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Gerais : Revista Interinstitucional de Psicologia

versión On-line ISSN 1983-8220

Gerais, Rev. Interinst. Psicol. vol.15 no.1 Belo Horizonte ene./jun. 2022

http://dx.doi.org/10.36298/gerais202215e17446 

ARTIGOS

 

Pessoas vivendo com HIV/Aids: estudo sobre coping religioso, resiliência e qualidade de vida

 

People living with HIV/AIDS: study on religious coping, resilience, and quality of life

 

 

Hérica Landi de BritoI; Eliane Maria Fleury SeidlII

ICentro Universitário Alves Faria, Goiânia, Brasil. E-mail: herica_lb@hotmail.com. (orcid.org/0000-0002-0629-5634)
IIUniversidade de Brasília, Brasília, Brasil. E-mail: seidl@unb.br. (orcid.org/0000-0002-1942-5100)

 

 


RESUMO

Estudos apontam que resiliência e estratégias de enfrentamento, em especial na dimensão religiosa e/ou espiritual, são fatores que permitem a pessoas com HIV/Aids se adaptarem à soropositividade e obterem melhor qualidade de vida (QV). O estudo teve como objetivo investigar preditores da percepção da QV, considerando variáveis sociodemográficas, médico-clínicas, estratégias de coping religioso e resiliência. Participaram 200 pessoas soropositivas (105 homens), com média de idade igual a 39 anos (DP=10,9). Os instrumentos foram: questionário sobre aspectos sociodemográficos e médico-clínicos, Escala Breve de Enfrentamento Religioso, Escala de Avaliação da Resiliência e o WHOQOL-HIV Bref. Na análise de regressão múltipla, os preditores da QV foram: resiliência (b= 0,29; p£ 0.001), escolaridade (b= 0,20; p£ 0,01) e coping religioso negativo (b= -0,22; p£ 0,001). Os resultados confirmaram o papel importante que resiliência e coping religioso podem ter no processo de superação de adversidades relacionadas ao HIV/Aids, com implicações nas práticas profissionais nessa área.

Palavras-chave: Pessoas vivendo com HIV/Aids. Resiliência. Coping religioso. Qualidade de vida.


ABSTRACT

Studies show that resilience and coping strategies, especially in their religious and / or spiritual dimension, are factors that allow people with HIV/Aids to adapt to seropositivity and have a better quality of life (QoL). The study aimed to investigate predictors of QoL perception, considering sociodemographic, medical-clinic variables, religious coping strategies and resilience. Two hundred HIV-positive people (105 men) participated with a mean age of 39 years (SD = 10.9). The instruments were: Questionnaire on sociodemographic and clinical-medical aspects; Brief Scale of Religious Coping; Resilience Assessment Scale and WHOQOL-HIV Bref. In the multiple regression analysis, the predictors of QoL were: resilience (b= 0,29; p£ 0.001), schooling (b= 0,20; p£ 0,01) and negative religious coping (b= -0,22; p£ 0,001). The results confirmed the important role that religious coping and resilience can play in overcoming adversities related to HIV /Aids, with implications for professional practices in this area.

Keywords: Persons living with HIV/AIDS. Resilience. Religious coping; Quality of life.


 

 

Com o advento da terapia antirretroviral (TARV), que se tornou disponível em 1996 no Sistema Único de Saúde (SUS), a Síndrome da Imunodeficiência Adquirida (Aids) transpôs a característica de enfermidade eminentemente letal para uma doença crônica e controlável. Como consequência, observou-se um declínio notável da morbidade secundária por doenças oportunistas e da mortalidade por Aids, ocasionando um aumento significativo da expectativa de vida com boas condições de saúde (Casotti, Passos, Oliveira, & Cerutti, 2011).

O Brasil, desde o início da epidemia, em 1980, até junho de 2016, alcançou 842.710 casos registrados da doença. Nos últimos cinco anos, o país tem registrado anualmente uma média de 41,1 mil casos novos de Aids. A taxa de detecção da infecção no Brasil tem apresentado estabilização nos últimos dez anos: a taxa de incidência apresenta uma média de 20,7 casos para cada 100 mil habitantes, de acordo com dados do Boletim Epidemiológico do Ministério da Saúde (Brasil, 2016). Desde o início da epidemia (1980) até dezembro de 2015, foram identificados 303.353 óbitos tendo como causa básica a Aids.

Diante dos avanços do tratamento, novas questões psicossociais tornaram-se presentes para as pessoas infectadas pelo HIV, merecendo destaque: a manutenção e/ou reconstrução dos objetivos pessoais, da situação profissional e dos relacionamentos interpessoais; a vivência da sexualidade, da conjugalidade, da paternidade/maternidade com parceiros com sorologia igual ou diferente; a configuração da rede social de apoio no contexto da soropositividade (Seidl & Faustino, 2014). Dessa forma, a evolução crônica da infecção pelo HIV, bem como o tratamento medicamentoso contínuo e prolongado, tem implicações médicas, psicológicas e sociais complexas que se apresentam em momentos diversos, desde o diagnóstico até outras fases do tratamento, que repercutem em domínios da qualidade de vida (QV) de pessoas vivendo com HIV/Aids (PVHA) (Dalmida, Koenig, Holstad, & Thomas, 2015; Reis, Santos, Dantas, & Gir, 2011).

A Organização Mundial da Saúde (OMS) define QV como a "percepção do indivíduo sobre sua posição na vida, no contexto da cultura e dos sistemas de valores nos quais ele vive em relação aos seus objetivos, expectativas, padrões e preocupações" (WHOQOL Group, 1994, p. 28). Trata-se de uma conceituação multidimensional e abrangente que se refere à percepção de aspectos das dimensões física, psicológica, sexual, espiritual e socioambiental. Estudos concluem que muitas PVHA preservam sua QV e seu bem-estar psicológico, fazendo uma autoavaliação positiva, tendo por base a vivência de sua condição crônica (Gaspar et al., 2010; Meirelles et al., 2010). Assim, apesar dos desafios biopsicossociais associados ao HIV/Aids, pessoas soropositivas conseguem evitar e superar eventuais efeitos negativos da doença sobre suas vidas (Vance, Brennan, Enah, Smith, & Kaur, 2011).

Ao lado do tema qualidade de vida, autores têm apontado a resiliência - processo que ocorre quando um indivíduo é confrontado com adversidades ou exposto a ameaças para a saúde física ou psicológica, mas é capaz de superar e/ou se adaptar às mesmas - como um dos construtos que esclarecem o porquê de pessoas sobreviverem e alcançarem o bem-estar em suas vidas (De Santis, Florom-Smith, Vermeesch, Barroso, & DeLeon, 2013; Wiegers, 2008). Um dos fatores mencionados na literatura, que pode contribuir para a promoção de resiliência de PVHA, é a religiosidade (Calvetti, Muller, & Nunes, 2008). Estudos têm ressaltado a importância de crenças e práticas religiosas como estratégias de enfrentamento a estressores do contexto de vida de PVHA, pois muitas lidam com dificuldades decorrentes da condição crônica a partir de sua dimensão religiosa, e esta se constitui em um dos aspectos presentes no processo de resiliência (Carvalho, Morais, Koller, & Piccinini, 2007). O fator religiosidade/espiritualidade, especificamente, tem sido indicado em pesquisas como um aspecto protetor de saúde e de promoção da qualidade de vida, na medida em que influencia tanto o desenvolvimento de estratégias de coping quanto os processos de resiliência relacionados à adaptação à soropositividade (Calvetti et al., 2008).

Nesse sentido, o processo pelo qual as pessoas, por meio de sua religião, tentam entender e/ou lidar com exigências pessoais ou situacionais em suas vidas é denominado de coping religioso (Pargament, 1997). Portanto, essa modalidade de coping se refere ao uso da fé/espiritualidade e de crenças religiosas para facilitar a solução de problemas e prevenir ou aliviar as consequências emocionais negativas das circunstâncias de vida percebidas como estressantes. As estratégias de coping religioso podem ser classificadas em positivas e negativas no que tange aos efeitos sobre as pessoas que as utilizam. De acordo com Pargament, Smith, Koenig e Perez (1998), o padrão de coping religioso positivo (CRP) é expressão da crença de que existe um sentido maior a ser encontrado na vida e de um senso de conectividade espiritual com os outros. Seus métodos abrangem estratégias que proporcionam efeitos benéficos na pessoa, como buscar apoio espiritual; resolver problemas em colaboração com Deus; redefinir o estressor de forma benevolente; perdoar e ser perdoado; orar/rezar pelo bem-estar dos outros e buscar ajuda de membros da instituição religiosa.

Em contraste, o padrão negativo reflete uma relação menos segura com Deus, senso de desconectividade com a comunidade religiosa, visão de mundo ameaçadora e um esforço religioso para encontrar e conservar o significado da vida. As estratégias de coping religioso negativo (CRN) envolvem, por sua vez, aquelas que geram consequências prejudiciais ao indivíduo e sugerem a presença de estresse emocional, como questionar a existência, o amor e os atos de Deus, presença de conflitos interpessoais com membros do grupo religioso, delegar a Deus a resolução dos problemas e redefinir o estressor como punição divina (Pargament et al., 1998).

Tais estratégias de coping religioso têm sido associadas a variáveis para o ajustamento a eventos críticos da vida. Enquanto as estratégias positivas apresentam associação à melhor saúde física e mental, melhor QV percebida, crescimento psicológico e espiritual, menores níveis de estresse e de sintomas psiquiátricos como resultado do manejo da condição estressora, as negativas associam-se à depressão, pior QV percebida e saúde psicológica e/ou física, além de maior nível de estresse (Pargament, Koenig, Tarakeshwar, & Hahn, 2004). Resultados de pesquisas indicaram que pessoas soropositivas utilizam estratégias de coping religioso, ressaltando a sua importância como recurso de enfrentamento a estressores relacionados ao viver com HIV/Aids (Joshi & Kumari, 2009; Pargament et al., 2004; Tsevat, 2006; Trevino et al., 2010). Frente à constatação de que a religiosidade pode desempenhar um papel relevante no enfrentamento adaptativo a situações de estresse (Tsevat et al., 2009; Dalmida et al., 2015), destaca-se a necessidade de estudos que elucidem melhor a influência do coping religioso no ajustamento, sendo que pouca atenção tem sido dada ao papel dessa modalidade de enfrentamento na QV de PVHA, sobretudo em amostras brasileiras. Além disso, a maioria das pesquisas em HIV/Aids tem investigado o impacto negativo da infecção no comprometimento de aspectos psicossociais, enquanto igual atenção não tem sido dada à investigação de fatores - como resiliência -, que podem contribuir para o desenvolvimento de respostas positivas para a QV (Medeiros & Saldanha, 2012).

O objetivo do estudo foi investigar preditores da percepção da qualidade de vida, considerando variáveis sociodemográficas, médico-clínicas, estratégias de coping religioso e resiliência em PVHA. A relevância da pesquisa deve-se à necessidade de aprofundar conhecimentos acerca da influência do coping religioso e da resiliência na qualidade de vida de pessoas soropositivas para a estruturação de modelos de atendimento direcionados a essa população, visando à atenção integral e interdisciplinar em HIV/Aids.

 

Método

Trata-se de pesquisa quantitativa, de corte transversal, de caráter correlacional e preditivo, com utilização de técnicas descritivas e inferenciais de análise de dados.

Participantes

A amostra foi composta de 200 pacientes diagnosticados com HIV/Aids, de ambos os sexos, adultos, acompanhados em um serviço público especializado de uma cidade do estado de Goiás. O número de participantes decorreu da quantidade de variáveis investigadas e das modalidades de análises inferenciais previstas.

Os critérios de inclusão dos participantes foram: (a) participação voluntária com assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE); (b) ter diagnóstico de infecção pelo HIV; (c) idade igual ou acima de 18 anos e inferior a 65 anos (devido às comorbidades que podem existir em idades mais avançadas, além da baixa prevalência de pessoas HIV positivas com mais de 65 anos); (d) ter condições para responder aos instrumentos de autorrelato, sozinho ou com ajuda de pesquisador treinado. Constituíram fatores para exclusão da participação no estudo: (a) pacientes analfabetos ou incapazes de compreender e responder aos instrumentos sozinhos ou com a ajuda do pesquisador; (b) ter diagnóstico psiquiátrico. A seleção dos participantes foi feita por conveniência.

Instrumentos

Questionário sociodemográfico e médico-clínico. Elaborado para o estudo referente aos seguintes aspectos: (1) sociodemográficos: sexo, idade, escolaridade, situação conjugal, situação empregatícia, renda familiar, número de filhos, crenças e práticas religiosas; (2) condição médico-clínica que incluiu: tempo de diagnóstico, uso de terapia antirretroviral (TARV), autoavaliação da adesão ao tratamento antirretroviral, percepção do estado atual de saúde, níveis de linfócitos T CD4 (número de células de defesa do organismo por milímetro cúbico de sangue), carga viral plasmática (medida pela quantidade de cópias virais por mililitro de sangue periférico). Esses últimos dados foram obtidos do prontuário do paciente referentes aos exames mais recentes.

Escala Breve de Enfrentamento Religioso. Baseada na BriefRCOPE desenvolvida por Pargament, Koenig e Perez (2000), traduzida para a língua portuguesa e analisada fatorialmente por Faria e Seidl (2006) em uma amostra de pacientes soropositivos, com o objetivo de avaliar a utilização da religiosidade no processo de coping. A versão brasileira, tal como a norte-americana, é composta de dois fatores, com sete itens cada um e avaliados por uma escala Likert de 4 pontos (1 = nunca; 4 = quase sempre): (1) coping religioso positivo - CRP (alpha=0,87): religiosidade como fonte de amor, cuidado, força, ajuda, purificação e ressignificação positiva do estressor; (2) coping religioso negativo - CRN (alpha=0,71): religiosidade como fonte de conflito intra e/ou interpessoal, sentimentos de culpa e punição, insegurança e ressignificação negativa do estressor. O participante foi orientado a responder ao instrumento em relação à condição de soropositividade no momento atual. No presente estudo, as escalas de CRP e CRN apresentaram boa consistência interna: alphas iguais a 0,83 e 0,74, respectivamente.

Escala de Avaliação de Resiliência (EAR). Instrumento de avaliação da resiliência elaborado e validado no contexto brasileiro por Martins, Siqueira e Emilio (2011), possui 32 itens; define resiliência como a habilidade do ser humano de ter êxito diante das adversidades da vida, superá-las e ser fortalecido ou transformado por elas. As dimensões de resiliência na EAR são: (a) F1 - aceitação positiva de mudanças, 10 itens (alpha=0,84), adaptação ou aceitação positiva de mudanças, definida como o reconhecimento de que mudanças e situações difíceis podem oferecer oportunidades de crescimento; (b) F2 - espiritualidade, 6 itens (alpha = 0,90), definida como a crença ou o sentimento de dependência de algo metafísico ou transcendental que oferece sentido à vida, de que algo sobrenatural exerce controle sobre a vida e seus acontecimentos; (c) F3 - resignação, 7 itens (alpha = 0,73), conceituada como a sujeição passiva diante dos acontecimentos negativos da vida, índices mais elevados nesse fator implicariam diminuição da capacidade de superação humana; (d) F4 - competência pessoal, 5 itens (alpha = 0,72), considerada o conhecimento das próprias capacidades e potencialidades e de seus limites; (e) F5 - persistência diante de dificuldades, 5 itens (alpha = 0,78), que dizem respeito a suportar os eventos adversos e/ou as situações difíceis, com confiança e perseverança (Emilio & Martins, 2012). As respostas são dadas em escala Likert de cinco pontos (0 = nunca é verdade; 4 = sempre é verdade). O alpha de Cronbach da escala original total foi igual a 0,83 e 0,77 para a amostra do presente estudo, sendo que os alphas dos cinco fatores variaram de 0,48 a 0,74. Como o melhor alpha observado foi o da escala completa (0,77), optou-se por trabalhar o construto de forma unifatorial.

Questionário WHOQOL-HIV Bref. Instrumento de avaliação de QV para PVHA, desenvolvido pela OMS, em versão brasileira validada por Zimpel e Fleck (2005). É constituído por 31 itens, distribuídos em seis domínios: físico, psicológico, nível de independência, relações sociais, meio ambiente e aspectos espirituais/religião/crenças pessoais. Permite avaliar ainda duas dimensões relacionadas à percepção individual do paciente sobre sua qualidade de vida e satisfação com a saúde. As questões são individualmente pontuadas em uma escala Likert de cinco pontos e escores mais altos indicam melhor qualidade de vida percebida. Como não se encontrou um índice que abrangesse todas as questões do instrumento, comparável ao índice total que foi computado para a escala de enfrentamento religioso e para a EAR, foi calculado um índice total para o instrumento WHOQOL-HIV Bref por meio da seguinte fórmula: QV total = média (dom1, dom2, dom3, dom4, dom5, percepção geral da QV e satisfação com a saúde), mantendo a sintaxe original de cada um, conforme sugerido por Panzini (2004). Computou-se, também, o valor de alpha de Cronbach para medir a consistência interna de cada domínio no presente estudo: obteve-se alpha de Cronbach de 0,92 para os 31 itens do WHOQOL-HIV Bref e valores 0,60 nos domínios do instrumento.

Procedimentos de Coleta de Dados

O projeto de pesquisa foi submetido ao Comitê de Ética em Pesquisa do Instituto de Ciências Humanas da Universidade de Brasília (UnB) e ao Comitê de Ética do hospital onde os dados foram coletados, segundo a Resolução 466/12 do Conselho Nacional de Saúde, tendo sido aprovado por ambos mediante os pareceres 993.672 e 1004386, respectivamente.

A fim de testar a adequação dos instrumentos, foi realizada uma aplicação piloto em cinco pacientes soropositivos, acompanhados em uma unidade do Sistema Único de Saúde, localizada em Brasília/DF. Diante da constatação acerca da necessidade de adequação da sequência dos instrumentos e de itens do questionário, mudanças foram efetuadas para se proceder à coleta definitiva.

Os pacientes foram convidados pela pesquisadora responsável e por uma auxiliar de pesquisa (psicóloga previamente treinada pela própria pesquisadora) no ambulatório de um hospital de uma cidade do estado de Goiás, enquanto aguardavam a realização de algum procedimento (exames laboratoriais, consulta médica e/ou atendimento psicológico) ou quando estavam no serviço para a busca de medicamentos na farmácia. Os participantes foram informados acerca da natureza e dos objetivos do estudo, o caráter voluntário de sua participação, o não recebimento de incentivo financeiro e o sigilo de sua identidade. Em caso de resposta afirmativa foi solicitado que assinassem, antes da aplicação dos instrumentos, o TCLE que formaliza a concordância em participar voluntariamente. Foi assegurada aos participantes a manutenção dos atendimentos e/ou outros serviços realizados no hospital, bem como a possibilidade de retirada do consentimento a qualquer momento, sem ônus para a sua pessoa e prejuízo na sua relação com a instituição onde era atendido e acompanhado.

A aplicação dos instrumentos foi individual, em um único encontro de aproximadamente 60 minutos. Assegurando-se que as instruções foram devidamente compreendidas, o instrumento foi autoaplicado e os participantes responderam a ele mediante aplicação assistida. Também foram acessados os prontuários dos pacientes para a coleta de dados referentes aos marcadores biológicos, como exames mais recentes de carga viral e contagem de linfócitos T CD4.

Apesar de a pesquisa não oferecer risco imediato aos participantes, considerou-se a possibilidade de um risco subjetivo, pois algumas perguntas dos instrumentos remetiam à autoavaliação de comportamentos, história de vida e infecção pelo HIV, além de investigar aspectos diversos como qualidade de vida, coping e resiliência. É importante ressaltar que, sempre que necessário, deve-se oferecer apoio psicológico a pacientes vulneráveis não apenas por sua condição clínica, mas também por outros fatores, como condição socioeconômica e ausência de suporte social. Aqueles que se mostrassem psicologicamente vulneráveis seriam encaminhados a um serviço de apoio psicológico do hospital, tal como acordado com a coordenadora do setor. Porém, essa demanda não foi identificada e nenhum paciente foi encaminhado.

 

Análise de Dados

Os dados foram analisados no software estatístico SPSS (Statistical Package for Social Sciences for Windows) versão 20, mediante o uso de técnicas descritivas e inferenciais pertinentes aos objetivos do estudo. Foi utilizado o nível de significância estatística de 5%. Antes das análises estatísticas foram identificadas e completadas algumas poucas omissões de respostas nas escalas utilizadas, correspondendo a menos de 1%, que foram substituídas pela média dos respectivos itens.

Inicialmente foram feitas análises descritivas que incluíram: média, mediana, desvio-padrão, assimetria, curtose e valores máximo e mínimo para as variáveis contínuas; e frequência e proporção para as variáveis categóricas. A normalidade da distribuição das variáveis critério (QV) e preditoras - resiliência e coping religioso - foi investigada mediante os histogramas, com dados de dispersão, os valores de skewness e kurtosis, bem como pelo teste Kolmogorov-Smirnov. O pressuposto de normalidade foi violado para as variáveis CRP (KS = 2,51, p < 0,001) e CRN (KS = 2,08, p < 0,001), sendo que resiliência (KS =0,66, p = 0,77) e QV (KS = 0,78, p = 0,58) não sofreram violações da normalidade. Não foram efetuadas transformações das variáveis que violaram o pressuposto da normalidade, optando-se por manter o banco de dados original. Gráficos de dispersão entre pares de variáveis não revelaram ausência de linearidade. Em seguida, análises de correlações de Pearson e Spearman foram computadas para acessar possíveis relações bivariadas entre as variáveis de interesse. Após examinar a distribuição normal dos subgrupos da amostra, foram realizados testes-t de Student para amostras independentes (e seu equivalente não paramétrico), a fim de comparar as médias das variáveis entre diferentes grupos (sexo, escolaridade, conjugalidade e idade) em relação à QV. Análises de variância (Teste ANOVA com post hoc de Tukey) foram utilizadas para comparar as médias dos escores de três níveis de tempo de diagnóstico e de uso de medicação ARV (até um ano, dois a seis anos e mais de seis anos), bem como as variáveis carga viral (CV) e linfócitos T CD4 com a QV.

Foi testado um modelo de regressão linear múltipla, sendo que a análise multivariada foi conduzida a partir dos resultados das análises bivariadas, de modo que variáveis com valores p menores que 0,05 entraram nas análises de regressão.

 

Resultados

Caracterização Sociodemográfica e Médico-Clínica da Amostra

Participaram do estudo 200 pessoas com HIV/Aids, sendo que 105 (52,5%) eram homens. Os participantes tinham entre 19 e 65 anos de idade (M=39 anos; DP = 10,9). Quanto à conjugalidade, 77 (38,7%) viviam com esposo(a) ou companheiro(a), 94 (47,2%) eram solteiros(as) e 28 (14,1%) separados(as), divorciados(as) ou viúvos(as). A escolaridade oscilou entre ensino fundamental incompleto (n = 60; 30%) a ensino superior completo (n = 15; 7,5%), sendo que 31% (n = 62) tinham ensino médio completo. Predominaram níveis baixos de renda familiar com base na soma de salários das pessoas que viviam na mesma casa: metade da amostra (n = 99; 50,3%) vivia com até um salário mínimo e 37,1% (n = 73) com dois a três salários.

Em relação aos dados clínicos, os pacientes haviam recebido o diagnóstico, em média, há sete anos (DP = 6,3), sendo 27 anos (n = 1; 0,5%) o maior tempo de diagnóstico e menos de 12 meses o menor tempo relatado (n=29; 14,5%). O tempo médio de uso de ARV foi de seis anos (DP = 6,0) variando de menos de um ano a 25 anos. Um número de 194 participantes (97%) referiu fazer uso dos ARV, o que era esperado considerando as políticas públicas de uso da TARV independentemente da contagem de linfócitos T CD4+ e da carga viral. Os seis casos que não estavam em uso de TARV referiram interrupção por conta própria e início de tratamento. Dos que tomavam a medicação, 173 pessoas (86,5%) percebiam sua adesão como boa ou muito boa, o que é coerente com o fato de que a maioria (n = 123; 61,5%) apresentava carga viral indetectável (menor ou igual a 50 cópias/mL), indicador de eficácia do tratamento antirretroviral. A carga viral plasmática medida pela quantidade de cópias virais por mililitro (mL) de sangue periférico (cópias/ml) oscilou entre 50 e 589.481 cópias (M=17.426,98; DP=62.555,027). Os valores da contagem dos linfócitos T CD4 + (número de células por milímetro cúbico de sangue) variaram de 5 a 1848 células/mm3 (M = 587,48; DP = 338,837).

 

Tabela 1

 

No que se refere aos dados sobre crenças e afiliação religiosas, a maioria (93,4%, n=185) relatou que sempre acreditou em Deus e 136 (68%) possuíam crenças em uma religião específica, sendo a maioria evangélica (38%), seguidos de católicos (20,5%) e espíritas (7,5%). Apenas um participante afirmou não acreditar em Deus. A quase totalidade dos participantes (n=185; 92,9%) indicou que sua fé era um fator importante ou muito importante em suas vidas, inclusive que esta tem ajudado ou tem ajudado muito no manejo do estresse (n = 164; 82%). Doze participantes (6%) afirmaram que sua religiosidade não tem ajudado a lidar com situações estressantes vivenciadas.

Descrição do Coping Religioso, da Resiliência e da Qualidade de Vida

Estatísticas descritivas revelaram que o escore médio do CRP foi maior que o do CRN, sendo 3,52 (DP = 0,52) e 1,71 (DP = 0,68), respectivamente, o que sugere predomínio no uso do padrão positivo de enfrentamento religioso nessa população, indicador de modos mais adaptativos de enfrentamento religioso para lidar com estressores relativos à soropositividade.

Os participantes, em geral, apresentaram bons níveis de resiliência (M = 3,06; DP = 0,41), sendo, portanto, capazes de enfrentar as dificuldades decorrentes da soropositividade e de aprender com elas. No entanto, houve variabilidade na amostra, indicando a diversidade de níveis de resiliência entre os participantes. A Tabela 2 apresenta a estatística descritiva das escalas CR e EAR.

O resultado da estatística descritiva dos domínios do instrumento WHOQOL-HIV Bref, incluindo a percepção global da QV e a satisfação com a saúde, também é apresentado na Tabela 2. A maior parte dos sujeitos considerou sua QV como boa ou muito boa (n = 145; 72,5%) e mostrou-se satisfeita ou muito satisfeita com sua saúde (n = 116; 58%).

Foram verificadas correlações entre os domínios do WHOQOL-HIV Bref e o índice total que abrangeu todas as questões do instrumento (denominada de QV total) com os fatores da escala CR e resiliência. A Tabela 3 descreve as correlações de Spearman entre os domínios da QV e as variáveis CRP e CRN, bem como as correlações de Pearson entre esses domínios e resiliência. Pode-se observar que o CRN associou-se significativa e negativamente com a QV total e com todos os domínios de QV, indicando que as pessoas que apresentaram melhor QV fizeram menor uso de CRN. Por outro lado, a relação entre CRP e QV não foi significativa com nenhuma dimensão do instrumento WHOQOL-HIV Bref. No que se refere às associações entre resiliência e QV, as análises de correlação de Pearson indicaram que estas foram positivas e significativas em todos os domínios, inclusive com a QV total na qual foi identificada a maior correlação (r = 0,31; p = 0,000).

Quanto aos aspectos sociodemográficos, a comparação das médias dos escores de QV obtidos para homens e mulheres revelou diferença estatisticamente significativa referentes a todos os domínios com os homens mais satisfeitos. Apenas no domínio relações sociais a diferença entre os sexos não foi significativa (t = 1,316; p = 0,19), sugerindo que homens e mulheres percebiam as relações sociais de forma semelhante.

Embora nível de escolaridade também não tenha apresentado diferença significativa nas médias dos escores dos domínios físicos (p = 0,08; t = -1,75) e espiritualidade e crenças pessoais (t = -1,90; p = 0,058), para os domínios psicológico, independência e relações sociais, bem como para a QV total, a diferença entre as médias foi significativa, considerando p £ 0,05 e p £ 0,001, de modo que pessoas com escolaridade mais alta apresentaram melhor pontuação de QV nestes domínios e na QV total. Não foram identificadas diferenças estatisticamente significativas entre os domínios do WHOQOL-HIV Bref e outras variáveis sociodemográficas e médico-clínicas analisadas.

Regressão Linear Múltipla: Procedimentos Preliminares

De forma preliminar foi verificada a viabilidade da análise de regressão múltipla padrão. Um paciente (caso 9) não preencheu a escala de resiliência, sendo que foi excluído das análises bivariadas e multivariadas que incluíram essa variável.

Investigou-se, na sequência, a existência de casos discrepantes univariados, sendo identificados três casos, não extremos, dois deles (números 112 e 148) na variável coping religioso positivo e um caso (número 65) em coping religioso geral. Optou-se pelo procedimento de reajuste dos escores desses três casos, visando tirá-los da condição de outlier. Foram realizadas alterações nos valores dos escores desses casos, aproximando-os dos valores dos casos não outliers que encontravam-se nas extremidades da distribuição, mantendo-se, portanto, o perfil de distribuição da amostra, tal como recomendado por Tabachnick e Fidel (2001). Assim, na variável coping religioso positivo, ambos tinham escore 1 e passaram a ter 1,70 (o anterior não outlier tinha escore 1,71). Com base no critério da distância Mahalanobis (c2 = 16,81, p < 0,01), os outliers multivariados foram pesquisados, sendo que um caso foi identificado, o de número 65, já identificado como outlier univariado e que teve seu escore ajustado. Optou-se por excluir esse caso da amostra nas análises multivariadas. Assim, as análises subsequentes tiveram 198 participantes.

Não foram identificados problemas de colinearidade entre as variáveis preditoras, já que se observou: ausência de correlações acima de 0,40 na matriz; fator de inflação da variância (FIV) de cada variável abaixo de cinco; estatística tolerância de cada variável acima de 0,20. A adequação das variáveis quanto aos pressupostos exigidos para análises multivariadas foi confirmada pela análise exploratória de dados e de pressupostos. Em relação à adequação do tamanho da amostra para a realização da análise de regressão múltipla, procedeu-se a cálculos de acordo com o número de variáveis antecedentes (cinco), segundo Tabachnik e Fidell (2001). Assim, a amostra deveria incluir no mínimo 92 participantes, mostrando-se satisfatória com 198 casos. Dessa forma, a análise de pressupostos indicou que a análise de regressão era viável.

Investigando os Preditores da Qualidade de Vida

Para a investigação dos preditores da QV, foi realizada análise de regressão múltipla método padrão, considerando como variáveis antecedentes sexo, escolaridade, resiliência, coping religioso positivo e coping religioso negativo. Essas variáveis foram selecionadas tendo em vista os resultados de análises bivariadas com QV, quando foram observadas associações estatisticamente significativas. Na Tabela 4 apresentam-se os resultados da análise de regressão múltipla.

Os resultados indicaram que três variáveis antecedentes contribuíram de modo significativo para a predição: resiliência, mais forte preditor, com 6% de contribuição para a variância da QV (sr2 = 0,06), seguido do coping religioso negativo com 4% (sr2 = 0,04) e da escolaridade, alcançando 3% de contribuição (sr2 = 0,03). A variável sexo contribuiu apenas com 1% (sr2 = 0,01), não obtendo significância estatística. Assim, as quatro variáveis alcançaram 14% de variabilidade única, ou seja, a soma da contribuição de cada uma delas na explicação da variância da QV. Assim, 25% (24% ajustado) da variância da QV pode ser predita com base nos escores dessas três variáveis antecedentes. Concluindo, escores mais altos em qualidade de vida resultaram de escores maiores em resiliência, maior escolaridade e menor utilização de coping religioso negativo na amostra de pessoas soropositivas que participaram do estudo.

 

Discussão

As características sociodemográficas da amostra foram compatíveis com as tendências epidemiológicas da Aids no Brasil, desde o advento da TARV: pauperização da epidemia (dada pelos indicadores de escolaridade e/ou renda familiar), faixa etária com predomínio de adultos na faixa etária de 20 a 34 anos e distribuição homogênea entre os sexos, semelhantes às observadas em outros estudos com PVHA no país, de acordo com o último boletim epidemiológico do Ministério da Saúde (Brasil, 2016).

Faz-se importante ressaltar a grande variabilidade no tempo do diagnóstico da infecção, revelando o aumento da expectativa de vida dos participantes, aspecto associado ao uso da TARV e coerente com estatísticas recentes que demonstram que no período de 2005 a 2013 o Brasil mais que dobrou o número de pessoas em tratamento, apresentando um aumento expressivo na proporção de PVHA em TARV a cada ano (Brasil, 2016). Logo, o fato de a maioria da amostra apresentar carga viral indetectável era esperado e, de forma coerente e em consequência, apresentavam bons níveis de valores médios de linfócitos T CD4 no sangue periférico. Cabe ressaltar que o Brasil é um dos países a adotar o protocolo denominado tratamento como prevenção (TasP), com a oferta do tratamento independente dos níveis de carga viral e línfócitos T CD4 (Hull, Lange, & Montaner, 2014; Seidl, 2015). A percepção acerca da QV geral foi satisfatória, bem como em relação aos domínios: os participantes apresentavam bons escores médios de QV para os seis domínios do WHOQOL-HIV Bref, variando de 11,78 a 15,36. PVHA avaliadas em outras pesquisas brasileiras tiveram escores médios similares aos obtidos neste estudo (Ferreira et al., 2012), resultados esperados já que o acesso universal à TARV tem se associado a melhores avaliações de QV em PVHA. Entre os seis domínios do WHOQOL-HIV Bref, o que revelou escores mais altos foi o domínio espiritualidade e crenças pessoais, seguido de relações sociais, dimensão psicológica, física, nível de independência e meio ambiente, corroborando resultados de pesquisas que mostraram que a dimensão espiritualidade e crenças pessoais foi o domínio melhor avaliado em pessoas com HIV/Aids (Calvetti et al., 2008; Henry, 2013) e, especificamente, por mulheres soropositivas (Gaspar et al., 2011).

Os participantes obtiveram escore médio mais baixo no domínio ambiente, o que pode ser reflexo da condição socioeconômica de grande parte da amostra já que os aspectos avaliados nesse item sofrem forte influência dos níveis de renda. Resultados semelhantes foram identificados em amostra de pessoas com HIV/Aids na cidade de São Paulo (Santos, Junior, & Lopes, 2007), em um serviço especializado do estado de Mato Grosso do Sul (Ferreira et al., 2012) e em estudo com mulheres soropositivas em João Pessoa (Medeiros, Silva, & Saldanha, 2013). Ressalta-se, portanto, que PVHA muitas vezes lidam com carências sociais e econômicas que seguramente têm impacto negativo na percepção da QV.

As diferenças nos escores médios dos domínios de QV entre homens e mulheres apontam a possível influência de questões de gênero na percepção da QV, também observada em outros estudos: Damilda et al. (2015) e Ferreira et al. (2012) verificaram que mulheres com HIV/Aids apresentaram piores médias de QV em relação aos homens. Ferreira et al. (2012), Gaspar et al. (2011) e Santos et al. (2007) afirmaram que a compreensão dessas diferenças de gênero na avaliação da QV deve ser feita à luz da realidade sociocultural brasileira, na qual piores condições econômicas e desigualdades de inserção no mercado de trabalho são fatores que contribuem para uma pior QV na percepção de mulheres que têm menos acesso a bens de consumo, à seguridade social e à educação. Quanto ao nível educacional, indivíduos com escolaridade mais alta apresentaram melhor avaliação da QV, indo ao encontro de estudos que também observaram associações relevantes entre QV e essa variável (Ferreira et al., 2012; Gaspar et al., 2011).

Os resultados dos participantes na escala de resiliência permitem concluir, não obstante a grande variabilidade, que grande parte apresentou escores altos nessa variável, denotando uma boa capacidade de ter respostas adaptativas e reagir positivamente a situações adversas relacionadas à condição crônica de soropositividade. Apesar de poucos pesquisadores terem documentado o processo de resiliência em PVHA, Calvetti et al. (2008), De Santis et al. (2013) e Wiegers (2008) concluíram em seus estudos que muitas PVHA vivenciam processos de resiliência, apesar dos desafios físicos, psicológicos e sociais desta condição crônica. Nossos resultados atestaram a relevância de se considerar a resiliência nos desfechos de saúde, na medida em que essa variável contribuiu significativamente para a predição da QV, sendo, inclusive, o mais forte preditor, o que corrobora dados do estudo de Cal, Sá, Glustake e Santiago (2015) em revisão da literatura sobre resiliência e doenças crônicas, incluindo HIV/Aids. Assim, em indivíduos soropositivos a resiliência parece representar um dos fatores que permite persistir e/ou se adaptar às dificuldades.

Tais achados corroboram os resultados identificados por Araújo, Teva e Bermúdez (2015) na revisão teórica de 412 artigos publicados entre os anos de 2000 a 2011 sobre resiliência em adultos. Os resultados indicaram que a resiliência funciona como fator de proteção para a superação de adversidades associadas a enfermidades físicas. Os autores observaram em vários estudos, por exemplo, que o coping e a resiliência tiveram uma relação positiva com a qualidade de vida. Os estudos centrados em resiliência e infecção por HIV indicaram que pessoas soropositivas com maior resiliência e autoestima tinham mais probabilidade de enfrentá-la de forma adaptativa.

Estudos prévios verificaram que PVHA se voltam para a religiosidade/espiritualidade utilizando, assim, uma variedade de estratégias de coping religioso para gerir sua condição (Henry, 2013; Kisenyi, Muliira, & Ayebare, 2013). Como esperado, os participantes fizeram mais uso de estratégias positivas de coping religioso, corroborando a literatura que aponta o predomínio do padrão positivo nessa população (Pargament et al., 2004; Joshi & Kumari, 2009; Trevino et al., 2010). No entanto, estratégias de CRN, embora menos frequentes, também foram relatadas no presente estudo e são expressão de uma relação desconfiada e menos segura com Deus, levando muitas vezes a conflitos religiosos/espirituais. As estratégias de coping religioso negativo têm sido associadas com sintomas depressivos (Charzyn'ska, 2015), pior bem-estar subjetivo (Faria & Seidl, 2005) e pior da percepção da QV nesta população (Joshi & Kumari, 2009; Trevino et al., 2010).

Os dados do estudo corroboraram também a ocorrência de correlação negativa entre todos os domínios de QV e CRN, mas não evidenciou a existência de correlação positiva entre dimensões da QV e CRP, achado identificado em estudos anteriores com PVHA (Dalmida et al., 2015; Henry et al., 2013; Trevino et al., 2010; Tsevat et al., 2009).

Os relacionamentos diferenciais entre CRN e CRP sublinham o caráter multifacetado da religião: paradoxalmente, esta pode ser uma fonte de soluções para os problemas, mas também pode ser prejudicial para a saúde mental por meio do uso de estratégias de coping religioso negativo que têm sido relacionadas a pior QV, pior bem-estar e maior sofrimento psicológico (Abu-Raiya, Pargament, & Krausen, 2015; Weber & Pargament, 2014).

Do ponto de vista qualitativo, é possível pensar que estratégicas de coping religioso negativas podem ser utilizadas de forma breve, sem implicações negativas na saúde mental. Outra possibilidade é que a expressão de dor e conflito religiosos, quando acompanhada de estresse, pode ter efeitos benéficos em longo prazo. Uma pequena, mas significativa, relação entre coping religioso negativo e crescimento pessoal relacionado ao estresse foi observada por autores que concluíram que o CRN pode ser danoso para algumas pessoas, mas fonte de crescimento e transformação pessoal para outras (Gall & Guirguis-Younger, 2013; Pargament et al., 1998; Phelphs et al., 2009). Ademais, a conceituação de dois tipos de enfrentamento religioso (positivo e negativo) é coerente com a perspectiva de que religião/espiritualidade pode ser tanto fonte de gratidão e suporte, quanto de conflito e decepção.

Em suma, os resultados indicaram que três variáveis antecedentes investigadas no estudo contribuíram de modo significativo para a explicação de 25% (24% ajustado) da variância da QV: resiliência, coping religioso negativo e escolaridade. Ressaltam-se, assim, as influências relevantes de variáveis psicossociais na predição dos resultados de QV, bem como a multidimensionalidade desse construto que requer análises mais complexas que envolvam um número maior de variáveis para a sua compreensão.

Os resultados, no entanto, devem ser interpretados com cautela, já que limitações podem ser identificadas no presente estudo. Os dados foram coletados com PVHA assistidas em um hospital localizado em Goiânia e se constituiu em amostra de conveniência. Ademais, a grande maioria dos participantes pertencia a uma afiliação religiosa cristã, de modo que a generalização dos resultados para indivíduos de outras denominações religiosas deve ser feita com parcimônia. Além disso, foram estudados pacientes com bom acesso ao acompanhamento e tratamento para HIV/Aids: mais de 95% estavam usando medicamentos antirretrovirais e a maioria apresentou taxas de carga viral abaixo do limite detectável e bons níveis imunológicos dados pelos valores das células T CD4. Esses resultados, não podem, portanto, ser generalizados para pacientes que não têm acesso aos ARV, como os de outros países onde a TARV não está disponível de forma universal.

O delineamento transversal, ainda que com análises estatísticas multivariadas, coloca limitações na inferência de relações causais entre as variáveis estudadas. Um entendimento abrangente de relações causais requer delineamentos de pesquisa longitudinais, com amostras randomizadas, que têm sido pouco realizados não obstante serem necessários para determinar e esclarecer as mudanças nas variáveis e os efeitos a longo prazo. Por fim, a carência de literatura sobre resiliência no contexto do HIV/Aids, acarretou uma discussão mais concisa dos resultados do presente estudo.

A RCOPE foi desenhada para ser teórica e empiricamente embasada, abrangente, clinicamente válida e aberta aos aspectos positivos e negativos da religiosidade. Estrutura-se de acordo com a cultura religiosa norte-americana, de tradição judaico-cristã, com maioria protestante (evangélicos tradicionais) e católica, mas os autores destacam sua aplicabilidade em populações com diferentes crenças e níveis de envolvimento religioso, bem como no coping com problemas diversos (Pargament, Feuille, & Burdzy, 2011). Diante dessas ponderações, sugere-se a realização de estudos sobre coping religioso em culturas fora do contexto ocidental que são, em grande parte, não cristãs e inclusive não-teístas, para verificar a aplicabilidade desse instrumento em outras religiões. Nessa direção, Gall e Guirguis-Younger (2013) ressaltam que uma tendência interessante de pesquisas futuras é considerar a influência do contexto sociocultural no coping religioso/espiritual, já que este pode ser mais utilizado em algumas culturas e grupos sociais e, também, em determinadas fases do desenvolvimento humano, indicando como o enfrentamento religioso evolui no curso de vida.

Os resultados atestam ainda a importância de se distinguir entre religião e espiritualidade, porque muitos participantes afirmaram que tinham crenças religiosas, mesmo não tendo uma afiliação específica. Poucas escalas levam em consideração as estratégias espirituais, não religiosas de enfrentamento.

 

Considerações finais

Os resultados sobre a percepção da QV eram esperados, pois a Aids hoje tem tratamento e possibilidades efetivas de controle mediante o uso de medicamentos antirretrovirais. Um dado importante deste estudo foi que as variáveis médico-clínicas - variação no tempo desde o diagnóstico de soropositividade e tempo de uso de ARV - mostraram-se pouco relevantes na percepção de uma QV satisfatória dos participantes, se comparadas às psicossociais, como resiliência, e às sociodemográficas, como escolaridade. A inclusão da avaliação da QV no seguimento clínico, com instrumentos padronizados, pode identificar domínios mais críticos das vidas de PVHA e contribuir para o direcionamento de ações e de intervenções profissionais visando atenção integral à saúde.

Uma implicação desse estudo é que muitos pacientes com HIV/Aids não apenas conseguem lidar e se adaptar à soropositividade, mas mantêm boa saúde e QV, o que oferece esperança para inúmeras pessoas infectadas com um vírus que antes prenunciava sofrimento e morte. Evidencia-se, assim, a importância da participação de profissionais de saúde e de pesquisadores, não apenas na avaliação dos prejuízos psicossociais associados à Aids, mas no redirecionamento do enfoque dos estudos e intervenções para aspectos promotores de saúde que visem ao desenvolvimento da resiliência. Conclui-se pela relevância de profissionais de saúde, em especial os psicólogos, reconhecerem a importância da religiosidade na assistência a pessoas com HIV/Aids. Certamente, esta é uma atitude que exige ética, tendo em vista que se trata de aceitar a religiosidade como um valor do paciente e, muitas vezes, como um recurso importante de enfrentamento da soropositividade naquele determinado momento.

 

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Recebido em: 4/1/2019
Aprovado em: 24/10/2019

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