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Psicologia em Pesquisa

versão On-line ISSN 1982-1247

Psicol. pesq. v.3 n.1 Juiz de Fora jun. 2009

 

RELATOS DE PESQUISA

 

Ortografia do português do Brasil e habilidades linguísticas em crianças bilíngues francês-português

 

Orthography and linguistic skills in French-Portuguese bilingual children

 

 

Berenice Marie Ballande RomanelliI, II* ; Sandra Regina Kirchner GuimarãesII, **

I Faculdade de Administração, Ciências, Educação e Letras
II UFPR

 

 


RESUMO

A presente pesquisa tem como objetivo analisar a escrita de palavras em português (ortografia) produzida por crianças bilíngues que têm como língua materna o francês, concentrando-se nas suas habilidades linguísticas. Participam 11 crianças com idade entre 6 e 11 anos, que aprendem o português em uma escola francesa de Curitiba/PR. Foi realizado um ditado de seis palavras isoladas seguido de uma entrevista com cada criança para investigar suas explicações quanto às suas escolhas ortográficas. O desempenho no ditado e suas respectivas explicações foram classificados e discutidos. Os resultados mostram que as crianças estão aprimorando a hipótese alfabética e substituindo-a pela hipótese ortográfica, e que uma maior experiência das crianças com o português escrito poderá consolidar a representação gráfica das palavras. Sugere-se que o trabalho docente leve à tomada de consciência do aprendiz sobre diferentes aspectos da linguagem, ressaltando o desenvolvimento das habilidades linguísticas na aprendizagem de uma língua estrangeira.

Palavras-chave: Habilidades linguísticas, Ortografia, Bilinguismo.


ABSTRACT

The current research aims to analyze the writing of words in Portuguese (orthography) made by bilingual children who have French as their mother language, concentrating on the linguistic skills of these children. Participants were 11 children aged between 6 and 11 years, who learn Portuguese in a French school in Curitiba/PR. A dictation of six isolated words followed by an interview with each child to investigate his/her explanations regarding orthographic choices. Their performance in the dictation and respective explanations were classified and discussed. The results show that the children are improving the alphabetic hypothesis and replacing it by the orthographic hypothesis, and that a greater experience of the children with written Portuguese may consolidate a graphic representation of words. It is suggested that teaching leads to the grasp of consciousness of the learner regarding different aspects of the language emphasizing the development of linguistic skills in learning a foreign language.

Keywords: Linguistic skills, Orthography, Bilingualism.


 

 

Introdução

Os deslocamentos dos indivíduos por diversos países provocam o contato e a troca entre diferentes culturas, fazendo com que a sociedade tenha características cada vez mais globais e heterogêneas. As pessoas que chegam a uma nova nação entram em contato com outra cultura, uma nova forma de entender o mundo, de viver e de falar. A língua é uma das características mais marcantes da cultura, e sua aprendizagem é uma premente necessidade de imigrantes que pretendem adaptar-se a um novo país de língua diferente daquela de seu país de origem. Assim, as redes de relação e de comunicação às quais cada sujeito participa geram impacto sobre os diferentes grupos linguísticos por ele visitados e vivenciados.

O bilinguismo se caracteriza pelo fato de as pessoas interagirem com o mundo ao seu redor, utilizando duas ou mais línguas (Grosjean, 1982). De acordo com esta definição, não é necessário que as pessoas utilizem as duas línguas de forma equivalente, podendo ser mais fluentes e ter melhor desempenho em uma delas.

O uso concomitante de duas ou mais línguas parece levar a certa “vantagem” cognitiva. Segundo Cummins1 (citado por Hagège, 2005) pessoas bilíngues têm resultados melhores do que monolíngues em atividades que avaliam a habilidade metalinguística, ou seja, a capacidade de se distanciar da língua para refletir sobre ela.

A habilidade metalinguística caracteriza-se pela capacidade do indivíduo de tratar a linguagem como objeto de análise e reflexão, controlando e planejando os mecanismos mentais presentes em atividades linguísticas (Gombert, 1990). Durante os últimos decênios, vários estudos sugerem o papel das habilidades metalinguísticas no acesso à escrita, revelando-as associadas à aprendizagem eficaz da leitura (Demont, 1997). Assim, para a aprendizagem da língua escrita é essencial que o aprendiz desenvolva habilidades linguísticas, mas também, principalmente, as metalinguísticas.

O processo de escrita requer de quem escreve uma análise dos fonemas para representá-los graficamente. Contudo, as palavras escritas também representam o significado, ou seja, em um sistema alfabético a escrita utiliza a mediação da fala. Ou, em outros termos, a escrita alfabética é uma representação direta dos significantes verbais (sequências de sons que compõem as palavras), representando indiretamente os significados. Desse modo, a fim de compreender o funcionamento da escrita, é necessário que o indivíduo seja capaz de diferenciar entre significante e significado, reconhecendo o caráter arbitrário da relação entre eles.

O sistema de escrita das línguas alfabéticas, porém, não representa uma transcrição perfeita dos fonemas (não existe uma correspondência biunívoca e recíproca entre fonema e letra). Em português, por exemplo, podem ser utilizadas duas letras para representar uma unidade sonora (dígrafos), como: gu em gueto, qu em quero, ch em cheio. Outras vezes são utilizadas letras que não têm valor sonoro, mas que são grafadas (h em hoje). Além disso, uma mesma letra pode estar relacionada com diferentes segmentos fonéticos (x em exato, xale, sexo), enquanto um mesmo segmento fonético pode ser representado por diferentes letras, como, por exemplo: /k/ em calo, queijo; /s/ em cintura, sapato, passeio. Enfim, existem situações em que a representação alfabética básica é alterada, as quais precisam ser dominadas para que se tenha sucesso na leitura e na escrita. A escrita ortograficamente correta decorre do aperfeiçoamento da linguagem escrita e envolve regras de transcrição específicas a cada língua.

Tanto na língua portuguesa quanto na francesa, a mediação fonológica é insuficiente para garantir a escrita correta das palavras. Dessa forma, toma espaço central o código ortográfico, que se refere à configuração das letras que compõem uma palavra (Golder & Gaonac’h, 1998). A partir do estágio alfabético o domínio pleno do sistema de escrita exige do aprendiz a consciência das irregularidades da correspondência entre letras e sons que, embora aparentemente arbitrárias, podem ser derivadas do contexto ortográfico ou da estrutura morfológica das palavras. Ou seja, o aperfeiçoamento da concepção alfabética de escrita requer a consciência de que as palavras nem sempre são escritas da forma como são ditas, por ser a escrita baseada em convenções ortográficas.

De acordo com Zorzi (2003), um grande desafio a ser enfrentado na aprendizagem da linguagem escrita é o de estabilizar a grafia convencional das palavras que sofrem variação entre a fala e a escrita. O autor explica que esta aquisição se dá pela substituição da hipótese fonética (baseada nos padrões da pronúncia) pela ortográfica, em que o aprendiz passa a dar mais atenção e consideração às regras linguísticas e aos aspectos visuais das palavras. Para compreender a representação da escrita a criança precisa ouvir leituras, guiando-se pela informação auditiva. Por outro lado, para aprender a ortografia, ela precisa trocar o canal receptivo para guiar-se predominantemente pela visão. Para Jolibert (1994, p. 116) “à medida que as crianças fazem observações, descobrem analogias, diferenças, elas vão descobrindo estruturas da língua, criando para si referências, mas também uma atitude de interrogação”. Para a autora, os primeiros passos da aprendizagem da escrita são marcados pela intuição, seguidos pela racionalização, diretamente relacionados com a educação formal, que possibilita a sistematização da escrita.

Segundo Carraher (1985), os erros de ortografia das crianças refletem justamente seu apego à regra alfabética básica de representar cada som por uma letra. Diante disso, Faraco (1992, p. 55) salienta que “os ‘erros’ observados na grafia dos alunos devem ser encarados como parte do processo de internalização do sistema. Em geral, esses ‘erros’ são perfeitamente previsíveis e decorrem, em boa parte, das próprias características do sistema gráfico (...) e da hipótese generalizante de que há correlações uniformes e biunívocas entre letras e sons.”

Os erros construtivos, como são chamados por Ferreiro e Teberosky (1985), fornecem pistas acerca das elaborações das crianças sobre a estrutura e organização da linguagem, assim como os passos necessários para se alcançar o êxito. Os erros ou alterações demonstram o nível do sujeito no que se refere à compreensão e ao domínio da leitura e da escrita. Leal e Roazzi (2003, p. 100) explicam que “os erros de grafia e suas formas de análises tornam-se ferramentas privilegiadas (...) para compreender e conhecer não apenas as estratégias com que a criança enfrenta os diferentes tipos de tarefas de escrita, como também as fontes de conhecimento empregadas preferencialmente.” Desse modo, o erro deixa de ser visto como algo que precisa ser eliminado, para ser considerado como fonte de informação acerca do domínio da linguagem escrita por parte da criança.

Nessa perspectiva, destaca-se o estudo de Rego e Buarque (2003) que investigaram o aperfeiçoamento da escrita no estágio pós-alfabético de forma semelhante ao que foi feito na presente investigação, mas analisando o caso específico do uso do “r” em crianças brasileiras.

Assim, a presente pesquisa teve como objetivo analisar a escrita de palavras em português (ortografia) produzida por crianças bilíngues que têm como língua materna o francês, concentrando-se nas habilidades metalinguísticas dessas crianças.

 

Método

Participantes

A pesquisa foi realizada em uma escola que segue o currículo francês inserida no espaço físico de uma escola particular de Curitiba. Participaram da pesquisa 11 crianças francesas que aprendem o português como segunda língua a partir do momento em que chegam ao Brasil, e sua frequência à escola permite a continuidade da escolarização francesa regular.

Tais crianças falam francês com seus pais e com os professores franceses, mas também aprendem português na escola, sobretudo para oportunizar situações de comunicação e interação com brasileiros. Destaca-se que esses alunos vieram para o Brasil, juntamente com a família, por motivo de trabalho de um dos genitores e estão aprendendo o português como segunda língua. As famílias chegaram ao Brasil em momentos diferentes, havendo variação do tempo em que estão no país entre 2 meses e 2 anos e 7 meses.

Material e Procedimentos

Primeiramente, os pais foram informados por meio de uma carta sobre a realização da pesquisa e o convite para que seu(s) filho(s) participasse(m), se tivessem interesse. Todas as crianças que participaram da pesquisa foram devidamente autorizadas por seus pais por meio da assinatura do termo de consentimento livre e esclarecido. Destaca-se que, para assegurar o anonimato dos participantes, neste texto, eles foram identificados com nomes fictícios, inventados por eles mesmos.

Foi realizado um ditado de seis palavras isoladas seguido de uma entrevista com cada criança para investigar suas explicações quanto às suas escolhas ortográficas.

1. Ditado

O material utilizado para investigar a capacidade ortográfica dos participantes na escrita do português foram seis palavras2 que apresentam alguma característica que ultrapassa a regra alfabética básica de representar cada som por uma letra, como se existisse uma correspondência biunívoca e recíproca entre letra e som. As seis palavras ditadas individualmente às crianças foram: corajoso, enfrentou, folhas, mamãe, marreca e usam. Em francês estas palavras são traduzidas e escritas da seguinte forma, na mesma ordem acima: courageux,(Il)a affronté, feuilles, maman, cane (la femelle du canard),(ils) utilisent.

Entrevista

Depois da escrita das palavras, perguntava-se à criança os motivos que determinaram suas escolhas ortográficas, suas hipóteses e seus conhecimentos acerca da escrita, com o objetivo de avaliar suas habilidades metalinguísticas. Essa forma de enquete foi empregada utilizando como referência o estudo de Guimarães e Roazzi (2003), que também investigaram as justificativas das crianças quanto à ortografia das palavras, buscando avaliar o nível de compreensão a respeito do sistema ortográfico da língua portuguesa que as crianças detinham.

Na ficha onde foram escritas as palavras do ditado, havia 6 espaços reservados para a escrita das palavras e, ao lado de cada um deles, um outro espaço (de igual tamanho) que poderia ser utilizado pela criança para reescrever a palavra, se o quisesse. Assim, se durante a entrevista a criança mudasse de idéia sobre a grafia da palavra, ela podia reescrevê-la da forma que considerasse mais correta.

Salienta-se que o pedido de explicação sobre a grafia escolhida não foi direto, uma vez que é comum entre as pessoas, que utilizam o português em sua forma escrita, terem dificuldade em justificar a grafia. Portanto, as perguntas foram efetuadas em forma de diálogo, como um convite à reflexão, como a seguir:

  • Você acha que escreveu certo ou errado? Você ficou em dúvida?
  • Você sabe por que escreveu assim?
  • Algumas crianças escreveram de tal jeito, o que você acha disso?

As crianças também foram questionadas com exemplos, ou seja, perguntava-se sobre a possibilidade de trocar uma das letras por ela escolhida por alguma outra letra, e que som resultaria dessa troca.

Destaca-se, ainda, que as entrevistas foram diferenciadas para as crianças da turma de alfabetização (6 e 7 anos) e as maiores, das demais turmas, com idade entre 8 e 11 anos. Ou seja, as crianças menores foram solicitadas a explicar o que é difícil ou fácil na escrita de cada palavra, mas não foram muito questionadas para não interferir negativamente em sua aprendizagem.

O desempenho dos participantes no ditado e suas respectivas explicações foram classificados e discutidos a posteriori. Considerou-se que as explicações dadas pelas crianças são conhecimentos explícitos verbais (Morais, 2003), uma vez que são produto da reflexão deliberada das crianças sobre a ortografia da língua portuguesa.

Resultados e Discussão

As explicações dos participantes para a escrita das palavras ditadas constituem-se num material interessante para entender suas escolhas ortográficas e as hipóteses construídas a respeito do sistema de escrita, ao mesmo tempo em que demonstram as habilidades metalinguísticas destas crianças.

Assim, para analisar os dados obtidos nas entrevistas individuais foram organizadas várias categorias, tomando-se como referência a própria escrita da criança, bem como suas explicações.

Para este artigo foram extraídos alguns trechos do diálogo entre a criança e a pesquisadora que pudessem mostrar a reflexão das crianças com relação à ortografia das palavras ditadas. Inicialmente, foi analisado o uso do “rr” e do “r” nas palavras “marreca”, “corajoso” e “enfrentou”, o uso do dígrafo “lh” na palavra “folhas” e, por último, a representação dos ditongos nasais /ãe/ da palavra “mamãe” e /ãu/ da palavra “usam”.

Assim como registrado no estudo de Rego e Buarque (2003), para os brasileiros, a diferenciação e uso do dígrafo “rr” na escrita é uma etapa desafiadora da aprendizagem da ortografia. Contudo, para as crianças francesas tal diferenciação constitui-se numa dificuldade ortográfica especial, já que para elas existe um agravante: a pronúncia. Muitas vezes não distinguem oralmente o /r/ do /R/, ou mesmo o /l/ do /r/, como pode ser percebido nas análises apresentada a seguir:

Generalização ou falta de discriminação entre /r/ e /R/

  • Pierre (10 anos, há 8 meses no Brasil) escreveu “marequa” (palavra ditada: marreca) e leu “marreca”.

Pesq: Como foi escrever esta palavra?
Pierre: Eu não sei se tem dois “r” (...).
Pesq: Porque você ficou na dúvida se era um “r” ou dois?
Pierre: Porque a gente diz marrêca.
Pesq: Se tivesse um “r”, como seria?
Pierre: marrêca.

Como Pierre não conseguiu discriminar o som /R/ de /r/, provavelmente por esse motivo ele não tenha conseguido chegar a uma conclusão na escrita.

Dificuldade de diferenciação entre o “l” e o “r”.

  • Zorro (6 anos, nasceu no Brasil, voltou para a França com 2 anos e retornou ao Brasil há 2 anos) escreveu “coragozo” (palavra ditada: corajoso) e leu “corajoso”

Pesq: Você sabe por que você escolheu estas letras?
Zorro: Porque é mais fácil.
Pesq: Você teve dúvidas?
Zorro: Silêncio.
Pesq: Teve alguma parte da palavra em que você teve que fazer uma escolha?
Zorro: Tive que fazer uma escolha.
Pesq: Onde, em que letra?
Zorro: No “r”.
Pesq: Que outra letra poderia ser?
Zorro: Um “l”, ou uma coisa com um r dentro.

Mesmo tendo escrito corretamente a sílaba da palavra que tem o “r”, Zorro demonstrou ter ficado na dúvida se era um “r” ou um “l”. Ele complementou dizendo que poderia ser um “l” ou uma coisa com um “r” dentro, o que sugere uma percepção de que há diferença entre o /r/ e /R/ (embora ele não soubesse como representá-la graficamente). No que se refere ao uso do “g” no lugar do “j”, possivelmente Zorro fez uma analogia com a palavra em francês que se escreve “courageux”.

Percepção da diferença entre os sons /r/ e /R/, mas escrita incorreta

  • Supergirl (10 anos, há 2 anos e 7 meses no Brasil) escreveu “corrajoso” (palavra ditada: corajoso) e leu “corajoso” (pronúncia correta).

- Pesq: Você ficou na dúvida ao escrever esta palavra?
Supergirl: Sim, porque teve dois “r”.
Pesq: Qual era a dúvida, ou dois “r” ou...?
Supergirl: ou um “r”.
Pesq: E porque você escolheu pôr dois “r”?
Supergirl: Porque é corajoso (pronúncia correta para um “r”)
Pesq: Se tivesse um “r”?
Supergirl: Corajoso (mesma pronúncia), não sei. Não sei.
Pesq: Leia como fica do jeito que você escreveu.
Supergirl: Corajoso
Pesq: E se tivesse um “r” só seria?
Supergirl: Corrajoso

É possível que a explicação de Supergirl tenha levado em conta o uso do “r” na língua materna. Neste caso, sua hipótese é a de que o som /R/ é grafado “r” como em francês (“courageux” - cujo som é /R/).

Compreensão da diferença entre o “r” e o dígrafo “rr”:A criança identificou uma diferença e a necessidade de colocar dois erres, mas não conseguiu pronunciar a palavra com um “r” só:

Fanie (8 anos, há 5 meses no Brasil) escreveu “mareca” (palavra ditada: marreca) e leu “marreca”

Pesq: Foi fácil de escrever?
Fanie: Sim.
Pesq: Poderia ser diferente?
Fanie: Não.
Pesq: Quando eu leio a palavra que você escreveu eu digo mareca e a palavra que eu disse era marreca. Você percebe alguma diferença?
Fanie: Não.
A pesquisadora repetiu as duas palavras.
Fanie: Ah, sim. Quando tem /R/ é dois “r”, e quando é mais doce, mais leve, é um “r”.

Fanie havia inicialmente generalizado os sons /r/ e /R/, mas conseguiu perceber a diferença entre estes sons ao ser questionada pela pesquisadora. Ela pôde perceber a diferença entre a escrita correta e a que ela tinha conseguido grafar num primeiro momento. Fanie, assim como Supergirl, pode ter realizado uma analogia com a ortografia do francês, já que o som da grafia “r” em francês (como em courageux) tem som de /R/. De acordo com Goswami (1999), uma analogia ortográfica envolve o uso automático de uma sequência ortográfica comum de acordo com o conhecimento fonológico que opera em determinada ortografia. Assim, uma criança que consegue ler determinado segmento de uma palavra pode utilizá-lo como base para ler este segmento em outras palavras. No contexto da presente pesquisa, as crianças estabelecem correspondências ortográficas entre segmentos de palavras do francês para a escrita do português.

Grafia correta do “r”: Seis das 11 crianças escreveram corretamente “corajoso” na sílaba “ra” neste ditado.

Grafia correta do “rr”:

Supergirl (10 anos) foi a única a escrever a palavra “marreca” com o dígrafo “rr”, mas ela também utilizou “rr” para escrever “corrajoso”. Das crianças maiores, ela é a que está no Brasil há mais tempo (2 anos e 7 meses) e parece saber que às vezes há palavras com “rr”, e outras com “r”, mas como foi visto nas classificações anteriores, ela não discrimina os contextos corretos de uso do “r” e “rr”. Este dado sugere que quanto maior o contato com a língua estrangeira mais se conhece as diferenças entre os sons próximos, sobretudo quando não existem na língua materna.

Em geral, analisando as respostas, percebe-se uma falta de diferenciação entre /R/ e /r/ na escrita do português. As crianças nem sempre distinguem os dois sons e os diferenciam nas palavras ditadas para conseguir grafá-las corretamente.

Em português, o som /R/ (erre forte) entre vogais é representado pelo dígrafo “rr”, como na palavra “carro”. Nas palavras do francês há um predomínio do som /R/, que pode ser escrito tanto com “r” quanto com “rr”, por motivos etimológicos. Provavelmente os participantes deste estudo não conseguiram discriminar a diferença entre o /r/ e o /R/ em português por terem a língua francesa como língua materna e por não terem experiências suficientes em língua portuguesa para perceber e compreender a diferença.

Em sua investigação, Rego e Buarque (2003) descobriram várias categorias de desempenho entre os participantes, demonstrando o caminho percorrido por crianças brasileiras para a aquisição da grafia correta do “r” e do “rr” em seus devidos contextos. Um dos resultados importantes da referida pesquisa foi a verificação da tendência apresentada pelas crianças, de regularizar a língua, ou seja, utilizar uma única letra para os sons /r/ e /R/ nos mais diferentes contextos. Apenas 50 % de crianças de 3ª série (9 anos) de escola particular conseguiam utilizar tais letras em seus contextos corretos. Assim, para os brasileiros, a diferenciação e uso do dígrafo “rr” na escrita é uma etapa desafiadora da aprendizagem da ortografia.

A discussão a seguir aborda as respostas das crianças relativas às perguntas sobre a escrita das palavras “folhas”, “mamãe” e “usam”. Cada uma destas palavras gera dificuldades diferentes para a escrita ortográfica. No caso da palavra “folhas”, pela utilização do dígrafo “lh”, que não existe na língua francesa, embora seja empregado o “ll” com sonoridade quase equivalente (em francês “folha” se escreve feuille, e se pronuncia de um modo parecido). A palavra “mamãe” pode gerar dois tipos de dificuldades: da sonoridade nasal, que neste caso não tem equivalência na língua francesa; e do uso do til, não utilizado no francês. Por último, a escrita da palavra “usam” pode gerar dificuldades na representação do ditongo nasal /ãu/, uma vez que requer a compreensão de que nas palavras em que este ditongo é átono, a representação é “am” (embora existam exceções, como “bênção”) e nas palavras em que o ditongo é tônico, a representação é “ão”.

A seguir são apresentados e analisados outros trechos das entrevistas realizadas com os participantes.

  • France (11 anos, há 2 meses no Brasil) escreveu “folias” e leu “folhas”.

Pesq: Você teve dúvidas?
France: Não.
Pesq: Como é que você tem tanta certeza?
France: É que como eu nunca tinha visto eu escrevi do jeito que se pronuncia.
Pesq: Tem outro jeito de fazer este som (lha) em português?
France: Não sei.
Pesq: E em francês?
France: Não.
Pesq: Como você escreveu fica folias (com acentuação no i).
France: Então coloca dois “l” (“follas”)
Pesq: Como ficaria?
France: (pronunciou) Folhás.

Cendrillon (7 anos, há 8 meses no Brasil) escreveu “ouson” e leu “uson”

Cendrillon: Eu não conseguia escrever, é por isso que está assim.
Pesq: O que é difícil nesta palavra?
Cendrillon: O “on”.
Pesq: Você não sabia o que colocar no lugar do “on”?
Cendrillon: Não.

No caso do uso do “ou” no lugar da letra “u”, é possível perceber uma analogia com a ortografia do som de /u/ em francês que pode ser escrito com as letras “ou”.

Essas descrições mostram como as crianças procuram as correspondências entre os sons das palavras e as possíveis letras que possam “produzir” ou formar determinados sons. France (há 2 meses no Brasil) parecia procurar uma relação entre fonema e grafema, mas provavelmente não tinha conhecimento do dígrafo “lh” para poder escrever corretamente a palavra “folhas”. Acredita-se que devido ao pouco contato com a língua portuguesa tais crianças não possuem no léxico mental representações (referências) que lhes possam dar pistas sobre as características gráficas de determinadas palavras. Esse mesmo aspecto pode ser percebido no trecho a seguir, em que France reforça que nunca tinha visto a palavra e, portanto, escreveu utilizando a referência sonora.

Fanie (8 anos, há 5 meses no Brasil) ao explicar a palavra folhas, escrita por ela “folias”:

Pesq: Você sabe me dizer por que você escreveu assim?
Fanie: Beh, quando você disse a palavra eu ouvi todas as sílabas e escrevi.

Pode-se dizer que esta criança está utilizando um procedimento sublexical de produção de escrita, o que lhe permite escrever as palavras a partir do referencial fonológico. Como as palavras ditadas eram, na maioria das vezes, palavras novas para elas, sua escrita foi feita como se fosse palavras “inventadas”. Ou seja, como as crianças não tinham essas informações em seu léxico mental, tiveram que “gerá-las” graficamente por meio das regras de correspondência entre fonemas e grafemas que elas acreditavam ser possível na língua portuguesa, o que demonstra também o apego à regra alfabética (Carraher, 1985).

  • France (11 anos, há 2 meses no Brasil) escreveu “mamai” e leu “mamai”

France: eu acho que tem um acento em algum lugar, mas não sei onde.
Pesq: Onde você colocaria o acento?
France: No “a”.
Pesq: No primeiro ou no segundo?
France: No primeiro.
Pesq: Por quê?
France: Não, não sei onde colocar o acento.
Pesq: Leia de novo.
France: Ah, no “i”, fica mamaí.
Pesq: Porque este acento?
France: É que eu já vi essa palavra e sei que tem acento, mas não sei onde.
Pesq: E se eu te disser que a palavra pode ser escrita assim: “mamãe”. Como você iria ler?
France: Eu não consigo, não sei ler isso. Acho que não é isso, nunca vi isso.

No relato da France (sobre a escrita da palavra “mamãe”) ela contou já ter visto a palavra e saber que há um acento em algum lugar. Esta referência pode ser atribuída ao acesso ao léxico ortográfico, uma espécie de estoque de palavras escritas, descrita por Alégria e Mousty (1997). O léxico mental, de acordo com Marquer (2005) comporta todas as informações (fonológicas, ortográficas, morfológicas, sintáticas e semânticas) concernentes às palavras conhecidas da língua, que se estabelecem sobre uma rede de conexões específicas da memória.

  • Lilia (9 anos, há 8 meses no Brasil) escreveu “usão”

Pesq: Você teve dúvidas quando você escreveu?
Lilia: Não porque eu sei que[o som] /am/ é um “ao” com uma ondinha[til].

Neste caso, Lilia não grafou adequadamente o ditongo nasal /ãu/ porque não conseguiu discriminar o ditongo átono representado por “am” do ditongo tônico representado por “ão”. Inclusive sua explicação denota a falta de discriminação.

Ao se referirem à língua francesa, Alégria e Mousty (1997) salientam que a ortografia desta língua faz parte dos sistemas ortográficos profundos, ou seja, a escrita representa tanto aspectos fonológicos quanto morfológicos e sintáticos da língua. Nesse caso os conhecimentos linguísticos do aprendiz devem ir muito além da simples transcrição fonema-grafema. Assim, em línguas de ortografia mais superficial (ou transparente) o acesso ao léxico ortográfico é menos necessário já que as correspondências são mais regulares.

É possível verificar pelo relato das crianças que elas estão aprimorando a hipótese alfabética e substituindo-a por uma hipótese ortográfica, ou seja, pensando as palavras não apenas do ponto de vista de sua estrutura acústica, mas também a partir de um referencial visual (ZORZI, 2003). Isso ocorre justamente porque a mediação fonológica mostra-se insuficiente para a escrita correta das palavras. Assim, France escreveu “mamãe” porque lembrava que esta palavra é acentuada e Lilia escreveu “usão” porque - embora não tenha discriminado adequadamente o som - estava buscando representá-lo com base na memória de que as palavras cujo som final é /ãu/ são representadas por “ão”. Esses dados sugerem que uma maior experiência das crianças com o português escrito poderá consolidar a representação gráfica das palavras em seu léxico mental.

  • Supergirl (10 anos, há 2 anos e 7 meses no Brasil) escreveu “folhas” e leu “folhas”

Pesq: Você pode me explicar porque você escreveu desse jeito, com estas letras?
Supergirl: Eu já sabia escrever e eu sei que o “l” “h” faz “lh”.

Neste caso, é possível constatar que Supergirl foi capaz de escrever a palavra “folhas” de forma correta, justificando sua grafia pelo conhecimento do dígrafo “lh”, domínio que só é obtido em estágios avançados de aquisição da grafia.

Em suma, os resultados da presente pesquisa atestam que a criança precisa substituir a hipótese alfabética pela hipótese ortográfica para conseguir escrever corretamente palavras contendo relações cruzadas. O domínio da escrita ortográfica pressupõe que as palavras não devam ser escritas tendo-se como base apenas o que se ouve, mas também o que se vê escrito. Foi possível perceber que as crianças, participantes desta pesquisa, buscavam prioritariamente a mediação fonológica para escrever as palavras; entretanto, quando eram questionadas, elas refletiam sobre as diversas possibilidades de se representar um mesmo som, e algumas delas abordaram aspectos referentes à configuração visual das palavras.

Gillet, Hommet e Billard (2000) descrevem as alterações ortográficas realizadas por crianças francesas na escrita do francês, sobretudo no caso de palavras que apresentam ambiguidades ortográficas. Segundo os autores, muitas escolhas ortográficas estão corretas do ponto de vista da representação gráfica do som, sendo “fonologicamente plausíveis”. Essas trocas ocorreram quando as crianças escreveram as palavras em português.

Além disso, os dados obtidos mostram que as crianças conseguiram escrever palavras que não conheciam, utilizando para isso as regras de correspondência fonema e grafema, demonstrando a utilização de um procedimento indireto ou “montagem fonológica”, base da construção do léxico mental (Marec-Breton e Gombert, 2004).

Os resultados deste estudo, bem como os do estudo de Romanelli (2007) mostram como as crianças francesas percebem as diferenças entre os dois sistemas ortográficos (português e francês). Cendrillon, de 7 anos, utilizou relações específicas da língua francesa para grafar uma palavra em português, por exemplo: escreveu “ousão” em lugar de “usam”. Assim, utilizou as letras “ou” podem representar o som /u/ generalizando o que ocorre na língua francesa. Pôde-se verificar, também, que algumas crianças, ao olhar para a palavra que haviam escrito, ficavam na dúvida sobre sua grafia, e diziam isso, mas não conseguiam produzir uma grafia alternativa porque não dominavam os padrões ortográficos da língua portuguesa.

O relato das crianças, em alguns casos, demonstra a compreensão do sistema ortográfico do português como diferenciado do da língua francesa. Este fato pode ser exemplificado pelas situações em que as crianças comentavam as diferenças na escrita das duas línguas, como France que explicou que a palavra “folhas” poderia ter sido escrita com “ll” caso fosse uma palavra francesa. Essa comparação também demonstra que os aprendizes de uma segunda língua utilizam referências da língua materna para a aprendizagem por meio de um processo de reflexão sobre suas operações linguísticas.

Ademais, foi possível verificar o uso do conhecimento de regras comuns às línguas portuguesa e francesa pelos acertos na ortografia de algumas palavras e também pelas explicações dadas pelas crianças. Este é o caso da letra “j” em “corajoso”, que somente Zorro, de 6 anos, em fase de alfabetização, trocou por “g”. Na verdade, verificou-se que o conhecimento das crianças a respeito da regra contextual que diferencia o uso do “g” e do “j” na língua francesa foi utilizado na escrita do português. Além de uma extração de regra geral, pode ter sido também uma analogia com a palavra em francês. (Goswami, 1999)

Dessa forma, a habilidade metalinguística da criança, ou seja, sua capacidade de refletir sobre a linguagem faz com que realizem comparações entre as duas línguas, suas semelhanças e diferenças, possibilitando um maior domínio ortográfico.

Entretanto, como a maioria das crianças está iniciando a aprendizagem do português, muitas das palavras apresentadas são novas para elas e não podem ser escritas considerando-se a referência da escrita. As palavras “corajoso”, “folhas” e “usam” são semelhantes às suas traduções em francês e, por isso, a maioria das crianças compreendiam seu significado somente pela semelhança fonológica entre as palavras nas duas línguas. De acordo com Gillet, Hommet e Billard (2000), para ser um escritor hábil, a criança precisa utilizar a estratégia lexical para acessar as representações visuais ou ortográficas das palavras “estocadas” na memória de longo prazo. No caso dos participantes da presente pesquisa, a maioria das palavras em questão não tinham sido guardadas em seu léxico mental em sua versão escrita do português. A maior parte das crianças relatou nunca ter visto as palavras antes, com exceção da palavra “mamãe”. Por isso infere-se que os acertos estão relacionados a um procedimento sublexical em que a ortografia das palavras é construída por meio da conversão som-letra, ou melhor, fonema-grafema (Guimarães, 2005).

A investigação das explicações das crianças quanto às suas escolhas ortográficas mostrou-se um método eficaz para compreender suas hipóteses e seus conhecimentos acerca da escrita, assim como as habilidades linguísticas e cognitivas subjacentes, em concordância com Ferreiro e Teberosky (1985), Jolibert (1994), Leal e Roazzi (2003), Morais (2003) e Zorzi (2003). É importante salientar que esse pedido de explicações possibilitou que os sujeitos refletissem sobre a ortografia e, em alguns casos, durante a própria explicação, algumas crianças tomaram consciência de aspectos formais da linguagem que não tinham se dado conta anteriormente. No relato de Fanie, com relação ao som /R/ da palavra “marreca”, logo que a pesquisadora repetiu as duas palavras (“marreca” e “mareca”) a criança concluiu: “Ah, sim. Quando tem /R/ é dois “r”, e quando é mais doce, mais leve, é um “r”. Fanie havia inicialmente generalizado os sons /R/ e /r/ mas conseguiu perceber a diferença entre esses sons ao ser questionada pela pesquisadora. Assim, ela pôde perceber a diferença entre a escrita correta e a que ela tinha realizado num primeiro momento.

Foi possível verificar, no entanto, que as crianças tinham compreensão do princípio alfabético e, normalmente, escreviam utilizando a regra alfabética básica, mas tinham dificuldades em explicar verbalmente o motivo de sua escolha. Essa constatação reflete a posição de Correa (2005) de que às vezes a criança age intencionalmente, mas não consegue justificar suas ações com palavras.

É importante salientar que o número reduzido de palavras ditadas, que foram analisadas, interfere na qualidade da discussão e não possibilita generalizações. Reforça-se, contudo, que este estudo faz parte de uma pesquisa mais ampla em que foram analisados outros dados da escrita de palavras em português (ortografia) por crianças bilíngues que têm como língua materna o francês. A intenção deste artigo foi justamente apresentar e discutir os dados obtidos na entrevista realizada com os participantes a propósito da grafia das seis palavras já especificadas.

Enfim, a investigação e análise das alterações ortográficas produzidas pelos aprendizes no estágio pós-alfabético revelam como eles estão sistematizando suas descobertas e conhecimentos sobre o sistema de escrita. Os conhecimentos produzidos nestas investigações possibilitam um aperfeiçoamento do trabalho pedagógico voltado à tomada de consciência dos aprendizes a respeito dos aspectos formais e estruturais da linguagem escrita.

Este tipo de habilidade se desenvolve principalmente com o ensino formal ou em situações em que a pessoa precise refletir sobre a língua de forma deliberada. Atualmente, vários autores sustentam que há uma relação “interativa” entre habilidades metalinguísticas e aprendizagem da linguagem escrita, ou seja, sustenta-se a existência de uma influência mútua entre os dois fatores (Morais, Alégria e Content, 1987; Manrique e Signorini, 1988; Alégria, Leybaert e Mousty, 1997 e Demont, 1997, Maluf, Zanella e Molina Pagnez, 2006; Mota e Castro, 2007 e Mota, 2009). Assim, comungando com esta posição, defende-se que, no processo de ensino-aprendizagem de uma língua estrangeira, o trabalho docente deve visar à tomada de consciência do aprendiz sobre os diferentes aspectos da linguagem (sua estrutura fonêmica, sintática, etc.). As próprias crianças mostram-se propensas ao desenvolvimento dessas habilidades quando manifestam dúvidas sobre a língua estrangeira, nas questões que formulam ao observar o uso da língua no dia-a-dia e na expressão de uma postura ativa diante da língua que não dominam.

Em outras palavras, como implicação pedagógica deste estudo sugere-se que o processo ensino-aprendizagem de uma língua estrangeira deve enfatizar o desenvolvimento das habilidades metalinguísticas, de forma que as comparações entre as línguas e os questionamentos sobre a sua estrutura e organização possam servir de apoio para a aprendizagem da língua estrangeira.

Por último, identificou-se nas interações sociais (como a estabelecida entre a entrevistadora e as crianças) um grande potencial de desenvolvimento da consciência linguística, na medida em que promove a reflexão das crianças sobre a ortografia das palavras. Por isso, acredita-se que é impossível falar do aprendizado de uma língua sem falar da importância das relações interpessoais. Para aprender a língua falada, é necessário ouvir o outro, que pronuncia, explica e utiliza a língua em sua forma oral. Na aprendizagem da língua escrita é imprescindível, além do contato com textos (material impresso), a presença de um mediador, que trabalhe com o ensino deliberado. Assim, defende-se que a aquisição sólida e orgânica de uma língua estrangeira é o resultado de relações cognitivas e afetivas com o outro a partir de um forte interesse social e uma motivação comunicativa, ou seja, de um processo vivo de intercâmbio social.

 

 

Referências

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Recebido em: Junho de 2009
Aceito em: Julho de 2009

 

 

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* Mestre e doutoranda em Educação pela UFPR. Professora do curso de Psicologia da FACEL – Faculdade de Administração, Ciências, Educação e Letras, em Curitiba e Substituta no Setor de Educação da UFPR. Contato: berenice@romanelli.net
** Doutora em Psicologia Escolar e do Desenvolvimento Humano pela Universidade de São Paulo. Docente do Curso de Pedagogia e do Programa de Pós-Graduação em Educação Stricto Sensu da UFPR. Contato: srkguimaraes@uol.com.br

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