituição, contou ter sido rotulada de "bandida" em virtude da cor da sua pele e por suas tatuagens (Diário de campo).

Numa outra etapa da photovoice, durante a entrevista individualizada de aprofundamento da discussão coletiva, foi solicitado pela pesquisadora que Marielle falasse um pouco sobre como foi aquele momento no qual a adolescente declarou ter sofrido preconceito, ao que a garota respondeu:

Foi muito ruim! Eu fiquei muito revoltada, porque não tinha nada haver uma coisa com a outra... só porque a gente tava falando de tatuagem, aí uma agente, que eu não vou citar o nome, pegou e disse "Além da pessoa ser pobre, ser preta, ainda ser cheia de tatuagem"... começou a me ofender, porque eu era preta, porque eu era cheia de tatuagem... aí ela olhou pra outra menina, que também tem tatuagem, aí disso "Oh, ela é branca e ninguém vai saber que ela é pobre!"... ela quis dizer que, só por causa da minha cor e das minhas tatuagem, ela tava me julgando... "Ninguém nem perceber que ela é bandida" e num sei o que... (Marielle – em memória ) .

A revolta sentida por Marielle é constituinte do sofrimento ético-político e não é algo só dela, vivido apenas de forma abstrata. Diz respeito à um lugar humano coletivo, de mulher negra, jovem e pobre, mas que, a partir das singularidades do contexto socioeducativo, se desdobra de maneira específica na vida de garotas como ela. Aqui, introduz-se o primeiro núcleo de significação, "do sentimento de ser, de ter que ser e do que é possível ser", a partir do qual poder-se-á elaborar mediações elementares entre as nuances manifestas nas situações de preconceito, passando pelo sofrimento ético-político e chegando até as bases materiais que sustentam e também se alimentam desse fenômeno: o racismo estrutural, o patriarcado e o sistema capitalista.

Sendo assim, algumas importantes considerações precisam ser tecidas sobre o episódio anteriormente apresentado: a primeira delas diz respeito ao fato de, em que pese o comentário racista e preconceituoso ter sido proferido por uma pessoa específica, o racismo não se trata de uma problemática de ordem individual, pois uma postura racista é apenas a cortina aparente que esconde a realidade de uma enorme engrenagem que funciona em benefício, acima de tudo e de todos, do capital (Almeida, 2018). Dentro da história brasileira, o racismo é estruturante para a separação entre as classes sociais vigentes, contribuindo na efetividade da concentração de riquezas em pró das elites brasileiras e encontrando como na violência uma ferramenta política contínua e garantida pelo Estado, o qual, dentro do paradigma neoliberal, precisa ser mínimo15, para assim garantir a acumulação e a reprodução do capital (Oliveira, 2016).

Com este objetivo no horizonte, vidas são, literal e simbolicamente, estraçalhadas pela dinâmica do racismo estrutural a partir de variadas estratégias e espaços, e sendo efetivado por diferentes atrizes/atores sociais. Nesse sentido, Sueli Carneiro (2011) assinala que uma das fisionomias mais maléficas do racismo são exatamente os prejuízos psíquicos, os quais podem recair sobre a autoestima das pessoas que vivenciam experiências de discriminação racial. Em um momento subsequente da conversa entre Marielle e a pesquisadora, ainda sobre a situação já citada, ao ser questionada se situações de preconceito eram comuns dentro e fora da unidade, a adolescente respondeu

Fora, acontece direto! Os povo fica julgando só por causa das tatuagem e da cor... do jeito de se vestir, o modo de falar... à vezes nem... a pessoa nem é, mas só pelo modo da pessoa agir, de falar, os outro pensa que é ladrão, bandido, assassino... é só o que povo pensa (Marielle – em memória ) .

Ainda nessa mesma conversa, Marielle, sobre como se sente em relação à esse tipo de situação, dispara uma afirmação que, no mínimo, convoca a sociedade como um todo para refletir:

Muito mal, por que todo mundo erra... eu acho que, até uma pessoa branca e rica, erra mais do que a gente, que somo pobre, preto e cheio de tatuagem! Até porque, os rico também tem tatuagem... tem muita gente que julga pelas aparência (Marielle – em memória ) .

Corroborando com a fala de Marielle, destaque-se a declaração feita por Elza, outra adolescente entrevistada. Na referida ocasião, enquanto conversava com a pesquisadora sobre a violência policial que sofreu durante sua apreensão, a garota, ao ser questionada acerca do porquê de ter sido violentada pela polícia, afirmou "porque na boca deles eu sou uma vagabunda, bandida!" (Elza). Apesar de não ter trazido nessa fala específica a cor de sua pele como um elemento, mesmo ela sendo negra, assim como Marielle, ambas as adolescentes abordaram nuances de um sofrimento compartilhado.

Pensando no contexto brasileiro do encarceramento (seja nas prisões ou nas unidades do sistema socioeducativo), pontue-se que o estigma que recai sobre a juventude oriunda das periferias (que coincide também – mas não despropositadamente - com a juventude que vem sendo criminalizada e encarcerada) pode ser compreendido como um fator desencadeador do sofrimento de ordem ético-política, haja vista que, como declara Tejadas (2007), o processo de estigmatização sofrido por este público enseja a aniquilação das possibilidade de construção de uma identidade diferente daquela construída com base nas posturas perversas de parcelas da sociedade, o que desenvolve nas(os) adolescentes e jovens uma baixa autoestima, baseada na crença de que são incompetentes e incapazes.

 

Considerações finais: apontamentos para caminhos possíveis?

Partindo-se das reflexões fomentadas acima, foi possível desvelar alguns elementos constituintes do funcionamento da teia social cisheteropatriarcar-racista-capitalista no que tange o sistema socioeducativo feminino. Com base no conceito de sofrimento ético-político, mediações foram feitas entre o que aquelas meninas sentem (física e simbolicamente) e no quanto isso, quando colocado sob uma perspectiva de totalidade, expõe as reais motivações para que pessoas como elas sejam colocadas num lugar de invisibilidade, que garante, como em outros espaços, a opressão/exploração das mulheres, e mais cruelmente, das mulheres negras e periféricas. O espectro da redução da maioridade penal tem acompanhado a rebordosa conservadora que inebria o país, enaltecendo a priorização de políticas punitivistas em detrimento do desmonte das políticas educacionais. É papel da ciência não só produzir conhecimento, mas fazer dele transformador da realidade na qual se insere e, por isso, esta pesquisa pretendeu-se a ser instrumento de luto, um saber que diz do singular e também do universal, e que pode contribuir para fomentar uma práxis com vistas à emancipação humana. Uma produção de conhecimento na Psicologia Social com perspectivas interdisciplinares, declaradamente feminista, antirracista e anticlassista, comprometida com a ruptura das teias do reformismo, com o combate da lógica punitivista sobre a juventude pobre e com o fim da dominação dos corpos feminizados pelo cisheteropatriarcado.

 

Referências

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Contato com as autoras:
Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes
Departamento de Psicologia
Av. Sen. Salgado Filho, Cidade Universitária
Natal-RN, Brasil
CEP: 59078-900

 

 

Sobre as autoras:
Lívia Rebouças da Costa
Doutoranda no Programa de Pós-Graduação em Psicologia da UFRN, pesquisadora no Observatório da População Infantojuvenil em Contextos de Violência – OBIJUV/UFRN e no Grupo de Pesquisas Marxismo &Educação – GPM&E. Especialista em Psicologia Social e Comunitária pela FATECI, graduada e mestra em Psicologia pela UFRN, e psicóloga com experiência na política de Assistência Social.
ORCID: https://orcid.org/0000-0002-1826-2119.
E-mail: liviareboucasc@gmail.com
Ilana Lemos de Paiva
Possui graduação e mestrado em Psicologia pela UFRN, e doutorado pela UFRN/UFPB, com estágio na Universidad Autônoma de Madrid. É professora do Departamento de Psicologia da UFRN, coordenadora do Observatório da População Infantojuvenil em Contextos de Violência - OBIJUV/UFRN, e membro da Red Iberoamericana para la Docencia e Investigación en Derechos de la Infancia.
ORCID: https://orcid.org/0000-0002-3331-2890
E-mail: ilanapaiva@hotmail.com
1 O termo diz respeito ao poder não só dos homens sobre o conjunto das mulheres, mas também a hegemonia heteronormativa e binária sobre os corpos feminizados.
2 É importante que se problematize a função que a criminalização de populações específicas, por parte do estado e da classe dominante, tem para a criminalidade feminina, de forma que se compreende que, apesar da quebra das normas sociais ter ocorrência em diferentes substratos sociais e grupos racializados, o ato de delinquir ganha destaque e status de crime majoritariamente quando os/as agentes vêm da população negra e subalternizada.
3 A categoria sexo é compreendida aqui não numa perspectiva biologizante, mas como construção social, assim como o são as categorias raça e classe (Devreux, 2005). Dessa forma, ao se falar em "mulher" e/ou "mulheres", estão sendo assim consideradas também as mulheres transsexuais.
4 Compreende-se que existem relações sociais estruturantes, dentre as quais temos as relações sociais de sexo, as quais dizem respeito às contradições e conflitos existentes entre homens e mulheres; as relações saciais de raça, que se referem aos conflitos e contradições entre pessoas brancas e não-brancas; e as relações sociais de classe, que se referem aos conflitos e contradições entre a classe dominante e a classe dominada. É a partir da dinâmica dessas relações que, dentre outras coisas, se estruturam hierarquias de poder e subsídios para a opressão/exploração diferenciada e desigual entre tais sujeitos (Cisne, 2018).
5 Trata-se de uma pesquisa de mestrado.
6 Na unidade pesquisada, é realizado o atendimento de adolescentes e jovens mulheres de 12 a 18 anos de idade (apesar de existirem casos de jovens com idades entre 18 e 21 anos, que se encontram nas unidades em virtude de algumas questões específicas da legislação) para o cumprimento de medida de internação, de internação provisória (durante até 45 dias, enquanto é aguardada a decisão da justiça pelo estabelecimento da medida socioeducativa a ser cumprida) e para o pronto-atendimento de adolescentes e jovens mulheres apreendidas sob alegação de cometimento de ato infracional.
7 Desde o início da imersão, foi construído um diálogo, tanto com as adolescentes e jovens, quanto com a equipe técnica da unidade de internação, sobre a presença da pesquisadora naquele espaço e a finalidade prático-científica do referido estudo, de maneira que a participação do público foi voluntária e sujeita a desistências de acordo com o desejo de cada uma das meninas.
8 Um ponto importante a ser enfatizado sobre as participantes da pesquisa é que, pelas características do serviço prestado na unidade de atendimento socioeducativo estudada, houve uma instabilidade no quantitativo de adolescentes e jovens durante o período de imersão, de maneira que nem todas as meninas estiveram presentes do início ao fim dos três meses em campo, o que trouxe como desdobramento, por exemplo (além da própria voluntariedade já afirmada anteriormente), o fato das meninas não necessariamente terem participado da aplicação das duas ferramentas utilizadas na pesquisa.
9 A Photovoice, apesar de originalmente ser realizada em nove etapas, é uma técnica que possibilita adaptações, de maneira que, para a presente pesquisa, foram desenvolvidas sete etapas: 1) aproximação com o contexto das adolescentes e jovens (através da observação participante); 2) eleição dos temas específicos para guiar as fotografias a serem tiradas pelas adolescentes e jovens; 3) apresentação da proposta metodológica das fotografias para as adolescentes e jovens, de maneira que assim pudessem voluntariamente escolher se queriam participar ou não desse momento da pesquisa; 4) realização dos encontros para tirar as fotografias; 5) realização de encontro grupal com as adolescentes e jovens para a realização de elucidações a partir das imagens capturadas por elas, através do que foi possível levantar as motivações que as levaram a fotografar aquelas imagens específicas; 6) construção de roteiros para a realização de entrevistas individuais com as adolescentes e jovens; e 7) realização de entrevistas individuais de aprofundamento de alguns pontos que se sobressaíram no encontro grupal e que mereciam maior atenção. Tanto o encontro em grupo para a discussão das fotos quanto as entrevistas individuais foram registradas em áudio através de gravador de voz e posteriormente transcritas para que assim fosse possível a análise do material.
10 Em virtudade da rotativida inerente ao próprio sistema socioeducativo, das treze adolescentes e jovens, apenas quatro participaram integralmente de todas as etapas da pesquisa: uma adolescente de 14 anos e uma de 18 anos, e duas jovens, tendo uma 18 anos e a outra, 20 anos.
11 Essa primeira temática foi usada como piloto das oficinas de fotografia participativa.
12 Exercício de livre associação de palavras comumente usado em práticas grupais sociopedagógicas.
13 As entrevistas foram realizadas com base em roteiros semiestruturados específicos para cada participantes (apesar de existirem perguntas comuns à todas), gravadas em áudio e posteriormente transcritas.
14 A fim de resguardar a identidade das adolescentes e jovens que integraram o presente estudo, foram atribuídos nomes fictícios para as mesmas, escolha a qual não foi feita de forma aleatória, de maneira que cada menina foi chamada pela pesquisadora por nomes de mulheres que tiveram histórias fortes, de resistência, de luta e de insistência no Brasil.
15 Destaque-se que a compreensão de Estado mínimo aqui adotada é a de que ele assim o é em relação as políticas sociais, se mantendo máximo no apoio aos banqueiros e no trato punitivista à população pobre e negra.

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