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Epistemo-somática

versão impressa ISSN 1980-2005

Epistemo-somática v.3 n.2 Belo Horizonte dez. 2006

 

ARTIGOS

 

Ética Contemporânea: os anos 60 e o projeto de psicologia humanista

 

Contemporaneous ethic: the 60's and the project of humanist psychology

 

 

Ronny Francy Campos*

PUC/MINAS - Campus de Poços de Caldas/MG

 

 


RESUMO

SOBRE A ÉTICA NA PSICOLOGIA: O projeto de psicologia humanista pode, na minha interpretação, ser perfeitamente entendido como um aliado nas lutas contra a desumanização, as opressões, as injustiças; como uma das possíveis formas de resistência aos abusos do regime. É preciso reconhecer que a psicologia humanista ganha maior evidência na história da psicologia, especialmente a partir do momento em que apresenta uma nova proposta de abordagem humana. Suas idéias indicam que, diante das dificuldades da psicologia naquele momento (anos 60) em lidar com os problemas políticos e sociais, uma alternativa poderia ser trabalhar centrando-se exclusivamente na pessoa.

Palavras-chave: Ética, Ética contemporânea, História da psicologia, Psicologia humanista, Carl Rogers, Anos 60, Abordagem centrada na pessoa.


ABSTRACT

ABOUT ETHIC IN PSYCHOLOGY: The humanist psychology project can, as I see it, be perfectly understood as an ally in the struggle against dehumanization, oppression, injustice, as well as one of the possible ways to oppose the abuses of the regime. It is necessary to recognize that the humanist psychology stands out in the history of psychology especially from the moment he introduces a new proposal of human approach. His ideas point to the fact that, given the difficulty of psychology at that moment (the 60’s) in dealing with social and political problems, an alternative could be to focus exclusively on the person.

Keywords: Ethic, Contemporaeous ethic, The history of psychology, Humanist psychology, Carl Rogers, The 60’s, The person centered approach.


 

 

Os anos 60 são tidos, historicamente, como anos de revoltas políticas, estudantis e de costumes, sobretudo entre a juventude. Esses foram anos de contestação da sociedade e do poder. Desde o início, as contestações não contavam com nenhuma espécie de dirigentes, nem estiveram ligadas a nenhum partido político; os jovens desse período contestavam inclusive os profissionais da contestação. Esses jovens estavam unidos por afinidades e não por cumplicidade. Tratava-se, naquele momento, de combater uma sociedade que se vinha constituindo como meramente tecnocrática1, voltada exclusivamente para a busca de um ideal do máximo de modernização, racionalização e planejamento, privilegiando os aspectos técnico-racionais, em detrimento dos sociais e humanos, reforçando uma tendência crescente para a burocratização da vida social. Segundo Pereira (1984),

“Tudo isto, por sua vez, apoiado e referendado pelo dogma da ciência, ou melhor, pela crença absoluta na objetividade do conhecimento científico e na palavra do especialista, o intérprete autorizado do discurso da tecnologia, da produtividade e do progresso” (PEREIRA, 1984:28).

A militância dos jovens da década de 60 era, sobretudo, contra a desumanização do homem, promovida, silenciosamente, pela tecnocracia. Esses jovens não se limitavam à contestação política, contestavam toda cultura vigente, sobretudo os regimes repressivos e autoritários que as instituições sociais, de um modo geral, haviam estabelecido.

Para os historiadores, nessa década aconteceram coisas demais. Foi nela que praticamente nasceram os movimentos ecológicos e pacifistas, “que se criaram as comunidades rurais, que se ’descobriram’ no Ocidente as religiões milenares do Oriente, que se deflagrou a revolução sexual, que se mergulhou na experiência alucinógena” (MACIEL, 1987:07).

Outro fator bastante mencionado sobre os anos 60 é a vocação política dos jovens daquele momento. Eles queriam mudar o mundo. Perguntavam-se como se poderia tornar o mundo mais humano, melhor de se viver, menos insensato. Era inconcebível para eles que as pessoas, de um modo geral, vivessem alheias aos problemas sociais e políticos. Segundo Maciel, “esta era, para nós, a pior das alienações. Foi assim que, nesses anos, produziu-se uma arte política, uma cultura voltada para a questão social” (MACIEL,1987:07).

“(...) fico chocado ao perceber que as gerações mais recentes não mostram a mesma disposição para a transformação, em qualquer de seus níveis, preferindo a inércia conformista e deixando que os 60 ganhem, cada vez mais, a aura de ter sido a década da rebeldia par excellence” (MACIEL, 1987:08).

Para os jovens dessa década, não era apenas a organização social que estava errada, era tudo. O jeito como se vivia, a maneira como as pessoas se vestiam, a música etc. “Rejeição total”. Esses jovens contestaram tudo, todas as formas de organização social, fossem elas capitalistas ou socialistas2.

Havia uma recusa generalizada do sistema. Segundo Paes,

“Para aqueles setores da juventude que tinham acesso aos benefícios do crescimento econômico e tecnológico das sociedades desenvolvidas, mas que recusavam seus valores e sua forma de organização, não havia nem canais de expressão e participação, nem propostas de transformação social suficientemente atraentes” (PAES,1997:21).

Aparentemente, a sociedade em que eles viviam nada mais tinha de atraente para lhes oferecer. Era preciso inventar novas propostas de vida. Inventar novos padrões estéticos, novos costumes sexuais, novos tipos de comunidades, novos padrões familiares.

No campo da moda, por exemplo, as inovações foram exemplares. Para uma geração que vinha sendo criada sob rígidas condições de repressão sexual, de repente, inventa-se a minissaia, uma das expressões da liberdade emergente.

Nos Estados Unidos, como em vários outros países do mundo, o LSD era uma outra onda3. Para Maciel, “a repressão policial, na verdade, estimulou o tráfico clandestino e o uso cada vez maior da droga sem assistência médica, transformando o LSD em mais uma bandeira dos jovens rebeldes” (MACIEL,1987:51). Usavam-se as drogas alucinógenas como um meio de expandir a mente e alargar a consciência. Enquanto isso, em Londres, surgia uma outra sofisticação existencial, um novo estilo de vida, que foi apresentado para o mundo inteiro nas letras e no ritmo do rock dos Beatles e dos Rolling Stones que transmitiam a mensagem libertária para milhões de jovens do mundo. O rock, nos anos 60, foi uma das principais fontes inspiradoras das mudanças de comportamento da juventude. Essa transmutação dos valores na década de 60 foi resumida, em seus aspectos gerais, pela célebre tríade: sexo, drogas e rock’n’roll.

“(...) o espírito da década. A atividade sexual rompia a barreira do papai-e-mamãe (...); muitas drogas psicotrópicas, naturais ou químicas, deixaram de ser atribuídas diretamente ao Demônio só porque haviam sido colocadas fora da lei dos homens e passaram a ser usadas para o lazer ou a descoberta espiritual; o rock assaltava os corpos, através dos ouvidos, com sons elétricos que exigiram uma verdadeira mutação no sistema nervoso do público. Tudo era posto em questão” (MACIEL, 1987:43).

Outro fato considerável dessa década é que uma boa parcela da juventude se desenvolveu, intelectualmente, estudando as idéias de Hebert Marcuse, filósofo alemão pertencente à Escola de Frankfurt4, e um dos mais respeitados analistas da sociedade industrial desenvolvida. Para Marcuse, a revolta dos jovens era na realidade uma revolta contra a sociedade produtivista e os simulacros de valores que ela engendra. Marcuse foi categórico ao escrever que a sociedade ocidental, da forma como estava organizada, era “irracional como um todo”. Uma sociedade que se equiparava a um aparato tecnocrático visando a “desmontar” a imaginação, reservando a si todo o significado da razão, realidade, progresso e conhecimento só poderia ser irracional. O que Marcuse criticava, nessa sociedade, era a busca implacável de eficiência, de ordem, de controle racional cada vez mais amplo. O título de uma de suas obras mais discutidas é O homem unidimensional5; nela, apresenta a tese de que, na sociedade industrial desenvolvida, os homens pensam numa única dimensão e as idéias contrárias ao pensamento estabelecido são repelidas em nome da razão. Contudo, ele mesmo alertou e incitou os jovens, alegando que mesmo nessa sociedade há brechas para imaginar um mundo diferente, há brechas para a libertação. Foi isso que uma parcela considerável dos jovens dos anos 60 fez: passou a procurar as brechas, visando a construir resistências ou mesmo linhas de fuga do modelo sócio-político-econômico e religioso que os oprimia naquele momento.

Diante de organizações sociais cujos valores morais e os sistemas políticos eram entendidos como altamente repressivos e massificantes, a característica principal das “brechas” procuradas pelos jovens era possibilitar alguma afirmação da individualidade, afastando-os das formas mais tradicionais e disponíveis de luta política.

“Não se tratava da revolta de uma elite que, embora privilegiada, visasse a uma redistribuição da riqueza social e do poder em favor dos mais humildes. Nem de uma ’revolta de despossuídos’. Ao contrário. Era exatamente a juventude das camadas altas e médias dos grandes centros urbanos que, tendo pleno acesso aos privilégios da cultura dominante, por suas grandes possibilidades de entrada no sistema de ensino e no mercado de trabalho, rejeitava esta mesma cultura de dentro. E mais. Rejeitavam-se não apenas os valores estabelecidos mas, basicamente, a estrutura de pensamento que prevalecia nas sociedades ocidentais” (PEREIRA, 1984:23).

Para os jovens da década de 60, a transformação da sociedade era inevitável caso se quisesse viver mais livremente. O processo envolvia, principalmente, uma mutação psicológica que acabou marcando a década como seu acontecimento central. Contestavam-se todas as formas de autoridade. As relações: Estado e Sociedade, Pais e Filhos, Professores e Alunos, Patrões e Empregados etc., essas relações de poder, de um modo geral, passaram a ser criticadas como formas intoleráveis de autoritarismo. Para os jovens dessa década ninguém tinha mais nada a ensinar-lhes. A recusa era tanto num nível pessoal como político.

A partir de então, um novo mundo, ou um novo modo de “ser-agir-pensar-falar-sentir” e produzir conhecimentos vai ganhar expressão em diversas formas de criação cultural. Termos e expressões como “Desrepressão, Revolução individual, You are what you eat, Aqui e Agora, Flower Power etc. etc.” (PEREIRA, 1984:07), palavras de ordem e expressões como estas foram, num determinado momento, capazes de mobilizar multidões de jovens e intelectuais, nas diferentes partes do mundo6. Os jovens rejeitavam a cultura dominante, os modelos tradicionais da família, trabalho, escola, religião etc. Falava-se o tempo todo no surgimento de uma nova consciência, de uma nova era, de um mundo alternativo; enfim, de novos tempos. Procuravam-se novas maneiras de pensar, modos diferentes de encarar e de se relacionar com as pessoas e com o mundo. De acordo com Pereira (1984),

“Começavam a se delinear, assim, os contornos de um movimento social de caráter fortemente libertário, com enorme apelo junto a uma juventude de camadas médias urbanas e com uma prática e um ideário que colocavam em xeque, frontalmente, alguns valores centrais da cultura ocidental, especialmente certos aspectos essenciais da racionalidade veiculada e privilegiada por esta mesma cultura” (PEREIRA, 1984:08).

Segundo Roszak (1972), como não é bom que aos jovens caiba tamanha responsabilidade em criar ou imaginar soluções para toda uma sociedade, essa tarefa é grande demais para que tenham êxito. Nesse sentido, foi que eles contaram, também, com uma saída psicológica. Com isso, numa organização social com propostas notadamente desumanizadoras serão indicadas terapias humanistas. Os jovens da década de 60

“percebem (...) que a construção da boa sociedade não é uma tarefa primordialmente social, e sim psíquica (...). São os jovens da classe média que estão dirigindo essa política de consciência, e o estão fazendo de maneira ruidosa, persistente, agressiva (...)” (ROSZAK,1972:63).

Foi como se a consciência de classe, que até aquele momento era muito debatida, fosse cedendo lugar à consciência da consciência. Foi, num certo sentido, como se naquele momento a sociologia passasse a compartilhar o seu espaço político e cultural com a psicologia7.

Os jovens, que nesse momento reivindicavam condições para experimentações de novas formas de vida, que combatiam os autoritarismos, a tecnocracia, os modelos capitalistas de organização social, criaram, a partir desse momento, possibilidades para que se organizassem novas modalidades de encontros que rompessem definitivamente com o isolamento proporcionado pelo estilo de vida moderno e contemporâneo.

É possível mostrar a relação entre este movimento cultural dos anos 60 e as reflexões realizadas por Foucault sobre o tema do poder-resistência, sobretudo, com as suas análises sobre a sociedade disciplinar8 ou de “normalização” e a idéia de “resistência” aos tipos de poder e saber produzidos por essa mesma sociedade.

Para Foucault, as sociedades capitalistas constituem-se predominantemente como sociedades disciplinares. As formas de gestão, ordenação e modelagem das forças sociais, nessas sociedades, são viabilizadas por meio da organização do espaço, do controle do tempo, da vigilância e do registro dos atos e das condutas comportamentais, possibilitando assim a fabricação do indivíduo. Essa “maquinaria social” acabou proporcionando a produção de uma nova tecnologia política do poder, cujo exercício inseriu-se profundamente em todo o tecido social, cobrindo plenamente a existência dos indivíduos, disciplinando seus corpos, suas energias políticas e produtivas.

É em Vigiar e Punir, inclusive, que esse autor oferece várias pistas sobre essa temática.

“Houve, durante a época clássica, uma descoberta do corpo como objeto e alvo do poder. Encontraríamos facilmente sinais dessa grande atenção dedicada então ao corpo - ao corpo que se manipula, se modela, se treina, que obedece, responde, se torna hábil ou cujas forças se multiplicam. (...) ’O Homem-máquina’ de La Mettrie é ao mesmo tempo uma redução materialista da alma e uma teoria geral do adestramento, no centro dos quais reina a noção de ’docilidade’ que une ao corpo analisável o corpo manipulável. É dócil um corpo que pode ser submetido, que pode ser utilizado, que pode ser transformado e aperfeiçoado” (FOUCAULT, 1987:125-126).

Nessa obra, Foucault discorre sobre o surgimento e a proliferação desse novo tipo de poder, bastante eficaz e que acabou sendo por ele denominado de “poder disciplinar”. Esse poder, segundo ele, possibilita produzir o tipo de homem necessário para o funcionamento e manutenção da sociedade capitalista-industrial-tecnocrática. Segundo esse autor, o indivíduo é um dos mais importantes efeitos do poder disciplinar. Na modelagem e produção efetiva do indivíduo, o que se percebe são forças se debatendo contra forças: ações sobre os corpos, adestramento dos gestos, regulação dos comportamentos, normalização do prazer etc., tudo isso ocorre não só em instituições como também em dimensões sociais mais amplas.

Ao analisar o poder disciplinar, em diversas instituições sociais ocidentais, Foucault foi descobrindo como esse poder possibilitou a organização de uma tecnologia específica de controle e de normalização dos indivíduos. Essa forma de entender o poder levou-o a analisar a história, procurando sempre considerar as instituições não mais como entidades administrativas neutras, mas como um sistema social complexo de dominação, que são movidas por sofisticadas práticas que visam a disciplinar os corpos e as mentes dos indivíduos, classificá-los e discriminá-los. É o caso, por exemplo, das crianças, dos doentes, dos loucos, dos criminosos etc., em instituições disciplinares, como as escolas, os hospitais, as instituições psiquiátricas, as prisões. O objetivo é a normalização:

“não é mais a exclusão do indivíduo pela sua reclusão, mas, ao contrário, adestrando-o, ensinando-o, corrigindo-o, objetivam sua normalização, isto é, sua ’inclusão’ como indivíduo” (FOCAULT,1996:91-92).

As técnicas de poder disciplinar - que são técnicas de individualização - aplicadas nas mais diversas instituições ajudaram a engendrar um tipo específico de saber: as ciências humanas. Ao analisar as instituições, Foucault percebeu vários rituais de poder, que se sustentavam por certos saberes e vice-versa. Entretanto, ele encontrou também expressões que foram por ele entendidas como sendo resistências locais relativas ao avanço dessas relações de forças. Em síntese, o que Foucault fez, principalmente com a sua “genealogia”, foi analisar o poder para denunciá-lo mostrando como esse poder produzido pelas sociedades capitalistas age discriminando e objetivando as pessoas.

Penso que esse discurso é um discurso muito próximo do movimento cultural dos anos 60 e, em especial, dos jovens que dele participaram. Esses jovens estavam literalmente contra o poder, contra as disciplinas, da mesma forma que Foucault . Embora não se encontre nos textos desse autor uma referência aos anos 60 propriamente dito, pode-se fazer uma aproximação entre a idéia de resistência de Foucault e o que os jovens dos anos 60 pretendiam.

Segundo dois pesquisadores norte-americanos, Dreyfus e Rabinow, por exemplo, que se especializaram na obra de Foucault, para eles, esse autor - em suas obras dos anos 70 - nos oferece uma compreensão bastante original com relação aos temas relacionados às questões do poder e do saber. Segundo eles, Foucault propõe:

“... uma interpretação radicalmente nova de poder e saber: uma interpretação que não considera o poder como uma posse que um grupo tem e outro não; que não considera o saber objetivo ou subjetivo, mas um componente central na transformação histórica de vários regimes de poder e de verdade” (DREYFUS E RABINOW, 1995:131).

Foucault, inclusive, em 1982, apresenta um texto, O sujeito e o poder, que está publicado como apêndice no livro de Dreyfus e Rabinow9, no qual ele discute abertamente sobre as práticas de resistências existentes nas sociedades capitalistas ocidentais. Para ele é possível indicar três tipos de lutas:

“... contra as formas de dominação (étnica, social e religiosa); contra as formas de exploração que separam os indivíduos daquilo que eles produzem; ou contra aquilo que liga o indivíduo a si mesmo e o submete, deste modo, aos outros (lutas contra a sujeição, contra as formas de subjetivação e submissão)” (DREYFUS; RAINBOW, 1995:227).

Para esse autor, o objetivo principal desses tipos de enfrentamentos é o confronto com as formas de poder que quer impor ao indivíduo leis de verdade. Ele acrescenta, nessa mesma obra, que a verdade não está fora do poder nem sem poder.

“A verdade está neste mundo; nele ela é produzida graças a múltiplas coações (...). Cada sociedade tem seu regime de verdades, sua ’política geral’ da verdade. Há um combate ’pela verdade’, ou pelo menos, ’em torno da verdade’ (....)” (DREYFUS; RAINBOW, 1995:130).

De acordo com Silva (2001), “há lutas contrárias aos privilégios do saber, contra os efeitos dos discursos de competência e da qualificação, que emergem dos regimes de verdade presentes na atualidade” (SILVA, 2001:37).

E assim, de um certo modo, estão “dadas” as condições para o surgimento do projeto de psicologia humanista. No meu entendimento, o clima cultural dos anos 60 foi a principal condição de possibilidade para a constituição dessa proposta de psicologia. Essa psicologia será uma resposta, fará eco ao movimento cultural dos anos 60 nos EUA. Portanto, para discorrer sobre a proposta humanista de psicologia é necessário “falar” também dos Estados Unidos, da cultura norte-americana, pelo menos no momento em que essa modalidade de psicologia se inicia.

Segundo os historiadores do campo da psicologia, a psicologia humanista aparece, inicialmente, ligada ao chamado Movimento do Potencial Humano. Esse Movimento desenvolveu-se nos Estados Unidos, na década de 60, basicamente atrelado às manifestações do Movimento Contracultural.

Entre os jovens norte-americanos, vigorava nesse período a “filosofia” do drop out (cair fora), lema do famoso “guru” da contracultura, o professor de psicologia da Universidade de Harvard, Timothy Leary (1920-1996), que incitava os jovens com o seu lema: turn on, turn in, and drop out (se ligue, sintonize e caia fora). Timothy Leary foi expulso da Universidade de Harvard por fazer apologia, entre os estudantes, das “vantagens” do uso das drogas. Esse professor de psicologia visava a explorar ao máximo o potencial criativo da mente experimentando, junto com os seus alunos, drogas como o LSD e a mescalina, cujos efeitos, naquela época, eram ignorados pelos cientistas e cidadãos comuns10.

A palavra de ordem era que os jovens caíssem fora, o quanto antes, daquele sistema político e social altamente repressor e excessivamente voltado para o consumo de bens e de serviços e das tradicionais organizações familiares e sexuais. A sugestão era que se recusasse a cultura dominante e se fizesse uma rigorosa crítica ao establishment ou “sistema” (como então se dizia). Criticava-se também o predomínio da racionalidade científica que havia, entre outras coisas, servido para criar a bomba atômica e a máquina de guerra. Precisava-se construir, urgentemente, novos significados para a existência; novas formas de se viver; novos mundos e modos de se relacionar consigo mesmo e com as outras pessoas. Esses novos modos de vida significavam literalmente recusar a racionalidade científica, o modelo industrial de sociedade que essa racionalidade ajudou a produzir e os valores, que tanto essa racionalidade quanto sociedade ajudaram a engendrar. Diante dessas insatisfações, começaram as buscas de outros referenciais para se “re-organizar” tanto a vida pública quanto privada. Uma das idéias foi a de tentar construir um novo modelo de vida baseado especialmente na natureza.

Outro fato considerável é o que se refere à vinculação do Movimento do Potencial Humano com a produção e promoção do hoje tão difundido misticismo no Ocidente.

“Já no nascedouro do Movimento do Potencial Humano, nos Estados Unidos e na contracultura estavam presentes os chamados enfoques e técnicas orientais que influenciaram não somente muitas dessas práticas ’alternativas’, mas que penetraram profundamente nas camadas mais jovens da sociedade. Fortaleceram-se tendências religiosas, místicas, que prometiam um sonho de paz, de equilíbrio, de sabedoria e refúgio” (COIMBRA, 1995a:59)1111.

Sabe-se que o principal foco de propagação do Movimento do Potencial Humano foi a Califórnia, onde, na década de 60, foram fortes os grupos hippies e a contracultura. Sua origem remonta a 1962. O ponto de referência é o Instituto de Esalen, cuja finalidade consistia em descobrir os meios de melhorar o potencial humano (COIMBRA, 1995b:249).

Esse Movimento valeu-se das mais diversificadas técnicas grupais, corporais, psicodrámaticas, bioenergéticas, de massagens, da filosofia oriental etc. Foi recorrendo a essas “tecnologias”, inclusive, que, no campo psicoterapêutico, se desenvolveram os princípios do chamado “potencial humano”.

“(...) O Movimento do Potencial Humano busca uma ’melhoria’ das condições psicológicas do sujeito (...). Desse modo, o investimento no ‘potencial humano’ de cada um passa a ser a palavra de ordem no campo terapêutico, o que, nos anos 60, nos Estados Unidos, será caracterizado por um forte movimento grupalista, com maratonas, workshops, laboratórios de sensibilidade, grupos de famílias, de jovens, de conselheiros conjugais tendo como pano de fundo o movimento contracultural (...)” (COIMBRA, 1995b: 249-250).

Para essa autora, esta “febre grupal” não foi criada por acaso, ela foi produzida pelo momento histórico norte-americano, que, através dos grupos, tentou resolver, ou pelo menos enfraquecer, as freqüentes reivindicações políticas presentes naquele período. Para ela, houve a partir daí um esvaziamento das questões públicas, coletivas e uma aglutinação de forças nos campos psicológico, privado e familiar.

Segundo esta interpretação, o Movimento do Potencial Humano, que se propôs a questionar e enfrentar o poder vigente, naquele momento, acabou sendo rapidamente assimilado pelo sistema, passando também a participar e contribuir para deixar em segundo plano as demandas políticas e sociais surgidas naqueles anos.

Em síntese, esse Movimento propunha uma revolução a partir das práticas existenciais imediatas, livres das repressões sociais impostas pelo capitalismo. O foco de difusão dessas idéias está na Califórnia, onde são fortes, naquele momento, os grupos hippies e o movimento cultural dos anos 60, acima descrito.

O projeto de psicologia humanista, de um modo geral, pode ser interpretado também como mais uma resposta, um eco às insatisfações manifestadas pelos jovens desse período contra os aspectos mecanicistas, materialistas e autoritários da cultura ocidental contemporânea. Esse projeto de psicologia nasce pretendendo, com suas propostas, contribuir para a constituição de um novo homem que possibilitasse um outro modelo social, menos controlador, mais atento às necessidades tidas como intrínsecas aos seres humanos; defendia os ideais de auto-realização e criatividade, com relações pessoais mais abertas, autênticas, auto-expressivas e prazerosas.

Os psicólogos adeptos desse projeto, sintonizados com as questões do momento e o clima cultural da época, procuraram organizar e promover métodos terapêuticos que acentuavam a liberdade de escolha, a responsabilidade pessoal e a tendência à auto-realização, bem como a consideração do indivíduo no contexto da família, da escola, do trabalho, da religião e de outros ambientes sociais. O homem, para esses psicólogos, devia ser visto como um ser essencialmente livre e intencional, devendo ser entendido primordialmente pela sua dimensão consciente e, sobretudo, pela vivência de suas experiências presentes.

A proposta teórica da psicologia humanista, de um modo geral, tem, como pano de fundo, uma visão de homem como um ser em busca constante de si mesmo, que vive um contínuo processo de vir a ser e que apresenta uma tendência “natural” para se desenvolver. Segundo os psicólogos que participaram da realização desse projeto, é a dimensão subjetiva dos sentimentos, das emoções, dos valores, das inter-relações etc., que deve ser o tema central de estudos da psicologia. A meta principal desses psicólogos se volta para a transformação da ciência12, da consciência, dos valores e das atitudes, tendo como finalidade básica a busca de novos espaços e novos canais de expressão para o indivíduo.

Com isso, uma visão positiva do homem e das suas potencialidades tornou-se o ponto comum e de partida dos participantes desse grupo. Os psicólogos que começaram essa nova proposta13 não pretendiam fazer nenhuma revisão, nem tampouco visavam a readaptações de alguma escola de psicologia já existente. Propunham, tendo em vista o contexto sociocultural daquele momento, a adoção de uma nova visão de homem, uma outra concepção filosófica como ponto de partida e princípio norteador para a construção de um novo projeto básico de psicologia. A organização desse novo projeto passou a ter a repercussão de mais um movimento no campo da psicologia. Esse movimento, além de apresentar uma nova proposta para o estudo da psicologia, queria, sobretudo, assumir o compromisso de ajudar o homem a se modificar, a ser mais humano, a tornar-se plenamente humano. Segundo Matson (1974), os organizadores desse projeto de psicologia foram enfáticos ao dizer que grande parte do que ocorria já há algum tempo no campo da psicologia nada tinha de “psicológico”, e era isso que os levava a apresentar uma nova proposta.

A proposta teórica desses psicólogos iniciou-se praticamente com a proposição de que a psicologia precisava se tornar mais humana, mais interessada nos problemas do homem. A idéia surgiu, inicialmente, entre alguns psicólogos americanos que consideravam muito limitados os modelos de psicologia que até então vigoravam. Segundo Holanda (1998):

“A psicologia havia adotado, em determinado momento histórico, o modelo específico das ciências exatas, caracterizadas principalmente pelo posicionamento do observador face ao objeto; colocando-se, portanto, numa atitude empirista cujo objetivo era o estabelecimento das leis gerais do psiquismo” (HOLANDA, 1998:38).

Esse modelo, porém, segundo os psicólogos humanistas, não suprira as necessidades integrais de compreensão que o ser humano tinha14. Desse modo, esses mesmos psicólogos passaram a preconizar o renascimento do humanismo em psicologia; a volta ao humano como tema principal de estudo da psicologia. Essa foi, sem dúvida nenhuma, a bandeira mais importante desse novo projeto em psicologia.

Em reação a dois outros projetos já estabelecidos no campo psi - behaviorismo e psicanálise -, foi apresentado esse novo projeto como uma terceira alternativa para o estudo e a prática em psicologia. É muito comum, no campo das idéias, que toda nova proposta que se apresente use as anteriores como base, a partir das quais impele a si mesma para ganhar projeção. Em termos práticos, a nova proposta precisava afirmar, articuladamente, aquilo que eles consideravam as fraquezas da visão dominante vigente. Devido a isso, em seu início, a psicologia humanista teve como principais alvos as duas propostas acima mencionadas.

Segundo os responsáveis pela nova proposta, o behaviorismo nessa época - anos 1950/1960 - era uma modalidade de psicologia fundamentada exclusivamente em respostas condicionadas, que faziam do ser humano uma espécie de organismo mecanizado respondendo aos estímulos apresentados15. Para os behavioristas, o comportamento humano devia ser estudado objetivamente16. Segundo eles, como a consciência não era objetiva, não era cientificamente válida, conseqüentemente não podia ser estudada. Na concepção dos psicólogos humanistas, os humanos não podiam ser simplesmente objetivados, quantificados e reduzidos a unidades de estímulo-resposta, como queriam, de um modo geral, os psicólogos comportamentais.

Já com relação à psicanálise, esses mesmos psicólogos também se opunham ao que eles consideravam como as tendências deterministas encontradas na abordagem freudiana da psicologia, bem como sua minimização do papel da consciência. Criticavam os psicanalistas freudianos daquele momento por só estudarem pessoas perturbadas mentalmente - neuróticos e psicóticos. Suas críticas centravam-se, sobretudo, naquilo que eles consideravam como sendo “uma visão pessimista, determinista e psicopatologizante atribuída à teoria de Freud” (BOANAIM JR., 1998:25).

O projeto da psicologia humanista veio a destacar-se, principalmente, por ser uma proposta que, afastando-se do tradicional enfoque clínico de privilegiar o estudo das psicopatologias, passou a enfatizar também a saúde, o bem-estar e o potencial humano de crescimento e de auto-realização.

Os psicólogos que participavam desse novo movimento estavam, como já indicado anteriormente, atentos às manifestações culturais dos jovens dos anos 60 e trabalharam praticamente em favor das solicitações de mudanças que naquele momento eram exigidas. As propostas psicoterápicas por eles apresentadas foram usadas, principalmente, em pessoas de saúde mental considerada normal (ou pouco debilitada), a fim de elevar seus níveis de auto-conhecimento, ajudá-las a se relacionarem melhor consigo mesmas e com os outros e promover seus potenciais latentes de criatividade e auto-desenvolvimento17.

Por se ter concentrado mais em pessoas psicologicamente saudáveis do que em pessoas emocionalmente perturbadas, essa nova modalidade de psicologia e a sua abordagem clínica, especificamente nesse período, tornou-se bastante diferente das propostas anteriores. Denominadas terapias do crescimento, as terapias humanistas proliferaram nos anos 1960 e 1970, quando milhões de pessoas passaram a freqüentar grupos de encontros e programas de treinamento da sensibilidade em escolas, empresas, igrejas, presídios e clínicas privadas.

Ao contrário do behaviorismo e da psicanálise, a psicologia humanista não se identificou ou se iniciou com o pensamento de determinado autor ou escola. Tratando-se primariamente de um discurso congregado de diversas tendências, unidas especialmente pela oposição às abordagens citadas, assim como pela convergência em torno de algumas propostas comuns, o projeto humanista de construção da psicologia, segundo os seus adeptos, tem compromisso com uma visão de homem que orienta a criação e o desenvolvimento de novas formas de estabelecer a saúde psíquica e promover o desenvolvimento dos melhores potenciais humanos.

Este discurso teórico foi caracterizado pela congregação de estudiosos em torno de alguns tópicos e interesses que posteriormente vieram a ser apontados como temas típicos e preferenciais da psicologia humanista, as qualidades e capacidades humanas por excelência, tais como valores, criatividade, sentimento, identidade, vontade, coragem, liberdade, responsabilidade, auto-realização etc.

Esta interpretação é proposta por Holanda; segundo o autor, a psicologia humanista surgiu da tentativa de construir uma visão mais ampla do ser humano:

“(...) surgiu da necessidade de ampliar, naquele momento, a visão de homem que, segundo os psicólogos humanistas, se achava limitada e restrita a apenas alguns aspectos, a alguns elementos apresentados pelas perspectivas teóricas dos behavioristas e dos psicanalistas. Para eles, tanto a psicanálise quanto o behaviorismo apontavam para partes de um todo maior e mais complexo que é o ser humano, estando a visão total do ser humano prejudicada por esta ênfase nas partes” (HOLANDA, 1998:38).

A rigor, o projeto teórico desses psicólogos se fundamentou numa preocupação exclusiva com o homem, “no sentido de valorizar sua existência e buscar a sua essência naquilo que ele possui de mais íntimo e particular: sua experiência, sua vivência” (HOLANDA, 1998:41).

James Bugental (1967), influente adepto dessa proposta de psicologia, via como finalidade de construção desse novo projeto a descrição completa do que poderia significar existir como homem. Segundo ele, essa descrição, que nunca poderia ser alcançada plenamente, inclui a valorização das potencialidades inatas do homem, seu crescimento, maturidade e declínio, sua interação com o ambiente físico e social, o tipo e extensão de suas experiências e seu lugar no universo. Segundo esse autor, deve-se considerar central nesta proposta o ponto de vista do indivíduo tal como ele descobre o seu próprio ser e se relaciona com outros indivíduos e grupos sociais.

Este discurso passou logo em seguida a ser conhecido mundialmente como psicologia humanista, ou terceira força em psicologia. A proposta desse projeto era tentar definir a psicologia como o estudo do homem - apresentando assim o ponto de vista de que a psicologia faz parte das ciências humanas e não das ciências naturais18. Vale esclarecer, também, que o projeto de psicologia humanista nunca “se constituiu como um corpo único de teoria, mas uma convergência de várias diretrizes e escolas de pensamento” (MATSON, 1974:75). Ainda segundo Matson, “o denominador comum do que veio a ser chamado de psicologia humanista foi o respeito incondicional ao indivíduo, o reconhecimento do outro não como um caso, ou um objeto, ou um feixe de instintos, mas como ele mesmo” (MATSON,1974:77). Assim, segundo os psicólogos humanistas, o reconhecimento do homem individual, em sua totalidade, em contraste com o homem universal, é a marca registrada dessa modalidade de psicologia.

De acordo com Boanaim Jr. (1998), as articulações para o lançamento do novo projeto de psicologia coincidiram também com a maior difusão nos Estados Unidos do trabalho que já há algum tempo vinha sendo realizado na Europa por diferentes escolas de psicologia e psicoterapia, inspiradas em filósofos existencialistas e fenomenólogos. Sabe-se que a psicologia humanista, logo no seu surgimento, foi amplamente acrescida dessas duas outras perspectivas teóricas, a ponto de, posteriormente, ser denominada também de abordagem humanista-existencial-fenomenológica em psicologia.

O projeto humanista em psicologia foi oficialmente iniciado em 1961, com o lançamento e publicação do primeiro número de uma revista que, depois de vários encontros, discussões e sugestões, recebera o título de Revista de Psicologia Humanista, título esse que definiu o nome da nova proposta em psicologia. O sucesso da revista foi tão grande que levou, em 1963, à criação da Associação Americana de Psicologia Humanista. Segundo o Journal of humanistic psychology (1961), a consolidação do movimento se deu definitivamente, em 1964, quando, em um encontro realizado na cidade de Old Saybrook, grandes nomes da psicologia daquele momento compareceram em aberta adesão. Estiveram presentes, além dos fundadores - Abraham Maslow e Anthony Sutich -, incentivadores como Gordon W. Allport, Kurt Goldstein, Hadley Cantril, Rollo May, Henry A. Murray e Carl Rogers (BUGENTAL, 1967).

As teorias humanistas, articuladas por esses psicólogos, advertiam que o comportamento do ser humano não poderia ser compreendido apenas por fatores externos a sua consciência:

“(...) não poderia ser adequadamente entendido a partir de referências exclusivas a influências determinantes, externas à sua consciência e aos significados atuais que imprime ao mundo, sejam essas influências provenientes do ambiente, do passado ou do inconsciente” (BOANAIM JR., 1998:33).

Essas teorias e esses autores, tendo em vista, principalmente, o que ocorria naquele momento, passaram a privilegiar mais a dimensão consciente e o vivenciar da experiência presente. Embora, atualmente, tenha-se o conhecimento da diversidade das teorias em psicologia que abrangem as idéias humanistas, o reconhecimento do que eles consideram como potencial criativo saudável do ser humano sempre tendeu a congregá-las num objetivo comum. Para esses psicólogos, o objetivo de qualquer tratamento em psicologia pode ser formulado em uma única frase: levar o indivíduo a ser ele mesmo. Propiciar aos indivíduos a conquista de uma existência autêntica, autoconsciente, transparente, espontânea, verdadeira, congruente (BOANAIM JR., 1998), eis o que pretendem esses psicólogos.

Acrescente-se que o amplo desenvolvimento de terapias e métodos de trabalho com grupos, especialmente na forma de vivência intensiva, foi uma das tendências que mais marcou esse projeto, e sua proposta teórica configurou-se como um estudo dos seres humanos e de sua conduta, sendo tanto do ponto de vista teórico quanto histórico muito bem representada pelas obras de Maslow e Rogers.

 

 

Referências

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Recebido em: 20/11/2006
Aprovado em: 06/12/2006

 

 

* Psicólogo • Doutor em Psicologia Clínica pela PUC/SP • Professor de Ética Profissional do Psicólogo e Teorias e Técnicas Psicoterápicas da PUC/MINAS - Campus de Poços de Caldas/MG • Endereço eletrônico: ronny@pocos-net.com.br
1 A tecnocracia pode ser definida como aquela sociedade na qual os governantes justificam-se invocando especialistas técnicos, que, por sua vez, justificam-se invocando formas científicas de conhecimento. “Na tecnocracia tudo aspira a tornar-se puramente técnico, objeto de atenção profissional. Por conseguinte, a tecnocracia é o regime dos especialistas - ou daqueles que podem empregar os especialistas” (ROSZAK, 1972:20).
2 “Enquanto nos países capitalistas os jovens recusavam o “american way of life”, ou o “campo de concentração de luxo”, nos países socialistas, ao contrário do que divulgava a imprensa ocidental, os estudantes não pretendiam a volta ao capitalismo, mas contestavam o autoritarismo stalinista das direções partidárias que impedia a construção do socialismo” (PAES, 1997:28).
3 LSD é a abreviatura de Lyserg Saeure Disethylamid (distalimida de ácido lisérgico). As mudanças de personalidade são freqüentes e as condições psíquicas de cada indivíduo, sob a ação dessa droga, podem originar uma série de manifestações imprevisíveis. Segundo Maciel (1987), calcula-se que, na década de 60, de 20 a 30% da juventude universitária norte-americana tomavam LSD como quem fuma um cigarro.
4 Usa-se o termo “Escola de Frankfurt” para indicar os intelectuais que se reuniam em Frankfurt, originariamente, nas décadas de 20 e 30. Entre os nomes mais destacados dessa Escola estão Max Horkheimer, Hebert Marcuse, Theodor Adorno, Walter Benjamin e Jürgen Habermas.
5 No Brasil, essa obra de Marcuse foi publicada com o título de A ideologia da sociedade industrial.
6 As manchetes da imprensa da época demonstram que essas idéias adquiriram dimensões internacionais. Em todo Ocidente (assim como no Japão e em certas partes da América Latina - o Brasil inclusive) são os jovens que se vêem na condição de única oposição radical efetiva em seus países. Segundo Roszak, “nem todos os jovens, é claro - talvez apenas uma minoria dos universitários. Entretanto, nenhuma posição analítica, senão a que vê uma minoria militante de jovens dissidentes em choque com a política apática de consenso e coalizão de seus pais burgueses, parece explicar as grandes perturbações políticas da época” (ROSZAK, 1972:16).
7 Hebert Marcuse foi um dos primeiros pensadores a apontar, naquele momento, a primazia da consciência na mudança social.
8 “Disciplinar”: é assim que Foucault adjetiva o tipo de sociedade que começa a instalar-se a partir dos fins do século XVIII, desenvolve-se no decurso do século XIX e que ainda hoje marca a sociedade que conhecemos” (MUCHAIL, 1983:10).
9 Dreyfus, Hubert L. e Rabinow Paul. MICHEL FOUCAULT, Uma trajetória filosófica: (para além do estruturalismo e da hermenêutica). Trad. Vera Porto Carrero. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1995.
10 Atualmente, tem-se a informação científica de que uma dose de apenas 20 microgramas de LSD é suficiente para produzir um efeito alucinógeno capaz de durar até dez horas.
11 Ressalta-se, segundo essa mesma autora, que nas últimas três décadas, por exemplo, vêm sendo bastante reforçados os processos de subjetivação vinculados “ao ensina-me a viver”, ao “como fazer amigos e influenciar pessoas”, ao “self-helping”, dentro da promessa de felicidade aos moldes do “American way of life”. Todas essas influências místico-religiosas, em sua maioria, advindas do Oriente, ao prometerem a “felicidade” e um “mundo de paz interior”, fortaleceram unilateralmente as subjetividades da “autenticidade”, da “liberdade interior”, do privado em detrimento do público (COIMBRA, 1995a:59).
12 Até bem próximo dos anos 60, os psicólogos que se diziam comprometidos com a ciência preocupavam-se, exclusivamente, em atender aos padrões mínimos de ciência, entendida na época como ciência natural. Os psicólogos humanistas desejaram uma concepção diferente de ciência - seja um novo tipo de ciência, seja uma significação mais ampla de ciência, que se mostrasse mais atenta aos problemas fundamentais apresentados pelos indivíduos naquele momento.
13 Na lista dos fundadores aparecem os nomes de Abraham Maslow, Anthony Sutich, Gordon W. Allport, Kurt Goldstein, Hadley Cantril, Rollo May, Henry A. Murray e Carl Rogers.
14 Na época, alguns psicólogos argumentavam que a psicologia só poderia tornar-se verdadeiramente uma ciência se mudasse seu foco de experiência consciente para o estudo do comportamento. Os behavioristas, por exemplo, acreditavam que “a experiência psicológica é conhecimento privado que não podia ser observado e verificado por outros e, conseqüentemente, se permanecesse assim, ficaria fora do reino da ciência”.
15 Segundo Millhollan e Forisha (1978), O behaviorismo como projeto de psicologia foi pela primeira vez anunciado por Watson, em um artigo intitulado A Psicologia como o behaviorista a vê, publicado em 1913. Seu campo de pesquisa principal era a psicologia animal. Contudo, ele acreditava que a mesma abordagem podia ser usada com seres humanos.
16 Por comportamento (behavior), Watson, por exemplo, entendia os movimentos de músculos e atividades de glândulas. Para ele, o pensamento só podia ser estudado como movimento da garganta, pois pensamento, como ele entendia, era simplesmente fala subvocal. Sentimentos e emoções igualmente eram movimentos das vísceras. Assim, esse autor punha de lado todos os aspectos da consciência em favor de uma ciência de comportamento puramente objetiva.
17 Para Castel (1987), a proposta de uma “terapia para os normais” não deixa de expressar uma curiosa ambigüidade. Segundo ele, se tomarmos ao pé da letra essa metáfora, pode ser que ela signifique que é a normalidade que deve funcionar a partir de então como sintoma.
18 Sabe-se que a psicologia concebida como ciência natural, até os anos 60, quase sempre ocupou posição dominante entre os psicólogos e aqueles que não concordavam com essa denominação eram tidos como contestadores. Foi nesse sentido, principalmente, que Abraham Maslow procurou desenvolver a noção de terceira força em psicologia, tendo como intenção primordial proporcionar uma identidade comum aos contestadores.

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