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Gerais : Revista Interinstitucional de Psicologia

versão On-line ISSN 1983-8220

Gerais, Rev. Interinst. Psicol. vol.5 no.1 Juiz de fora jun. 2012

 

ARTIGOS

 

Avaliação da tipologia psicológica observada em uma amostra de estudantes de um curso de psicologia1

 

Assessment of the psychological typology observed in a sample of students from a psychology undergraduate program

 

 

Ádhila Carlos Oliveira de Espírito*,2; Paulo Francisco de Castro+

* Universidade Guarulhos, Guarulhos, Brasil
* + Universidade de Taubaté, Taubaté, Brasil

 

 


RESUMO

O presente artigo teve como objetivo descrever quais são as características tipológicas encontradas em estudantes de Psicologia de acordo com a literatura junguiana. Participaram da pesquisa 200 graduandos de Psicologia do primeiro ao último ano, com idade a partir de 18 anos, pertencentes à Universidade Guarulhos (UnG). Para o desenvolvimento da pesquisa, foi utilizado o Questionário de Avaliação Tipológica (QUATI). Por meio deste, foi possível identificar o perfil psicológico do estudante de Psicologia em diferentes estágios da graduação. A análise dos perfis encontrados demonstrou a existência de diferentes perfis psicológicos, que sugerem, pela proximidade de suas funções principal e secundária, o amadurecimento psicológico do graduando de Psicologia. Portanto, o estudante de psicologia pode amadurecer alguns traços de personalidade durante sua graduação, o que parece ser fruto das exigências estabelecidas pelo curso de Psicologia, como o amadurecimento e desenvolvimento de suas habilidades e capacidades emocionais e intelectuais.

Palavras-chave: Personalidade, Características Tipológicas, Avaliação Psicológica, Estudantes Universitários, Carl G. Jung (1875-1961)


ABSTRACT

This article aimed at describing the typological characteristics found in Psychology students, according to the Jungian literature. The subjects were 200 undergraduate students from the first to the last term, with 18 years of age or more, from Guarulhos University (Ung). For the development of the survey the Typological Assessment Questionnaire (QUATI) was used, by means of which it was possible to identify the psychological profile of the Psychology student in different levels of the undergraduate program. The analysis of the profiles which were found demonstrated the existence of different psychological profiles, which suggest, due to the proximity of their primary and secondary functions, the psychological maturing of the Psychology student. Therefore, the Psychology student may develop some traces of personality during the program, which seems to be the consequence of the requirements established by the Psychology undergraduate program, such as the maturing and the development of their emotional and intellectual skills and capabilities.

Keywords: Personality. Typological Characteristics. Psychological Assessment. Undergraduate Student. Carl G. Jung (1875-1961).


 

 

No campo científico, têm-se muitas pesquisas que caracterizam a personalidade de estudantes universitários das mais variadas teorias e instrumentos de avaliação dentro do campo acadêmico. A partir de um estudo exploratório sobre tipos psicológicos e suas possíveis relações com a profissão escolhida, Campos (2005) afirma que, por meio do Questionário de Avaliação Psicológica (QUATI), grande parte dos universitários participantes de diferentes cursos apresentou como atitude predominante a extroversão, como função principal o sentimento e como função auxiliar a sensação e também o sentimento, de modo considerável. O autor esclarece que a extroversão como atitude psicológica mais evidente nos universitários pesquisados apresenta-se de modo mais característico no curso de Biologia, e como função principal predominante o sentimento no curso de Medicina.

Ao se abordar o curso de Direito, destaca-se a contribuição de Khalil (2010), que investigou o processo de decisão de juízes à luz da tipologia psicológica. Ele conclui que não foi observada relação entre a atitude extrovertida ou introvertida na frequência de designação de audiências. Inclusive, reflete que, independente de o juiz indicar um perfil extrovertido ou introvertido, durante as relações humanas que são estabelecidas em uma audiência, uma ação extrovertida deve ser assumida pelo magistrado, independente de seu perfil psicológico. Para tanto, os recursos das funções principal e auxiliar são utilizados na tarefa do juiz.

Já no curso de Psicologia, os estudantes apresentaram como função principal o sentimento; função auxiliar, a sensação; e como atitude, a extroversão, demonstrando forte sentimento de valor nas características únicas de cada experiência, interesse pela realidade sentida por meio dos órgãos sensoriais, além da necessidade de realizar contatos humanos. Segundo Campos (2005), a identificação de perfis variados dentro da profissão de psicólogo está ligada à ampla e diversificada atuação da área, atingindo campos diferenciados, não sendo mais exclusivamente clínica, mas organizacional, hospitalar, escolar e social, entre outras.

As atitudes e funções encontradas nos universitários relacionam-se com o curso escolhido, pois, junto com as habilidades e requisitos que uma profissão exige e a harmonia entre características e inclinações pessoais dos estudantes, a probabilidade de satisfação maior na realização do seu trabalho atual e futuro tornar-se-ia muito mais viável e melhor. A possibilidade de divergências entre características psicológicas dos universitários e as habilidades esperadas e exigidas pelo curso pode interferir na atuação profissional futura, frustrando seus futuros clientes e/ou pacientes e a si mesmo (Campos, 2005).

 

Breve caracterização da teoria de personalidade de Jung

Do ponto de vista analítico, Feist e Feist (2008) apontam que cada teoria da personalidade foi concebida e descrita em um contexto diferente, com aspectos e focos diversos; portanto, cada uma possui seu próprio conceito, que envolve experiência pessoal e estudos nas áreas de interesse. Mediante cada visão, tanto em termos estruturais quanto psicodinâmicos, o conceito de personalidade pode ser visto sob óticas próprias, as quais observam o mesmo fenômeno, mas com visões distintas.

Em seu aspecto psicodinâmico, o modelo de funcionamento da personalidade junguiana descreve que o psiquismo está estruturado em níveis, como consciente, inconsciente coletivo e inconsciente pessoal (Feist & Feist, 2008). O presente estudo não pretende observar tal aspecto, uma vez que este, para sua observação, não dispõe de recursos objetivos para tal investigação, sendo que se trata de um fenômeno complexo, abstrato e subjetivo.

Segundo Magalhães (1984), a psicologia junguiana baseia-se na compreensão da personalidade como aquela que busca crescimento em direção à sua própria totalidade psíquica (inconsciente e consciente), na qual, a partir de sua totalização e seu amadurecimento, inicia-se o processo de individuação da pessoa. O desenvolvimento da personalidade, como fruto do processo de individuação, é importante papel na diferenciação particular e individual de cada pessoa, fato que a diferencia do coletivo e a caracteriza como sujeito único (Jung, 1981).

Jung (1981) observou o funcionamento dinâmico da psique e descreve que todo indivíduo possui um tipo geral de disposição, denominado como introversão ou extroversão, e um tipo funcional, chamado por ele, mais tarde, de atitudes psíquicas, as quais se constituem a partir da tentativa de adaptação em suas relações de ajustamento (sujeito e objeto) e de funções diferenciadas e constantes em suas reações com o objeto.

De acordo com Magalhães (1984), a abordagem junguiana propõe uma tipologia psicológica, ou tipo de atitudes básicas, a qual se baseia em diferentes tipos de temperamentos chamados de introversão e extroversão, em que o primeiro flui em direção ao seu mundo interno e o segundo, ao mundo externo. Estes "mundos" dizem respeito aos tipos de objeto, seja um objeto externo ou a própria pessoa. Jung (1981) considera sua proposta da psicologia analítica como componente fundamental no contraste entre as diferentes disposições, a direção dada a seus interesses e o movimento da libido para as relações e situações com o objeto, de maneira que este define seu tipo habitual de funcionamento psíquico.

Para Zacharias (2003), a construção da tipologia, como instrumento de observação científico, não se baseia em analisar o homem em sua totalidade, uma vez que a psique é dinâmica, mas, sim, em analisar seu estilo cognitivo e comportamento individual dentro das três grandes tipologias: somática, somatopsíquica e psíquica. Em termos de uma possível avaliação psicológica, leva-se em conta o dinamismo psíquico, pois a avaliação do teste (QUATI) é estática. Tal dinâmica, que permeia a compreensão das relações entre função principal ou auxiliar com a função inferior e o conceito de persona e sombra, possibilita a construção mais aproximada de um perfil psicológico (Zacharias, 2003).

Diante dos diferentes tipos de direcionamento de interesse, Magalhães (1984) conclui que todas as pessoas possuem as duas atitudes, mas o que determina um estilo ou o outro é a sua atitude mais habitual, isto é, o que se apresenta com maior frequência. Na tipologia junguiana com base psíquica, o foco está centrado somente nos aspectos psicológicos com o intuito de oferecer uma compreensão mais aproximada do fenômeno psíquico (Zacharias, 2003).

Dessa forma, a circulação do fluxo de libido apresenta um movimento entre o nível consciente e o inconsciente, em que uma atitude habitual consciente sempre terá um deslocamento de fluxo inconsciente para a sua atitude oposta (Magalhães, 1984). Segundo Silveira (1981) e Von Franz (1996), os conceitos de introversão e extroversão são pautados na maneira como o sujeito processa a energia psíquica (libido) em relação ao objeto. Na extroversão, a libido flui em direção ao objeto e, na introversão, a libido recua diante do objeto. A relação do indivíduo com o objeto cria uma circulação da libido, que pode caracterizá-lo como introvertido ou extrovertido. Entretanto, devido a um movimento inconsciente de compensação, há um retrocesso de libido para o sujeito extrovertido e um fluxo de energia libidinal em direção ao objeto no indivíduo introvertido, levando à circulação da libido em qualquer que seja a atitude identificada em termos conscientes. Ambas, introversão ou extroversão, são consideradas atitudes normais, sendo interpretadas como patológicas apenas em grau exagerado ou mórbido.

Jung percebe que indivíduos com mesma atitude, introversão ou extroversão, apresentam comportamentos distintos diante das vivências cotidianas. A partir de observações empíricas, apresenta quatro funções que a consciência utiliza para a adaptação ao mundo externo, sendo sensação, pensamento, sentimento e intuição (Silveira, 1981; Von Franz, 1996). Assim, as duas atitudes básicas articulam-se às quatro funções de relação com o mundo externo, caracterizando-se, o que se denomina atualmente, de Tipologia Psicológica. Em verdade, todos os indivíduos possuem as quatro faces das funções, com o desenvolvimento particular e a partir do processo de individuação, uma delas prevalece sobre as demais, caracterizando a tipologia predominante.

Assim, a psicologia analítica, em uma perspectiva junguiana, tenta explicar os motivos de um mesmo grupo de pessoas com o mesmo temperamento agirem e comportarem-se diferentemente umas das outras por meio de funções psíquicas (Magalhães, 1984). A função é fruto do processo de desenvolvimento psicológico e atua sobre a realidade de maneira operacional, levando o indivíduo a uma ação efetiva e observável. O amadurecimento de uma determinada característica se dá a partir de um conjunto de estrutura que se agrega de forma pragmática. Pode-se compreender a função definida na tipologia junguiana por meio dessa dinâmica (Hillman, 2007).

O que determina se uma função é predominante ou não é o seu desenvolvimento, o que caracteriza, então, um hábito de reação e constitui o tipo de pessoa, tendo por trás um conjunto de influências internas e externas, como a herança genética, as influências familiares e culturais e as experiências adquiridas em sua formação e, portanto, determinando um modo de reagir ao mundo (Magalhães, 1984).

No entanto, a palavra "tipo" pode gerar um pensamento de que a personalidade é estática e determinante. Porém, a definição de um tipo psicológico, na visão junguiana, é de que todo ser humano é dinâmico e tende ao seu desenvolvimento, que se afirma no processo de individuação, no qual quanto maior o seu equilíbrio e menor sua rigidez e preponderância entre suas atitudes, mais o indivíduo fará uso de suas quatro funções (Magalhães, 1984).

Nesse sentido, a tipologia tem como função orientar, e não classificar, um indivíduo em A ou B. É, por isso, um instrumento que auxilia na análise e possíveis discussões, sob uma perspectiva da psicologia prática. A proposta junguiana enaltece estilos cognitivos, chamados pelo autor de funções. Sempre haverá uma função superior caracterizada pelo consciente e, oposta a esta, a função inferior caracterizada pelo inconsciente, em que uma complementa a outra (Magalhães, 1984).

As funções pensamento e sentimento formam um par de opostos. O pensamento como função, avalia os objetos de maneira impessoal, lógica e objetiva, excluindo o valor afetivo. Tal domínio afetivo pertence à função sentimento, que avalia o objeto de maneira pessoal e com estima. Ambas são consideradas pela proposta junguiana como "racionais", pois introduzem um julgamento e consideração sobre o objeto, cada qual com o seu juízo de valor para um e subjetivo para o outro (Magalhães, 1984).

Há mais duas funções opostas: a sensação e a intuição. Tanto uma como a outra são consideradas "irracionais" por não avaliarem ou julgarem seus objetos, mas, sim, por senti-los de maneira sensorial e perceptiva. A função sensação, por meio dos sentidos, informa as características do objeto. Já a função intuição faz uso do passado e do futuro como instrumento de orientação, como origem e possível curso do objeto. A sensação recebe e capta. Já a intuição codifica e armazena (Magalhães, 1984).

Para Magalhães (1984), cada indivíduo possui as quatro funções como potencialidades, mas utilizará apenas uma com maior frequência em sua vida. Ela, por sua vez, denominada de função principal é a aquela que dispõe dos recursos necessários para o indivíduo se adaptar à vida. A função principal está, portanto, a serviço do ego em uma atitude consciente e que se torna mais desenvolvida, ao passo que sua função oposta, a função inferior ou função auxiliar, torna-se menos desenvolvida e primitiva na medida em que é menos utilizada. Há uma terceira função, denominada de terciária, a qual faz uso parcial do consciente sendo utilizada com menor frequência que a função auxiliar (Magalhães, 1984).

No sentido de ilustrar tais colocações, recorre-se à visão de Von Franz (1981) sobre a relação dos tipos psicológicos na interpretação de contos de fadas. Ele explica que cada função da consciência leva a uma determinada forma de compreensão dos conteúdos apresentados nos contos de fadas, sendo que o indivíduo com função pensamento predominante foca na forma como os temas se entrelaçam e se complementam: o tipo sentimento visa à hierarquização dos valores e mensagens expressas, o tipo sensação dá ênfase aos símbolos e suas interpretações e o tipo intuição integra os conteúdos e mensagens do conto para dar-lhe significado pessoal. Assim, da mesma forma que existem diferenças na interpretação dos contos, cada tipo psicológico incorporará e interpretará a realidade de acordo com seu funcionamento psíquico.

As funções principal e inferior associam-se com as duas atitudes básicas (introversão e extroversão) na constituição do tipo psicológico. Segundo a psicologia analítica, há oito tipos característicos de personalidade: pensamento extrovertido, pensamento introvertido, sentimento extrovertido, sentimento introvertido, sensação extrovertida, sensação introvertida, intuição extrovertida e intuição introvertida (Magalhães, 1984).

Conforme explica Magalhães (1984), os oitos tipos psicológicos descritos pelo QUATI possuem características peculiares e remetem cada qual a uma função e atitude, a experiências pessoais e à adaptabilidade de convivência. A seguir, uma breve descrição sobre tais características em cada tipo psicológico:

-Tipo Pensamento Extrovertido: o indivíduo que possui este tipo como função superior dá ênfase sempre aos objetos, e não às ideias, dentro das situações externas, lidando apenas com o lado objetivo e racional, ou seja, é determinado pelo sistema de conclusões intelectuais. Pode ser autoritário, não leva em conta os sentimentos dos outros, tem dificuldades na expressão de afetos, tendo sua função inferior (introversão) menos desenvolvida.

-Tipo Pensamento Introvertido: o indivíduo que possui esta função principal tem como característica a organização e a clarificação de ideias, interessando-se por abstrações teóricas novas e originais. O sentimento manifesta-se de modo intenso e pouco diferenciado, dirigindo-se sempre a objetos externos e, portanto, com dificuldades em discernir qualidades positivas em meio às negativas. Tem como função inferior a extroversão em um modelo de funcionamento entre o amor e o ódio.

-Tipo Sentimento Extrovertido: neste tipo psicológico, o indivíduo consegue estabelecer uma relação adequada com os objetos exteriores, promovendo uma adaptação basicamente afetiva. É guiado pelos princípios afetivos e possui o sentimento bastante discriminado, sendo expansivo. Tendo a função inferior introvertida, tem dificuldades em relação ao raciocínio abstrato e pensamentos negativos quando só, pois propicia a introversão.

-Tipo Sentimento Introvertido: pessoa desse tipo é calma, retraída e silenciosa, motivada por sentimentos profundos, com um desenvolvido padrão de valores e discriminação. Possui influência moral e, embora não expresse externamente seus sentimentos, tende a ser rígido e às vezes não compreendido.

-Tipo Sensação Extrovertida: sujeito assim possui prazer na apreciação sensorial das coisas, com um agudo senso de realidade, sendo eficiente para lidar com as situações. Relaciona-se de modo prático e concreto com alta capacidade de perceber os objetos do mundo externo. Com sua função inferior, a intuição, possui dificuldades de perceber uma possibilidade de desenvolvimento com as mudanças. A atitude introvertida pode se manifestar com premonições negativas sobre si mesmo.

-Tipo Sensação Introvertida: este tipo caracteriza-se pela percepção dos acontecimentos internos e subjetivos, sintonizados com a sensação interna, despertada por um objeto ou fato com a percepção sensorial extremamente diferenciada. Com alta capacidade de apreender impressões provenientes dos objetos, preocupa-se muito com o próprio corpo e acredita que os outros podem ter alguma influência negativa sobre si.

-Tipo Intuição Extrovertida: indivíduo assim possui um feeling para as potencialidades do mundo externo, é inovador e sempre está empreendendo algo novo. Não suporta a rotina e situações estáveis. Raramente, percebe o que está acontecendo com o seu corpo.

-Tipo Intuição Introvertida: pessoa com este caráter é atraída por acontecimentos subjetivos, altamente solicitada pelo mundo interno e atrás de futuras possibilidades. Sua percepção da realidade objetiva é fraca e altamente indiscriminada, tornando-se desadaptada e podendo ter uma perda do contato com a realidade (Magalhães, 1984).

O modelo junguiano não tem como base oferecer uma análise precisa e direta, uma vez que se utiliza como objeto de observação o ser humano, compreendendo-o como singular e essencialmente dinâmico. Contudo, pode propiciar uma direção e oferecer suporte teórico para lidar de maneira mais adequada com tantos elementos psíquicos (Zacharias, 2003).

As diferentes disposições psíquicas diferenciam-se pelo modo de pensar, sentir e atuar diante de um objeto. A relação entre sujeito e objeto, em termos biológicos, constitui-se por meio de algum tipo de ajustamento que envolve modificações em sua relação, sendo esse ajustamento uma disposição típica, individual e peculiar do sujeito. Assim, o tipo de disposição (introversão ou extroversão) orienta o estilo de funcionamento psíquico do sujeito e propicia sua adaptação dentro de suas possibilidades (Jung, 1981).

Jung (1981) afirma que há indivíduos que possuem maior facilidade e capacidade para se ajustar em suas relações de acordo com sua disposição. Considerando que toda disposição teria uma causa inconsciente e instintiva, O autor afirma que, desde a tenra infância, seria possível reconhecer uma disposição típica predominante do sujeito, o qual seria fruto de sua natureza inconsciente. Tal ajustamento psicológico seria resultante da influência materna

 

Objetivos

O objetivo geral do presente artigo é identificar as características tipológicas em estudantes de Psicologia de uma Universidade particular situada na Grande São Paulo, de acordo com a abordagem junguiana. Para que fosse possível atingir o objetivo geral proposto, foram traçados como objetivos específicos: avaliar o perfil psicológico, por meio da tipologia proposta pela teoria junguiana em estudantes do curso de Psicologia das etapas inicial, intermediária e final da graduação; e comparar os resultados com vistas à identificação de possíveis diferenças apresentadas pelos acadêmicos.

 

Método

Participantes

Esta pesquisa contou com a participação de 200 graduandos do curso de Psicologia de uma Universidade situada na Grande São Paulo, com idade superior a 18 anos. Não foram controladas variáveis, como nível socioeconômico, origem e procedência, por não interferirem diretamente no objeto de estudo. No que se refere ao número de participantes na pesquisa por semestre e sexo, obteve-se, conforme a Tabela 1, a participação de 19,5% (N = 39) de graduandos do sexo masculino e 80,5% (N = 161) da participação de graduandos do sexo feminino, distribuídos nos semestres indicados.

Sobre o número de participantes por semestre, têm-se, aqui, quantidades representativas, as quais serão classificadas por categorias, como Alunos no início da graduação (iniciantes), Alunos no meio da graduação (medianos) e Alunos no final da graduação (concluintes). Os Alunos no início da graduação pertenciam aos 1º e 2º semestres e compuseram 48% (N = 96) de sujeitos na pesquisa. Já os Alunos no meio da graduação, pertencentes aos 3º, 4º e 5º semestres, consistiam de 20% (N = 40) do total de sujeitos. E os Alunos no final da graduação, pertencentes aos 8º, 9º e 10º semestres, perfizeram 32% (N = 64) do grupo.

Na Tabela 2, tem-se a porcentagem dos participantes por faixa etária, na qual é possível identificar 40,5% (N = 81) dos participantes tanto do sexo masculino quanto do feminino, com idades entre 21 a 30 anos, caracterizando a maior quantidade de sujeitos. De modo geral, observando a frequência dos participantes por faixa etária, têm-se 22% (N = 44) de sujeitos com até 20 anos de idade, 17,5% (N = 36) entre 31 a 40 anos, 13% (N = 26) entre 41 a 50 anos, 3% (N = 6) entre 51 a 60 anos e 3,5% (N = 7) não informaram a idade.

Instrumento

Para a realização da pesquisa, foi utilizado o QUATI, que avalia a personalidade dos indivíduos segundo o modelo junguiano. Esse Questionário possui 93 questões, sendo estas subdivididas em seis categorias (a festa, o trabalho, a viagem, o estudo, o lazer e aspectos pessoais), que expõem situações comuns, sendo que o colaborador tem duas alternativas (A e B) em cada questão, escolhendo, assim, apenas aquela que corresponde àquilo que ele faria ou não, avaliando as escolhas situacionais do sujeito. Em relação aos resultados, é possível a identificação da atitude predominante do sujeito (introversão e extroversão), das funções perceptivas (intuição e sensação) e das funções avaliativas (pensamento e sentimento). Por meio do QUATI, pode-se descrever o tipo psicológico a partir da função principal e a função auxiliar (Zacharias, 2003).

Em relação à validade e precisão de instrumentos psicométricos, Moraes e Primi (2002), em seus estudos, descrevem fatores como validade de constructo, validade de critério e precisão por consistência interna dos itens como tópicos de suma importância que confirmam a qualidade do QUATI em sua adequada operacionalização. Os autores, além de Souza e Castro (2008a, 2008b), indicam a relevância de novos estudos correlacionais com testes psicométricos, embora afirmem a credibilidade e compatibilidade entre as características de participantes submetidos ao QUATI com a tipologia junguiana, demonstrando, assim, a importância de tal instrumento e seus parâmetros psicométricos.

Procedimento

Após as permissões institucionais necessárias, iniciou-se o convite para a colaboração na pesquisa, sendo necessária a participação de estudantes do primeiro ao último anos, divididos por semestres, sendo excluso os do terceiro ano (5º e 6º semestres), pois estes iniciaram o estudo sobre o instrumento a ser utilizado e o conheciam. Vale destacar que os alunos que cursavam os 7º, 8º, 9º e 10º semestres foram incluídos na amostra por não conhecerem o QUATI, porque, devido a uma mudança curricular em andamento, tal instrumento não fazia parte do programa das disciplinas de avaliação psicológica até então.

O convite foi feito em cada semestre, solicitando a participação dos alunos para tal pesquisa, na qual a aplicação do QUATI aconteceu nas salas da Universidade, sendo disponibilizado pela Direção, para a aplicação coletiva em salas de aula e salas de supervisão da Clínica Psicológica. O levantamento de dados consistiu na apresentação do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), no qual cada estudante ficou ciente do entendimento, finalidade da pesquisa e conhecimento da aluna bolsista e do orientador, sem qualquer tipo de constrangimento para os participantes, formalizando que há a possibilidade de recusa de participação da pesquisa a qualquer momento, bem como real participação e sigilo profissional.

Após agendamento prévio com os sujeitos da pesquisa, iniciou-se a aplicação do QUATI. Foi entregue a cada sujeito de pesquisa um exemplar do QUATI e o TCLE, com instruções dadas pela aluna bolsista. Para a realização do QUATI cada aluno recebeu um caderno com perguntas, uma folha de repostas e o TCLE mediante explicação da aluna bolsista. Com o término do QUATI, foram recolhidos, de cada participante, o caderno de perguntas, a folha de respostas e uma via do TCLE, explicando também que, ao final da correção e análise, haveria uma devolutiva dos dados por escrito ou pessoalmente, com agendamento prévio, para aqueles que assim desejassem. Os sujeitos foram avisados sobre a possibilidade de receberem a devolução dos dados levantados no teste. Nesse caso, deveriam indicar um e-mail para contato com a aluna bolsista. Com a finalização da coleta de dados, o próximo passo consistiu no tratamento estatístico, análise e interpretação dos dados obtidos. preferencialmente do sexo masculino.

 

Apresentação e discussão dos resultados

Para descrever o perfil sociodemográfico e psicológico da amostra, foram feitos gráficos e tabelas de frequência com valores de frequência absoluta (N) e relativa (%) das variáveis categóricas observadas, como faixa etária, sexo, atitude, função principal, função auxiliar e perfil psicológico.

Perfil sociodemográfico da amostra

Os dados obtidos possibilitaram uma análise sobre o perfil sociodemográfico dos participantes da pesquisa. Os dados sobre frequência de participantes por sexo e por idade podem sugerir um perfil sociodemográfico característico da amostra escolhida, mas também apontar para aspectos relacionados à escolha vocacional/profissional.

Verificou-se que 40,5 % dos participantes na pesquisa possuem suas idades entre a faixa etária dos 21 aos 30 anos, período no qual, geralmente, acontece a formação profissional em Ensino Superior. Observouse um percentual significativo de participantes do sexo feminino em todos os semestres na pesquisa, o que indica uma predominância do sexo feminino na escolha e formação do curso de Psicologia, fato observado ao longo da história da área.

Para Campos (2005), a predominância de universitários do sexo feminino em diferentes cursos de graduação pode estar ligada à expansão da mulher no mercado de trabalho e também à mudança de perfil das profissões que são ou eram consideradas

Tipologia psicológica

Para a comparação das variáveis categóricas, como atitude, função principal, função auxiliar e perfil entre os grupos de semestres (iniciantes, medianos e concluintes), utilizaram-se os testes Qui-Quadrado ou exato de Fisher (para valores esperados menores que 5), sendo o nível de significância adotado para os testes estatísticos de 5% (p < 0,05).

A tipologia psicológica vem sendo utilizada por diferentes áreas do conhecimento, como instrumento teórico, a fim de identificar, descrever e nortear perfis de personalidade. O QUATI, como instrumento de avaliação, também tem sido utilizado tanto como recurso principal quanto auxiliar em pesquisas sobre a avaliação do perfil de estudantes universitários.

Na pesquisa realizada por Miguel e Noronha (2006) com uma pequena amostra de estudantes de Psicologia, objetivando verificar a correlação entre os instrumentos MSCEIT, que avalia a inteligência emocional, e o QUATI, o tipo psicológico, buscou-se traçar um estudo exploratório, levantando dados científicos significativos correlacionais que possam assegurar algum tipo de relação entre alguns aspectos da inteligência emocional e da personalidade desses estudantes, sugerindo uma relação entre o funcionamento cognitivo com aspectos emocionais. Já na pesquisa realizada por Homsi (2006), em estudantes das áreas de Humanas, Exatas e Biológicas,

foram utilizados o QUATI e o Questionário sobre estilos de pensar e criar, com o objetivo de verificar se há relações significativas entre os tipos de temperamento e os estilos de pensar e criar dos estudantes universitários.

Este estudo pôde indicar que não existem diferenças significativas entre temperamento e estilos de pensar e criar, evidenciando a utilização do QUATI como instrumento identificatório da adequação e maturidade dos futuros profissionais que podem vir a ser.

Aspectos psicológicos observados nos participantes

Os dados obtidos possibilitaram uma breve análise de aspectos psicológicos encontrados nos participantes por meio do QUATI. Cabe aqui destacar que as atitudes e funções levantadas não indicam um perfil, mas, sim, características tipológicas observadas como componentes da personalidade.

Como se pode notar na Tabela 3, após a análise estatística para comparação dos resultados entre os três grupos por meio do teste Qui-Quadrado, obteve-se valor X2 = 2,48 com p = 0,289, revelando que não existem diferenças estatisticamente significativas quando se analisa a Atitude entre os grupos de iniciantes, medianos e concluintes. Observou-se que as Atitudes Extroversão e Introversão, como bases estruturantes do funcionamento da personalidade, obtiveram valores muito aproximados entre os participantes da amostra, como Extrovertido (N = 105) e Introvertido (N = 95), que não podem apontar isoladamente para uma Atitude predominante ou característica principal dos participantes da pesquisa.

No estudo comparativo realizado por Campos (2005) sobre as características psicológicas em universitários e seus respectivos cursos, a maioria dos universitários participantes de diferentes cursos obteve como atitude básica a Extroversão, como no presente estudo. Para autora, a atitude básica predominante pode ser analisada tanto quantitativa quanto qualitativamente, sugerindo que tal aspecto psicológico pode ser encontrado em cursos das áreas de Humanas, Exatas e Biológicas, inclusive na Psicologia, em que a atitude Introversão deveria ser preferencial como traço de personalidade característico da profissão.

Pagotti e Gomide (2009), em seu estudo sobre os tipos psicológicos dos universitários das áreas de Saúde, Exatas, Jurídicas e Sociais e as possíveis correlações entre os tipos e a escolha do curso, identificaram que a Extroversão obteve maior incidência entre todos os universitários das diferentes áreas observadas. Pautados no Instrumento Classificador de Temperamentos, que pode sugerir 16 tipos psicológicos, semelhante à base teórica do QUATI, os autores afirmam que há o predomínio do tipo Extrovertido sobre o tipo Introvertido em qualquer área do conhecimento. Porém, segundo eles, os tipos Extrovertido e Introvertido podem se aproximar quando a variável intuição está presente, indicando alguns aspectos similares entre os tipos.

Com o objetivo de apontar correlações entre a inteligência emocional e os tipos psicológicos de universitários de Psicologia, Miguel e Noronha (2006) afirmam que, quanto ao sexo dos estudantes participantes da pesquisa, não houve diferenças significativas entre as atitudes analisadas pelo QUATI, mas apenas mais respostas associadas à atitude Extrovertida do que em relação à atitude Introvertida.

A Tabela 4 evidencia os valores obtidos para cada função principal dos grupos de Semestres por meio do teste Qui-Quadrado com significância de X2 = 12,39 e p = 0,054. Os dados obtidos para cada função principal revelam novamente que, assim como não há uma Atitude característica, também não há uma função consciente característica nos graduandos de Psicologia, mas valores predominantes que indicam maior incidência da função sentimento nos três grupos.

Corroborando tal informação, ainda no mesmo estudo comparativo dos tipos psicológicos e profissões de Campos (2005), a função sentimento obteve maior porcentagem como função principal nos estudantes de Psicologia participantes da pesquisa. Esse dado demonstra que grande parte dos universitários de Psicologia ou de outros cursos, pertencentes ou não à área da Saúde, possui como atitude consciente racional mais desenvolvida o sentimento, utilizando como juízo de valor a afetividade, mais do que qualquer outro tipo de função.

Para Pagotti e Gomide (2009), não há uma única função principal ou auxiliar característica dos diversos cursos e áreas observados em seu estudo, mas a predominância da função sensação como a percepção da realidade de modo prático e realista.

Nota-se, na Tabela 5, uma aproximação dos dados obtidos entre cada função inconsciente observada, indicando a presença dos quatros tipos de funções auxiliar nos grupos de semestre, o que sugere a existência das funções, mas não uma função auxiliar característica dos grupos. Nessa categoria, obteve-se, por meio do teste Qui-Quadrado, a significância de X2 = 8,38 com p = 0,212.

Campos (2005) também aponta que a função sensação também se destacou entre os diferentes cursos de graduação observados. Porém, no presente estudo, esse pode ser um aspecto psicológico considerável, no qual alguns dos estudantes, inclusive os de Psicologia, possuem como atitude inconsciente irracional menos desenvolvida a sensação, percebendo o mundo e o outro pelos órgãos sensoriais.

Perfil psicológico observado nos participantes

Perfil psicológico é a integração de alguns aspectos psicológicos da personalidade. Este, segundo o modelo junguiano, é constituído a partir da atitude básica mais desenvolvida pelo sujeito, seja ela a Extroversão ou a Introversão, e também das funções (principal e auxiliar) mais e menos desenvolvidas pelo sujeito, sendo elas: pensamento, sentimento, sensação e intuição (Jung, 1981).

A atitude básica predominante e as funções mais utilizadas definem o tipo habitual de funcionamento psíquico do indivíduo. A atitude refere-se à energia investida pelo sujeito, seja ao mundo externo (sociedade) ou interno (consigo), e as funções conscientes e inconscientes referem-se à percepção das situações e relações do sujeito (Jung, 1981). A partir dos perfis psicológicos encontrados em cada grupo de semestre, é importante salientar que, para a descrição dos perfis que se seguem, tomou-se como base teórica o material técnico sobre o QUATI desenvolvido por Zacharias (2003).

Nota-se, na Tabela 6, que os estudantes iniciantes de Psicologia possuem como perfil psicológico predominante a Introversão, com a função principal sensação e auxiliar sentimento (I Ss St = 13,54% e N = 13) e também a Introversão com a função principal sentimento e auxiliar Intuição (I St In = 14,58% e N = 14).

Os sujeitos com perfil psicológico I Ss St são extremamente confiáveis, sensatos e capazes de aceitar responsabilidades que vão além de suas obrigações. Realistas e práticos com os fatos concretos, utilizam e lembramse de um grande número de fatos, dando grande importância à sua fidedignidade. Quando pensam sobre alguma situação qualquer, podem aceitar a responsabilidade deles para si. Vivem com intensidade suas reações de modo muito próprio, mostrando raramente suas emoções por meio de sua expressão facial e podendo parecer extremamente calmos. Perfeccionistas, diligentes e perseverantes, são capazes de trabalhar com afinco, sendo muito pacientes com procedimentos e pormenores. Dificilmente, entram impulsivamente em situações. Com sua observação cuidadosa, bondade, compassividade e diplomacia, demonstram um interesse genuíno em ajudar as pessoas. Precisos, organizados e conservadores, possuem o cuidado de conhecer todos os fatos necessários para apoiar suas avaliações e decisões. Possuem a tendência de comparar os problemas atuais aos que tiveram que enfrentar antes.

Já os sujeitos com o perfil psicológico I St In são calorosos e muito leais com os deveres e obrigações para com suas ideias e com aqueles que lhe são caros. Possuem uma visão sobre o mundo e a vida de modo extremamente pessoal, pensando e medindo todas as coisas a partir dos padrões fornecidos por suas ideias e valores pessoais. Expressam muito raramente seus sentimentos mais profundos de ternura. Demonstram uma aparência tranquila e reservada. Mostram-se geralmente tolerantes, abertos, compreensivos, flexíveis e adaptáveis. Valorizam as pessoas que se dão ao trabalho de tentar compreender seus valores e as metas que se propõem a alcançar. Possuem a capacidade de vislumbrar além do que está presente, óbvio e conhecido, sendo muito eficientes quando trabalham em algo que acreditam. Desejam que o trabalho que realizam, de alguma forma, possa contribuir para os demais. São muito perfeccionistas, quando alguma coisa lhes é cara e importante. Mostram muita curiosidade por ideias novas, boa capacidade de ver as coisas a longo prazo, boa capacidade de expressão e grande habilidade para convencer os outros quando querem comunicar algo com que estão entusiasmados. Podem ter dificuldades para encontrar um canal para expressar suas ideias, podendo se tornar extremamente sensíveis e vulneráveis com sua confiança e confiança na vida.

Como mencionado anteriormente, o QUATI pode ser utilizado como instrumento de avaliação psicológica juntamente com outros instrumentos que procuram analisar traços de personalidade e aspectos que compõem a estrutura de personalidade do indivíduo. Sabendo disso, buscou-se aqui, a partir dos materiais científicos encontrados e disponíveis acerca do tema, ou pelo menos com conteúdos pertinentes à presente pesquisa, descrever e analisar as possíveis características tipológicas de personalidade dos graduandos de Psicologia.

Os estudos de Bueno, Oliveira e Oliveira (2001) identificaram aspectos psicológicos de universitários primeiro-anistas de diferentes cursos, inclusive do curso de psicologia. Segundo os autores, diferentes traços de personalidade também podem estar relacionados a habilidades sociais, afirmando que a extroversão e a capacidade de dar abertura a novas experiências, como traços de personalidade, se correlacionam positivamente com a habilidade de enfrentamento e autoafirmação com risco. Essa afirmação contrapõe-se com o perfil encontrado dos alunos iniciantes de Psicologia, pois, diferentemente do traço de personalidade que pôde ser analisado na pesquisa dos autores, tais alunos se caracterizaram no perfil introvertido desta pesquisa como característico desses graduandos no estágio inicial da graduação.

No mesmo estudo realizado por Buento et al. (2001), a habilidade na expressão de afeto positivo correlacionou-se com os traços de personalidade que envolvem socialização e equilíbrio emocional. Tais aspectos psicológicos puderam ser descritos no perfil dos alunos iniciantes do curso de Psicologia da presente pesquisa, afirmando que estes são capazes de se adaptarem ao ambiente social e também terem equilíbrio sobre suas emoções. Tais aspectos observados nesses estudantes iniciantes pelos autores confirmam que, tanto esses estudantes podem apresentar esse perfil como também demonstrar diferentes habilidades concomitantes a alguns traços de personalidade.

Já os estudantes medianos e concluintes possuem como atitude básica predominante a extroversão, sendo que o perfil predominante dos medianos é extroversão com função principal sensação e auxiliar sentimento (E Ss St = 25,00% e N = 10), e dos concluintes é extroversão com função principal sentimento e auxiliar sensação (E St Ss = 21,88% e N =14).

Os sujeitos que possuem o perfil E Ss St são amistosos, adaptáveis e realistas. Buscam solução satisfatória, evitando tentar impor seus parâmetros pessoais ao mundo que os cerca. Tolerantes, principalmente consigo mesmos, têm a habilidade de aliviar situações tensas e conseguir que as partes em conflito cheguem a um acordo. São capazes de vislumbrar maneiras de se chegar a resultados, usando as regras e circunstâncias de maneira original. Possuem atenção voltada para as sensações e o momento presente. Demonstram interesse por novos objetos, novas paisagens, novas atitudes, tipos de comidas exóticas e diferentes, além de pessoas novas. São capazes de saber que tipo de ação um determinado momento exige e executá-la com precisão. Possuem a capacidade de conduzir com manejo habilidoso pessoas e conflitos. Conseguem absorver, aplicar e se recordar de um grande número de fatos, além de um gosto artístico apurado. Tomam decisões a partir de valores pessoais, transmitindo simpatia, cuidado no trato com as pessoas e interesse no contato humano. Alcançam melhor desempenho em provas práticas do que em exames escritos. Apreciam boa comida, roupas bonitas e confortáveis e atividade física, podendo nesta apresentar bom desempenho.

Já os sujeitos que possuem o perfil E St Ss irradiam calor humano e simpatia, pois sua atenção está voltada para as pessoas que os rodeiam, valorizando muito o contato humano. Geralmente, são amistosos, cheios de tato e capazes de entrar em sintonia com os outros. Mostram-se também perseverantes, conscienciosos e ordeiros, mesmo em assuntos de menor importância, e esperam que os outros também se comportem assim. Muito sensíveis a manifestações de aprovação, sofrem com a indiferença por parte dos que lhe estão próximos. Concordam com as opiniões alheias dentro dos limites do razoável e, quando confrontados com opiniões conflitantes, conseguem chegar a uma conclusão harmoniosa. Práticos e realistas, concentram-se bastante nas características únicas de cada experiência, apreciando e aproveitando aquilo que possui. Gostam de novidades e variedades, mas também são capazes de se adaptarem à rotina. Têm como qualidades notórias a compaixão e boa vontade com os outros. Suas decisões, geralmente, se baseiam em fatos comprovados e valores pessoais. Às vezes, podem tomar conclusões precipitadas, antes de terem compreendido a situação como um todo, agindo à sua maneira ao invés de pararem para pensar o que seria mais útil ou necessário. Possuem tendência em não admitir fatos desagradáveis com as pessoas e situações com as quais se sentem emocionalmente envolvidos.

Segundo Pagotti e Gomide (2009), o tipo psicológico que pode ser mais facilmente encontrado entre os universitários de diferentes áreas do conhecimento é o tipo extrovertido como tipo predominante dos acadêmicos. Tal afirmação dos autores demonstra a existência do perfil extrovertido, que pôde ser encontrado entre os universitários de Psicologia desta pesquisa, que se encontram no meio e na etapa final da graduação.

No estudo exploratório realizado por Campos (2005), o perfil predominante do universitário, independentemente do curso, também é o tipo extrovertido, com função auxiliar sentimento e secundária a sensação. Essa descrição do perfil dos universitários citada por Campos (2005) reafirma e indica novamente para o perfil extrovertido, agora acompanhado pelas funções sentimento e sensação (E St Ss), o que, na presente pesquisa, obteve maior incidência nos estudantes de Psicologia concluintes.

Em contraponto, os estudantes que estão no início da graduação não demonstraram o mesmo perfil dos medianos e concluintes, bem como não apresentaram também o perfil mais esperado para os graduandos de Psicologia ou de outras áreas do conhecimento, como o que pode ser apontado por Pagotti e Gomide (2009) e Campos (2005) como perfil predominante.

Ainda Pagotti e Gomide (2009) afirmam que, como atitude característica dos universitários, o tipo extrovertido, na maioria dos universitários, pode vir acompanhado da função sensação, caracterizando o perfil psicológico orientado mais para o mundo externo, ou seja, sua atenção está mais voltada para as pessoas e objetos que o cercam e direcionado, de modo perceptivo e avaliativo, pelas sensações obtidas pelos órgãos sensoriais, no contexto do "aqui e agora". Essa ressalva feita pelos autores também pôde ser observada nesta pesquisa, na qual um dos perfis encontrados nos estudantes medianos de Psicologia foi E Ss St, o que confirma a existência desse perfil e também, talvez, sua predominância de incidência nos universitários.

Para Zacharias (2003), há quatro tipos psicológicos que podem ser encontrados ou indicados para a profissão de psicólogo. São eles: I St In, I In St, E St In e E In St. Esses perfis podem ser indicadores também para outras áreas profissionais, principalmente referentes à área de Humanas, com ênfase na Saúde e também nas Artes. Diante dos perfis possíveis descritos por Zacharias (2003), nesta presente investigação, apenas um dos tipos psicológicos descritos pelo autor obteve incidência significativa: I St In, como um dos perfis típicos dos estudantes iniciantes.

Porém, como pôde ser observado nos dados obtidos, os perfis E St Ss e E Ss St também apresentaram certa relevância pela possibilidade de identificação e confirmação desses perfis, que puderam ser encontrados em outros universitários de Psicologia e de outros cursos. Analisando-se os dados obtidos juntamente com os estudos científicos, de acordo com os perfis encontrados, não há um único perfil predominante no estudante de Psicologia em formação, mas perfis diferenciados de acordo com o estágio do curso, que sugerem uma possível mudança de características psicológicas. Hipotetiza-se, diante desses dados, que a maturidade e o conhecimento técnico advindos do curso de Psicologia possam alterar alguns traços de personalidade avaliados pelo QUATI.

Para Campos (2005), a variação do perfil psicológico do estudante de Psicologia pode acontecer devido à possibilidade de outras funções, como o sentimento e a intuição, e também fazerem parte do perfil indicado para a profissão de psicólogo. Essa possibilidade de diversificação do perfil do estudante de Psicologia também pode ser observada neste estudo, no qual, nos perfis encontrados, as funções sentimento e intuição apareceram. Todavia, essa diversificação de perfis em graduandos de Psicologia pode ocorrer também pela demanda da sociedade por profissionais da área que cada vez mais têm ampliado seu campo de atuação, atingindo, assim, mais pessoas e ramos profissionais (Campos, 2005). Conforme exposto por Campos (2005), tal questionamento sugere que a diversificação dos perfis que podem ser encontrados no estudante de Psicologia se dê pela ampliação das áreas de trabalho que o psicólogo vem ocupando, o que parece pedir essa diversidade de perfis psicológicos, que na presente pesquisa, também puderam ser observados.

Segundo Zacharias (2003), há profissões que podem ser mais encontradas em um perfil psicológico específico. O autor afirma que tais tipos podem ser indicadores para a escolha profissional, direcionando, possivelmente, a probabilidade de uma escolha de acordo com os traços de personalidade do sujeito. Campos (2005) ressalta que a diferenciação entre as características psicológicas e a profissão escolhida, ou seja, a não complementaridade entre o perfil psicológico e a profissão desejada ou escolhida, pode trazer frustração para o futuro profissional, bem como para as pessoas que necessitam de seus serviços.

Diante da análise dos resultados obtidos, percebeu-se a possibilidade de diferentes perfis que podem ser encontrados nos graduandos de Psicologia desta pesquisa e em outros estudos. No entanto, os estudos feitos até o presente momento descrevem o perfil que pode ser característico dos universitários desta pesquisa, porém não descrevem o perfil do graduando de Psicologia como aquele passível de transformações, mudanças e, principalmente, de maturação psicológica.

O QUATI, como instrumento de avaliação desta pesquisa, foi aplicado nos estudantes de Psicologia em diferentes estágios da graduação. Essa preocupação em obter dados relevantes em cada etapa da graduação teve como objetivo verificar a existência do perfil característico do estudante de Psicologia em determinada fase, sabendo que, quando esse instrumento é aplicado na mesma pessoa em diferentes momentos da vida, pode apresentar pequenas mudanças em alguns traços de personalidade. Os diferentes perfis obtidos nos estudantes de Psicologia participantes desta pesquisa corroboram a hipótese de que o perfil psicológico pode passar por uma maturação, em maior ou menor escala em cada período da graduação desses estudantes, o que aponta para o desenvolvimento emocional no decorrer do curso.

Ressalta-se aqui, também, que os dados obtidos podem indicar que as atitudes predominantes não devem ser utilizadas isoladamente, como orientação de possíveis perfis, pois estas, por vezes, se complementam e vão integrando de modo peculiar cada tipo psicológico e cada perfil característico de suas funções.

Por último, tem-se aqui a identificação do perfil psicológico dos estudantes de Psicologia, ou suas características tipológicas em suas diferentes etapas da graduação, o que demonstra a possibilidade de descrição e também de compreensão de quem é o estudante que cursa Psicologia e como ele poderá vir a ser como futuro psicólogo.

 

Considerações Finais

Esta pesquisa teve como objetivo identificar e descrever o perfil psicológico do estudante de Psicologia em plena formação. Buscou-se, aqui, analisar, em diferentes etapas da graduação, as características tipológicas mais evidentes, observando os dados expressos por estudantes que estão no início, meio e final da graduação. Os dados analisados na presente reflexão sugerem que, a partir da amostra observada, há diferentes perfis psicológicos, porém ocorre a ausência de um perfil característico, ou seja, predominante e único no graduando de Psicologia em todos os semestres. Tais reflexões podem inferir, então, a possibilidade de amadurecimento psicológico desses estudantes e também a diversificação do perfil decorrente do amplo campo de atuação que a Psicologia tem conquistado.

Tendo-se como base a identificação e a análise das atitudes e funções encontradas entre os estudantes de Psicologia, estas, quando analisadas separadamente, não possuem diferenciação significativa, demonstrando, assim, a importância da identificação de um perfil somando suas variáveis, e não apenas na descrição de alguns traços que podem indicar um possível perfil. Ressalta-se, aqui, a possibilidade de não haver um único perfil predominante no estudante de Psicologia, pelo fato da identificação de diferentes perfis que, ao mesmo tempo, se aproximam pelas funções psíquicas atuantes, apresentando suas atitudes como aspectos que o diferenciam.

Apesar disso, foi possível observar um perfil quando o período do curso foi considerado, conjeturando-se a possibilidade de mudança de perfil durante o curso e levando os acadêmicos a um amadurecimento necessário e exigido durante a formação.

O QUATI, empregado como instrumento base da pesquisa, possibilitou a verificação dos perfis, de modo prático e também preciso, sem pecar pela facilidade de obter aspectos psicológicos tão complexos do ser humano, demonstrando confiabilidade em sua utilização e também a possibilidade de seu uso em futuras pesquisas.

Por fim, o desenvolvimento desta pesquisa pode contribuir na compreensão de alguns aspectos da personalidade do graduando de Psicologia, revelando sua complexidade e diversidade dos tipos psicológicos. Cabe ressaltar que os dados ora apresentados e discutidos referem-se à realidade de uma Universidade privada situada na Grande São Paulo, não sendo possível, com as informações expressas, articular generalizações.

Entretanto, surgem novas indagações a respeito da tipologia psicológica observada em estudantes universitários, tais como: identificação de possível diferença no perfil expresso por estudantes de universidades públicas e privadas ou verificação de possíveis relações entre o curso escolhido e um perfil tipológico definido. Ao considerarmos os alunos do curso de Psicologia, poder-se-ia investigar se a escolha da área de atuação (clínica, trabalho ou escolar, entre outras) estaria relacionada a um determinado tipo psicológico ou, até mesmo, se a identificação com alguma abordagem teórica poderia estar ligada à constituição tipológica dos alunos e egressos do curso de Psicologia.

Enfim, muitos estudos com esse tema podem ser desenvolvidos, com o QUATI e também com outros instrumentos de avaliação psicológica, pois compreender a realidade psíquica dos acadêmicos dos cursos proporcionará rico material para planejamento e articulação dos conteúdos, estratégias de ensino e vivências práticas que possam estar mais condizentes com o funcionamento psíquico dos acadêmicos, utilizando seus recursos próprios para o desenvolvimento das habilidades e competências necessárias à boa formação na área que escolheram.

 

Referências

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Recebido: 17/10/2011
Aceito: 07/03/2012

 

 

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