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Psicologia em Pesquisa

versão On-line ISSN 1982-1247

Psicol. pesq. vol.7 no.2 Juiz de Fora dez. 2013

http://dx.doi.org/10.5327/Z1982-1247201300020009 

ARTIGOS
DOI: 10.5327/Z1982-1247201300020009

 

Atenção e Funções Executivas em Crianças com Dislexia do Desenvolvimento*

 

Attention and Executive Functions in Children with Developmental Dyslexia

 

 

Ricardo Franco de Lima; Cíntia Alves Salgado Azoni; Sylvia Maria Ciasca

Universidade Estadual de Campinas (Campinas), Brasil

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

São escassos os estudos nacionais sobre a Dislexia do Desenvolvimento (DD) que investigam outros domínios cognitivos, além da linguagem. O presente estudo objetivou comparar o desempenho de crianças com DD e crianças sem dificuldades de aprendizagem em instrumentos que avaliam a atenção e as Funções Executivas (FE). Participaram 61 crianças, com idade média de 9,7 anos, divididas em grupo com DD e controle. Foram utilizados os instrumentos: subtestes da Escala de Inteligência Wechsler para crianças, Testes de Cancelamento, Teste das Trilhas, Teste Stroop, Torre de Londres, Teste Wisconsin e Fluência Verbal. Os resultados mostraram diferenças entre os grupos, sugerindo que indivíduos com DD podem apresentar prejuízos na atenção e em componentes das FE. Também sugeriram que as crianças com DD apresentam padrão diferente de rastreamento visual e seleção de recursos executivos, principalmente diante de estímulos com conteúdo verbal.

Palavras-chave: Neuropsicologia; dislexia; atenção; função executiva.


ABSTRACT

National studies on Developmental Dyslexia (DD) that investigate other cognitive domains, besides language, are scarce. This study aimed to compare the performance of children with DD and children without learning disabilities in instruments that assess attention and Executive Functions (EF). Sixty-one children, with average age of 9.7 years, divided into group with DD and control group participated in the study. The used instruments were: subtests of the Wechsler Intelligence Scale for Children, Cancellation Test, Trail Making Test, Stroop Test, Tower of London Test, Wisconsin Card Sorting Test and Verbal Fluency. The results showed differences between the groups, suggesting that children with DD may have impairments in attention and components of EF. The findings also suggested that children with DD present different patterns of visual scanning and selection of executives resources, mainly in front of stimulus with verbal content.

Keywords: Neuropsychology; dyslexia; attention; executive function.


 

 

A Dislexia do Desenvolvimento (DD) é um transtorno neurobiológico, caracterizado por dificuldades na aquisição e uso da leitura e escrita em função de um déficit no componente fonológico da linguagem. Tais características são inesperadas quando considerado o nível de inteligência e a instrução efetiva em sala de aula (Lyon, Shaywitz & Shaywitz, 2003; American Psychiatric Association [APA], 2002).

De acordo com a Classificação Internacional de Doenças (CID-10) (Organização Mundial da Saúde [OMS], 2008), os principais critérios diagnósticos da DD são: desempenho em leitura/escrita abaixo do esperado, nível de inteligência dentro da média para a faixa etária, ausência de alterações sensoriais não corrigidas, ausência de outros problemas neurológicos e psiquiátricos que justifiquem as dificuldades.

Há consenso que o diagnóstico da DD deve ser realizado por equipe interdisciplinar para avaliação de diferentes habilidades cognitivas, processamento fonológico e linguagem escrita, uma vez que é caracterizada por alterações que comprometem a aprendizagem, além de comorbidades (Pestun, Ciasca & Gonçalves, 2002; Silver et al., 2008).

No que se refere aos fatores etiológicos, Frith (1999) indica que a DD resulta da interação complexa entre fatores biológicos (como os genéticos), cognitivos e ambientais.

Do ponto de vista neuropsicológico, a DD é acompanhada por alterações em diferentes funções cognitivas. A linguagem e o processamento fonológico têm tido maior ênfase na literatura, em função de suas relações evidentes com a leitura e escrita. No entanto, outros domínios cognitivos também têm merecido destaque no contexto internacional, dentre eles, a atenção e as Funções Executivas (FE), dada a importância dessas funções para as diferentes etapas do processamento da leitura/escrita: decodificação, conversão letra-som e compreensão (Reiter, Tucha & Lange, 2005; Franceschini, Gori, Ruffino, Pedrolli & Facoetti, 2012; Lima, Travaini, Salgado-Azoni & Ciasca, 2012).

A atenção pode ser definida como a capacidade de o indivíduo responder predominantemente aos estímulos que lhe são significativos (Raz & Buhle, 2006). Já as FE referem-se ao grupo de habilidades cognitivas que auxiliam o indivíduo na realização de tarefas dirigidas às metas e de maneira independente. As FE representam um construto multifatorial que envolve componentes como: planejamento, flexibilidade mental, estratégias cognitivas, memória operacional, fluência, controle inibitório, dentre outros (Kluwe-Schiavon, Viola & Grassi-Oliveira, 2012). Tanto a atenção como as FE possuem relação com a habilidade de leitura e escrita, na medida em que atuam em todas as etapas do processamento das informações: recepção dos estímulos, processamento, planejamento e organização de respostas (Kaufman, 2011).

No que concerne à atenção sustentada visual, diferentes características são descritas em crianças com DD. Em tarefas de atenção visuoespacial com medidas de tempo de reação, crianças com DD demonstram maior tempo de resolução quando comparadas aos controles (Facoetti & Molteni, 2001; Facoetti et al., 2010; Franceschini et al., 2012).

Facoetti e Molteni (2001) compararam um grupo de 11 crianças com DD (idade média de 12,1 anos) a um grupo controle (idade média de 11,4 anos) em tarefa computadorizada de atenção visuoespacial baseada no paradigma de atenção encoberta e medidas de tempo de reação. Para os autores, as alterações atencionais exibidas pelo grupo com DD podem ser explicadas pela distribuição espacial anômala dos recursos de atenção visuoespacial.

No estudo de Heiervang e Hugdahl (2003), realizado com 25 crianças com DD e controles, com idade entre 10 e 12 anos, foi demonstrado que o primeiro grupo mostrou padrão de respostas mais lento em tarefas de atenção visual e leitura. Os autores também sugerem que os indivíduos com DD apresentam problemas no recrutamento de recursos cognitivos associados com a atenção, como a velocidade de processamento, e que são necessários para o desempenho de tarefas complexas de tempo de reação e fluência de leitura.

Hari e Renvall (2001) sugerem que a alternância atencional lenta (SAS, do inglês Sluggish Attentional Shifting) pode explicar o prejuízo no processamento de uma sequência de estímulos rápidos (visuais ou auditivos) na DD. Para as autoras, indivíduos com DD são mais lentos para processar os estímulos visuais e auditivos envolvidos com a leitura, demonstrando tempo aumentado de reação em testes de atenção, e tais alterações podem acompanhar o déficit no processamento fonológico.

Visser, Boden e Giaschi (2004) compararam o desempenho de um grupo de crianças com DD (10–15 anos) a outros dois grupos controles pareados por idade (10–15 anos) e por nível de leitura (7–10 anos) usando tarefa computadorizada de atenção sustentada visual por meio do paradigma de apresentação visual serial rápida (RSVP, do inglês Rapid Serial Visual Presentation). Essa tarefa tinha como objetivo principal avaliar o processamento temporal, isto é, o processamento necessário quando um ou mais estímulos são apresentados em uma determinada sequência. Os resultados indicaram que a precisão para identificar os estímulos foi pior no grupo de crianças com DD quando comparado com os demais grupos. Para os autores, a diminuição na acurácia para a identificação dos estímulos pode interferir na distribuição de recursos atencionais e no processamento temporal e sequencial dos grafemas durante a leitura. Na mesma direção, Marendaz, Valdois e
Walch (1996) mostraram que crianças com DD apresentaram maior quantidade de erros em tarefas de busca atencional em série, como em Testes de Cancelamento, devido à redução do número de itens processados simultaneamente.

Shanaham et al. (2006) compararam o desempenho de crianças com Transtorno de Leitura (10,9 anos), com Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH) (idade média de 11,1 anos) e com ambos os transtornos (11 anos) a um grupo controle (idade média de 11,5 anos) no subteste Código (WISC-R), Trail Making Test (TMT), Teste Cor-Palavra de Stroop (SCWT, do inglês Stroop Color Word Test), Stop Signal Test, Gordon Diagnostic System e teste de Nomeação Automática Rápida (RAN) como medidas da velocidade de processamento. Os resultados mostraram que o grupo com Transtorno de Leitura exibiu alterações semelhantes às das crianças com TDAH. Apesar dessa similaridade, os grupos clínicos distinguiram-se na magnitude, pois os déficits foram maiores em crianças com o Transtorno de Leitura. Para os autores, o prejuízo na velocidade de processamento pode ser compreendido como fator de risco para ambos os transtornos.

Alguns autores (Marzocchi, Ornaghi & Barboglio, 2009; Ziegler, Pech-Georgel, Dufau & Grainger, 2010; Savill & Thierry, 2012) indicam que o déficit de atenção visual na DD pode ser específico às características dos estímulos apresentados, mostrando-se significativo somente no processamento de materiais verbais (letras e dígitos), mas não com materiais não verbais (símbolos).

Com relação às FE, apesar de sua importância para as diferentes etapas de processamento da leitura (decodificação, conversão letra-som e compreensão) (Meltzer, 2007), sua investigação tem sido negligenciada nos estudos de crianças com DD e sem comorbidades. Devido ao caráter multidimensional das FE, no geral, os estudos indicam que há comprometimento em apenas alguns aspectos (Helland & Asbjørnsen, 2000; Reiter et al., 2005; Lima et al., 2012).

Reiter et al. (2005) compararam 42 crianças com DD (idade média de 10,8 anos) e 42 sem dificuldades (idade média de 10,6 anos) utilizando bateria de instrumentos que avaliavam as FE. O grupo com DD apresentou escores rebaixados em tarefas de memória operacional verbal e visual, controle inibitório, flexibilidade, fluência verbal e figural. Para os autores, crianças com DD armazenam informações verbais e visuais por período mais curto que crianças sem o transtorno, explicando o rebaixamento na memória operacional. Para avaliar o controle inibitório, foram utilizados três testes: SCWT, Teste Go/No Go e Teste Computadorizado de Flexibilidade. No SCWT, o grupo com DD apresentou tempo aumentado de processamento nas três condições (neutra, congruente e incongruente) e escore maior de interferência. Também teve desempenho pior no teste de flexibilidade. Na avaliação da habilidade de planejamento e organização por meio da Torre de Londres (ToL), o grupo com DD não diferiu no número de problemas resolvidos, mas teve tempo maior de planejamento. Na versão modificada do Teste Wisconsin de Classificação de Cartas (WCST), para avaliar a formação de conceitos e uso de estratégias, teve número maior de erros e respostas perseverativas e precisou de número maior de cartas para finalizar a tarefa. Também houve prejuízo na fluência verbal e figural, indicando dificuldades na geração, evocação de palavras e no uso de estratégias. No Teste das Trilhas (TMT), teve tempo aumentado na Parte B, relacionada à flexibilidade cognitiva.

Helland e Asbjørnsen (2000) também realizaram comparação entre 30 crianças proficientes em leitura e 43 crianças com DD, divididas em 2 grupos conforme suas características na linguagem receptiva. Para a avaliação das FE, os autores utilizaram o Teste de Escuta Dicótica, o SCWT e o WCST. O grupo com DD demonstrou prejuízo nos instrumentos utilizados, mas esse desempenho foi pior conforme suas características de linguagem.

Alguns estudos têm privilegiado a investigação de algum componente específico das FE na DD. Närhi, Räsänen, Metsäpelto e Ahonen (1997) compararam o desempenho de 19 crianças com Transtorno de Leitura e 34 controles, estudantes do 4º ao 6º ano, nas Partes A e B do TMT. Adicionalmente, também foi utilizada a versão alfabética da Parte A. Os autores observaram diferenças significativas entre os grupos somente nos escores de tempo da Parte A – alfabética. Apesar de não significativo, o grupo com Transtorno de Leitura também exibiu tempo maior na Parte B e os autores atribuíram esse desempenho à sequência alfabética presente no teste.

Outros trabalhos investigaram o desempenho de indivíduos com DD no SCWT. O desempenho no cartão "Cor/Palavras" tem sido associado com o "efeito Stroop", no qual o indivíduo inibe as respostas automáticas (leitura das palavras) para emitir respostas controladas (nomeação da cor) (Everatt, Warner, Miles & Thompson, 1997; Protopapas, Archonti & Skaloumbakas, 2007). Segundo MacLeod e MacDonald (2000), nessa condição, a nomeação das palavras é mais automática que a nomeação de cores. Assim, o indivíduo deve inibir as respostas automáticas (leitura das palavras) para emitir respostas controladas (nomeação da cor).

Considerando-se que os indivíduos com DD apresentam dificuldades para a leitura automática de palavras, seria esperado menor efeito de interferência na condição incongruente do instrumento, isto é, para nomear a cor ao invés de ler as palavras. Entretanto, pesquisas demonstram escores maiores de tempo/erros nessa condição, sugerindo que algum nível de processamento automático das palavras pode ocorrer, o que interfere na capacidade de inibir essas respostas (Everatt et al., 1997; Protopapas et al., 2007).

Em nosso contexto, alguns trabalhos também têm demonstrado resultados semelhantes aos da literatura internacional. Lima et al. (2012) compararam o desempenho de 25 estudantes com DD e 25 sem dificuldades de aprendizagem, com idade entre 8 e 14 anos, nos instrumentos: Testes de Cancelamento, TMT, SCWT e ToL. O grupo com DD apresentou escores aumentados de tempo no TMT-Parte A e B, tempo e erros do Teste de Cancelamento (Figuras Geométricas), erros do Teste de Cancelamento (Letras em Fileira) e tempo/erros dos cartões do SCWT. Não houve diferenças entre os grupos no escore de acerto da ToL. Os autores sugerem que crianças com DD podem apresentar pior desempenho em tarefas de atenção sustentada visual e em alguns componentes das FE (flexibilidade e controle inibitório).

Em suma, os estudos têm demonstrado que indivíduos com DD possuem déficits na atenção sustentada visual e em diferentes componentes das FE, como memória operacional, flexibilidade, fluência verbal, controle inibitório e uso de estratégias cognitivas.

Além dos componentes das FE estudados por Lima et al. (2012) (flexibilidade, controle inibitório e planejamento), o presente trabalho propõe-se a investigar também a memória operacional, o uso de estratégias e a fluência verbal.

A descrição do desempenho de indivíduos com DD em tarefas de atenção e FE e identificação de possíveis déficits pode auxiliar na elaboração de estratégias interventivas mais profícuas, incluindo outros domínios cognitivos, além da linguagem.

Desta maneira, foi objetivo do presente trabalho comparar e descrever o desempenho de crianças com DD e crianças sem dificuldades de aprendizagem em instrumentos neuropsicológicos que avaliam a atenção sustentada visual e as FE (memória operacional, flexibilidade, controle inibitório, planejamento, estratégias cognitivas e fluência verbal). A hipótese do estudo é que as crianças do grupo com DD apresentem prejuízos nos instrumentos utilizados, quando comparadas à crianças sem dificuldades de aprendizagem.

 

Método

Participantes

Participaram do estudo 61 crianças, de ambos os gêneros (62% meninos e 23% meninas), com faixa etária entre 7 e 14 anos, idade média de 9,72 anos (desvio padrão – DP=1,57), cursando do 2º ao 8º ano do Ensino Fundamental e provenientes de escolas públicas da região metropolitana da cidade de Campinas (SP). Foram estudados dois grupos:

Grupo com Dislexia do Desenvolvimento (GD): composto por 31 crianças selecionadas dentre os encaminhamentos ao Ambulatório de Neuro-Dificuldades de Aprendizagem (Hospital de Clínicas da Universidade Estadual de Campinas – Unicamp) e que passaram por avaliação interdisciplinar (neuropsicologia, fonoaudiologia, pedagogia, neurologia e psiquiatria). Para o diagnóstico, foram seguidos os critérios do Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais – DSM-IV-TR (APA, 2002), critérios da CID-10 (OMS, 2008) e características clínicas: Quociente de Inteligência – QI≥80 avaliado pela Escala de Inteligência Wechsler para Crianças – WISC-III (Figueiredo, 2002); desempenho com 2 DPs abaixo da média em medidas de leitura/escrita (velocidade e precisão de leitura, tipos de erros na escrita) e alterações no processamento fonológico (acesso ao léxico, consciência fonológica e memória de operacional fonológica).

Grupo Controle (GC): composto por 30 crianças selecionadas em uma escola pública estadual, sem queixas de dificuldades de aprendizagem e/ou de atenção e leitores proficientes, com base nos resultados de avaliação do processamento fonológico e de leitura/escrita.

Os critérios de inclusão e exclusão dos grupos foram: (a) autorização dos pais por meio do termo de consentimento; (b) apresentar QI≥80, conforme o WISC-III (Figueiredo, 2002); (c) apresentar diagnóstico interdisciplinar de dislexia, no caso do GD; (d) não apresentar critérios para outros diagnósticos relacionados à aprendizagem e/ou atenção, como TDAH, conforme avaliação clínica interdisciplinar; (e) ter sido indicado pelas professoras por não apresentarem queixas de dificuldades de aprendizagem, não apresentar desempenho escolar abaixo da média, histórico de repetência e ter nível de leitura dentro do esperado para a idade, para o GC; (f) não fazer uso de medicamento psicotrópico, não apresentar algum tipo de deficiência sensorial, quadro neurológico ou atraso no desenvolvimento, conforme relato familiar.

Materiais

WISC-III (Figueiredo, 2002). Instrumento clínico para avaliação da capacidade intelectual geral. Foram utilizados os escores: QI Total (QIT), QI Verbal (QIV) e QI de Execução (QIE).

Subtestes do WISC-III: Código (Cod) e Procurar Símbolos (PS). Avaliam a atenção sustentada visual. No Cod, a criança observa símbolos simples pareados com formas geométricas (Código A) ou com números (Código B), que servem como modelos, e os copia no local correspondente. O PS é composto por folha em que deve examinar visualmente um grupo padrão (alvos) e outro de busca. Em cada um dos itens, a criança deve marcar se a figura-modelo aparece ou não no grupo de busca. Ambos os subtestes devem ser realizados em dois minutos. Foram utilizados os escores ponderados para a idade, conforme a padronização.

Índice de Velocidade de Processamento (IVP) do WISC-III. Índice fatorial obtido a partir da soma dos subtestes Cod e PS e que fornece estimativa da capacidade atencional. Para as análises, foi utilizado o QI deste índice fatorial.

Testes de Cancelamento – TC (Lima, Travaini & Ciasca, 2009). Avaliam a atenção sustentada e rastreamento visual. Foram utilizadas duas versões: (a) Figuras Geométricas (TC-FG), em que a criança deve marcar os círculos (alvos) encontrados o mais rápido que conseguir em uma folha com figuras desorganizadas visuoespacialmente; (b) Letras em Fileira (TC-LF), em que deve marcar todas as letras "A" em uma folha com diferentes letras distribuídas aleatoriamente e organizadas, do ponto de vista espacial. Foram considerados os escores de tempo (em segundos) e erros por omissão (número de estímulos-alvo não assinalados).

Teste das Trilhas A e B (TMT-A/B) (Spreen & Strauss, 1991). A Parte A avalia atenção sustentada visual e a Parte B, flexilidade mental. O TMT-A é composto por folha com círculos numerados de 1 a 25, distribuídos de forma aleatória, e a criança deve traçar uma linha ligando a sequência. Foram considerados os escores de tempo e de erros de sequência. A parte B é composta por círculos com números e letras e a criança deve ligar alternadamente os círculos com números e letras, seguindo respectivamente as ordens numérica e alfabética. Foram utilizados os escores de tempo, erros de sequência (número de vezes em que a criança não segue a sequência correta de números e/ou letras) e erros de alternância (número de vezes em que a criança não alterna as ligações entre números e letras).

SCWT, versão Stroop Victoria (Spreen & Strauss, 1991). Avalia o controle inibitório e atenção seletiva visual. É composto por 4 cores e 24 estímulos em cada uma das três partes: (a) Cartão Cores (C): nomear os quadrados pintados nas quatro cores; (b) Cartão Palavras (P): dizer os nomes das cores impressas nas cores correspondentes (situação congruente); (c) Cartão Cor-Palavra (CP): são apresentados nomes de cores impressos em outras cores não correspondentes (condição incongruente) e a criança deve nomear a cor e não ler a palavra. Foram obtidos escores de tempo (em segundos) e número de erros para cada cartão.

ToL (Tunstall, 1999). Avalia a habilidade de planejamento e raciocínio lógico. É composta por uma base de madeira com três pinos verticais e quatro discos coloridos do mesmo tamanho, com furo no centro para o encaixe nos pinos. O objetivo é mover os discos para reproduzir, em um número determinado de movimentos, a posição de uma figura-alvo apresentada. São permitidas três tentativas e a resposta é considerada correta quando a solução é alcançada com o número correto de movimentos. Os escores de cada item podem variar de 0 a 3 pontos e o escore total é a soma dos escores de todos os itens.

WCST (Cunha et al., 2005). Avalia capacidade de uso e modificação de estratégias. A criança deve realizar associações (cor, forma ou número) entre cartas de um baralho e quatro cartas-estímulo que atuam como modelos. O pesquisador somente pode dizer à criança se ela está certa ou errada, conforme o princípio classificatório envolvido. Ao longo da tarefa, a criança deve utilizar o feedback do pesquisador para modificar sua estratégia de classificação.
Foram considerados os seguintes escores: Número de ensaios administrados (NEA); Ensaios para completar a primeira categoria (WCST-ECPC); Número de categorias completadas (WCST-NCC); Número total correto (WCST-NTC); Percentil do número total de erros (WCST-NTE); Percentil do número de respostas perseverativas (WCST-RP); Percentil do número de respostas de nível conceitual (WCST-RNC).

Dígitos – Ordem Inversa (Dig-OI) (Figueiredo, 2002). Parte do subteste Dig do WISC-III que avalia a memória operacional. É composto por sequência de dois a oito algarismos e é solicitado que a criança repita a sequência expressa pelo avaliador na ordem inversa. Foram considerados os escores brutos que podem variar de 0 a 14.

Teste de Fluência Verbal (FAS) (Mello, 2003). Avalia a capacidade de produção de palavras verbalmente e acesso ao léxico. Foram usadas as versões: (a) Fonológica (FVF) – dizer o maior número de palavras que começam com as letras F, A e S em um minuto; (b) Semântica (FVS) – dizer o maior número de palavras nas categorias animais, frutas e materiais escolares. Foram considerados os escores totais de palavras para cada versão.

Procedimentos

O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade de Ciências Médicas da Unicamp (Protocolo nº 648/2007). Todas as crianças foram avaliadas individualmente e de acordo com as instruções específicas de cada instrumento. A avaliação foi realizada em quatro sessões e os instrumentos foram administrados na seguinte ordem: 1º e 2º (WISC-III); 3º (TC, TMT, ToL) e 4º (SCWT, WCST e FAS). As avaliações do GD foram realizadas em salas do Hospital de Clínicas da Unicamp e as avaliações do GC, em sala da escola pública destinada para essa finalidade. A análise estatística foi realizada por meio do Programa Statistical Package for the Social Sciences (SPSS Statistics 20.0 for Windows®). Para comparação dos grupos, foi utilizado teste não paramétrico de Mann-Whitney, com nível de significância de p<0,05. Conforme recomendação da APA (Conboy, 2003) foi incluída medida de magnitude de efeito (Cohen's d), para comparação das diferenças de médias entre dois grupos independentes. Conforme os critérios de Cohen, a magnitude de efeito é interpretada da seguinte maneira: d=0,20 (pequena), d=0,50 (média) e d=0,80 (elevada).

 

Resultados

Conforme observa-se na Tabela 1, não houve diferenças na distribuição de frequência entre os grupos nas variáveis gênero [x²(1,n=61)=2,02; p=0,16] e ano escolar [x²(1,n=61)=1,31; p=0,25]. A comparação das idades médias entre os grupos mostrou diferenças significativas (U=224,50; p=0,001). Em relação ao desempenho intelectual, houve diferenças significativas entre os grupos nos escores: QIV (U=213,00; p<0,001), QIE (U=231,00; p=0,001) e QIT (U=194,00; p<0,001).

Na Tabela 2, são apresentados os resultados das comparações entre os grupos nos diferentes intrumentos utilizados.

 

Discussão

O presente estudo teve como objetivos comparar e descrever o desempenho de crianças com DD e de crianças sem dificuldades de aprendizagem em instrumentos que avaliam atenção sustentada visual e componentes das FE (memória operacional, flexibilidade, controle inibitório, estratégias e fluência verbal).

Do ponto de vista intelectual, apesar de ambos os grupos apresentarem desempenho dentro da normalidade, conforme os critérios de inclusão, as médias dos três QIs do GD foram menores que as do GC. Em relação aos resultados do GD, nossos achados são semelhantes aos obtidos no estudo realizado por De Clercq-Quaegebeur et al. (2010), que analisaram o perfil de crianças francesas com DD na quarta edição do WISC.

No que tange ao desempenho nos instrumentos de atenção do WISC-III, apesar de os escores ponderados estarem dentro da faixa média (considerando-se média – M=10; DP=3), o GD apresentou escores inferiores ao GC no Cod, PS e IVP (WISC-III). Esses substestes e índice podem ser considerados medidas de atenção sustentada visual, envolvendo também rastreamento visual, habilidade visomotora e resposta grafomotora rápida/repetitiva e velocidade de processamento.

Quanto à velocidade de processamento, a literatura tem mostrado resultados controversos. Shanaham et al. (2006) demonstram que indivíduos com transtorno de leitura possuem prejuízos em medidas como o Cod (WISC-R), TMT, SCWT, Stop Signal Test, Gordon Diagnostic System e teste de Nomeação Automática Rápida (RAN). Wolf e Bowers (1999), que propuseram a hipótese do duplo déficit na DD, também indicam que a alteração na velocidade de processamento, mediada pela diminuição da velocidade de nomeação, pode ser um déficit secundário na dislexia. De Clercq-Quaegebeur et al. (2010) também encontraram alteração no IVP do WISC-IV. Entretanto, tal resultado foi explicado somente pelo prejuízo no subteste Cod e não no PS, o que, para os autores, não indicaria rebaixamento global nessa habilidade. É possível que diferenças entre os métodos, no caso, versões do PS do WISC — terceira ou quarta edição — possam justificar os resultados discordantes.

Nos Testes de Cancelamento, apesar de as crianças com DD exibirem escores maiores de tempo/erros, houve diferença entre os grupos no número de erros por omissão no TC (Letras em Fileira), por meio do teste de Mann-Whitney, e erros por omissão no TC (Figuras Geométricas), conforme resultado da medida de magnitude de efeito (Cohen's d; d=0,59 – média). Deste modo, apesar da semelhança no tempo, a qualidade do desempenho atencional e o recrutamento de recursos para controlar tal desempenho foi inferior, expressos pelos erros cometidos.

Os resultados do presente estudo replicam os achados de Lima et al. (2012). São resultados que também vêm sendo descritos em outros estudos, apontando que indivíduos com DD possuem dificuldades em testes com rastreamento visual em série (como os TC) em função da redução do número de itens atendidos simultaneamente (Marendaz et al., 1996) e do processamento atencional lento (Hari & Renvall, 2001). Especificamente no que concerne aos escores de tempo, estudos realizados com outros paradigmas de avaliação atencional (atenção encoberta ou apresentação visual serial rápida) (Facoetti & Molteni, 2001; Heiervang & Hugdahl, 2003; Visser et al., 2004; Facoetti et al., 2010; Franceschini et al., 2012) e que utilizam registros computadorizados de reação demonstram maiores prejuízos em crianças com DD.

Aventa-se a hipótese de que o uso dessas medidas computadorizadas de tempo de reação possui maior acurácia para a detecção de diferenças entre os grupos, de modo que estudos posteriores podem considerar melhor essa variável.

Outro aspecto a ser ressaltado é que o aumento do número de erros foi mais significativo na versão Letras em Fileira do TC, que possui estímulos verbais. Outros trabalhos apontam que as dificuldades atencionais na DD podem ser específicas às características dos estímulos, isto é, diante de estímulos verbais, o prejuízo é maior (Marzocchi et al., 2009; Ziegler et al., 2010; Savill & Thierry, 2012). Segundo Marzocchi et al. (2009), o padrão desatento, que pode acompanhar o indivíduo com DD na escola, ocorre em função do processamento mais lento, principalmente quando são expostos a estímulos verbais. Os autores ainda verificaram que o desempenho atencional e executivo foi significativamente influenciado pelas habilidades fonológicas. Desta maneira, há evidências de que o prejuízo atencional pode correlacionar-se positivamente ao prejuízo no desempenho fonológico.

Na avaliação dos diferentes componentes das FE, as crianças com DD tiveram desempenho prejudicado em alguns componentes. Foram encontradas diferenças entre os grupos nos escores de tempo/erros do TMT (Parte B), tempo/erros do SCWT, número de erros, respostas perseverativas, respostas de nível conceitual do WCST, escore do Dig-OI e categoria fonológica do FAS. Os resultados da medida da magnitude do efeito (Cohen's d) também indicaram diferenças entre os grupos no tempo (SCWT-CP), ToL e demais escores do WCST.

Estudos prévios com crianças com DD demonstram prejuízos no desempenho do TMT. Com relação à Parte A, que envolve somente a ligação de sequência numérica, nossos resultados corroboram outras pesquisas que não indicam diferenças entre os grupos nos escores de tempo/erros (Närhi et al., 1997; Reiter et al., 2005; Lima et al., 2012). Na Parte B, que envolve alternância entre sequência numérica e alfabética, nosso resultado foi semelhante ao obtido por Närhi et al. (1997) e Reiter et al. (2005), de modo que as crianças do GD exibiram escores maiores de tempo e erros. Ainda que as crianças com DD tenham conhecimento da ordem alfabética, com o envolvimento da velocidade de processamento e alternância atencional na Parte B, essa tarefa torna-se complexa do ponto de vista cognitivo, podendo explicar o desempenho prejudicado.

Na avaliação do controle inibitório por meio do SCWT, o GD teve escores aumentados de tempo e erros. O cartão Cor assemelha-se a outra prova internacionalmente utilizada para avaliar velocidade de acesso ao léxico, chamada prova de nomeação automatizada rápida – RAN. Outro trabalho (Capellini, Ferreira, Salgado & Ciasca, 2007) aponta que indivíduos com DD exibem tempo maior para nomeação de cores quando comparados a bons leitores ou crianças com TDAH. Além disso, há evidências de relações entre a nomeação rápida, processamento fonológico e velocidade de processamento, de forma que o tempo e o número de erros aumentados nessa parte do SCWT podem ser esperados e corroboram a hipótese do déficit de nomeação rápida (Capellini et al., 2007).

Com relação ao "efeito Stroop", em nosso estudo, o GD mostrou escores superiores de tempo e erros. Resultados similares foram obtidos em outros trabalhos (Reiter et al., 2005; Everatt et al., 1997; Protopapas et al., 2007; Lima et al., 2012), sugerindo que indivíduos com DD podem apresentar dificuldades no controle inibitório, assim como em atenção seletiva visual.

Contudo, se observamos melhor esses achados, não seria esperado que indivíduos com dislexia tivessem algum tipo de dificuldade na condição incongruente, pois apresentam dificuldades para leitura. Deste modo, não seria preciso inibir essa resposta, pois não se mostra automatizada. Algumas explicações têm sido levantadas na literatura:

a)   é possível ocorrer algum nível de processamento da palavra que cause interferência;

b)   podem ocorrer problemas na automatização;

c)   possível alteração no controle das respostas (leitura ou nomeação da cor);

d)   alterações no acesso ao léxico prejudicam o desempenho na tarefa (Everatt et al., 1997; Lima et al., 2012). Assim, alterações nas habilidades de acesso ao léxico e em sua demanda atencional podem servir de base para compreender o desempenho de indivíduos com DD no SCWT. Desta maneira, os resultados podem sugerir desempenho prejudicado em controle inibitório, conforme outros estudos (Everatt et al., 1997; Helland & Asbjørnsen, 2000; Reiter et al., 2005).

Com relação ao desempenho na ToL, há inconsistências na literatura quanto à hipótese de prejuízo na DD. No presente trabalho, não houve diferenças no escore total entre os grupos conforme a estatística tradicional, sendo condizente com estudo prévio realizado com a mesma versão do instrumento (Lima et al., 2012). No entanto, o uso da medida de magnitude de efeito indicou desempenho inferior para o GD, apesar de o efeito ter sido médio (d=-0,50). O resultado da estatística tradicional foi semelhante ao obtido por Reiter et al. (2005) quanto ao escore de acertos, mas os autores também aferiram o tempo de resolução e esse foi maior no grupo com DD. Não podemos comparar os trabalhos neste aspecto, uma vez que não avaliamos tempo de resolução. Na mesma direção, o uso de versões diferentes também prejudica a comparação e generalização dos achados.

Marzocchi et al. (2008) também verificaram que crianças com DD tiveram desempenho semelhante aos controles quando comparadas a um grupo com TDAH. Os autores explicaram que, qualitativamente, as crianças com TDAH demonstraram mais respostas impulsivas e maior número de violação de regras, o que explicaria a diminuição nos escores. No presente estudo, do ponto de vista qualitativo, também não foram observadas respostas impulsivas nas crianças do GD para a resolução dessa tarefa.

Desta maneira, podemos inferir que, apesar de necessitarem de tempo maior para a organização e planejamento da resposta (Reiter et al., 2005), o que envolve funcionamento executivo e velocidade de processamento (habilidades alteradas), a criança com DD demonstra desempenho satisfatório. Além disso, a ausência de respostas impulsivas pode garantir melhor desempenho.

No WCST, de modo geral, o GD apresentou maior número de erros/respostas perseverativas e menos respostas de nível conceitual. Diferenças marginalmente significativas entre os grupos, conforme a estatística tradicional, indicaram que o GD necessitou de maior número de ensaios para realizar o teste, apresentou maior número de ensaios para completar a primeira categoria e completou menos categorias. Conforme a medida de magnitude de efeito, foram observadas diferenças entre os grupos nos escores anteriormente mencionados, além de o GD também apresentar menos escores corretos.

Resultados contraditórios são encontrados na literatura. Marzocchi et al. (2009) apontam que os indivíduos com DD apresentam porcentagem maior de erros perseverativos, enquanto outros (Menghini et al., 2010) apontam que os mesmos completam menos categorias, mas não demonstram mais erros perseverativos.

Utilizando a versão reduzida do WCST, Reiter et al. (2005) observaram que o grupo com DD teve menos erros e perseverações e mais respostas corretas que os controles. Os autores arguem que esse resultado pode ser devido à familiaridade desses indivíduos com procedimentos de testes em situações diagnósticas. Porém, essa explicação não nos parece mais plausível do que a possibilidade de alterações na habilidade cognitiva avaliada pelo instrumento. Além disso, a diferença entre as versões podem prejudicar a comparação entre os estudos. Contudo, outros trabalhos (Helland & Asbjornsen, 2000; Marzocchi et al., 2009), utilizando a versão original do WCST, mostram resultados contrários e que coincidem com os nossos achados.

Foi utilizada a parte inversa do subteste Dígitos do WISC-III como medida da memória operacional e os resultados indicaram que o GD teve escores rebaixados (extensão menor) quando comparados ao GC. Outros trabalhos também encontraram resultados semelhantes usando o Dig (WISC) ou outras versões do Digit Span (Helland & Asbjørnsen, 2000; De Clercq-Quaegebeur et al., 2010). Alguns autores (Reiter et al., 2005; De Clercq-Quaegebeur et al., 2010) sugerem que instrumentos que avaliam a alça fonológica da memória operacional podem ser utilizados para distinguir crianças com DD e controle, pois refletem problemas relacionados à representação fonológica.

Ainda sobre a memória operacional, no estudo de De Clercq-Quaegebeur et al. (2010), foi identificado que 70% das crianças com DD tiveram resultados inferiores no Índice de Memória Operacional (WMI) do WISC-IV, principalmente aquelas com dislexia fonológica. Para os autores, esse índice pode ser considerado sensível para a definição de possível perfil de indivíduos com DD para diagnóstico. No WISC-IV, o WMI substitui o Índice de Resistência à Distração do WISC-III e é formado pelos subtestes Dígitos, Aritmética e Sequência Letra-Número.

No FAS, observamos que, em ambos os grupos, os escores da categoria semântica são maiores que os da categoria fonológica. Esse pode ser considerado um padrão normal devido à maior facilidade dessa prova. No entanto, os grupos diferiram significativamente na categoria fonológica.

Estudos prévios descrevem prejuízos em crianças com DD no desempenho de testes de fluência verbal, com a recuperação de número menor de palavras, principalmente na categoria fonológica (Reiter et al., 2005; Marzocchi et al., 2008). Além da fluência verbal, Reiter et al. (2005) também verificaram que o grupo controle apresentou desempenho melhor em versões visuais dessa tarefa. Marzocchi et al. (2008) também observaram que o grupo com DD produziu número menor de palavras no teste de fluência de letras (o que corresponde ao nosso FAS – categoria fonológica) e não no teste de fluência semântica. Os autores ainda observaram que, dentre os testes de FE utilizados, o teste de fluência foi um dos que mais diferenciou crianças com DD e TDAH.

A identificação de prejuízos em outros domínios cognitivos na DD, além da linguagem, torna-se relevante na medida em que permite explorar desdobramentos para a prática clínica da reabilitação neuropsicológica (Facoetti, Lorusso, Paganoni, Umiltà & Mascetti, 2003) e das estratégias de suporte escolar (Meltzer, 2007).

 

Conclusão

Os resultados do estudo corroboram os encontrados na literatura e sugerem que as crianças com DD podem apresentar desempenho prejudicado em testes de atenção sustentada visual e nos diferentes componentes das FE investigados (flexibilidade, controle inibitório, estratégias e fluência verbal). Também sugerem que indivíduos com DD podem demonstrar padrão diferente de rastreamento visual e seleção de recursos executivos, principalmente diante de estímulos com conteúdo verbal.

Essas características podem ser mais bem investigadas de modo a estabelecer um perfil clínico que permita diferenciar a DD de outros transtornos, como o TDAH. Além disso, desdobramentos teóricos, clínicos e educacionais podem ser elencados buscando-se maiores esclarecimentos se tais déficits são centrais ou secundários à linguagem, quais suas relações com a linguagem escrita e implicações para possível tratamento farmacológico, intervenção neuropsicológica e manejo educacional.

 

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Endereço para correspondência:
Ricardo Franco de Lima
Universidade Estadual de Campinas
Departamento de Neurologia
Caixa Postal 6.111
CEP 13083-970 – Campinas/SP
E-mail: rilima@fcm.unicamp.br

Recebido em 25/04/2013
Revisto em 10/07/2013
Aceito em 22/07/2013

 

* Apoio financeiro: Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).