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Psicologia em Pesquisa

On-line version ISSN 1982-1247

Psicol. pesq. vol.12 no.1 Juiz de Fora Jan./Apr. 2018

http://dx.doi.org/10.24879/201800120010078 

Artigo Original

10.24879/201800120010078

 

Atitudes das equipes dos serviços de atenção psicossocial em álcool e drogas

 

Attitudes of psychosocial care services teams in alcohol and drugs

 

Paula Hayasi Pinho I,II; Márcia Aparecida Ferreira Oliveira I; Heloísa Garcia Claro I; Ricardo Henrique Soares I; Rejane Maria Dias Abreu Gonçalves I; Maria Odete Pereira I

I Universidade de São Paulo - Escola de Enfermagem

II Psicóloga, Especialista em Saúde Mental e Atenção Psicossocial, Doutora em Ciências pela Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo. Docente do Centro de Ciências da Saúde da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia.

 

 

 


Resumo

Considerando que as atitudes dos profissionais de saúde influenciam suas práticas assistenciais, objetivou-se mensurar as atitudes desses profissionais frente ao álcool, alcoolismo e alcoolista. Foram entrevistados 288 profissionais de 12 Centros de Atenção Psicossocial Álcool/Drogas por meio da Escala de Atitudes Frente ao Álcool, Alcoolismo e Alcoolista. Apontou-se tendência a atitudes positivas, sobretudo dos profissionais com nível superior e que desenvolviam intervenções dirigidas a alertar os riscos do consumo do álcool e a desenvolver consciência crítica dos problemas. Entretanto, os trabalhadores apresentaram atitudes negativas frente à etiologia do alcoolismo e aqueles que desenvolviam intervenções dirigidas à abstinência apresentaram atitudes menos positivas.

Palavras chave: atitude do pessoal de saúde; avaliação de serviços de saúde; transtornos relacionados ao uso de álcool; serviços comunitários de saúde mental; usuários de drogas


Abstract

Considering that the attitudes of health professionals influence their care practices, this study aimed to measure the attitudes of these professionals towards alcohol, alcoholism and alcoholism. 288 professionals from 12 Psychosocial Alcohol / Drug Attention Centers were interviewed through the Attitudes Scale Facing Alcohol, Alcoholism and Alcoholism. There was a tendency for positive attitudes, especially for professionals with higher education, who developed interventions aimed at alerting the risks of alcohol consumption and developing a critical awareness of problems. However, workers presented negative attitudes towards the etiology of alcoholism and those who developed abstinence-oriented interventions presented less positive attitudes.

Keywords: attitude of health personnel; health services evaluation; substance-related disorders; mental health services; community mental health services; drug users

 

 

As atitudes podem ser definidas como disposições afetivas relativamente estáveis, que influenciam as respostas direcionadas, positiva ou negativamente, a determinado alvo ou objeto, culturalmente aprendidas e organizadas pela experiência. (Krech, Crutchfield, & Ballachey, 1962)

As atitudes consistiriam em uma predisposição adquirida e persistente para agir da mesma maneira em face de uma determinada classe de objetos, entretanto, trata-se de uma predisposição relativa e, portanto, mutável. (Vargas, 2005)

No contexto da assistência em saúde, as atitudes estão associadas ao desenvolvimento do processo de cuidado, uma vez que as atitudes dos profissionais atuantes nessa área são exteriorizadas por meio de suas ações no curso do tratamento, de modo que parte da própria intervenção em saúde oferecida pelos profissionais traduz suas predisposições para agir. (Vargas, 2010)

Estudos retrataram as atitudes de enfermeiros de hospitais gerais frente a pacientes alcoolistas. Os resultados sugeriram que esses profissionais têm sentimentos de embaraço e desconforto ao lidarem com alcoolistas (70% dos enfermeiros indicaram que não trabalham bem com alcoolistas; 80% preferem não trabalhar; e 60% têm dificuldades de falar a respeito do alcoolismo com os pacientes), percebendo-os como pessoas infelizes, solitárias, sensíveis, que duvidam de seu próprio valor e apresentam sérias dificuldades emocionais. (Vargas & Labate, 2005; Vargas, 2010)

Com relação aos demais profissionais da área da saúde, estudo bibliográfico (Soares, Vargas & Oliveira, 2011) evidenciou que a maioria deles apresentou atitudes típicas do senso comum em relação aos pacientes alcoolistas e que pelo menos ao longo de cinco décadas (1959 a 2009) tais atitudes sofreram poucas transformações.

Verifica-se reduzido número de publicações acerca das atitudes e conhecimentos dos profissionais de saúde diante do álcool, alcoolismo e do alcoolista, evidenciando que a temática tem despertado pouco interesse entre pesquisadores, no âmbito nacional e internacional (Soares, Vargas & Oliveira, 2011; Vargas, Oliveira & Duarte, 2011; Caixeta, Pedrosa & Haas, 2016), o que justifica a relevância do presente estudo.

Com efeito, e tendo em vista que as atitudes dos profissionais de saúde influenciam as práticas assistenciais prestadas aos usuários dos serviços, este estudo objetivou mensurar as atitudes dos profissionais de saúde atuantes nos serviços especializados de atenção psicossocial em álcool e drogas em relação ao álcool, ao alcoolismo e ao alcoolista, bem como verificar se existe associação entre as variáveis sociodemográficas, de perfil dos trabalhadores e de processo de trabalho com as atitudes desses profissionais.

 

METODOLOGIA

Como recorte de uma tese de doutorado intitulada “Avaliação dos Centros de Atenção Psicossocial em Álcool e outras Drogas do município de São Paulo”, o presente estudo transversal, exploratório, descritivo e de natureza quantitativa foi desenvolvido entre maio de 2013 e abril de 2014, em 12 CAPSad da cidade de São Paulo, no Estado de São Paulo, credenciados no Ministério da Saúde e com um ano de funcionamento, no mínimo.

Foram incluídos no estudo todos os trabalhadores que estivessem trabalhando no serviço há pelo menos um ano. Do total de 349 trabalhadores cadastrados, foram entrevistados 288, sendo que dois profissionais foram excluídos da amostra e houve 61 perdas. Os motivos para perdas incluíram: trabalhadores em licença, férias ou afastados durante o período de coleta de dados; recusa em participar da pesquisa e trabalhadores alocados em outros serviços de saúde.

Para a coleta dos dados utilizou-se um instrumento semiestruturado, elaborado pelos autores para caracterização sociodemográfica dos trabalhadores dos CAPsad e a Escala de Atitudes frente ao Álcool, Alcoolismo e Alcoolista – EAFAAA (Vargas, 2011). Os dados foram coletados por meio de entrevista individual.

A EAFAAA apresenta bons índices de confiabilidade e consistência interna, foi construída com o objetivo de avaliar os principais grupos de atitudes dos profissionais de saúde frente ao álcool e ao alcoolismo - fator moral, fator doença, fator etiológico, fator profissional e fator humano. (Pillon, Laranjeira & Dunn, 1998)

A versão da EAFAAA utilizada possui 50 itens, que avaliam as atitudes dos profissionais em uma escala de Likert de 1 a 5. Pontuações finais mais elevadas no escore da escala predizem profissionais com atitudes mais positivas frente ao álcool, o alcoolismo e o alcoolista. Alguns itens possuem lógica invertida e, desse modo, precisam ter os seus valores considerados como opostos para que seja efetuado o cálculo adequado das atitudes.

Os dados foram analisados pelo Programa STATA 12 para Windows®. Foi realizada uma análise descritiva dos dados, testes de médias e cálculos dos intervalos de confiança para cada uma das variáveis quantitativas.

Para verificar as associações entre as variáveis, foram realizados modelos de regressão de mínimos quadrados ordinários (Ordinary Least Squares – OLS) univariadas e múltiplas. (Baldi & Moore, 2014)

Definiu-se como variável dependente o escore da EAFAAA e para a análise dos determinantes das atitudes dos profissionais, dividiu-se as variáveis independentes em três classes: descrição sociodemográfica dos trabalhadores, perfil dos trabalhadores e processo de trabalho.

Na primeira etapa da pesquisa, realizou-se a análise univariada de cada variável e inclui-se no modelo final de cada classe as variáveis com valor de p ≤ 0,3, sendo elas: variáveis sociodemográficas do trabalhador, perfil dos trabalhadores e do processo de trabalho. Após a elaboração do modelo múltiplo em cada variável, selecionou-se todas as variáveis que tiveram um valor de p ≤ 0,1 nos modelos múltiplos e as mesmas foram incluídas no modelo final. As variáveis são a respeito dos determinantes das atitudes frente ao álcool, ao alcoolismo e ao alcoolista. Todos os dados foram distribuídos em tabelas.

A pesquisa foi aprovada no comitê de ética (CEP–EEUSP nº 1.001/2011) sob CAAE nº 0005.0.196.000-11 e os autores observaram todas as determinações éticas estabelecidas pela Resolução do Conselho Nacional de Ética em Pesquisa, nº 466 de 2012. As entrevistas foram realizadas após assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.

 

RESULTADOS

Entre os trabalhadores participantes, verificou-se predomínio de profissionais do sexo feminino, com idade média de 40 anos e pós-graduados, conforme os dados distribuídos na Tabela 1.

 

 

Dentre os 288 participantes, verificou-se a prevalência de técnicos e auxiliares de enfermagem; profissionais da área administrativa e de psicólogos. Outros dados referentes às funções exercidas pelos profissionais nos CAPSad que participaram da pesquisa podem ser observados na Tabela 2.

 

 

A Tabela 3 apresenta os escores obtidos na EAFAAA, como um todo e em cada um dos fatores da escala, pelos profissionais dos CAPSad que responderam à pesquisa (n=288).

 

 

A média do escore obtido na EAFAAA foi de 3,56%. com tendência para as atitudes positivas dos profissionais frente ao álcool, alcoolista e alcoolismo. Ao verificar por fator, notou-se que a média para o fator 1, 2 e 4 apresentou tendência sugestiva de atitudes positivas, quando comparadas com a média observada. Já para o fator 3, a tendência apresentada revelou-se sugestiva de atitudes negativas, se comparadas com a média observada.

Na Tabela 4 pode-se verificar a distribuição dos efeitos das características sociodemográficas do trabalhador em suas atitudes frente ao álcool, ao alcoolismo e ao alcoolista. As variáveis incluídas no modelo foram as de a) sexo; b) cor/raça; c) escolaridade; d) renda; e) cursos de atualização; e f) profissão.

 

 

Os autores mediram: gênero em 0 - masculino e 1-feminino; cor/raça por meio da autodeclaração do trabalhador, que foram divididos em duas categorias: 0- branco e 1- não branco. Outra variável dicotômica foi a variável curso de atualização que mensura se o trabalhador não fez (0) ou fez (1) cursos de atualização. As outras três variáveis possuem quatro categorias:

i) Escolaridade: 0 – ensino fundamental ou médio; 1 – ensino técnico; 2 – ensino superior; 3 – pós-graduação. Tomou-se como categoria de comparação a educação fundamental ou média.

ii) Renda total: 0 – 1 a 3 salários mínimos; 1 – 4 a 7 salários mínimos; 2 – 8 a 11 salários mínimos e 3 – acima de 12 salários mínimos. A categoria de comparação foi 1 a 3 salários mínimos.

iii) Profissão: 0 – técnico administrativo; 1 – técnico de saúde; 2 – oficineiro; 3 – nível superior de saúde.

Conforme se pode verificar na Tabela 4, todas as variáveis que tiveram valor de p ≤ 0,3 nos modelos univariados foram inseridas nos modelos múltiplos. Vale ressaltar que todas as variáveis e categorias univariadas da tabela tiveram valor de p ≤ 0,05. Contudo, no modelo múltiplo, as variáveis de sexo e cor/raça perderam significância. Em relação à variável de escolaridade, apenas aqueles que pertenciam à categoria Ensino Superior possuíam atitudes mais positivas e essa diferença foi significantemente diferente da categoria educação fundamental ou média. Acerca da variável de renda, as duas categorias de maior remuneração possuíam atitudes mais positivas em relação à categoria de comparação.

Ademais, os trabalhadores que fizeram cursos de atualização também possuíam atitudes significativamente mais positivas do que as daqueles que não fizeram. Os trabalhadores técnicos e com nível superior de saúde possuem melhores atitudes que os técnicos administrativos. Por fim, observando os R2 dos modelos, verificou-se que as variáveis mais explicativas são a escolaridade e a renda obtida no CAPSad. Ambas explicitaram 24% e 28% da variação das atitudes dos trabalhadores. No entanto, ambas pareceram captar os mesmos efeitos, uma vez que o R2 do modelo múltiplo foi ligeiramente superior, explicando 33% das atitudes.

O objetivo das intervenções terapêuticas foi medido da seguinte forma: 0 – alertar para os riscos do consumo de álcool e outras drogas; afastar as pessoas das drogas; evitar lugares e pessoas que incentivam o uso de álcool e outras drogas ou não sei; 1 – Desenvolver a consciência crítica para além do consumo de álcool e outras drogas e o conjunto de todas as alternativas. Estes resultados podem ser vistos na Tabela 5, que analisou os efeitos de duas variáveis acerca do Processo de Trabalho, a saber: a) objetivo das intervenções terapêuticas e b) indicação das internações.

 

 

As indicações de internações foram medidas como 0 – pelo médico, pela família, pelo usuário ou por via judicial e 1 – após discussão em equipe.

Ambas as variáveis foram significantes no modelo múltiplo, indicando os indivíduos que acreditavam que desenvolver consciência crítica acerca do álcool e outras drogas era o principal objetivo das intervenções e, aqueles que indicavam internação, após discussão de caso em equipe possuíam melhores atitudes, com um p valor ≤ 0,0001, mostrando alta significância deste modelo.

Por fim, na Tabela 6 é representado o modelo múltiplo final, que inclui todas as variáveis que foram estatisticamente significantes, apresentadas nos modelos múltiplos das tabelas 3 e 4. O critério adotado para entrada de uma variável no modelo final foi que a variável tivesse um valor de p ≤ 0,1 no modelo múltiplo. Incluiu-se da Tabela 3 as variáveis: escolaridade; cursos de atualização, renda e profissão. Da Tabela 4, foram incluídos as duas variáveis de processo: intervenções e internações.

 

 

A apresentação do modelo final é um pouco diferente das tabelas anteriores, pois se incluiu apenas um modelo e apresentou o coeficiente estimado. Em seguida, o seu valor de p e o seu respectivo intervalo de confiança.

No modelo final acerca das atitudes, apresentado na Tabela 6, as variáveis que permaneceram significantes com valor de p ≤ 0,05 foram: Renda, Profissão e Intervenções. Da variável escolaridade, apenas os profissionais que possuíam ensino superior possuíam atitudes significativamente mais positivas que as dos trabalhadores que tinham cursado apenas o Ensino Fundamental ou Médio, com um valor de p ≤ 0,1. O mesmo aconteceu com a variável renda, pois aqueles que ganhavam de 8 a 11 salários mínimos possuíam atitudes mais positivas que o grupo de comparação.

Resultado semelhante obteve-se acerca da profissão dos trabalhadores, uma vez que apenas os profissionais de saúde, com terceiro grau e oficineiros tiveram atitudes significantemente mais positivas que os de setores administrativos.

Por fim, o objetivo das intervenções está positivamente associado às melhores atitudes dos profissionais.

 

DISCUSSÃO

Considerando que o presente estudo objetivou mensurar as atitudes dos profissionais de saúde atuantes nos serviços especializados de atenção psicossocial em álcool e drogas em relação ao álcool, ao alcoolismo e ao alcoolista, além de verificar se há associação entre variáveis sociodemográficas, de perfil dos trabalhadores e de processo de trabalho com as atitudes dos mesmos. A seguir, os autores farão a dialética com outros estudos, acerca da temática.

Estudos nacionais que analisaram o perfil sociodemográfico dos trabalhadores de saúde mental tiveram a prevalência do sexo feminino; adultas jovens com estado civil casada, e com nível de educação superior. (Kantorski et al., 2009; Leal, Bandeira & Azevedo, 2012; Rebouças, Legay, & Abelha, 2007)

Em relação ao período de tempo trabalhado no CAPSad, estudo realizado com profissionais em serviços de saúde mental, prevaleceram os que trabalhavam entre 2 a 4 anos (Silva et. Al, 2013).

Acerca das atitudes dos trabalhadores, os dados encontrados na EAFAA apontaram uma tendência às atitudes positivas frente ao álcool, ao alcoolismo e ao alcoolista, que pode estar associada ao fato de estes profissionais prestarem assistência a usuários de álcool e outras drogas. Há evidências científicas de que os que trabalham no cuidado de pessoas em uso problemático de álcool apresentam atitudes mais positivas frente ao usuário e melhor conhecimento acerca da temática. (Pinikahana, Happell, & Carta, 2002; Soares, Vargas & Oliveira, 2011)

Pesquisa que objetivou analisar as atitudes desenvolvidas pelos profissionais da Atenção Primária à Saúde junto às pessoas com transtornos relacionados ao uso de álcool com 489 profissionais da saúde em um município de Minas Gerais, revelou que esses profissionais apresentaram atitudes positivas frente aqueles usuários, com uma compreensão de que o alcoolista era um doente e requer tratamento. As atitudes têm um papel significativo com relação ao tratamento de pessoas com transtornos relacionados ao uso de álcool. (Caixeta, Pedrosa & Haas, 2016)

Os autores inferem que as atitudes negativas dos profissionais frente à etiologia do alcoolismo podem estar relacionadas ao processo de formação, uma vez que a falta de conhecimento acerca da temática, pelos que atuam em CAPSad também foi relatada por Vargas e Duarte (2011). Conforme Laurell (1976), esta condição contribui para que os profissionais não saibam identificar as causas reais do alcoolismo que tem caráter multifatorial, apesar da prática assistencial no serviço especializado.

Os dados nos permitem dizer que a pessoa do alcoolista é mais aceita pelos profissionais do CAPSad do que seu uso problemático. Dados semelhantes foram encontrados em estudo desenvolvido por Vargas e Luis (2008), demonstrando que uma parcela significativa de enfermeiros apresenta atitudes negativas e moralistas.

O fato de ter-se observado que aqueles profissionais com nível superior e maior renda apresentaram uma tendência a atitudes mais positivas do que aqueles apenas com nível fundamental e médio, aponta para a necessidade da inclusão do tema álcool e outras drogas na formação dos profissionais de nível médio, em especial ao profissional da equipe de enfermagem, já que estão em maior número nos CAPSad.

Estudo realizado com profissionais de nível médio também observou a falta de preparo destes para atuar junto aos usuários de álcool e outras drogas (Vargas et al, 2014). Entretanto, esta modalidade profissional também foi sujeito da transformação das práticas em saúde, no movimento da história que foi imprescindível para a Reforma Psiquiátrica. (Aranha e Silva, 2003)

Resultados do presente estudo revelaram que os profissionais que relataram realizar intervenções que objetivavam alertar acerca dos riscos e perigos do consumo do álcool e, desenvolver consciência crítica com relação às questões para além do consumo de álcool, apresentaram atitudes mais positivas frente ao álcool, ao alcoolismo e à pessoa em uso problemático do que aqueles que relataram a realização de intervenções que objetivavam o estímulo à abstinência.

Os autores deste estudo inferem que os resultados citados acima também estejam relacionados ao processo de trabalho nos CAPSad, uma vez que, segundo Moraes (2008), estes são serviços que, ao seguir o modelo de atenção integral à saúde de usuários de álcool e outras drogas, carregam consigo a ideologia da promoção de sujeitos doentes para cidadãos, além da reinserção social; intersetorialidade das ações; adoção da redução de danos e outros princípios para atenção integral, justa e equânime; o que pode fazer com que a grande maioria dos profissional nesses serviços, siga as estratégias propostas, tenha uma visão diferenciada do alcoolismo, da pessoa em relação de dependência com o álcool e da própria bebida alcoólica e, por consequência, atitudes mais positivas.

Faz necessário ressaltar que a própria noção de cidadania, compreendendo o uso de drogas como uma questão de liberdade de escolha e direito e não de crime, doença ou pecado, permitiria uma maior reflexão por parte dos profissionais de saúde e da sociedade, no que se refere aos “problemas” originados pela maneira de compreensão das drogas e não necessariamente pelo seu uso, como é o caso da folha de coca em alguns países da América do Sul. (Pinho et al, 2013). A limitação deste estudo relaciona-se a impossibilidade da pesquisa quantitativa em relatar a vivência dos participantes acerca da atitude frente aos objetos aqui apresentados e discutidos. Sendo assim, os autores sugerem que investigações qualitativas sejam realizadas para preencher esta lacuna de conhecimento acerca da temática.

 

CONCLUSÃO

O estudo mostrou que as atitudes mais positivas foram as dos trabalhadores dos serviços de atenção psicossocial, frente ao álcool, ao alcoolismo e pessoa em uso problemático, com nível superior de escolaridade, uma vez que a tendência de atitudes positivas diminuía em função do nível de escolaridade dos mesmos.

Conclui-se também que os profissionais apresentaram atitudes negativas frente à etiologia do alcoolismo e que aqueles que relataram a realização de intervenções que objetivavam a abstinência apresentaram atitudes menos positivas do que os profissionais que relataram realizar intervenções que objetivavam alertar acerca dos riscos e perigos do consumo do álcool e desenvolver consciência crítica dos problemas relacionados para além do consumo de álcool.

O presente estudo traz como contribuições possibilitar que os profissionais da saúde que atendem usuários de álcool e outras drogas possam refletir acerca de suas atitudes para com os mesmos e a etiologia do consumo, de modo a superar a concepção paradigmática que prevalece no senso comum. Ademais, os dados deste estudo ressaltam para a importância de que os profissionais sejam capacitados para atuarem na área.

 

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Endereço para correspondência:

Paula Hayasi Pinho

Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo

Av. Dr. Enéas de Carvalho Aguiar, 419

CEP: 05403-000 – Cerqueira César, São Paulo/SP

E-mail: paulapinho@usp.br

Recebido em 31/01/2017

Aceito em 17/04/2017

 

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