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CliniCAPS

versão On-line ISSN 1983-6007

CliniCAPS v.1 n.3 Belo Horizonte dez. 2007

 

RELATO DE EXPERIÊNCIA

 

Do olhar que sustenta a cena

 

 

Equipe de Pesquisa CliniCAPS*

 

 

A conversação foi solicitada pelo serviço devido à dificuldade na condução clínica de uma paciente, cujo comportamento a colocava constantemente em situações de risco em que ela deixava atônita a equipe que a acompanhava. Essa paciente, a quem iremos nos referir pelo nome fictício de Suzana, é uma jovem de 20 anos de idade, solteira, filha mais velha do primeiro casamento de sua mãe, cuja escolaridade se estendeu até a 3ª. série primária. Proveniente de Minas Novas, no estado de Minas Gerais, com uma irmã mais nova por parte de pai e mãe, Suzana nasceu prematura, com oito meses de gestação e apresentou, ao exame semiológico neo-natal, um sopro no coração. Segundo relato de sua mãe, após dois anos “o buraco fechou e não teve mais nada”. Não foi amamentada após nascer e também não se adaptou a qualquer outro tipo de leite, vindo a falar com 1 ano e meio e a andar com 2 anos de idade. Embora tenha apresentado enurese noturna que durou até a adolescência, não há história de nenhuma complicação orgânica nem tampouco de doenças tais como convulsão, cirurgias, etc. Tanto na família materna quanto paterna de Suzana, não há relato de tratamentos psiquiátricos.

Sabe-se que, aos 4 anos de idade, ela foi inserida na creche, sendo aos 7 anos transferida para uma escola regular. Quando Suzana tinha 1 ano e meio de idade, a mãe decidiu separar-se do seu pai, argumentando que ele “não prestava, não trabalhava e também não registrou a filha com o nome dele”. Naquela época, já estaria grávida da segunda filha A., hoje com 18 anos, mas mesmo assim mudou-se de cidade com Suzana. Nessa cidade, onde vivem até o momento, a mãe conheceu seu segundo marido (J.G.), com o qual teve mais 4 filhos (M., 15 anos, L.P. 13 a., D. 9 a. e Di. 7a.). Suzana foi criada pelo padrasto, o qual sempre tratou como pai. Quando este ficou doente em decorrência de um acidente vascular cerebral, ela parou de estudar durante dois anos para dele se ocupar, permitindo que sua mãe pudesse trabalhar.

Durante o segundo casamento, a mãe conheceu outro companheiro, cujo nome fictício será Lúcio, que terminou vindo morar com ela e a família, chegando a coabitar com o segundo marido, que apresentava seqüelas decorrentes de seu AVC. Consta que este terceiro companheiro era extremamente violento, havendo inclusive relatos de envolvimentos em delitos de tráfico e crimes, assim como várias passagens pela polícia. As brigas em casa eram constantes; ele chegou a agredir o segundo marido da mãe de Suzana, cortando-lhe o pescoço. Subseqüentemente a esse episódio, esse primeiro padrasto, a quem Suzana muito estimava, teve que ser transferido para um asilo.

Segundo o relato da equipe, a mãe de Suzana sempre apresentou uma indiferença notável em relação a certas atitudes e a algumas situações nas quais a filha se envolve. Ela afirma que a filha “é de lua”, e não mostra muita preocupação com o fato dela comer cacos de vidro, ter crises de asma ou morder o irmão mais novo. Da mesma forma, chama atenção o modo como Suzana cria situações de conflito em casa e todos continuam impassíveis, como se nada ali ocorresse. Segundo testemunhos da equipe do CAPS em que é atendida, Suzana parece a todo tempo querer criar algum problema com a mãe, assim como manter uma relação conflituosa com os irmãos: ela os provoca ao ponto de levá-los a enfrentá-la, obrigando-na a se afastar de casa e voltar ao CAPS.

Quanto ao padrasto atual, Lúcio, Suzana se queixa de suas constantes tentativas e abuso sexual. Diz que este quer “pegá-la”, que ele diz que ela “tem que ser dele”, queixa essa que parece se confirmar na fala do motorista do CAPS, com o qual ela mantém uma espécie de relação paternal: quando, por exemplo, ele a elogia ressaltando que ela deveria se vestir como mulher, ela diz que não usa roupas femininas por causa do padrasto. É necessário ainda salientar que Suzana revela uma certa ingenuidade – ou mesmo puerilidade - em relação a questões que envolvem a sexualidade, apesar de dizer “não se vestir de mulher” e demonstrar interesse por algumas mulheres do serviço, declarando-se mesmo apaixonada por elas.

 

O Tratamento

Suzana iniciou seu tratamento no serviço de Saúde Mental quando era ainda adolescente , entre 14 e 15 anos de idade, sendo acolhida pelo CAPS Infanto-Juvenil-CAPSi em julho de 2000. Apresentava nessa ocasião alteração de comportamento na escola aonde estudava, ameaçando se jogar do 2º. pavimento dessa instituição, fato que levou a diretora da escola a encaminhá-la para o CAPSi. Suzana então relatava, vagamente, que estava apaixonada pela professora e que gostava de mulher, segundo fala testemunhada pela assistente social. Antes dessa idade, ela freqüentava a escola, cuidava da casa e da família sem maiores problemas.

Sua transferência para o CAPS adulto ocorreu quando ela tinha 19 anos de idade, em setembro de 2006. Pouco antes dessa transferência, Suzana apresentou intensificação das suas atuações, sendo acolhida pela urgência e pelo serviço pernoite do CAPS adulto por várias vezes. Três dias antes da transferência, Suzana ameaçou pular de um viaduto do bairro onde mora diante de sua terapeuta do CAPSi, no momento em que esta iria acompanhá-la até a Unidade de Saúde na qual continuaria seu tratamento. No dia seguinte, após pernoitar no CAPS adulto e retornar para o CAPSi, ela saiu da Unidade e se jogou na frente de um ônibus. Ao ser socorrida, pediu para chamar sua assistente social, endereçando assim seu pedido de cuidados. Ficou em observação no Hospital Regional durante o dia, mas à noite foi liberada e encaminhada para pernoite no CAPS adulto. Dois dias após essas atuações, a equipe do CAPSi decidiu, em reunião técnica, pela transferência do tratamento de Suzana para o CAPS adulto, uma vez que ela já contava com 19 anos de idade.

 

Passagens ao Ato ou Acting Out?

Os 15 primeiros dias após sua transferência foram marcados por freqüentes distúrbios de conduta, tais como quebrar vidros da Unidade, sempre sofrendo cortes superficiais nas mãos e testa, bem como tentativa de “mastigar” vidros, mas sem engoli-los ou machucar a boca. Outra característica do comportamento de Suzana era provocar situações de conflitos e brigas com os pacientes, com a equipe e com a família. Vários acontecimentos nos demonstram esse movimento. Quando queria, por exemplo, passar a noite na casa do cunhado, alegando que não podia retornar para a casa da mãe, por haver denunciado à polícia, por agressão, o companheiro de sua mãe, era comum que ela ali causasse brigas por querer ouvir música em alto volume, ou então por se recusar a tomar a medicação. No CAPS adulto, entrava freqüentemente em conflito com a equipe devido às constantes demandas de visitas ao CAPSi onde fazia tratamento. Ela solicitava insistentemente ir lá, alegando que não queria ficar no CAPS adulto porque as pessoas não gostavam dela. Entrava na cozinha e pegava faca ameaçando se cortar.

Era comum que ela provocasse os pacientes, para em seguida se queixar de ser agredida por eles. O fato notável é que num desses momentos seu psiquiatra, que estava de plantão, interveio dizendo: “será contida se apanhar de novo”. Somente então as queixas e as provocações em relação aos pacientes cessaram. Verificou-se, além disso, que todos esses momentos eram sustentados pelo olhar dos outros que ela deixava perplexos com suas ameaças, causando desespero nas pessoas à sua volta. Afora isso, tais ameaças, geralmente voltadas contra ela mesma, interrompiam-se se os técnicos paravam de reagir com perplexidade e passavam a intervir com a palavra, convocando-a a se haver com as conseqüências de seus atos. Essas observações nos levaram a procurar definir a natureza de seu comportamento, conforme se tratasse de actings out ou de passagens ao ato, assim como a tentar estabelecer o seu diagnóstico.

Verificou-se que, de fato, o que conduzia Suzana ao CAPS e que dela fazia um caso clínico não era um delírio, nem tampouco alucinações, mas sim distúrbios de comportamento que podemos qualificar como actings out. Não se tratava de passagem ao ato, já que seu comportamento parecia ser endereçado ao Outro, apresentando um significado a ser interpretado. Salientamos que ao se colocar cuidadosamente debaixo de um carro, ela fazia algo totalmente diferente do que seria o ato de se jogar debaixo do carro para sair da cena, para se expelir do campo do Outro social em que se encontra incluída. Sublinhamos, além disso, que embora já houvesse mastigado pedaços de vidro por várias vezes, ela jamais apresentara um único episódio de hemorragia digestiva. Nesse sentido, notamos que o que estava em jogo não era uma situação insuportável que a obrigasse a se expelir do campo do Outro, como ocorre no caso da passagem ao ato, mas sim um acting out que visa despertar no Outro o efeito de uma mensagem. No caso de Suzana, essa mensagem poderia ser traduzida da seguinte forma: “Eu mastigo ou quebro vidro porque não me escutam, eu me mostro agredida para que percebam o quanto eu sou vítima”. Assim, podemos localizar no comportamento de Suzana um acting out que demanda uma interpretação, a qual se verifica claramente na resposta de seu psiquiatra, cuja intervenção fez com que ela parasse de se fazer espancar.

A hipótese de acting out pode ainda ser corroborada pelo fato de que Suzana parecia induzir no Outro a resposta da violência. Ela provoca constantemente a equipe, colocando a todos numa condição de limite, como se estivesse verificando até que ponto ela seria tolerada. Essa hipótese afasta enfim a suposição de que pudesse tratar de um caso de debilidade, se considerarmos que Suzana manipula a demanda, e não fica totalmente à mercê da demanda do Outro, como ocorre nos casos de debilidade. Mas essa hipótese não é suficiente, todavia, para definir o diagnóstico diferencial entre neurose e psicose, posto que os episódios de acting out podem estar presentes tanto em pacientes neuróticos quanto em psicóticos. É nessa perspectiva que fomos levados a interrogar se ela de fato apresentava fenômenos alucinatórios, conforme se via nos relatos da equipe do CAPS que a atendia.

 

Pontuações sobre o diagnóstico e tratamento

Inicialmente, o diagnóstico levantado pela equipe para o caso de Suzana era de uma psicose. Entretanto, após algum tempo de tratamento no CAPS adulto, esse diagnóstico foi questionado e levantou-se a hipótese de uma neurose com déficit cognitivo. A psicose foi questionada ao se considerar os relatos de alucinação que Suzana manifestava, por serem demasiado próximos dos filmes de terror que ela assistia com muito interesse. Verificava-se ainda que seus pesadelos colocavam sempre em cena a figura do atual companheiro de sua mãe (Lúcio) ameaçando matá-la.

Durante sua permanência diária no CAPS adulto, era comum Suzana dizer, nos momentos das atuações, que ouvia vozes dizendo: “foi o Chuck; quer sangue, o meu sangue... o vampiro...”. Isso ocorria principalmente quando quebrava vidros, ou pegava facas, ou então quando fugia do CAPS e tentava pular na frente de carros e se justificava afirmando: “Estou ouvindo vozes...”, “Jason, Chuck, vampiro, demônios que querem meu sangue”. Acrescentava ainda que se não desse seu sangue quebrando vidros e se cortando, seus irmãos serão machucados, lembrando que seu irmão F. teria sido atropelado porque ela não deu seu sangue.

Embora a questão do diagnóstico psiquiátrico e estrutural tenha permanecido em aberto, ao fim da primeira conversação, era possível pensar num diagnóstico de discurso. Para conceber o diagnóstico de discurso temos que nos perguntar, primeiramente, quem é o Outro para Suzana e como ela interage nessa relação com o Outro. Como já havia sido ressaltado, parece que o sentido da ação de Suzana é de produzir uma reação violenta da parte do Outro, para em seguida se expor, diante do olhar perplexo da equipe, como vítima da reação que ela mesma suscita. Verifica-se que ela interage muito bem no campo da violência, mediante provocações constantes, tanto no campo da contenção mecânica quanto no campo de uma agressão. Se é na violência que ela opera, é porque ali ela encontra uma forma de produzir no Outro uma resposta cujo sentido temos ainda que elucidar, mas que parece dizer respeito ao problema que ela enfrenta com seu padrasto. Vale, com relação a isso, notar que, embora seu comportamento pueril por vezes conduza à hipótese de um comprometimento cognitivo, a esperteza que ela apresenta ao manejar o Outro, com essa finalidade, leva-nos a questionar essa suposição de retardo mental. Cumpre igualmente salientar que Suzana não somente é capaz de estabelecer algum tipo de transferência, como também é susceptível à interpretação.

Afora isso, foi interessante notar que o motorista do serviço, que a conduz, parecia escapar à série dos profissionais em que ela suscita a violência por meio de provocações. Isso nos indicava algo que poderia servir como uma possibilidade de tratamento. Se ela visa suscitar a violência como resposta no campo do Outro, composto pela equipe que a atende, o motorista não faz parte da equipe terapêutica que parece se confundir, aos olhos da paciente, com algo que ela encontrava em sua família. O motorista parece não entrar nessa série; ele está dali separado numa posição que o permite ser do serviço, mas não da equipe terapêutica.

O comportamento de Suzana nos indica que ela quer um lugar no campo do Outro que ela provoca, ao suscitar tanto a violência quanto a perplexidade, e que fora desse lugar ela não consegue transitar. Nosso esforço consiste, portanto, em desconstruir essa solução, possibilitando-lhe compor um vínculo distinto daquele que ela consegue produzir. Se por um lado, observamos a interrupção dessa violência quando ela responde à interpretação de seu psiquiatra, que lhe demonstrava que, longe de ser pura vítima, ela se fazia ativamente espancar, por outro lado se fez necessário examinar o modo de reação da equipe, que se angustiava diante das provocações de Suzana, a fim de deslocar essa equipe da posição que ela até então ocupava, qual seja, a de expectador perplexo da cena do “se fazer espancada”.

 

Retorno do caso (2ª. Conversação)

A discussão de retorno do caso Suzana na 2ª. conversação da equipe iniciou-se com a fala de sua psicóloga, que observou sua melhora clínica a partir de uma intervenção em que teria interpretado em suas atuações um sentido sexual. Pôde-se, aliás, situar vários efeitos que esse modo de intervenção surtia para a paciente. Dentre eles, é necessário notar que Suzana freqüentemente procura elaborar um sentido para o que foi lhe dito, e que o fato de ela ceder à interpretação deve ser considerado como indicativo de uma hipótese diagnóstica que se distancia da psicose.

Dentro dessa perspectiva, é necessário apontar uma fala do psiquiatra de Suzana, que nos aponta os efeitos da reunião em que foi proposta a construção do caso clínico. Para a equipe, um dos principais pontos extraídos da reunião dizia respeito à mudança no modo de tratar a paciente, o que possibilitou à equipe fazer uma outra aposta diagnóstica. Uma das mudanças da equipe refere-se à forma de tratar os fenômenos trazidos pela paciente, mediante uma ênfase dada à palavra e uma retirada da posição de expectador perplexo de seus actings out. As pretensas alucinações, cuja forma hollywoodiana nos põe a duvidar do seu estatuto, também convergem para esse cenário dirigido a um expectador perplexo: “é o Chuck, é muito sangue, é o monstro”. Tanto é que quando a equipe deixa de agir como expectadora de tal cenário, não lhe atribuindo muita importância, esse estado cede. O mesmo ocorre com as atitudes de oposição da paciente em relação à medicação. Quando a intervenção não dá ênfase a essa estratégia, sua recusa e as crises que ela suscita se desfazem, o que levou a uma diminuição considerável da dosagem de neuroléptico que ela estava usando.

Verificamos assim, a partir da construção do caso clínico, que aqui encontramos, que a maior parte dos problemas apresentados por Suzana estavam ligados à dimensão de um cenário que somente se sustentava pelo olhar perplexo do expectador, e que por isso mesmo podiam responder à interpretação. No nível desse cenário, é possível apontar que ela sempre se exibe ao Outro institucional, seja ele qual for, ora debaixo de um carro, ora mastigando pedaços de vidro, ora se fazendo espancar, mas sempre, como se pode ver, na posição de alguém que deve ser socorrido imediatamente. Ela, aliás, realiza isso com tamanha perícia que continuamos a questionar, como foi dito mais acima, a hipótese de um retardo ou de uma debilidade mental.

A construção do caso clínico propiciou, assim, à equipe orientar-se no sentido de não ser mais o olhar perplexo do expectador que sustenta tal cenário que ela constrói. Dentro dessa perspectiva, uma prova de que ela pode sustentar esse deslocamento desse olhar é a eficácia do papel do motorista na equipe. Pode-se levantar a hipótese de que o motorista se apresenta numa posição de exterioridade interna com relação à equipe, na medida em que não se encontra diretamente inserido nessa dimensão terapêutica que Suzana convoca ao se mostrar como vítima.

Já no que tange à dimensão da interpretação, vale igualmente sublinhar que ela respondeu justamente ao psiquiatra que lhe desvelou essa estratégia de se fazer de vítima: ‘você será contida se apanhar novamente’. O psiquiatra lhe mostrou, sob a apresentação passiva de vítima espancada, a dimensão ativa de se fazer espancar, produzindo assim uma importante mudança em sua posição subjetiva no momento da atuação.

A construção do caso clínico ainda nos permite questionar alguns aspectos da relação de Suzana com seu segundo padrasto. Segundo testemunhos, Suzana inicialmente convocava a equipe a denunciar o padrasto, produzindo constantemente um cenário ameaçador em que atribuía a esse personagem um lugar muito especial. A equipe decidiu não responder a essa estratégia, sendo tal conduta mais esclarecida no decorrer da construção do caso clínico. Ainda com relação à família, há que se salientar um outro aspecto que tem importância para o diagnóstico. Chama-nos a atenção o fato de que, malgrado a extrema precariedade de sua estrutura familiar, Suzana chegou a subjetivar uma figura paterna representado pelo primeiro padrasto. Embora a mãe não o mencione quase nunca, ele parece ter grande relevância para Suzana, visto que ela não somente o chamava de pai, como também dele se ocupou quando fora vitimado por um acidente vascular cerebral. Isso nos indica, aliás, que em determinado momento a equipe talvez estivesse dando demasiado ênfase ao pai terrível e preterindo o primeiro padrasto, que é uma figura de mediação. Ao passo que o segundo padrasto se coloca, desde sempre, como uma figura terrível, de difícil subjetivação, o primeiro padrasto parece ser um elemento subjetivável que nos autoriza a trabalhar com a hipótese de que Suzana responda à mediação simbólica.

Enfim, a construção do caso clínico nos possibilitou extrair hipóteses em relação ao caso que são verificadas a cada movimento da paciente, tal como perceber que ela constrói uma cena em que ela visa se mostrar violentada, vitimizada, colocando a equipe como expectador terapêutico da cena. Ou seja, expectador que vai cuidar e corrigir a catástrofe que ela expõe. Porém, o que ela visa obter com isso é o socorro e a angústia que gera na instituição, ao mostrar que é impossível salvá-la de uma vitimização. Por outro lado, banalizar essa cena não sendo o olhar angustiado que a compõe tem efeitos sobre a paciente.

 

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