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Gerais : Revista Interinstitucional de Psicologia

On-line version ISSN 1983-8220

Gerais, Rev. Interinst. Psicol. vol.4 no.1 Juiz de fora June 2011

 

ARTIGOS

 

A percepção da brincadeira de faz-de-conta por crianças de uma Instituição da Educação Infantil

 

The perception of make-believe activities by children from a Child Education Institution

 

 

Iara Feldman1; Mariane Lima De Souza

Universidade Federal do Espírito Santo, Vitória, Brasil

 

 


RESUMO

Este artigo investigou a percepção de crianças sobre a brincadeira de faz-de-conta no ambiente escolar. Participaram do estudo quatro crianças entre cinco e seis anos do último período de educação infantil. As crianças participaram de duas vivências na "Oficina de Jogo Simbólico" e responderam a uma entrevista semiestruturada, conforme o método clínico piagetiano. Os resultados sugerem que a percepção das crianças do jogo simbólico tem um foco problemático que abrange cinco pontos: 1) a consciência de que a brincadeira de faz-de-conta não é real, 2) o exercício do jogo simbólico e a circularidade de papéis, 3) o ponto de vista do outro, 4) a resolução de conflitos e 5)o prazer funcional e a vivência da brincadeira simbólica coletiva. Conclui-se que o espaço lúdico pode ser uma importante forma de estimulação da criança no ambiente escolar.

Palavras-chave: Jogo Simbólico, Método Clínico, Infância


ABSTRACT

This study investigated the children's perception of children about make-believe activities in the school environment. The study included four children between five and six years of age, in the last year of child education. The children participated in two activities in the "Symbolic Game Workshop" and answered a semistructured interview in accordance with the Piagetian Clinical Method. The results suggest that the children's perception of the make-believe activities has a problematic focus including five issues: 1) awareness that the make-believe activity is not real, 2) the exercise of the symbolic game and the rotation of roles, 3) the point of view of the others, 4) the conflict resolution, and 5) the functional pleasure and the experience of the collective symbolic activity. The conclusion is that the ludic space may be an important form of child stimulation in the school environment.

Keywords: Symbolic Game, Clinical Method, Childhood


 

 

O interesse no tema de brincar de faz-de-conta em crianças pequenas teve origem na observação da primeira autora de crianças de quatro a cinco anos, em um kibutz2 situado ao norte de Israel. Durante o ano de 1972, em um programa de intercâmbio cultural para estudantes estrangeiros, a primeira autora teve a oportunidade de estagiar em uma Casa de Crianças instalada em um kibutz. A organização do ambiente educativo chamou a atenção por adotar um modelo distinto do que se concebia como educação infantil no Brasil. A casa era organizada em cantos de atividade, onde as crianças brincavam e interagiam de forma autônoma. O canto mais concorrido era denominado Canto das Bonecas, que consistia em um ambiente que simulava uma casa com móveis e utensílios proporcionais ao tamanho dos pequenos. As crianças conheciam a rotina e se organizavam nos cantos para brincar a partir da mediação do educador e de acordo com uma tabela estabelecida entre ele e o grupo na roda de conversas. Nessas conversas, eram estabelecidos os dias de as crianças brincarem em cada canto para evitar conflitos, permitir que circulassem por todos os cantos e organizar a rotina de forma participativa. No Canto das Bonecas, as crianças desenvolviam o jogo simbólico, desempenhando papéis, criando situações e utilizando a linguagem tanto de uma forma egocêntrica, isto é, falando para si mesmas, quanto de forma socializada quando entabulavam conversação com outra criança. Pareceu curioso que crianças pequenas se envolvessem em conversações durante boa parte do tempo em que brincavam nesse canto. De volta ao Brasil, essa organização do espaço educativo foi introduzida nas escolas em que a primeira autora atuou como professora e coordenadora pedagógica. A investigação científica sobre o jogo simbólico passou a ser, então, um interesse fundamental de pesquisa.

Momentos de contação de histórias, de fantasias, de imitação do mundo, de faz-de-conta e de jogos dramáticos podem emprestar às crianças a possibilidade de imitar o mundo dos adultos, compreendendo o meio em que vivem, reelaborando situações desconfortáveis, sociabilizando e desenvolvendo a linguagem verbal, a criatividade e os pré-requisitos para o conhecimento sistematizado (Barbosa, 2006).

Brincadeira de faz-de-conta, jogo de ficção ou de imaginação, jogo dramático e jogo simbólico são algumas das diversas denominações atribuídas ao fenômeno de brincar, imprimindo significados aos objetos, simulando ser outro personagem ou criando contextos imaginários (Barbosa & Souza, 2010). Brincar é uma atividade por meio da qual a inteireza fica preservada, a aprendizagem e o desenvolvimento acontecem, a criatividade vislumbra espaço e o conhecimento sistematizado encontra seus verdadeiros pré-requisitos. Assim, a brincadeira tem para a criança as mesmas funções que o trabalho tem para os adultos, já que, por meio dela, as crianças socializam-se, convivem e desenvolvem-se. Sendo uma atividade criadora da imaginação, a brincadeira se alimenta da riqueza e variedade da experiência acumulada pelo homem, "porque esta experiência é o material com o qual constrói seus edifícios de fantasia" (Vygotsky, 1987, p. 17).

Além disso, o brincar pode ser considerado uma atividade terapêutica, pois possibilita que a criança reelabore situações dolorosas, medos e ansiedades. Simbolizando, falando e representando os conteúdos que o perturbaram, o pequeno reelabora, nomeia e reconhece melhor os eventos, as pessoas e os objetos que constituem seu mundo (Kishimoto, 2002). O jogo simbólico é uma das formas de manifestação da função simbólica ou semiótica que emerge por volta dos dois anos de idade. Ao brincar de "faz-de-conta", a criança transforma o real, por assimilação mais ou menos pura, ao sabor das necessidades do eu (Piaget & Inhelder, 1966/2007). O jogo de ficção possibilita que a criança se expresse livremente, sem as imposições de adaptação ao meio, criando uma linguagem simbólica que adapta o real às suas necessidades. Já a linguagem verbal representa um esforço de adaptação ao meio na medida em que a criança necessita compreender signos coletivos construídos pelo meio social e cultural.

Contudo, no atual contexto educacional brasileiro, as crianças entram no ensino fundamental com idade cada vez menor. Com a sanção da Lei n. 11.274, que regulamenta o ensino fundamental de nove anos (Brasil, 2006), crianças de seis anos são submetidas ao esquema tradicional do ensino fundamental, onde os espaços lúdicos são menos valorizados, quando não abandonados por completo. Dessa forma, o objetivo deste artigo foi analisar e discutir a percepção das crianças de educação infantil sobre a brincadeira de faz-de conta a partir de um estudo empírico realizado em uma escola pública de educação infantil localizada no município de Vitória, no Espírito Santo. O estudo propõe uma abordagem metodológica inovadora, que utiliza o método clínico piagetiano como contexto para o procedimento de coleta de dados, por meio da entrevista clínica, e o método fenomenológico-semiótico como critério para o procedimento de análise dos dados. Para tanto, o artigo está organizado em três blocos que apresentam, sequencialmente, uma breve descrição do método clínico piagetiano e do método fenomenológico-semiótico, indicando os principais pontos de convergência e os procedimentos metodológicos; os resultados e discussão de um estudo com crianças do último período de educação infantil, utilizando a "Oficina de Jogo Simbólico"; e uma argumentação final que reafirma a importância da preservação do espaço lúdico nas escolas como uma estratégia que cria oportunidades para a criança representar e simbolizar.

 

Interfaces entre o Método Clínico Piagetiano e a Fenomenologia Semiótica

Para que os resultados da pesquisa em ciências humanas possam se aproximar do fenômeno puro, a fenomenologia semiótica sugere que o pesquisador suspenda o que sabe ou conhece sobre o fenômeno, utilizando a lógica da descoberta no lugar da lógica da "invenção". "O benefício da pesquisa com a descoberta é de que um julgamento qualitativo possibilita exatidão e abstração na descrição (representação). A lógica da fenomenologia [...] funciona como um teste de exatidão no julgamento da pesquisa" (Lanigan, 1997, p. 21: grifo do autor). O esforço do pesquisador consiste em reencontrar o mundo a partir de um olhar ingênuo, suspendendo qualquer reflexão ou interpretação, para lhe dar, enfim, um estatuto filosófico (Merleau-Ponty, 1999).

Com relação ao método clínico piagetiano, o pesquisador deve abrir mão de sua forma de pensar para compreender a percepção do sujeito. Para isso, deve procurar esclarecer o significado dos termos utilizados pelo sujeito dentro de sua estrutura mental (Delval, 2002). Esse método consiste em um procedimento de coleta e análise de dados para o estudo do pensamento, que se realiza mediante entrevistas ou situações muito abertas, nas quais se procura acompanhar o curso do pensamento do sujeito ao longo da situação, fazendo sempre novas perguntas para esclarecer respostas anteriores. Consta de algumas perguntas básicas, na forma de uma entrevista semiestruturada, e outras que variam em função das respostas do entrevistado e dos interesses que orientam a pesquisa que está sendo realizada. Tanto a entrevista clínica como a entrevista fenomenológica pressupõem que o pesquisador deve conduzir a entrevista sem sugestionar o entrevistado, para que se possa aproximar do fenômeno puro (Fenomenologia) ou lançar luz sobre a forma de pensamento do indivíduo (Método Clínico). No método clínico, uma das tarefas do pesquisador é, justamente, tornar consciente a concepção de mundo do sujeito que está geralmente implícita e da qual o próprio sujeito não tem consciência. Assim, a suspensão do que se conhece a respeito do fenômeno para a fenomenologia pode ser correlata à conduta de "abrir mão" de sua forma de pensar que o pesquisador deve adotar no método clínico. O rigor no cuidado com tal possível interferência do pesquisador na coleta dos dados (Método Clínico), bem como na análise dos resultados (Fenomenologia Semiótica), pode enriquecer a nossa pesquisa, já que, por meio da convergência entre os dois métodos, buscar-se-á conhecer o que é singular na percepção do sujeito.

Nesse sentido, uma proposta metodológica, que conjuga o método clínico piagetiano e a interpretação fenomenológica, pode contribuir para a descrição de um fenômeno tal como ele é, a partir da utilização da lógica da descoberta, e tornar consciente a percepção do sujeito a respeito do fenômeno, que está implícita.

O presente estudo teve como objetivo investigar a percepção de crianças de cinco a seis anos de idade sobre a brincadeira de faz-de-conta, o jogo simbólico, por meio de entrevistas individuais realizadas com cada participante após a vivência coletiva na "Oficina de Jogo Simbólico".

 

Método

Participantes

Foram sorteadas quatro crianças (dois meninos e duas meninas) de cinco anos de idade que frequentam o último período de uma escola de educação infantil do município de Vitória, no Espírito Santo. Os pais das crianças e os responsáveis pela instituição foram informados do caráter científico da pesquisa e consentiram a gravação em áudio e vídeo dos momentos de coleta de dados para o trabalho, assinando Termo de Consentimento Livre e Esclarecido de acordo com as diretrizes nacionais e internacionais para pesquisa.

Instrumentos e Procedimentos

Após aprovação pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Centro de Ciências da Saúde da Universidade Federal do Espírito Santo, em julho de 2010, sob o registro 127/10, iniciou-se a pesquisa com crianças do último período da escola de educação infantil para investigar a percepção das mesmas a respeito da brincadeira de faz-deconta.

Para a realização da coleta de dados, organizamos um espaço educativo, denominado de "Oficina de Jogo Simbólico", que simula uma casa com alguns cômodos: sala e escritório, quarto e cozinha. Foram acrescentados utensílios e acessórios que estimulassem as crianças a entrar no jogo simbólico: telefone, bloco de anotações, caneta, utensílios de cozinha, ferro de passar roupa, paletó, gravata, aventais, bonés, espelho e relógio. A experiência foi realizada em duas sessões, com um intervalo de 20 dias entre elas. Em cada uma delas, antes da vivência do jogo simbólico, reunimos as crianças e, numa "Roda de Conversa", com duração de aproximadamente 10 minutos, solicitamos que nos explicassem o que é o jogo de faz-de-conta e como se joga. Em seguida, fizemos o enquadramento, mostrando no relógio o tempo que teriam para brincar livremente na "Oficina de Jogo Simbólico", bem como comunicamos que estariam sendo filmadas. Durante 20 minutos, as crianças brincaram no espaço organizado para esse fim, sendo observadas e filmadas pelo grupo de assistentes de pesquisa.

Após a vivência coletiva, as crianças foram convidadas a participar, individualmente, de uma entrevista semiestruturada, baseada no método clínico proposto por Jean Piaget (1926), com o propósito de compreendermos o pensamento de cada criança sobre a sua vivência do jogo simbólico. No Quadro 1, apresentamos o roteiro dessa entrevista, lembrando que esse roteiro é aberto e pode conduzir a distintos caminhos em função das respostas de cada participante.

 

 

Procedimentos de Análise dos Dados

Os dados obtidos a partir das entrevistas clínicas de cada criança foram transcritos e analisados com base nos critérios da fenomenologia semiótica (Gomes, 1998; Lanigan, 1988). A apresentação das percepções das crianças sobre a brincadeira de faz-de-conta obedeceu à sequência dos três passos da análise fenomenológica: descrição, redução e interpretação. O primeiro passo apresenta uma descrição fenomenológica dos aspectos significativos que emergiram a partir das entrevistas. Na descrição fenomenológica, o pesquisador busca apresentar os dados coletados sem um pré-julgamento, isto é, como se não tivesse um conhecimento prévio ou hipóteses sobre tais situações, apresentando o contexto temático do fenômeno investigado. O segundo passo busca demarcar as relações que se estabelecem entre os temas significativos e as variações de percepção, apresentando o foco problemático do fenômeno investigado, isto é, a característica essencial do fenômeno. O terceiro passo articula e interpreta os temas indicados na redução fenomenológica, comparando e contrastando a percepção dos participantes e do pesquisador aos achados de estudos científicos e à teoria na área em que se situa o fenômeno investigado.

 

Resultados e Discussão

A leitura fenomenológica das entrevistas procurou manter em tensão o relato da criança, como uma expressão vivencial, e o entendimento do pesquisador, como consciência de uma experiência vivida. Os significados demarcados nessa etapa são uma expressão da percepção consciente de uma experiência vivencial e, portanto, devem fazer emergir a lógica daquele que experienciou o fenômeno investigado, e não a lógica do pesquisador ou de seu viés teórico. Procurou-se identificar a percepção que a criança tem da brincadeira de faz-de-conta, apresentada a seguir como uma descrição fenomenológica a partir da análise dos temas significativos que emergiram das entrevistas.

A brincadeira é percebida pelas crianças como uma criação da imaginação. As crianças demonstram ter consciência de que o jogo simbólico é engendrado a partir de sua própria imaginação.

A gente imagina brincando... (P. 02)

Não, é de mentirinha. Tudo o que acontece está na nossa cabecinha. (P. 01)

Tal criação pode ser construída coletivamente, estabelecendo-se uma divisão e circulação dos papéis no jogo entre as crianças.

Eu escrevia o nome das pessoas que ligavam pra pedir uma pizza. Aí eu falava, quer vir comer aqui ou é para entregar? Aí o Hai3 fazia a pizza e a Liz ia entregar na casa. (P. 02)

O aspecto coletivo do jogo é percebido pelas crianças.

Nós brincamos juntos. (P. 03)

Brinquei com Ger e com Liz. (P. 04)

O jogo simbólico coletivo parece viabilizar a busca de solução dos conflitos que surgem na divisão de papéis. A criança, ao brincar espontaneamente, sem a interferência do adulto, procura solucionar pequenos entraves que aparecem quando duas disputam o mesmo papel no jogo.

Primeiro um brinca de ser aquilo e depois passa para o outro. (P. 02)

As meninas demonstraram estar imbuídas de uma ideia rígida e estereotipada de gênero, segundo a qual somente a mulher desempenha funções domésticas, visto que estimularam a criação de um simbolismo paralelo pelos meninos. Assim, as meninas excluem os meninos das funções domésticas, e estes, por sua vez, parecem procurar outros papéis e funções.

Por que eu queria ser cozinheiro e elas não deixaram. (P. 01)

Eu era ladrão. Eu roubei só o caderno. Porque eu queria escrever e elas não deixavam. Aí, eu peguei sem ninguém ver. (P. 01)

A percepção do ponto de vista do outro apareceu na atribuição da autoria de ideias ou na atribuição de estados afetivos aos outros participantes.

O Hai foi quem deu a ideia de brincar de hotel. (P. 02)

O Hai ficou magoado porque a Ive não deixou ele brincar de cozinheiro. (P. 02)

A brincadeira foi percebida como muito prazerosa a ponto de se desejar que não terminasse.

Ótima. E até vi o relógio. (P. 03, que escondeu o relógio quando se deu conta que o tempo da brincadeira se esgotava)

A descrição fenomenológica desvelou a percepção das crianças sobre o jogo simbólico a partir da entrevista clínica realizada com cada uma das crianças. A tarefa da redução fenomenológica foi demarcar as percepções que expressam o pensamento das crianças a respeito da vivência realizada na "Oficina de Jogo Simbólico" coletivo. Dessa forma, a partir da descrição fenomenológica, a redução apontou um foco problemático organizado em torno de cinco pontos essenciais: 1)

o conceito da brincadeira de faz-de-conta e a consciência de que o jogo simbólico não é real; 2) a divisão de papéis durante o jogo e a circularidade dos mesmos; 3) a percepção do ponto de vista do outro e o jogo simbólico coletivo; 4) a resolução de conflitos surgidos durante a vivência do jogo; e 5)o prazer funcional proporcionado pelo jogo simbólico.

A percepção do jogo simbólico como uma criação da imaginação parece estabelecer a divisão entre o imaginário e o real, a ficção e a realidade, a fantasia e o mundo real. Situações observadas no mundo real das crianças são aqui recriadas no nível simbólico. Aparecem episódios completos, apresentando sequência lógica, divisão de papéis e verossimilhança com situações reais do cotidiano. Essa recriação do real no nível simbólico parece ser parte da experiência consciente da criança. Do ponto de vista da fenomenologia semiótica a experiência consciente é entendida como se tratando de uma capacidade e uma habilidade comunicacional (Gomes, 1998). Contudo, na concepção piagetiana, a linguagem das crianças de cinco anos ainda é essencialmente egocêntrica, não apresentando ainda a função de comunicar como seu principal objetivo (Piaget, 1923/1973).

Sugerimos que as crianças de cinco anos desenvolvem a linguagem comunicacional a partir das experiências com o meio social na qual estão inseridas. Vygotsky (conforme citado por La Taille, Oliveira, & Dantas, 1992) tem como um de seus pressupostos básicos a ideia de que o ser humano constitui-se como tal na sua relação com o outro social. A linguagem humana, por sua vez, representa um sistema simbólico fundamental na mediação entre sujeito e objeto e tem duas funções básicas: a de intercâmbio social e a de pensamento generalizante (La Taille et al., 1992). A função comunicacional ou de intercâmbio social da linguagem parece evidente tanto na vivência do jogo simbólico coletivo como na percepção da criança sobre o jogo. A divisão e a circularidade de papéis no jogo sugerem que, ao pensar na resolução de conflitos surgidos durante o jogo, ocorre a ampliação do ponto de vista egocêntrico para a percepção de que existem outras perspectivas.

Piaget e Inhelder (1966/2007) caracterizaram o pensamento e o comportamento de uma criança pré-operacional (dos dois aos sete anos de idade) como "egocêntrico", isto é, a criança não pode assumir o papel ou o ponto de vista do outro. Antes dos seis ou sete anos, aproximadamente, as crianças ainda não tomam consciência de que seus pensamentos entram em nítido conflito com aqueles de seus pares. Com essa consciência, elas começam a se acomodar aos outros e, com isso, o pensamento egocêntrico começa a ceder às pressões sociais. A interação social com outras crianças e a presença do conflito dos próprios pensamentos com os dos outros, eventualmente, obrigam a criança a questionar e verificar seus próprios pensamentos. A verdadeira fonte de conflito, a interação social, vem a ser a fonte de verificação da criança. Portanto, a interação social entre colegas, como ocorre no jogo simbólico coletivo, é um fator fundamental para dissolver gradativamente o egocentrismo cognitivo. Isso representa uma substancial adaptação ao meio social (Wadsworth, 1999).

Os papéis estereotipados que o meio social determina para meninas e meninos interferiram na circularidade de papéis durante o jogo. As meninas impediram que os meninos entrassem nas cenas criadas por elas, enquanto os meninos se mantiveram submissos à autoridade feminina. Papéis determinados pelo meio sociocultural como essencialmente femininos, tais como as funções domésticas, foram desempenhados somente pelas meninas apesar de terem sido disputados pelos meninos. O sentimento de exclusão dos meninos motivou a criação de um simbolismo paralelo por parte deles. Esse episódio pode ser classificado, de acordo com a categorização de Piaget (1946/1990) para o jogo simbólico, como uma combinação liquidante, na qual a criança visa a compensar ou a corrigir o real, e não mais reproduzi-lo pelo simples prazer. Um dos meninos afirmou ter desempenhado o papel de ladrão na brincadeira, roubando uma bolsa e um caderno de anotações sem que os outros se dessem conta. Justificou a sua atuação, dizendo que, em função de que impediram que ele entrasse na brincadeira, "pegou sem ninguém ver". Nesse episódio, ficou evidente a combinação liquidante, que, segundo a classificação de Piaget (1946/1990), é característica da Fase I (crianças até quatro anos de idade) do jogo simbólico, na qual o jogo é, essencialmente, egocêntrico. Vemos que Hai (P. 01), nesse episódio, não interagiu com seus parceiros e agiu solitariamente. Podemos inferir que Hai (P. 01), sentindo-se excluído do jogo coletivo, teve momentos de regressão em seu simbolismo lúdico, construindo uma representação paralela egocêntrica e solitária.

A percepção do ponto de vista do outro ficou evidente nos relatos das crianças sobre os papéis desempenhados pelos pares na brincadeira. As afirmações de como o outro se sentiu diante da exclusão da brincadeira demonstraram que as crianças de cinco anos podem se colocar no lugar do outro, percebendo no colega sentimentos como mágoa, tristeza e contrariedade. Em diversos momentos da entrevista clínica, Ger (P. 02) demonstrou ter percebido o ponto de vista dos colegas na brincadeira. Quando descreveu os papéis desempenhados pelos colegas, ofereceu solução para a resolução de conflitos e contou como seus pares se sentiram durante o jogo. Ger demonstrou ter percebido o ponto de vista dos colegas na brincadeira. Quando descreveu os papéis desempenhados pelos colegas, ofereceu solução para a resolução de conflitos e contou como seus pares se sentiram durante o jogo. Ger(P. 02) denotou exercer um jogo simbólico coletivo em diversos momentos, nos quais falou da adequação e divisão de papéis no jogo. É possível sugerir que, a partir das respostas de Ger (P. 02) no decorrer da entrevista clínica, ele esteja gestando a superação da posição egocêntrica, desenvolvendo um simbolismo, efetivamente, coletivo. Estando exposto a uma situação de grupo, Ger (P.02) interage com os outros, divide espaço e papéis, percebe o ponto de vista do outro e até mesmo oferece soluções para a resolução de conflitos.

Considera-se que o embrião de um futuro cidadão moralmente autônomo é gestado desde os primeiros anos de vida escolar. A possibilidade de operar em grupos abre às crianças a possibilidade de perceber a existência de outros pontos de vista e gradualmente superar o pensamento egocêntrico (Wadsworth, 1999). Enquanto o adulto se encontra no papel de mero observador, as crianças são estimuladas a dividir espaço e papéis, podendo emergir uma gênese da cooperação entre iguais.

Quanto à resolução de conflitos, as crianças demonstram, no nível do pensamento, uma clareza das possibilidades de negociação com seus pares, verbalizando estarem conscientes de possibilidades como a troca e a circularidade de papéis no jogo. Na prática do jogo simbólico, contudo, os conflitos não foram solucionados com facilidade, e o ajustamento de papéis não foi satisfatório para todos os participantes, gerando a necessidade de construções lúdicas paralelas, para compensar a insatisfação. A oportunidade de se envolver no jogo simbólico coletivo pode estimular na criança a necessidade de utilizar uma linguagem mais socializada, com características de conversação. A emergência de conflitos durante o jogo motivaria a criança a utilizar uma linguagem comunicativa para a resolução dos mesmos. "Pode perfeitamente acontecer que sejam as disputas que levam as crianças à necessidade de fazer-se compreender" (Piaget, 1923/1973, p. 144).

De acordo com Piaget e Inhelder (1966/2007), o jogo simbólico guarda do jogo de exercício, próprio do estágio sensório motor, o prazer funcional proporcionado pela situação lúdica. A criança, ao brincar de faz-de-conta, relaxa do esforço de adaptação ao meio social e age pelo prazer gerado pela brincadeira. Assim, adapta o real às suas necessidades subjetivas no lugar de adaptar-se às exigências do meio. O prazer funcional ocasionado pelo jogo ficou evidente nos dados colhidos a partir das entrevistas. Todos os participantes relataram que a brincadeira gerou prazer e que gostariam de continuar brincando por um espaço de tempo maior. O ato de esconder o relógio, antes do final do tempo marcado para o término da oficina, demonstrou a tentativa de usurpar os limites temporais, estendendo o tempo de jogo, possivelmente por ser uma atividade prazerosa. Em situações confortáveis e agradáveis, as crianças procuram ignorar os limites temporais, prolongando o prazer funcional.

A interpretação fenomenológica, a seguir, é uma articulação dos temas apresentados na descrição (explanação da evolução do pensamento das crianças de cinco anos de idade em duas oficinas de jogo simbólico) e demarcados na redução (análise do contexto temático com foco na conduta das crianças, definindo os aspectos essenciais em uma síntese da percepção das crianças a respeito da brincadeira de faz-de-conta). Procurou-se estabelecer interfaces entre a percepção das crianças sobre a experiência do jogo simbólico e os achados da literatura científica na área, com foco especial na teorização de Piaget (1946/1990) sobre o jogo simbólico e a função semiótica.

A capacidade de criar símbolos é um dos definidores da humanização. Ao simbolizar o ser humano, cria cultura, constrói sistemas de comunicação, produz arte, elabora mitos e lendas, faz ciência e vai gradativamente evoluindo em seu processo de humanização, diferenciando-se de outras espécies animais. A criança só poderá entrar no universo da cultura na medida em que for capaz de simbolizar, representar. A capacidade simbólica está na origem dos processos de aprendizagem mais essenciais para a efetivação da humanidade de cada um. As aprendizagens escolares têm como condição necessária, mas não suficiente, a capacidade de simbolizar (Corso, 2005).

A compreensão da natureza da capacidade representativa foi amplamente discutida na epistemologia genética de Jean Piaget, que não a define como inata, nem como resultado de simples maturação do sistema nervoso ou de um aprendizado a partir do meio social. A função semiótica é fruto de um longo processo de construção, que tem início nos primeiros anos de vida. Para Piaget e Inhelder (1966/2007), a função simbólica ou semiótica emerge por volta dos dois anos de idade. A partir da ação da criança sobre o meio, será construída a capacidade de diferenciar o significante do significado, evocando objetos ou acontecimentos ausentes ou passados. Na superação do presente imediato, a criança constrói a capacidade de evocar objetos e eventos ausentes, reconstituir acontecimentos passados e antecipar ações futuras. Na conquista da função semiótica, a criança constrói gradativamente a socialização, adentrando e se inserindo no meio social. Desse modo, a vida social "[...] desempenha um papel essencial na elaboração do conceito e dos esquemas representativos vinculados à expressão verbal [...]" (Piaget, 1946/1990, p. 14), possibilitando a aquisição da linguagem e a consequente compreensão e utilização de signos coletivos.

Numa visão sócio-histórica da aprendizagem e do desenvolvimento, Vygotsky (1987) alerta para a questão de que são os instrumentos simbólicos que constituem a cultura e que a relação do sujeito com o objeto do conhecimento deve ser mediada por esses instrumentos, que, segundo ele, têm sua gênese no gesto, na fala, no rabisco, nas brincadeiras de situação simbólica e nos signos. Nesse sentido, a linguagem é o principal instrumento simbólico que o ser humano criou em sua existência histórica. Existem mecanismos específicos que são acionados para que tais representações e simbolizações possam se manifestar. Segundo Piaget (1946/1990), esses mecanismos são a imitação, a imagem mental, a brincadeira de faz de conta, a linguagem falada e o desenho. No presente trabalho, o foco é colocado na brincadeira de faz-de-conta.

Em nosso estudo, a partir da ação da criança sobre o meio durante a brincadeira de faz-de-conta coletiva, observou-se uma crescente capacidade de superação do presente imediato, uma construção da capacidade de evocar objetos ou eventos ausentes e um desenvolvimento da socialização e da capacidade de solucionar conflitos. Acredita-se que o estímulo ao jogo simbólico coletivo nas escolas de educação infantil pode representar um facilitador das aprendizagens sistemáticas. No jogo simbólico, a criança relaxa da necessidade e do esforço de se adaptar, incessantemente, ao mundo social e cultural na qual está inserida. Ao brincar de faz-de-conta, a criança transforma o mundo real ao sabor de suas necessidades afetivas, sociais e cognitivas. Portanto, é indispensável ao seu equilíbrio afetivo e intelectual a possibilidade de se envolver no jogo simbólico (Piaget & Inhelder, 1966/2007).

A circularidade de papéis ocorreu com maior intensidade na primeira sessão do que na segunda, realizada 20 dias depois, o que poderia indicar que não houve evolução no jogo simbólico das crianças entre os dois encontros. Contudo, os conflitos que se apresentaram na segunda sessão podem apontar para a premissa de que é por meio da resolução dos conflitos que as crianças podem desenvolver a percepção do ponto de vista do outro, superando sua posição egocêntrica e articulando uma linguagem mais socializada na medida da necessidade de justificar seu ponto de vista.

O prazer funcional que caracteriza o jogo simbólico pareceu estar mais presente na primeira sessão de acordo com as entrevistas clínicas realizadas após a oficina. Na segunda sessão, em decorrência dos conflitos, o prazer no jogo parece ter sido prejudicado, sugerindo que, na resolução de conflitos, o prazer que o jogo proporciona pode arrefecer. Mas, por outro lado, é justamente ao elaborar os sentimentos de exclusão, mágoa ou desconforto que as crianças desenvolvem a capacidade de viver coletivamente (Piaget, 1946/1990) e, pode-se acrescentar, a capacidade de se comunicar.

 

Considerações Finais

O presente estudo sugere que as crianças pequenas, quando expostas a situações coletivas que possibilitem o envolvimento no jogo simbólico, podem desenvolver sua capacidade comunicacional. A linguagem socializada poderia, dessa forma, ser estimulada e emergir desde a mais tenra idade por meio da preservação do espaço lúdico coletivo das crianças.

O estímulo ao exercício do jogo simbólico coletivo em crianças pré-escolares pode contribuir para o desenvolvimento afetivo, cognitivo e social. Do ponto de vista afetivo, por meio do envolvimento em situações de jogo coletivo, a criança elabora seus sentimentos e conflitos interiores. Cognitivamente, o pequeno sujeito constrói o conhecimento do mundo que o rodeia, desenvolvendo a linguagem oral, conhecendo os limites impostos pelo meio, interagindo com seus pares em situações de igualdade sem a interferência do adulto e, como consequência, humanizando-se gradativamente. A capacidade de criar símbolos é uma medida de humanização do ser humano, diferenciando-o de outras espécies animais.

O envolvimento em situações lúdicas coletivas que oportunizem a simbolização e representação em crianças pequenas facilita ainda a gênese da cooperação entre iguais. Em situações nas quais precisam interagir com seus pares, com o fim de dividir espaços, papéis no jogo e objetos, fantasias ou utensílios, os pequenos sujeitos se veem impelidos a utilizar uma linguagem comunicativa. Na resolução de conflitos que surgem no decorrer do jogo, podem superar a posição egocêntrica, evoluindo no sentido da linguagem socializada e de disputas verdadeiras.

O espaço lúdico para o jogo simbólico está cada vez mais reduzido no contexto das instituições educacionais brasileiras. As crianças de classe média, frequentemente, são submetidas a uma agenda de pequenos executivos, sem tempo para brincar. Os pequenos, das classes menos favorecidas, ou estão nas ruas contribuindo para o aumento da renda familiar, ou são cuidados por "babás eletrônicas", ficando algumas horas em frente à telinha da TV. Nas escolas de educação infantil, o espaço lúdico, na maior parte das instituições, é restrito a jogos de conteúdo acadêmico e algumas poucas bonecas, bolas e carrinhos jogados em um baú. A partir deste estudo, sugerimos que as escolas de educação infantil preservem o espaço lúdico para a prática espontânea do jogo simbólico coletivo.

Por outro lado, nas instituições de ensino que atendem à diversidade, é fundamental o papel do docente na criação de um entorno que favoreça o desenvolvimento da autonomia e possibilite à criança ser o sujeito de sua aprendizagem. Para esse fim, os educadores que trabalham com uma concepção que atenda à diversidade elaboram e implantam "centros de aprendizagem" (Anijovich, Malbergier, & Sigal, 2004), que podem ser denominados também "cantos de aprendizagem".

Na instituição na qual foi realizada a pesquisa, a equipe pedagógica está sendo orientada pela primeira autora na implementação do "Canto da Dramatização" nas salas de aula. As professoras regentes participarão de oficinas para que possam se tornar facilitadoras do brincar de faz-de-conta para crianças de educação infantil. Assim, este estudo pode oferecer pequena contribuição para que a escola de educação infantil privilegie o espaço lúdico e simbólico, de fundamental importância para todos os aspectos do desenvolvimento infantil.

 

Referências

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Recebido em: 21/12/10
Aceito em: 25/05/11

 

 

1 Contato: iarafeld@hotmail.com
2 Kibutz: fazenda coletiva em Israel criada durante o processo de colonização, onde os meios de produção, a receita e os bens materiais são socializados
3 O nome das crianças foi modificado, visando a preservar o anonimato dos participantes.