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Psicologia em Pesquisa

versão On-line ISSN 1982-1247

Psicol. pesq. vol.5 no.1 Juiz de Fora ago. 2011

 

ARTIGOS

 

Explorando o Perfil de Saúde dos Idosos do Exército Brasileiro*

 

Exploring the Profile of Older Adults from the Brazilian Army

 

 

Daniele Cupertino de OliveiraI; Ana Paula CupertinoII

I Escola de Saúde do Exército
II University of Kansas Medical Center, Kansas, USA

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

O militar brasileiro usualmente segue uma rotina de atividades físicas regulares e hábitos de vida saudáveis. Estas características têm sido diretamente relacionadas com qualidade de vida na velhice. Foram enviados 600 questionários para militares aposentados. 19,3% dos militares retornaram os questionários. Avaliamos aspectos socioeconômicos, grau de satisfação pessoal, autoavaliação da saúde, hospitalizações, quedas, alterações do sono, morbidade e outros fatores de risco. Observamos que 87,7% são casados e 85% residem em imóvel próprio. Apesar de relatarem (85,1%) pelo menos uma morbidade, a grande maioria apresentou sono bom e alta satisfação com a vida. Em relação aos hábitos de vida, 43,8% raramente consomem bebidas alcoólicas, 11% são sedentários e somente 4,3% fumam, atualmente. Este é o primeiro estudo que descreve o perfil dos idosos do Exército Brasileiro. No geral eles relatam bom perfil de saúde, alta satisfação com suas vidas, suporte social estável e poucos fatores de risco.

Palavras-Chave: Envelhecimento; saúde do idoso; Exército Brasileiro.


ABSTRACT

Brazilian army personnel usually follow a routine of frequent regular exercise and healthy lifestyle. These characteristics have been directly correlated with quality of life in later life. We mailed 600 surveys to a list of retired army personnel.  19, 3% returned the surveys. We assessed socioeconomic status, life satisfaction, self-rated health, hospitalization and fall in the previous year, sleep patterns, morbidity and other risk factors. We identified that 87,7% are married and 85% own their house. Even though they (85,1%) reported at least one morbidity, the great majority has a good sleep pattern and high satisfaction with their life. In terms lifestyle 43,8% rarely drink alcohol; only 11% are sedentary and 4,3% currently smoke. This is the first study to describe the profile older military personnel.  Overall they report good health profile, high satisfaction with their life, stable social support and few risk factors.

Keywords: Aging, health aging, Brazilian Army.


 

 

O envelhecimento populacional representa um dos maiores triunfos da humanidade e também um grande desafio que ocasiona um aumento das demandas sociais e econômicas em todo o mundo. As projeções para o próximo século indicam que o envelhecimento populacional irá aumentar a população idosa mundial a um nível insustentável (Kalache, 2008). Segundo Lourenço (2006) a participação da população idosa no mundo duplicou nosúltimos cinquenta anos, com projeções recentes mostrando que este segmento poderá ser responsável por quase 15% da população total no ano de 2020. Ao contrário dos países desenvolvidos que se tornaram ricos antes de envelhecer, os países em desenvolvimento estão envelhecendo antes de terem os recursos sociais e de saúde ideais. Em todos os países, principalmente os em desenvolvimento, iniciativas de saúde pública de fomento ao envelhecimento saudável e ativo são uma necessidade, e não um luxo (Organização Mundial de Saúde [OMS], 2002).

As condições de saúde, da população idosa, pode ser determinada através de seus perfis de morbimortalidade; da presença de déficits físicos, cognitivos e da utilização de serviços de saúde, entre outros indicadores mais específicos (Costa, Barreto & Giatti 2003; Ramos, 2003; Lebrão & Laurenti, 2005). São obtidas, em grande parte, através de estudos epidemiológicos de base populacional. (Camarano, 2002; Lopes & Bottino, 2002). Em um estudo realizado no Ceará, foi observado que 75,3% dos idosos moravam em domicílio multigeracional, 18% dos idosos mencionaram mais de cinco doenças crônicas, e a grande maioria (92,4%) relatou pelo menos uma doença. Um terço indicou uma queda noúltimo ano, 61,4% procuraram serviço de saúde em pelo menos uma ocasião nosúltimos seis meses e 47,7% apresentaram perda de autonomia (Coelho Filho & Ramos, 1999).

Em um estudo epidemiológico, o "Saúde, bem-estar e envelhecimento" [SABE], realizado na população de São Paulo, foi constatado que o conjunto das doenças do aparelho circulatório representaram risco, significativamente maior, de óbito. Tendo em vista que a cardiopatia coronariana é a principal causa de morte em vários países, a Organização Mundial da Saúde traçou estratégias preventivas e de estabilização das condições clínicas, com o intuito de evitar agravos, incapacidades e mortes decorrentes dessas doenças. (Lebrão & Laurenti, 2005; Maia, Duarte & Lebrão, 2006). Essas estratégias incluem a adoção de estilo de vida saudável (atividade física, alimentação saudável, abstinência do fumo e do álcool) e a participação ativa no cuidado da própria saúde como medidas importantes na prevenção de doenças, no declínio funcional, bem como no aumento da longevidade e da qualidade de vida. (OMS, 2005).

Quando fatores de risco de doenças crônicas e de declínio funcional são mantidos baixos, e os fatores de proteção elevados, as pessoas desfrutam maior quantidade e maior qualidade de vida, permanecem sadias e capazes de cuidar de sua própria vida à medida que envelhecem. Em condições ambientais adequadas combinadas a comportamentos saudáveis como não ingerir álcool frequentemente, exercitar-se regularmente e manter uma boa atividade mental, o ser humano pode alcançar uma expectativa de vida média de 85 anos e um envelhecimento mais saudável (Perls, Kunkel & Puca, 2002; Patrício, Ribeiro, Hoshino & Bochis, 2008). Como a atividade física regular e o estilo de vida regrado são peculiaridades da profissão militar, é possível que o militar envelheça de modo otimizado em comparação com a população de um modo geral.

A fim de compreender o motivo que leva uma população a manter níveis de atividades físicas regulares, foi realizado um estudo com militares americanos. Este estudo, que enfatiza a adoção de hábitos saudáveis como requisito importante para a profissão militar, identificou a melhora na performance física como um fator de incentivo para a prática esportiva e a exaustão como uma barreira para tal prática. Nesta amostra identificou-se uma relação positiva entre atividade física, força física e saúde de um modo geral (Nelson & Gordon, 2003).

O estudo prospectivo longitudinal Millennium, The Millennium Cohort Study, foi delineado com o objetivo de descrever fatores do serviço militar relacionados com a saúde (Smith et al., 2008). Mostrou que militares americanos tem um perfil de saúde mental e fisica melhor que a população americana geral do mesmo sexo e idade. O envolvimento constante com operações de combate complexas aumenta a possibilidade do militar manter uma boa saúde física e mental ( Riddle et al, 2007; Smith et al., 2007).

Um estudo piloto desenvolvido para identificar similaridades e diferenças nas necessidades de saúde de militares e civis do Exército americano, identificou dentro das similaridades, uma população com alta satisfação com a vida (Wind, Bonefil & Harris, 2001). Neste estudo, 71 % dos entrevistados eram casados; 34,4% estavam com sobrepeso (índice de massa corporal - 27,47); 16,7% eram fumantes, 46% hipertensos. Mostra que 68,5% da amostra está satisfeita com a vida e nenhum faz uso de álcool durante a semana. 57,7% dos militares consomem alimentos gordurosos mais de 3 vezes por semana e 76,7% da população civil não se exercita com regularidade. Os funcionários civis mostram escores menores quando avaliada a falta de exercício regular, com apenas 23% praticando exercícios físicos regulares e 53% com sobrepeso, diferente da população de militares, onde 71,2% se exercitam regularmente. Jonas (1994), encontra em sua população de soldados do Exército Americano, déficit de atividades físicas regulares em 27,5% da amostra, alto consumo de gordura saturada em 27,2% e sobrepeso em 23%.

Sendo assim, o presente estudo tem por objetivo descrever os idosos militares que supostamente viveram um padrão de vida mais regrado, com hábitos saudáveis e mais acesso aos serviços de saúde. Tem por finalidade dar subsídios para a implantação de programas e planejamento de estratégias de atendimento, bem como intervenções adequadas à realidade da instituição, contribuindo assim para um processo de envelhecimento, senão com qualidade de vida plena, que ao menos tenda para tal situação. Poderá ainda guiar as futuras tomadas de decisões do Sistema de Saúde do Exército, o FuSEx (Fundo de Saúde do Exército), no cuidado e na assistência aos idosos.

 

Método

Amostra

A amostra do presente estudo foi composta por 116 militares da reserva, todos do sexo masculino, com média de idade de 75,72 anos (DP = 4,94), cadastrados na SIP (Seção de Inativos e Pensionistas) da 1ª Região Militar, localizada no Rio de Janeiro.

Procedimentos

Foi realizado um estudo de natureza aplicada, com uma abordagem quantitativa, exploratória e descritiva. A coleta de dados foi realizada através de um questionário com perguntas fechadas. Os idosos receberam um questionário, juntamente com um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, via correio. Somente idosos que retornaram a sua autorização escrita de participação foram incluídos neste estudo. O presente trabalho foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Hospital Central do Exército, recebendo parecer de número 08/2008 (Parecer n° 08/2008).

Variáveis estudadas

As variáveis estudadas foram agrupadas em 4 (quatro) categorias:

1) Aspectos socioeconômicos: Estado civil, moradia, composição da família e domicilio. Avaliado por perguntas simples e diretas para cada item, com respostas de múltipla escolha de três a cinco opções.

2) Grau de satisfação pessoal: Avaliado através de 17 (dezessete) perguntas simples, e respostas de múltipla escolha com cinco opções (muito insatisfeito, insatisfeito, nem satisfeito nem insatisfeito, satisfeito e muito satisfeito).

3) Percepção da saúde física e autocuidado: Autoavaliação da saúde, da visão, da audição e da memória; hospitalizações noúltimo ano; quedas noúltimo ano; alterações do sono e morbidade. Avaliado através de perguntas simples e diretas para cada item e respostas de múltipla escolha com três a cinco opções (excelente, muito boa, boa, razoável e péssima). Para a avaliação do sono foi realizado um pequeno questionário de 11 (onze) perguntas, com 7 (sete) opções de respostas, que geravam uma pontuação e consequente classificação do sono (muito bom, bom, alterado e muito alterado). A morbidade foi avaliada através de uma lista de 36 possibilidades diagnosticadas por médicos nosúltimos cinco anos.

4) Fatores de risco: Avaliados através de pergunta simples e direta para cada item e respostas de múltipla escolha. Tabagismo (fuma atualmente, ex fumante, nunca fumou); etilismo (bebe atualmente, bebeu e não bebe mais, nunca bebeu) e sedentarismo (frequência semanal de atividades distribuídas em cinco opções).

Instrumentos

Para a caracterização da amostra foi feita estatística descritiva simples, com cálculo de média e desvio padrão para todas as variáveis. Para a análise estatística foi utilizado o Statistical Package for Social Sciences (SPSS) for Windows, versão 16.0, tendo sido fixado nível de significância p < 0,05.

 

Resultados

Foram enviados 600 questionários para as residências de idosos militares, com um retorno de 116 questionários (19,3%). A amostra, na sua totalidade composta por homens, variou em idades entre 69 e 91 anos, com média de idade de 75,72 anos (DP = 4,94). A grande maioria dos idosos (81%) pode ser classificada como idosos com idade concentrada em uma faixa etária de 70 a 80 anos. A média de peso foi de 76,92Kg (DP = 10Kg) e altura de 1,70m (DP = 0,05). A maioria dos participantes relatou ter patente de oficial (82,6%), e todos residentes no Estado do Rio de Janeiro – RJ. (ver Tabela 1)

 

 

Na população de idosos, os casados representam 87,7% e os demais, viúvos, separados e que nunca casaram representam 6%. Entre os viúvos, todos têm idade superior a 75 anos (ver Tabela 1). A totalidade da amostra teve filhos, sendo que mais da metade (52,4%) teve três filhos ou mais.

Do ponto de vista do tipo de residência, 85% possuem imóvel próprio e somente 14,6% vivem em imóveis alugados, cedidos ou divididos com outros familiares (Tabela 1). A maioria dos idosos, 79,9%, está satisfeita ou muito satisfeita com o local onde mora. Sobre a composição domiciliar, poucos residem sozinhos (6%) e mais da metade da amostra (58,7%) reside em domicílio com uma outra pessoa, sendo ela a esposa ou companheira, na quase totalidade (94%). Dos 34,6% que residem com mais de duas pessoas, 2/3 moram com os filhos e esposas, e 1/3 com netos, sogra, empregada e outros.

Com relação ao trabalho, os idosos do Exército se aposentam com idade média de 51,7 anos (DP = 5,92); 77,4% desses idosos não trabalham atualmente e somente 14,6% ainda trabalham. Entre os idosos que estão trabalhando, 50% se dedicam ao trabalho voluntário (Tabela 1).

Com o objetivo de avaliar a satisfação com a vida, foram formuladas questões relacionadas à locomoção, desempenho de atividades do dia-a-dia, relações pessoais, apoio dos amigos, satisfação pessoal, vida sexual, condições do local onde mora, acesso ao serviço de saúde e meios de transporte. Os idosos deste estudo também relataram alta satisfação e apenas 14,4% com pouca satisfação (Tabela 1). Com a finalidade de avaliar o grau de satisfação, os idosos foram questionados sobre aspectos relacionados à energia suficiente para atividades diárias, aceitação de sua aparência física, dinheiro suficiente para satisfazer suas necessidades, disponibilidade de informações, oportunidades de lazer e necessidade de atendimento médico, obtendo assim 87,1% de satisfeitos; sendo 35,1% com alto grau de satisfação e apenas 12,9% da amostra com pouca satisfação (Tabela 1).

Em termos da satisfação em relação ao trabalho realizado ao longo da vida, a grande maioria (96,2%) declarou-se satisfeita, sendo que 61,9% destes declararam alta satisfação. A grande maioria dos idosos que participaram deste estudo (87,7%) raramente relataram sentimentos negativos como mau humor, desespero, ansiedade e depressão.

Em geral, os idosos que participaram deste estudo relataram alto perfil de qualidade de saúde. Quando solicitados a avaliar a própria saúde, a grande maioria (83,4%) auto-avaliou a sua saúde como boa ou excelente e apenas 1,7% declararam possuir péssima saúde. Cerca de 79,1% consideraram sua visão excelente ou boa; a mesma avaliação foi feita por 78,2% em relação à memória. A autoavaliação da audição também variou entre boa e excelente para 63,6% da amostra, e 36,1% declararam péssima ou razoável, aspecto que alcançou maior índice de avaliação negativa. A autoavaliação da saúde, se comparada com outros idosos da mesma idade, foi igual ou melhor para 95,4% da amostra (Tabela 2).

 

 

Nossos dados apontam que 87,4% possuem sono bom ou muito bom, e 12,6% com o sono alterado. Apenas 4% apresentaram sono muito alterado (Tabela 2).

Quanto à frequência com que procuraram o médico noúltimo ano, verificou-se que 45,5% procuraram 1 a 3 vezes; 29,2% 4 a 6 vezes e apenas 15,4% dos idosos não visitaram o médico noúltimo ano (Tabela 2). Foram internados, noúltimo ano, 23,2% (Tabela 2), sendo que as principais causas de internação foram as doenças cardiovasculares (25,9%). Em relação às quedas, apenas 9% relataram que caíram, umaúnica vez, nosúltimos doze meses.

Quando avaliada a morbidade, 85,1% declararam pelo menos um diagnóstico clínico formulado por um médico nosúltimos anos. Quanto à hierarquia das causas mórbidas, as morbidades cardiovasculares e endócrinas ocorrem em 85,3% dos indivíduos, seguidas das morbidades gastrintestinais (81%), osteoarticulares (30,1%) e respiratórias (20,6%). Dentre as enfermidades de maior ocorrência, a hipertensão atinge metade dos idosos (50,8%), e aproximadamente 2/5 tem hipercolesterolemia (38,7%) e catarata (36,2%). Hipertrigliceridemia, gastrite, arritmia cardíaca e Diabete Melito são comuns em aproximadamente ¼ da amostra (25,8%, 22,4%, 20,6% e 20,6% respectivamente)(Tabela 3).

 

 

Em relação ao grupo de variáveis comportamentais de risco, mais da metade (59,3%) é ex-fumante; 36,1% dos idosos nunca fumaram; e 4,3% fumam atualmente (Tabela 4). Quanto ao padrão de consumo de álcool; 55,9% não consomem álcool com regularidade e 43,8% consumem socialmente (Tabela 4).

 

 

Quando avaliado o Índice de Massa Corporal (IMC), os indivíduos da amostra se apresentaram com IMC médio de 26,3 ± 3,05 (DP = 3,05), sendo que 60,3% estavam com pré-obesidade (24,5 < IMC < 29,9), 8,6% com obesidade classe I (30 < IMC < 34,9) e 29,3% com índice normal (18,5 < IMC < 24,4) (Tabela 4). O sedentarismo (idoso que não pratica nenhuma atividade física) afeta 11,1% dos avaliados (Tabela 4). Com relação às atividades físicas, 73,9% se exercitam mais de duas vezes por semana e 35,6% realizam mais de uma atividade física. As principais atividades físicas praticadas são a caminhada (68,53%) e a ginástica (16%). 30,2% realizam atividades diversas como hidroginástica, corrida, musculação e tênis (Tabela 4).

As restrições alimentares atingem 59,3%, sendo 2/4 com duas ou três restrições. A gordura (40,4%), o sal (36,1%) e o açúcar (35,2%) são as principais restrições e outras como as calóricas, os leites/derivados e os carboidratos representam 20,6% (Tabela 4).

Através da Correlação de Pearson, foi feita uma correlação dos resultados onde foram evidenciadas correlações positivas entre a autoavaliação da saúde e outros aspectos, como a visão (r = .442, p = 0.000), a audição (r = .341, p = 0.000) e a memória (r = .430, p = 0.000). Ao contrário do esperado, a autoavaliação da saúde não obteve correlação significativa com a idade. Ou seja, independente da idade, os participantes deste estudo tem boa qualidade de saúde. Não foi encontrada relação significante entre a alterações do sono e a idade (r = -0.003, p = 0.98).

Não foram encontradas correlações significativas entre a idade e outros aspectos da pesquisa, tais como: sono; satisfação geral (r = 0.02, p = 0.87); frequência de sentimentos negativos (r = -0.16, p = 0.09) e saúde autorreferida (r = -0.09, p = 0.33).

 

Discussão

Traçar um perfil dos idosos militares é estudar uma amostra com características peculiares, haja vista ter uma média de 35 anos de trabalho dedicado à caserna, com hábitos profissionais e pessoais bastante semelhantes, otimizadores de saúde.

O alto índice de satisfação pessoal, com a moradia e com o trabalho desenvolvido ao longo da vida é um ponto que se destaca nessa população. Podemos sugerir que os possíveis fatores contribuintes sejam a boa estrutura familiar, a estabilidade financeira e a casa própria relatada pela grande maioria.

A falta de correlação significativa de diversas variáveis com a idade foge um pouco da realidade demonstrada em outros estudos de base populacional (Costa, Guerra & Firmo, 2001; Lebrão & Laurenti, 2005; Novaes, Cupertino & Lourenço 2006; Ramos, 2003), indicando que os idosos participantes deste estudo relataram padrões de saúde independente da idade. Isto pode ser explicado em parte pela homogeneidade da amostra que retornou a entrevista. Diferente do relatado na maioria dos estudos populacionais com idosos, o padrão de sono do idoso do Exército Brasileiro foi caracterizado como ligeiramente alterado. Estudos comprovam que com o envelhecimento há aumento da prevalência de distúrbios do sono. Alguns autores evidenciam uma média de 80% de idosos com uma ou mais queixas, o que poderia representar um marcador de doença física ou mental ruim. Como a amostra se mostrou saudável (boa saúde física e mental), as queixas de sono foram naturalmente menores do que a média evidenciada no estudo de Espiritu (2008).

O alto percentual de militares que procuraram atendimento médico noúltimo ano pode justificar o baixo percentual de internações. Este fato demonstra a preocupação e os cuidados com a saúde, que pode ser explicado pela frequência elevada de consultas médicas noúltimo ano, colaborando assim para a prevenção de doença, diagnóstico precoce e tratamento adequado.

Sabendo que os militares, na sua totalidade, são usuários do Fundo de Saúde do Exército, que lhes dá direito à assistência médico-hospitalar e odontológica, acreditamos que o acesso facilitado às consultas médicas periódicas, bem como a possibilidade de uma assistência médica integral sejam possíveis aspectos que têm diferenciado a amostra estudada da população como um todo, que na sua maioria é usuária do Sistema Único de Saúde.

A autopercepção de saúde, considerada muito boa pela maioria, e a baixa incidência de sedentários nesta população, justifica o índice de quedas da amostra ser inferior à média de outros estudos, onde as quedas estariam diretamente associadas com idade avançada, sedentarismo, auto percepção de saúde ruim e maior número de medicação referida por uso continuo.

Os militares, no serviço ativo, são diariamente estimulados à prática de atividades físicas, o que possivelmente se torna um hábito que se estende na velhice. Mesmo assim, verificamos que o IMC da maior parte da amostra, está classificada na pré-obesidade e somente 1/3 em índices normais. Considerando que o IMC e a atividade física se correlacionam negativamente, nossa amostra não deveria estar enquadrada na pré-obesidade, na medida em que comprovadamente executam mais atividades físicas. Isto talvez seja explicado pelo fato do cálculo do IMC (peso/altura2) desconsiderar a composição do peso no que diz respeito ao percentual de massa muscular e de gordura, não sendo assim a maneira mais fiel para se estipular padrão de obesidade.

Quanto às limitações do estudo, podemos citar o viés dos questionários autopreenchidos, o número reduzido e a homogeneidade da amostra. Apesar de o questionário autopreenchido poder permitir o viés de influenciar alguns dados por questões de interpretação e entendimentos divergentes, acreditamos que essa dificuldade não tenha influenciado muito neste trabalho, pois a maioria dos participantes eram idosos, com o 3º grau completo. Sendo uma amostra ainda muito pequena, não representativa de militares do Exército Brasileiro, podemos acreditar que a população que respondeu os questionários seria mais saudável e por isso com alto grau de satisfação pessoal, não refletindo, portanto, a realidade dos idosos do Exército. Por se tratar de um projeto piloto, nos estimula a ampliar para diversas organizações militares distribuídas pelo Brasil o presente questionário a fim de obter dados que reflitam melhor a realidade dos idosos do Exército Brasileiro.

É um projeto de grande valia para que possamos conhecer um pouco melhor o militar idoso que, como a população geral, está envelhecendo e cada vez mais precisando de um serviço de saúde preparado e adequado para suprir suas principais demandas.

Sabendo dos gastos dispensados com internações e tratamentos especializados fundamentais para o tratamento das diversas doenças crônicas, frequentes na população idosa, este trabalho, tende a contribuir de alguma forma para um incentivo a uma abordagem multidisciplinar, integral e preventiva nas Organizações Militares de Saúde.

Outra questão a ser abordada é a possibilidade dos militares não relatarem aspectos que demonstrem fraqueza. Mesmo assim, sendo essa uma questão a ser investigada, o estudo mostra que se os resultados não são enviesados por relatos da percepção do sujeito do que ele pode revelar (talvez os dados mais objetivos de saúde e não de saúde mental sejam um indício), o estudo mostra a importância de um cuidado estruturado e do suporte das instituições de saúde para garantir qualidade de vida no envelhecimento.

 

Considerações Finais

Pode-se concluir que estamos diante de um tipo de idoso diferenciado. Se analisarmos alguns fatores como: a alta satisfação com a vida e com a saúde; a baixa internação; a uma boa saúde física e mental; a independência na vida diária; a integração social; o suporte familiar; o baixo índice de comportamentos de risco; e a independência econômica, se pode afirmar que os idosos do Exército Brasileiro se caracterizam por apresentar um envelhecimento mais saudável que a média nacional. Neste estudo, causa surpresa o fato da variável idade não ter influenciado no declínio de alguns fatores como saúde, sono e satisfação; isto se explica por se tratar de uma amostra extremamente homogênea, com estabilidade emocional e financeira, onde a variável idade deixou de ser importante.

 

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Endereço para correspondência:
Daniele Cupertino Oliveira
Rua Sampaio 243/301, Centro
CEP 36013-240 - Juiz de Fora-MG
Tel: (32) 3216-4036
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Recebido em Abril de 2010
Revisto em Agosto de 2010
Aceito em Dezembro de 2010

 

 

* Artigo baseado no trabalho de conclusão de curso apresentado ao programa de pós-graduação em Aplicações Complementares às Ciências Médicas, como requisito parcial para aprovação no Curso de Formação de Oficiais do Serviço de Saúde, especialização em Aplicações Complementares às Ciências Militares, da Escola de Saúde do Exército Brasileiro, em 2008.