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Gerais : Revista Interinstitucional de Psicologia

versão On-line ISSN 1983-8220

Gerais, Rev. Interinst. Psicol. vol.3 no.1 Juiz de fora jul. 2010

 

ARTIGOS

 

Gênero e as práticas de gestão nas melhores empresas para se trabalhar no Brasil1

 

Gender and management practices at the best companies to work for in Brazil

 

 

Fernanda Mendes PiresI,2; Angela Christina LucasII; Sandra Mara de AndradeI; Wilson Aparecido Costa de AmorimIII; André Luiz FischerI

IFaculdade de Economia, Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo, São Paulo, Brasil
IIInstituto Presbiteriano Mackenzie, São Paulo, Brasil
IIIFundação Instituto de Administração, São Paulo, Brasil

 

 


RESUMO

O objetivo deste artigo é investigar práticas adotadas pelas empresas para o atendimento, atração e retenção das mulheres em seu quadro funcional. As organizações pesquisadas foram as 150 Melhores Empresas para Você Trabalhar. No aspecto metodológico, realizaram-se análises descritivas dos empregados e empresas, além de uma análise de conteúdo e descrição de frequências das práticas organizacionais. Enquanto algumas empresas negam as diferenças existentes entre homens e mulheres, outras adotam a perspectiva da valorização das diferenças, desenvolvendo ações, como: metas para contratação e promoção de mulheres, apoio ao equilíbrio entre vida familiar e carreira, e incentivo aos cuidados com a saúde. Constata-se que, ainda que o tema seja pauta de discussão e evolução na sociedade, as organizações têm desenvolvido de maneira lenta suas ações voltadas para esse público, mesmo aquelas que se destacam como as melhores para se trabalhar no Brasil.

Palavras-chave: Mercado de Trabalho para Mulheres, Administração de Recursos Humanos, Gestão da Diversidade


ABSTRACT

The purpose of this article was to investigate the practices adopted by companies for the treatment, attraction, and retention of women in its staff. The companies researched were the 150 Best Companies to Work For. In the methodological aspect, descriptive analyses of employees and companies were performed, as well as a content analysis and a description of frequencies of organizational practices. While some companies deny the differences between men and women, others adopt the perspective of valuing the differences by performing actions such as: targets for hiring and promoting women, supporting the balance between family and career, incentives to health care. It can be noticed that, although the issue is in the agenda of discussions and developments in the society, the organizations have developed their actions geared towards this public very slowly, including those that stand out as the best places to work for in Brazil.

Key words: female labor market, human resource management, diversity management


 

 

A questão da diversidade da força de trabalho tem sido muito discutida desde 1960 nos Estados Unidos e Canadá, principalmente no aspecto racial. No final dos anos 1960, os Estados Unidos promulgaram o Affirmative Action, que incluía a obrigação da adoção de práticas para promoção da diversidade por empresas que assinavam contrato com o governo e incluíam as mulheres entre os grupos apoiados (Fleury, 2000).

O tema no Brasil mostra-se mais recente e um dos fatores determinantes da postergação da discussão do tema é, segundo Fleury (2000), o nãoreconhecimento do preconceito e da discriminação, posto que, na construção da identidade brasileira, existe a ideia de um país sem preconceitos. Tomando isso por base, segundo pesquisa realizada pela autora, as companhias que desenvolviam programas para a diversidade, em sua maioria, eram subsidiárias de empresas norte-americanas.

Segundo o Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos - DIEESE -, durante os anos 1990, a discussão das questões relativas ao trabalho das mulheres e à igualdade de gêneros nas negociações coletivas mostrou-se crescente no Brasil. A partir de 2000, vê-se um efetivo avanço de cláusulas coletivas com esse tema (OIT, 2009).

A busca pela literatura na área da administração no Brasil sobre as mulheres nas organizações revelou reduzido número de trabalhos com foco em políticas e práticas de atração, atendimento e retenção das mulheres. Alguns dos estudos encontrados tratam do mercado de trabalho (Azevedo, 2007), de identidade (Irigaray & Vergara, 2009; Lima, Lima, & Tanure, 2009), da valorização da diversidade versus dissolução das diferenças (Pereira & Hanashiro, 2007), dos vários papéis da mulher na sociedade (Arruda, 1996; Tanure, Carvalho Neto, & Andrade, 2006) e a respeito do preconceito no ambiente de trabalho (Aguiar & Siqueira, 2007; Betiol & Tonelli, 1991; Brunstein & Coêlho Jr, 2006; Irigaray & Vergara, 2009).

Um dos poucos artigos encontrados que descrevem práticas organizacionais aponta a dificuldade de compatibilizar o papel da mulher, de mãe e de profissional (Arruda, 1996). A autora entende que as empresas devem tentar minimizar a ausência das mulheres no âmbito familiar, pois ainda são responsáveis pela formação do caráter e da educação dos filhos. Arruda (1996) apresenta resumidamente alguns casos de empresas que começam a facilitar a relação empresa-família. Outro caso sobre prática organizacional voltada para a mulher descreve a criação e gestão de um grupo de mulheres em uma empresa do ramo financeiro (Brunstein, Jaime, & Gil, 2008). Os autores apontaram os principais desafios e conquistas desse grupo no que se refere a questões de poder, carreira e reconhecimento das diferenças.

Como a maioria dos trabalhos pesquisados apresenta a situação da mulher no ambiente de trabalho e seus diversos desafios nas esferas profissional e familiar, percebeu-se a necessidade de verificar quais são as ações dentro desse contexto. Dessa forma, o objetivo deste artigo é investigar as práticas adotadas pelas empresas para o atendimento, atração e retenção das mulheres em seu quadro funcional. Para isso, um grupo de empresas denominadas como as melhores empresas para se trabalhar no Brasil3 foi adotado para análise.

A opção por esse grupo tem por base a suposição de que, por se destacarem pela qualidade do ambiente organizacional, as empresas têm um modelo de gestão de pessoas diferenciado entre outras práticas voltadas para as mulheres, de maneira mais atuante frente o restante do mercado.

Este artigo está estruturado em cinco seções: esta introdução, a apresentação do referencial teórico, a metodologia utilizada, a análise e as considerações finais.

 

Referencial Teórico

Esta seção abordará como temas a inserção da mulher no mercado de trabalho, a sua participação nas empresas e ações das organizações com o intuito de atrair e reter essas profissionais. Essas abordagens auxiliarão na análise e conclusão do artigo.

As Mulheres no Mercado de Ttrabalho

Lopes (2006) explica que a Constituição de 1988 foi um marco para a igualdade no trabalho entre homens e mulheres. Até esse momento, a legislação era protetora em relação aos direitos da mulher, proibindo horas-extras e trabalho pesado. Dessa forma, protegia as mulheres, partindo do princípio de que seriam mais frágeis, e deixava-as fora da competição pelo trabalho. A partir de 1988, houve a inclusão e mudanças nas leis de proteção à maternidade, normas de combate à discriminação e meios de assegurar a igualdade (como proibição da diferença de salários), o que transformou o direito do trabalho voltado à mulher de protetor a promocional.

A divisão social do trabalho até o século XX foi marcada pela mulher como responsável pelo cuidado da casa e dos filhos, enquanto o homem era provedor econômico. Ao longo do século, esse quadro mudou substancialmente, tendo em vista o conjunto de transformações pelas quais a sociedade passou e as manifestações e conquistas femininas. Ao longo do tempo, foram vários os fatos expressivos, como a possibilidade do voto feminino, a disseminação dos métodos contraceptivos e a crescente inserção no mercado de trabalho, notadamente das mulheres casadas (Hobsbawm, 1995).

De acordo com estudos: "O aumento intenso e persistente da inserção feminina é uma das tendências mais claras de mudança na estrutura do mercado de trabalho nas últimas décadas, tanto no Brasil quanto na América Latina" (CEPAL, 2001; Abramo & Valenzuela, 2001, 2006 citado por CEPAL/PNUD/OIT, 2008, p. 46). E essa tendência segue relacionada ao aumento da escolaridade feminina, ao processo de transição demográfica que reduz o número de filhos por mulher, à maior expectativa de autonomia econômica e de realização pessoal, e à maior intenção, disponibilidade ou necessidade de contribuir com a renda familiar.

Apesar da evolução e mudança do papel da mulher na sociedade, são muitos os avanços a serem feitos no que concerne ao ambiente de trabalho. De acordo com Azevedo (2007), ainda há uma diferença social dos sexos que se reflete no mercado de trabalho.

O mercado de trabalho no Brasil entre os anos 1990 e 2006 caracterizou-se pelo alto grau de desigualdade, refletindo um nível significativo de discriminação em relação às mulheres e à população negra. A participação entre as mulheres no mercado passou de 53,2% para 58,9% entre 1992 e 2006, enquanto, dos homens, a participação caiu de 86,3 para 82% no mesmo período. A desigualdade entre homens e mulheres atinge, em especial, as mais pobres e menos escolarizadas. Dessa maneira, mesmo garantindo menor desigualdade de participação, não há garantia, por si só, da igualdade entre os gêneros. Além disso, vale destacar que dados de 2006 apontam que as mulheres tinham mais anos de estudo que os homens e que, mesmo entre o mesmo nível de escolaridade, há diferença entre a remuneração de homens e mulheres, assim como entre brancos e negros (CEPAL/PNUD/OIT, 2008).

Contudo, vale verificar que a crescente inserção das mulheres no mercado de trabalho abre novas perspectivas para elas nas esferas pública e privada. As mudanças e os novos papéis sociais femininos e masculinos vêm abalando os quadros de referência que norteiam as relações, de gênero e, consequentemente, as representações sociais sobre o assunto (Cappelle, Mageste, Melo, & Brito, 2003).

As Mulheres nas Empresas

Discussões sobre o perfil dos profissionais no que tange ao gênero e ao destaque para suas diferenças são comuns na literatura. Percebe-se que em muitos momentos as mulheres em cargos executivos tendem a copiar os homens e a negligenciar as suas "qualidades naturais" (Rizzo & Mendez, 1990 como citado por Fischlmayr, 2002). No entanto, Adler (2002) destaca que essas características estereotipadas podem variar dependendo da empresa e da cultura local.

Outro aspecto a ser observado dentro das empresas é o fenômeno do "teto de vidro". Segundo Miranda (2006), o "teto de vidro" é uma barreira sutil e transparente, forte o suficiente para evitar a passagem das mulheres aos níveis hierárquicos mais elevados nas organizações onde trabalham. Como exemplo, na pesquisa das Melhores Empresas para Você Trabalhar, grupo de empresas escolhidas para este estudo, é possível verificar o reduzido percentual de mulheres nos cargos de liderança. Entre os cargos de presidência, vê-se que apenas 4% deles são ocupados por mulheres e, nos demais cargos de liderança das empresas (diretores, gerentes e supervisores), 36% são ocupados por mulheres. Essa informação sugere que há no Brasil um "teto de vidro" que dificulta o crescimento da carreira executiva feminina. Meyerson and Fletcher (2002) afirmam que o preconceito quanto à presença das mulheres no mercado de trabalho também cria essa barreira, que raramente é ultrapassada.

Sob esse aspecto, Mor Barak, Cherin, e Berkman (1998) afirmam que os homens percebem a organização em que trabalham mais justa do que as mulheres. Os homens não percebem barreiras e injustiças porque não estão expostos a ela ou não participam da sua criação. Como consequência, os autores afirmam que a mulher é mais favorável à criação de iniciativas e programas desenhados para promover a diversidade, assunto que será tratado a seguir.

Práticas de Gestão da Diversidade em Relação ao Gênero no Ambiente de Trabalho

Dass e Parker (1999) explicam que a diversidade pode ser vista de diferentes maneiras dentro da empresa e propõem o estudo delas a partir de quatro perspectivas: 1) resistência: a diversidade é vista como ameaça aos grupos dominantes e, como consequência, os membros reagem com a negação, falta de respeito e manipulação; 2) discriminação e justiça: a diversidade é percebida como um problema a ser resolvido e as pessoas desse grupo precisam ser protegidas; as empresas nessa situação usam táticas de negociação e pacificação de interesse de diferentes grupos além de imposição de normas; 3) acesso e legitimidade: a empresa vê na diferença a criação de oportunidades e, por isso, promove a diversidade; e 4) aprendizagem: a empresa vê similaridades e diferenças como algo importante que faz parte do aprendizado dos indivíduos e da organização no longo prazo.

As quatro perspectivas apresentadas darão origem às práticas de gestão da diversidade de determinada empresa e seus resultados. Com relação às práticas de gestão da diversidade, Pereira e Hanashiro (2010) as definem como

[...] atividades pelas quais pessoas compartilham de conteúdos, de processos e de significados sobre como agir diante das diferenças que há entre os indivíduos, seja de gênero, raça, nacionalidade, religião etc. ou de quaisquer dimensões visíveis ou menos visíveis, profundas ou superficiais (p. 675).

As políticas e práticas das empresas voltadas às mulheres podem ser classificadas em pelo menos duas dimensões: valorização das diferenças e dissolução das diferenças. A gestão da diversidade, que atua na perspectiva de valorização das diferenças, cria condições para atender às diferentes necessidades dos grupos sociais que compõem o quadro de funcionários, mas pode gerar reações negativas dos integrantes dos grupos não beneficiados. Já a perspectiva de dissolução das diferenças busca a meritocracia e a justiça como principais aspectos para subsidiarem políticas e práticas empresariais (Pereira & Hanashiro, 2007).

Segundo Fleury (2000), as práticas e projetos para diversificarem a força de trabalho nas empresas têm focado principalmente a questão de gênero. A autora aponta práticas de empresas que recrutam mais mulheres para balancearem seu corpo de empregados, realizarem programas de treinamento para conscientização das diferenças culturais e investirem em projetos de comunicação interna, com a finalidade de divulgar os objetivos do programa de diversidade a todos os empregados.

De acordo com Meyerson e Fletcher (2000), a busca por ações e programas relacionados à diversidade se inicia quando os próprios indicadores da empresa destacam a iniquidade existente. Dentre os benefícios potenciais da gestão da diversidade, Cox e Blake (1991) mencionam: atração e retenção dos melhores talentos no mercado de trabalho, independente de raça ou gênero, promoção da criatividade e inovação pela diversidade de perspectivas.

Outro referencial para a existência de práticas voltadas para a mulher no interior das organizações pode ser encontrado em estudos sobre o conteúdo de acordos coletivos. Estudo realizado pelo DIEESE para a Organização Internacional do Trabalho (OIT, 2009) acompanhou a evolução da presença de cláusulas relacionadas às mulheres em anos recentes em acordos coletivos no Brasil. Destaca-se que a adoção de cláusulas que melhoram o já prescrito pela legislação ou mesmo que criam novos direitos no âmbito da contratação do trabalho, implica, de parte das organizações, a estruturação de processos e práticas para o atendimento daquilo que é determinado na negociação junto aos sindicatos. O DIEESE constatou que no período 2001-2006 havia em média seis cláusulas relacionadas à mulher e às questões de gênero, enquanto nos períodos precedentes - 1993-1995 e 1996-2000 - as médias eram de quatro e cinco cláusulas, respectivamente. Esses dados dão conta de um período de 13 anos e revelam um aumento da presença de cláusulas vinculadas à mulher ou às questões de gênero. Dada à gama de possibilidades da questão, nota-se, entretanto, que essa evolução foi lenta.

Síntese do Referencial Teórico

Os avanços das cláusulas de acordos coletivos e o aumento do percentual de participação nas organizações vêm mostrando uma evolução, embora lenta, das mulheres no mercado de trabalho. Como apontado, ainda se reconhece o fenômeno do "teto de vidro" (Miranda, 2006) com o reduzido número de mulheres em cargos de liderança das empresas. Além disso, segundo Adler (2002), muitas características das mulheres ainda são estereotipadas nos ambientes de trabalho.

Mesmo com uma atual negação das diferenças por parte das empresas, percebe-se uma evolução e reconhecimento destas, sendo essa a primeira perspectiva da diversidade exposta por Dass e Parker (1999). A partir desse ponto, novas abordagens têm sido utilizadas pelas empresas, como o uso das diferenças como fonte de aprendizagem e inovação.

Diante desse cenário, algumas práticas vêm sendo utilizadas pelas organizações, a fim de atender, atrair e reter as mulheres. Características biológicas e sociais tornam-se foco dessas ações, bem como a criação de políticas com atenção em recrutamento e carreira (Fleury, 2000). A seguir, apresentam-se os métodos de investigação e os resultados da presente de pesquisa.

 

Metodologia

As empresas da amostra para o estudo das políticas e práticas de atendimento, atração e retenção das mulheres foram as escolhidas como as 150 Melhores Empresas para Você Trabalhar, com base em pesquisa de 20094. Ao fazerem inscrição para esta pesquisa, as empresas preencheram um questionário sobre suas políticas e práticas e desenvolveram um material denominado caderno de evidências, no qual descreveram esses itens. Os dados relativos à inscrição e ao questionário foram utilizados para traçar o perfil das empresas selecionadas. Além disso, seus funcionários, escolhidos aleatoriamente, responderam ao questionário de clima organizacional e, a partir desse instrumento, podese traçar um perfil do grupo de respondentes da pesquisa.

Para a análise inicial das ações direcionadas ao público feminino, optou-se por analisar com mais atenção os cadernos de evidências em função do caráter exploratório do estudo. Porém, com menor ênfase, as respostas dos questionários também foram utilizadas.

O caderno de evidências de cada empresa contém a descrição de diversas práticas e políticas da gestão de pessoas. Entretanto, para as análises deste estudo, decidiu-se por avaliar somente a questão específica sobre práticas de atendimento, atração e retenção de mulheres. As análises foram realizadas de acordo com a técnica análise de conteúdo proposta por Bardin (2006).

A análise de conteúdo foi feita em três fases, de acordo com a estrutura proposta por Bardin (2006, p. 89): a pré-análise (leitura flutuante do material a ser analisado), a exploração do material (identificação de temas, agrupando-os e categorizando-os) e o tratamento dos resultados e interpretação. O agrupamento de temas foi feito de acordo com as categorias: práticas para atendimento à família (Família), práticas para promoção da saúde da mulher (Saúde), práticas estruturadas para o fortalecimento da carreira (Carreira), ações pontuais e não adoção de práticas. A escolha dessas categorias seguiu as regras de análise de conteúdo: homogeneidade, exclusão mútua, pertinência e objetividade (Bardin, 2006) e foram definidas a posteriori. Em um primeiro momento, todas as práticas (dados brutos) voltadas para as mulheres de cada uma das empresas foram analisadas e listadas. Em seguida, as práticas foram agrupadas por semelhança de objetivos e as categorias de pesquisa formadas a partir desse agrupamento.

Os dados foram analisados com técnicas básicas de estatística ao se utilizar a distribuição de frequências. Nessa técnica, o objetivo é contar o número de respostas associados a cada variável; nesse caso, às práticas (Malhotra, 2004). Os percentuais expostos nas tabelas a seguir seguem essa análise de frequência, isto é, o número de empresas que adotam determinadas práticas.

 

Apresentação e Análise dos Dados

A presente seção de análise discorrerá sobre o grupo de 150 empresas escolhidas para o estudo. Inicialmente, apresentam-se características da população estudada; posteriormente, as empresas serão analisadas de forma breve quanto ao seu posicionamento no formulário preenchido para a pesquisa; e, em seguida, serão apresentadas quatro categorias e suas respectivas análises, em que os cadernos de evidência foram utilizados.

Caracterização da População Estudada

Nesta seção, destacam-se algumas características das mulheres que responderam à pesquisa. Dentre os 59.011 respondentes da pesquisa, 20.064 são mulheres. Dessa forma, as exposições a seguir têm o percentual relativo baseado no número de mulheres e o comparativo com o número de homens.

Na Tabela 1, é possível verificar que quase metade dos homens (48,63%) tem nível de escolaridade igual ou abaixo do ensino médio; comparativamente, há menor proporção de mulheres também nesse nível (36,98%).

 

 

Ainda se tratando da Tabela 1, quando se compara com o percentual de mulheres, ao somar Ensino Superior completo e Pós-graduação, verifica-se que 44,3% das respondentes têm nível de escolaridade elevado, o que representa quase metade das funcionárias dessas empresas. Tal quadro se assemelha ao encontrado no quadro geral do mercado de trabalho brasileiro formal, no qual as mulheres têm maior escolaridade (MTE, 2008). Entretanto, quando se analisa a Tabela 2, referente ao cargo, ao comparar os percentuais de mulheres e de homens na diretoria das empresas, vê-se que eles preenchem esses cargos três vezes mais que as mulheres.

 

 

A Tabela 2 demonstra que os cargos administrativos e operacionais concentram a maior parte das mulheres e somam 55,54%. Isso reforça a percepção de Santos, Rodrigues, Dutra e Costa (2008) sobre esse grupo de empresas, quando descrevem que

parece, portanto, que as 150 Melhores Empresas não se distanciam muito da realidade organizacional nacional, na qual a inserção das mulheres no mercado de trabalho é concentrada em ocupações menos qualificadas e de baixa remuneração (p. 15).

Com relação ao rendimento mensal, na Tabela 3 verifica-se que 50,86% das mulheres recebem até R$1.245,00, enquanto cerca de 40% dos homens estão nessa faixa salarial. As informações das Tabelas 2 e 3 reforçam o fenômeno do "teto de vidro" referenciado na revisão de literatura. A alta representatividade das mulheres em cargos de menor nível hierárquico e com baixa remuneração remete a um quadro que possibilita a existência desse fenômeno. Além disso, vale destacar que os dados apresentados estão em consonância com os estudos que afirmam que a presença feminina no mercado de trabalho cria uma barreira salarial que raramente é ultrapassada pelas mulheres (Araujo, 2009). Para esse autor, mesmo com escolaridade maior, elas não ocupam em maior número os cargos mais altos nem recebem os melhores salários.

 

 

Caracterização das Empresas

A amostra de 150 empresas caracteriza-se como referência em ambiente de trabalho, mas elas se diferenciam em vários aspectos, como porte, setor e localização, entre outros. Quanto ao porte, o apontamento considera o número de empregados para sua definição. Em 2009, o grupo de 150 empresas apresentou 37% delas como pequenas, 30% médias e 33% para grandes empresas. As empresas pertencem a diferentes setores, com 11% em serviços diversos, 9% em comércio varejista, 8% em serviços de saúde e os demais distribuídos em outros 18 setores. Já em relação à localização das empresas, 55,3% delas estão no estado de São Paulo; em seguida, tem-se Rio de Janeiro, Paraná, Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Minas Gerais. Todos esses Estados citados somam 85,2 % das empresas da amostra, caracterizando uma concentração nas regiões Sudeste e Sul.

Após uma breve caracterização das empresas investigadas, a análise passa a se ater às ações voltadas para as mulheres de seu público interno. O instrumento de pesquisa investiga de modo geral se as empresas adotam programas voltados especificamente para as mulheres. Ao verificar se adotam ou não, as empresas são questionadas quanto às práticas relacionadas aos filhos, família, qualidade de vida das mulheres e carreira. A Tabela 4 caracteriza sob esse aspecto as empresas estudadas.

Vê-se que pouco mais da metade das empresas da amostra (53%) adota programas para o atendimento, atração e retenção de mulheres em seu quadro de funcionários. Quando se verifica qual tipo de ação é praticada, grande parte se concentra que buscam a melhoria da qualidade de vida das mulheres no ambiente de trabalho (33%); em seguida, estão os programas educacionais para os filhos (29%), desenvolvimento da carreira (29%), planejamento familiar (25%); e, por último, instalações adequadas para atendimento e cuidados com os filhos (9%).

Quanto ao tempo de adoção dessas práticas, pode-se verificar, conforme a Tabela 4, que das empresas que mantêm as práticas, metade delas (51,25%) já as adota há mais de cinco anos, de três a cinco anos, 31,25%, e com menos de dois anos, 17,50% das empresas. Esse período possibilita reconhecer as práticas adotadas e seus resultados e buscar aperfeiçoamento ao longo do tempo.

Categorias de Análise

Após uma breve caracterização das empresas e um levantamento sobre a adoção ou não, além do tempo, de programas e práticas voltadas para as mulheres, esta seção propõe descrever como essas ações acontecem dentro das organizações. Ao longo das análises, verificou-se que mesmo as 80 empresas (53%) que, no questionário, descreveram não adotar tais práticas, no caderno de evidências (instrumento aberto de pesquisa) discorreram sobre ações voltadas para as mulheres. Dessa forma, com o intuito de aproveitar todas as informações para análise, a investigação desta seção corresponde ao grupo de 150 empresas.

A seguir, a análise está dividida por categorias, conforme apontado na descrição da metodologia deste trabalho. Além da categorização, ao longo do texto serão analisados trechos do discurso com o objetivo de expor conceitos e princípios das empresas, além de exemplificar as ações. Com o intuito de manter o sigilo das empresas, nomes dos programas e das próprias empresas serão resguardados.

Ao longo da investigação, os pesquisadores atentaram para o discurso utilizado pelas empresas nos cadernos de evidência. O material é preparado pelas empresas para participarem de um "concurso", a fim de se tornarem referência em ambiente de trabalho no Brasil. Por isso, as informações procuram demonstrar características positivas das empresas e, nesse caso, há uma limitação na análise deste estudo. Vale destacar que o caderno de evidências é um instrumento que possibilita a escrita livre das organizações, mas há limite (total de número de páginas) para isso. Dessa maneira, ao verificar as práticas, caso uma ou outra não seja citada, não significa que não é adotada pela empresa, mas que, naquele determinado espaço do instrumento para descrever os programas voltados especificamente para a atração, desenvolvimento e retenção de mulheres, a empresa não destacou a sua adoção. As próximas subseções apresentarão práticas abordadas com os percentuais de adoção, mas vale destacar que os valores auxiliarão os leitores a perceberem as práticas mais valorizadas pelas empresas e não, necessariamente, as mais adotadas.

Categoria: práticas para atendimento à família

A categoria Família apresenta maior representatividade nos relatos das empresas quanto às mulheres de seu público interno e, por isso, muitas foram as práticas relacionadas. A Tabela 5 apresenta as práticas que serão comentadas a seguir.

 

 

O auxílio à creche e babá é a prática mais recorrente entre as empresas. Vê-se que o valor do benefício varia de empresa para empresa, sendo valores fixos ou percentuais já estabelecidos do salário mínimo. Além disso, em alguns casos, esse benefício é estendido a todos os empregados, não sendo exclusivo às mulheres, mas atendendo também aos pais da organização.

Reuniões, cursos, palestras, assim como realização de exames pré-natal são ações descritas frequentemente pelas empresas. Elas representam o que se denominou ações de apoio à gestação e à amamentação. Em alguns casos, as empresas citam a possibilidade de troca de local de trabalho para que o contato com o bebê seja facilitado ou mesmo a disponibilização de horários para amamentação durante o expediente de trabalho (esse último é benefício previsto em lei). Também relacionadas à maternidade, algumas empresas citam a distribuição de enxoval e a realização de chá de bebê como práticas relacionadas à retenção e valorização das mulheres na empresa.

Dentro desse ponto de vista, parece que a maternidade é encarada de forma preconceituosa nos ambientes de trabalho. Nota-se a necessidade e disposição das empresas em reafirmarem o compromisso com a profissional ao manterem seu posto de trabalho, aguardando o período de licença-maternidade para seu retorno.

Entre os fatores que atraem as mulheres para trabalhar na empresa está o ambiente informal e não-burocrático, no qual a mulher pode exercer plenamente seus papéis como profissional e integrante da família. Sabe, por exemplo, que, ao se afastar para ter seu bebê, encontrará seu lugar na volta da licença-maternidade (Empresa A).

No entanto, vale observar que algumas empresas citam essa prática como um diferencial em sua ação voltada para a mulher enquanto estão cumprindo a lei. Quando descrevem a nãodiscriminação em caso de gravidez, embora seja o esperado, a empresa não tem o controle total, pois depende, além da filosofia da empresa, da atitude de cada um dos empregados.

Respeitamos a condição da mulher e seus diversos papéis na sociedade. Não há discriminação em caso de gravidez e licença-maternidade, há flexibilidade de horário no caso de acompanhar os filhos em consulta médica ou reunião de pais (Empresa B).

Em seguida, tem-se a adoção de horário flexíveis e/ou teletrabalho, que, em alguns casos, não consideram apenas o momento pósmaternidade, mas também o período de cuidados dos filhos mais velhos.

Há um programa para que as mães possam retornar ao trabalho sem se afastar completamente dos filhos após o término da licença-maternidade. O expediente é cumprido, mas parte em casa, parte na empresa (Empresa C).

Diferentemente, para algumas empresas, a flexibilidade não é necessária, e as mulheres, ao planejarem melhor seu tempo, respeitarão seu horário de trabalho. Dessa forma, uma dessas empresas cita como política:

Respeito ao horário de trabalho, fazendo com que as funcionárias planejem suas responsabilidades extraempresa com assertividade (Empresa D).

Percebe-se que a empresa cita como diferencial para as mulheres o respeito ao horário de trabalho, o que pode significar que para os homens não há o mesmo respeito ou que na maioria das empresas isso não acontece.

Em um número menor de citações, estão os benefícios estendidos aos filhos maiores e ao restante da família. Como exemplos, podem ser citados o plano de assistência à saúde e o auxílio à educação, até mesmo à faculdade e cursos de pósgraduação. Embora as empresas descrevam essas políticas como voltadas às mulheres, também são abrangentes para os empregados do sexo masculino. Já em relação ao planejamento familiar, palestras e encontros são organizados com o intuito de orientar as mulheres sobre a gestação e o cuidado com os filhos. Por último, há um benefício que ultrapassa a legislação e tem sido adotado pelas empresas: a licença-maternidade de seis meses. Esse benefício foi citado como ação diferenciada pelas empresas e, por uma delas, apontada como uma prática que garante a qualidade do vínculo entre mãe e bebê e o retorno mais tranqüilo ao trabalho para a profissional.

Diante do apresentado nesta categoria, é possível verificar empresas que reconhecem os diferentes papéis sociais da mulher. Os dados reforçam o resultado da pesquisa de Betiol e Tonelli (1991), na qual as autoras concluem que a cultura organizacional tem uma forte influência no sucesso da mulher quando se reconhece seus vários papéis e responsabilidades sociais.

Categoria: práticas para promoção da saúde da mulher

Em segunda posição, no que se refere ao número de citações, aparecem as ações voltadas para a saúde da mulher. Nessas práticas, referenciadas na Tabela 6, não são consideradas ações voltadas para a saúde da mulher gestante, pois já foram registradas na categoria relacionada à família.

 

 

As empresas mantêm a prática de divulgar informações de saúde por meio de palestras ou de maneira virtual ao seu público feminino, em geral sobre prevenção ao câncer de mama e colo de útero. Além disso, as empresas estimulam a realização de exames preventivos e consultas para tratamento em suas próprias instalações, ou fora, durante todo o ano ou utilizando semanas especiais para mobilização das empregadas nesse sentido.

As informações apresentadas aqui demonstram que as organizações atentam para as diferenças biológicas entre homens e mulheres, promovendo ações que atendam a cada gênero no que se refere à saúde.

Categoria: carreira

Esta categoria ganha menor destaque no discurso das organizações investigadas, apesar de apresentar-se como uma das grandes dificuldades das mulheres no mercado. Diferenças entre homens e mulheres dentro das organizações são constatadas quanto à participação em cargos de liderança, oportunidades de crescimento e remuneração. Muitas empresas, nos cadernos de evidência, afirmam não realizarem discriminação, dizendo que todas as suas práticas ocorrem de forma igualitária para os sexos. No entanto, o número geral de mulheres nos cargos de liderança e remuneração média das 150 empresas (conforme seção de caracterização dos respondentes do estudo) mostra que provavelmente as mulheres ainda não possuem as mesmas oportunidades dos homens apesar de possuírem um grau de escolaridade maior.

A prática de realização de palestras, reuniões de incentivo e treinamentos específicos para as mulheres, a fim de impulsionar e criar oportunidades para o desenvolvimento dessas profissionais, é adotada por parte das empresas. Em uma das empresas estudadas, foi identificado um grupo de mulheres executivas para comporem um programa no qual são definidas ações de desenvolvimento profissional que passam desde treinamentos específicos, liderança de projetos especiais e trabalho temporário em outras operações da empresa no mundo. Segundo Brunstein et al. (2008), esse tipo de ação coletiva traz visibilidade à questão da diversidade, além de criar oportunidades para que as profissionais sejam protagonistas das políticas de diversidade empresarial. Outras empresas também apresentam ações nesta categoria, como:

A orientação global da companhia determina um aumento no número de mulheres em seu quadro funcional nos próximos anos. Por conta disso, a empresa está monitorando métricas de crescimento e implementando ações que equilibrem cada vez mais a proporção entre homens e mulheres na empresa (Empresa E).

Nesse ponto, é possível verificar que empresas têm focado principalmente a questão de gênero quando descrevem suas práticas para diversificar a força de trabalho, o que coincide com o que Fleury (2000) também aponta. Isso porque as empresas, em alguns casos, buscam reduzir a diferença numérica entre homens e mulheres em postos de comando, com estabelecimento de metas e planos de ação. De acordo com os trechos apresentados, verifica-se uma preocupação por parte de algumas empresas em valorizar suas profissionais com políticas e práticas específicas para o rompimento do "teto de vidro". Primeiramente, essas empresas demonstram que reconhecem sua existência, para, a partir daí, criarem maneiras de contribuir com a igualdade de oportunidades.

 

 

Inicialmente, percebe-se que o mapeamento de homens e mulheres do quadro de empregados traz apontamentos sobre a necessidade de desenvolvimento de ações sob esse aspecto. E tem sido esse o primeiro passo. Muitas das empresas investigadas apresentam esse mapeamento como início de suas ações. Após verificarem o cenário interno, em alguns casos, o objetivo do programa de diversidade envolve metas de expansão de mulheres na liderança e em cargos técnicos. E esse é um aspecto bastante citado nos cadernos de evidência.

O programa foi criado há dez anos com o objetivo de atrair, treinar e reter os talentos femininos. Buscou causar uma verdadeira revolução cultural para permitir que as mulheres pudessem permanecer na empresa e ainda assim mover-se para altos cargos de direção (Empresa F).

No entanto, muitas empresas têm dificuldades no cumprimento dessas metas pela pouca oferta de mão de obra especializada em seus setores. Empresas de setores como automotivo, químico, metalurgia e siderurgia apresentaram esse tipo de barreira quando do esforço para que as mulheres ocupem posições que anteriormente eram dominadas por homens. No entanto, frente às dificuldades e com o objetivo estabelecido, uma das empresas demonstra que tomou a decisão de qualificar profissionais e, nesse caso, os treinamentos possuem metas de aprendizes femininos. O destaque importante está no setor de atuação: essa empresa pertence à indústria pesada, conta com 90% do quadro de empregados na área operacional e enfrenta baixa oferta de mão de obra técnica feminina.

[...] a forma que a empresa encontrou para interferir neste cenário foi o caminho do progresso e do desenvolvimento: qualificar profissionalmente mulheres e, assim, buscar reverter a preponderância masculina na área (Empresa G).

Conforme apontado no referencial teórico, a intenção é ampliar o espaço de busca por novos talentos das empresas. Para isso, a valorização da diversidade contribui diretamente com o negócio, aumentando a possibilidade de recrutamento e valorização de pessoas com alto potencial e fazendo das diferenças um diferencial da força de trabalho.

Já em relação às outras práticas encontradas, um reduzido percentual estimula suas profissionais a conseguirem outras fontes de renda com realização de oficinas para ensinar-lhes artesanato. Além de concentrar as responsabilidades perante a família, atuar no mercado, buscar oportunidades de crescimento e desenvolvimento em um trabalho fora de casa, a mulher também é estimulada, nesses casos, a assumir outra função.

Todos os dados apresentados até aqui, tanto no discurso quanto nas tabelas que demonstram escolaridade, rendimento e cargo, apontam para o que descrevem Cramer, Cappelle e Silva (2001) quando dizem que

há evidências de que existem desigualdades na participação masculina e feminina no mercado de trabalho, seja em relação aos níveis salariais, possibilidade de crescimento na carreira ou oportunidades de exercer determinadas funções (p. 2).

Categoria: ações pontuais

Para a construção desta categoria, utilizou-se a descrição de ações pontuais das empresas, como aquelas voltadas aos cuidados estéticos ou comemorações. Na Tabela 8, encontram-se as práticas descritas pelas empresas.

 

 

A Tabela 8 apresenta que a realização de eventos em datas comemorativas é praticada por muitas empresas, sendo também encontradas com as ações voltadas para beleza e cuidados pessoais.

A empresa transformou o Dia Internacional da mulher em Semana Internacional da Mulher. Durante esse período, é preparada uma extensa programação de eventos, envolvendo palestras educativas, desfiles de moda, curso de maquiagem, e, na data, um almoço especial é oferecido a todos os colaboradores. Os presentinhos não poderiam faltar... (Empresa H)

Outras datas também fazem parte do calendário, como Dia das Mães e Dia da Secretária, que também são motivos de lembranças especiais (Empresa I).

Várias empresas estudadas associam práticas e políticas de atendimento, atração e retenção das mulheres a eventos pontuais ou datas comemorativas. Outro ponto de atenção é a associação apresentada entre mulheres em ambiente de trabalho e o cargo de secretária. Esse estereótipo remete ao tipo de participação que faz parte da visão dos empregados sobre o papel da mulher dentro das empresas. Além disso, as ações mostram-se estritamente relacionadas a ações voltadas para beleza e cuidados pessoais.

Algumas outras ações também foram realizadas, como diferenciação nos uniformes, e realização de outras ações, como implementação de espelhos nos banheiros e produtos de uso pessoal (Empresa J).

A empresa proporciona às suas colaboradoras um ambiente de trabalho de liberdade onde as mesmas podem trabalhar vestidas de acordo com sua individualidade (Empresa L).

Aqui as colaboradoras são sempre incentivadas a correrem atrás dos seus sonhos mesmo tendo que administrar tantos papéis: são mães, filhas, esposas, estudantes e profissionais, e ainda precisam se cuidar, pois são mulheres, e a sociedade cobra muita mais em relação à aparência feminina do que à masculina (Empresa M).

[...] valorização de nossos colaboradores, principalmente da classe feminina, que nos trazem delicadeza e ao mesmo tempo competência nas funções exercidas (Empresa N).

De acordo com os trechos apresentados, podese observar a preocupação da empresa com os aspectos estéticos por acreditarem que eles são importantes no atendimento, atração e retenção das mulheres. O último, inclusive, expõe uma questão cultural voltada à busca constante pelos padrões de beleza ditados pela sociedade atual. Além disso, mais uma vez os estereótipos aparecem: necessidade do fortalecimento da autoestima, delicadeza, desfile de moda e cuidados com a estética.

Empresas que não Adotam Políticas e Práticas para as Mulheres

Muitas empresas escreveram apenas que não adotam ações voltadas exclusivamente para as mulheres. Outras optaram por explicitar que consideram ações desse tipo como discriminatórias. Para elas, a gestão da diversidade deve atuar na dissolução das diferenças.

Não realizamos nenhuma ação neste aspecto. A empresa não faz nenhuma distinção no tratamento com os colaboradores. Prova disso foi o resultado na última pesquisa de clima, onde 80% dos colaboradores apontou que se sentem respeitados no ambiente de trabalho, independente de raça, nível hierárquico, credo, orientação sexual etc. (Empresa O).

Outras não as adotam por não verificarem em seu quadro de empregados distorções na representatividade de mulheres e homens e/ou ao não perceberem descontentamento, por meio das pesquisas de clima, das mulheres a esse respeito.

Temos 65% de mulheres trabalhando na empresa. Temos um ambiente de trabalho adequado e propício ao trabalho das mulheres. Por isso, não nos preocupamos até o momento em desenvolver um programa específico e formal de retenção para mulheres (Empresa P).

A opção por explicar a não adoção das práticas mostra que as empresas acreditam na relevância dessa questão na escolha das melhores empresas para se trabalhar. Quando a empresa descreve, como no caso citado anteriormente, que há um grande percentual de mulheres no quadro funcional, não há uma apresentação dos cargos e níveis hierárquicos, ficando a dúvida sobre a existência do "teto de vidro".

 

Considerações Finais

Acredita-se que com os dados apresentados atingiu-se o objetivo deste artigo, que era investigar as políticas e práticas adotadas pelas empresas para o atendimento, atração e retenção das mulheres em seu quadro funcional. Entre os principais resultados, vale ressaltar o reduzido número de trabalhos com foco em políticas e práticas de atração, atendimento e retenção das mulheres.

Com a análise dos dados, o fenômeno do "teto de vidro" se confirmou. Além disso, viu-se que mesmo com maior escolaridade, as mulheres recebem salários menores e ocupam menos cargos de direção nas organizações pesquisadas.

Do ponto de vista das práticas, constatou-se a presença das duas dimensões destacadas na literatura: valorização e dissolução das diferenças. As principais práticas descritas pelas empresas visam a auxiliar as funcionárias no desempenho dos seus diferentes papéis sociais. Essas práticas atentam para as diferenças biológicas entre homens e mulheres, promovendo ações que atendam a cada gênero no que se refere à saúde e à adoção de programas na tentativa de ascensão igualitária entre os sexos a cargos de liderança. Entretanto, é possível dizer que ainda não há equidade em relação à gestão da diversidade no que tange ao gênero, pois foram encontradas evidências de que as organizações, ao tratarem a inserção das mulheres no mercado de trabalho, comumente negam as diferenças entre os gêneros (Adler, 2002). Quando essas diferenças não são negadas, vê-se que elas são estereotipadas. A mulher vem associada às figuras de delicadeza, beleza, mãe e secretária, que generalizam e promovem o preconceito ao invés de superarem-no.

Com este estudo, foi possível verificar que, ao mesmo tempo em que há práticas que podem ser consideradas benchmarking, como ações voltadas para crescimento profissional, há outras que merecem atenção da gestão, pois atendem a demandas pontuais e fazem agrados em datas especiais, reforçando estereótipos. Nesse sentido, vê-se que mesmo as empresas com intento de serem as melhores empresas para se trabalhar no Brasil apresentam diferentes compreensões e esforços quanto às práticas voltadas para as mulheres.

Esse fato aponta a reflexão sobre a discussão a respeito das mulheres na sociedade. Apesar da evolução e mudança do papel da mulher na sociedade e no mercado de trabalho discutido no início do estudo, vê-se que tal evolução tem sido realizada, mas de maneira lenta, pelas organizações brasileiras; as mudanças ocorridas na sociedade não estão sendo refletidas na forma de gestão das empresas.

Os dados da pesquisa das melhores empresas são verificados in loco. Cada empregado indica sua percepção quanto ao seu ambiente de trabalho. No entanto, a percepção de homens e mulheres é vista de maneira geral, e não especificamente em relação à percepção quanto às políticas e práticas voltadas para atendimento, atração e retenção das mulheres. Esse confronto específico entre práticas e percepção dos empregados coloca-se como uma limitação e oportunidade para futuras pesquisas. Há também a necessidade de pesquisas com amostras mais diversificadas de empresas, pois a presente amostra foi definida com base em empresas selecionadas como as melhores para se trabalhar.

Ao passo em que novos estudos e pesquisas forem desenvolvidos para o acompanhamento das empresas, no plano social ideal, as ações de gestão da diversidade deveriam se incorporar ao dia a dia até o ponto em que não mais demandassem esforços extras da gestão.

 

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Recebido em: 20/10/10
Aceito em: 03/12/10

 

 

1 Os autores agradecem as contribuições dos pareceristas no aperfeiçoamento do artigo.
2 Contato: fermpires@gmail.com
3 O ranking das Melhores Empresas para Você Trabalhar é publicado pelas revistas Exame e Você AS anualmente
4 Mais informações sobre a metodologia da pesquisa em Veloso, Nakata, Fischer e Dutra (2007).