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Revista Psicologia Organizações e Trabalho

versão On-line ISSN 1984-6657

Rev. Psicol., Organ. Trab. v.6 n.1 Florianópolis jun. 2006

 

EDITORIAL

 

O II Congresso Brasileiro de Psicologia Organizacional e do Trabalho (II CBPOT), realizado em Brasília em julho de 2006, incluiu, dentre suas áreas temáticas, o Comportamento do Consumidor. Tal fato, além de ser um avanço para esse campo de pesquisa no País, também gerou um grande número de apresentações e discussões da mais alta qualidade nesse encontro bienal. Ao todo, foram apresentados: uma conferência internacional, dois mini-cursos, dois simpósios, um estudo de caso, duas sessões coordenadas, oito pesquisas resumidas em duas apresentações orais e seis posteres. De cer to modo, o II CBPOT fortaleceu a relevância desta área para o País. Porém, mais do que isso, as discussões realizadas no Congresso apontaram para a importância de se ter uma produção científica de qualidade no Brasil. A produção do presente Volume Especial da rPOT sobre Comportamento do Consumidor vem atender a essa demanda.

O campo da Psicologia do Consumidor tem feito grandes progressos nos últimos anos, ampliando a exploração de tópicos a serem investigados, bem como de pesquisadores com interesse no estudo das facetas que constituem esse fenómeno, ou seja, o comportamento do consumidor. No primeiro capítulo, dedicado exclusivamente à Psicologia do Consumidor no Annual Review of Psychology, Guest (1962) se limitou a descrever as técnicas de coleta de dados e outros aspectos metodológicos da pesquisa com o consumidor, além de fazer uma revisão compreensiva sobre as propagandas subliminares. Desde então, muito avanço tem sido feito. Hoje em dia, pesquisadores do comportamento de consumo já representam quase a metade dos professores das escolas de Marketing do mundo, e estudos sobre o consumo já podem ser considerados como a área de maior crescimento em disciplinas como Antropologia e Sociologia. Todavia, o estudo do comportamento do consumidor, na Psicologia, ainda é incipiente, em especial no Brasil, o que indica a necessidade de formação de pesquisadores na área.

O comportamento do consumidor tem sido estudado do ponto de vista da compra em si (especialmente pela Economia e Administração) e também com relação ao processo de tomada de decisão. Os consumidores geralmente coletam informações antes de efetuar as suas compras. Eles podem procurar bons preços, boas condições de pagamento, marcas específicas, características dos produtos, experimentar novos itens ou marcas e assim por diante. Tais procuras podem ser breves e de baixo custo, como quando alguém escolhe um produto na prateleira de um supermercado, ou demoradas e dispendiosas, como quando alguém procura por um automóvel ou apartamento. Conhecer as variáveis que influenciam o comportamento de procura de produtos pode auxiliar diversas decisões empresariais, tais como a escolha do local de ponto de venda, da forma de apresentar o produto, das características de novas embalagens e sistema de promoções. Pesquisas têm apontado que o significado do produto (e seus atributos) para o consumidor é uma das variáveis que melhor prediz o comportamento de procura e compra. Evidências demonstram que os produtos e serviços, na verdade, são sinais que são interpretados pelos indivíduos por meio do significado que é atribuído a estes produtos. Ao contrário de algumas teorias econômicas tradicionais, que entendem que o valor de um produto está ligado apenas ao seu valor de troca no mercado, autores da área sugerem que o seu significado também dá valor ao produto.

O significado atribuído ao produto ou serVIço tem SIdo estudado na Psicologia, em especial, na área Social-Cognitiva. Aliás, explicações de orientação cognitivista-social têm prevalecido na área de pesquisa sobre comportamento do consumidor, assim como em quase todas as áreas da Psicologia. Muitos desses modelos teóricos, como aquele proposto por Allen (1999), interpretam as escolhas do consumidor como uma atividade de resolução de problemas, determinadas pelo processamento de informações. As informações sobre produtos, marcas e preços senam, de acordo com tais modelos, analisadas, classificadas e interpretadas, sendo transformadas por processamento em atitudes e intenções que acabariam por produzir escolhas e compras. O artigo de Allen, no presente volume, ilustra essa abordagem.

Já em 1990, Foxall chamava a atenção para o excessivo domínio de abordagens teóricas de inspiração social-cognitiva e, apesar de reconhecer sua importância, ressaltava a necessidade de diversidade para o progresso científico. Naquele contexto, o autor propósum modelo comportamental para analisar o comportamento do consumidor (Foxall, 1986), enfatizando os efeitos das conseqüências geradas pelo comportamento do consumidor e de variáveis situacionais.

O presente volume pretende apresentar um panorama dos modelos mais inovadores que têm sido utilizados para a compreensão do comportamento do consumidor, preservando a diversidade teórica que nos parece essencial para o desenvolvimento da área. Grande parte dos artigos foram inspirados por teorias cognitivas ou comportamentais. Os enfoques social-cognitivo e comportamental, apesar de se basearem em premissas epistemológicas diferentes muitas vezes conflitantes, quando interpretados sem exageros e radicalismos podem ser vistos como complementares na investigação do comportamento do consumidor. Enquanto o primeiro enfoque tende a enfatizar os processos de tomada de decisão e características individuais quase que independentemente do contexto específico onde ocorrem, o segundo tende a enfatizar variáveis situacionais e de contexto, minimizando a inferência de processos mediadores e quase que independentemente de características individuais (ou disposicionais, como atitudes). Nesse sentido, primeiramente são apresentados dois artigos teóricos, um de Allen e outro de Foxall, Oliveira-Castro, James e Schrezenmaier, onde tais modelos são discutidos. Em seguida, quatro artigos empíricos de autores nacionais demonstram a aplicação desses modelos no Brasil, utilizando amostras brasileiras no desenvolvimento das pesquisas relatadas. Dois outros artigos, um sobre satisfação do consumidor e outro sobre o uso da inteligência artificial no julgamento de produtos são apresentados, em coerência com as linhas teóricas introduzidas nos dois primeiros artigos do volume, ou seja, Psicologia Social-Cognitiva e Análise do Comportamento. Finalmente, um artigo metodológico discute a aplicação da abordagem multimetodológica para pesquisas sobre consumo.

Esperamos, com esse volume, reforçar a área de pesquisas sobre consumidores no Brasil, incentivando a pesquisa científica séria na área, a exemplo do Grupo de Pesquisa Consuma - da Universidade de Brasília. A aplicabilidade desse tipo de pesquisa nos parece óbvia: Com a convergência tecnológica, o estabelecimento das parcerias multinacionais e a abertura de mercados internacionais, como no caso do Mercosul, o consumidor passa a ser o foco principal dos negócios. Além disso, evidências recentes cada vez mais indicam que, na industria de serviços, o mais apropriado critério de desempenho da organização e a satisfaçao do consumidor. Conhecer tais tipos de relações entre variáveis, estudá-las e saber das suas implicações parece ser uma tarefa necessária para o pesquisador que pretende aprofundar-se na Psicologia do Consumidor. Aproveitem o volume.

 

Editores Convidados

Cláudio V. Torres
Jorge M. Oliveira-Castro

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